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Avaliação Psicológica
versão impressa ISSN 1677-0471
Aval. psicol. vol.10 no.2 Itatiba ago. 2011
Avaliação do suporte familiar em idosos residentes em domicílio
Evaluation of family support in elderly living at home
Luciana Araújo dos Reis1, I; Gilson de Vasconcelos TorresI; Luana Araújo dos ReisII; Marcos Henrique FernandesI; Thaiza Teixeira Xavier NobreIII
IUniversidade Estadual do Sudoeste da Bahia
IIUniversidade Federal da Bahia
IIIUniversidade Federal do Rio Grande do Norte
RESUMO
Este teve por objetivo avaliar a percepção do suporte familiar em idosos residentes em domicílio. Trata-se de uma pesquisa do tipo analítica, com delineamento transversal, tendo uma amostra de 150 idosos, com média de idade de 74,47 (DP 9,42) anos, cadastrados em quatro Unidades de Saúde no município de Jequié/BA. O instrumento foi constituído de: dados sociodemográficos e de saúde; Mini-exame do Estado Mental e o Inventário de Percepção do Suporte Familiar. De acordo com a média dos valores dos domínios do Inventário do Suporte de Percepção Familiar, a maioria dos idosos apresentou percepção do suporte familiar inadequada nos domínios Afetividade-Consistência (52,0%) e Autonomia (58,0%) e percepção do suporte familiar adequado no domínio Adaptação Familiar (67,3%). Diante do exposto, fica evidente que boa parte dos idosos entrevistados apresentou comprometimento dos domínios Afetividade-Consistência e Autonomia do Inventário de Percepção do Suporte Familiar, o que demonstra, em parte, a falta preparo das famílias na prestação de cuidados aos idosos.
Palavras-chave: idoso, família, suporte familiar, cuidado.
ABSTRACT
The aim of the present study was to assess the perception of family support in elderly individuals living at home. This is an analytical study with a cross-sectional design involving a sample of 150 elderly subjects with mean age of 74.47 (SD 9.42) years, enrolled in four health units in the city of Jequié, Brazil. The instruments consisted of social demographic data and health; the Mini-Mental State Examination and the Perception of Family Support Inventory. According to the mean of the areas of Inventory of Perceived Family Support, most seniors had inadequate perception of family support in the areas Affectivity-consistency (52.0%) and autonomy (58.0%) and perception of family support system in the area Family Adaptation (67.3%). It is evident that many of the elderly subjects showed commitment, consistency and affective domains of the Self Perception Inventory of Family Support. It shows, in part, the lack of preparation in families providing care for the elderly.
Keywords: elderly, family, family support, care.
O processo de envelhecimento populacional é alvo de atenção em todos os países, uma vez que ocorre um aumento significativo do número de idosos na população em geral. Estima-se que entre os anos de 1980 e 2020 a população mundial total deverá ter crescido 80%, enquanto o número de idosos deverá ter crescido 160% (Sampaio, Lessa, Reis & Torres, 2007). No Brasil, o envelhecimento da população assume características peculiares dadas à rapidez com que vem se instalando. De acordo com os padrões estabelecidos pela Organização Mundial de Saúde (OMS), o país já pode ser considerado estruturalmente envelhecido, dado que mais de 7% de sua população possui hoje 60 ou mais anos de idade (Reis, Mascarenhas & Torres, 2008).
O envelhecimento pode ser entendido como um processo comum a todos os seres, que depende das características próprias de cada ser e será influenciado por múltiplos fatores (biológicos, econômicos, psicológicos, sociais, culturais, entre outros), conferindo a cada um que envelhece características particulares. É um processo dinâmico e progressivo no qual modificações tanto morfológicas como funcionais e bioquímicas podem interferir na capacidade de adaptação do indivíduo ao meio social em que vive, tornando-o mais vulnerável aos agravos e doenças, comprometendo sua qualidade de saúde (Trelha & cols, 2005).
A maior vulnerabilidade e maior incidência de processos patológicos podem ocasionar a diminuição da capacidade funcional do idoso, o que na maioria das vezes implica em uma necessidade de cuidado diferenciado para com o mesmo (Silva & cols., 2006). Nesse sentido, é imprescindível à qualidade do cuidado revelar o papel da família do idoso, uma vez que ela está presente no dia a dia do mesmo, tendo que lidar com o processo de envelhecimento e com os problemas que o idoso pode desenvolver. Essa dinâmica vem ocasionando mudanças na própria estrutura familiar, na qual a intergeracionalidade surge como uma das características do processo de envelhecimento não só individual, mas coletivo, em que famílias envelhecem junto com os seus membros, se reorganizando para fazer face às demandas do envelhecimento.
Ressalta-se que, em 2000, 24,1% das famílias brasileiras tinham pelo menos uma pessoa com 60 anos ou mais de idade coabitando a mesma casa, reforçando o seu importante papel de apoio informal na sociedade (Silva, Galera & Moreno, 2007; Souza, Skubs & Bretãs, 2007). Nessa perspectiva, o suporte familiar é caracterizado pelas variáveis psicológicas presentes nas relações familiares, que têm papel fundamental no desenvolvimento de seus membros, influenciando a forma como são vivenciados e reproduzidos comportamentos, afetividade e valores sociais. O suporte familiar é considerado ótimo quando houver na família altos níveis de carinho e permissão para autonomia e independência (Baptista, 2005).
A família é um sistema dinâmico em interação dialógica que pretende (ou deve pretender) ajudar a pessoa a desenvolver uma presença afetiva, responsável e livre no mundo (Silva, Bessa & Oliveira, 2004). Cada pessoa tem e terá ao longo de sua existência, várias famílias (a de seus ancestrais, a de sua infância, a de sua adolescência, a de sua vida adulta e de sua velhice), assumindo em cada fase características peculiares, mas mantendo a função primordial, a de preservar a integridade física e emocional de seus membros e do próprio grupo, propiciando o seu desenvolvimento (Pavarini & cols, 2008; Montezuma, Freitas & Monteiro, 2008).
Diante do rápido envelhecimento populacional verificado nas últimas décadas, percebe-se que a organização do sistema público de saúde ainda não conseguiu se desenvolver com a mesma rapidez. Apesar das mudanças ocorridas no cenário nacional em relação às políticas de proteção social ao idoso, estas ainda se apresentam muito restritas na oferta de serviços e programas de saúde pública, como na amplitude da sua intervenção.
Quando se trata de idosos residentes em domicílios de áreas periféricas, essa situação é ainda mais grave, pois estes idosos apresentam elevado grau de problemas de saúde e de incapacidades funcionais, e não se beneficiam da maioria dos programas relacionados à terceira idade que visam sua qualidade de vida e interação com a sociedade. Dessa forma, a problemática do idoso acaba se tornando um fardo para as famílias, que não apresentam conhecimentos básicos sobre a temática necessária para o devido cuidado para com ele. Esse despreparo resulta em desgastes familiares, comprometimento na qualidade do cuidado prestado ao idoso, prejuízo na saúde do idoso e do cuidador.
Mediante o exposto, se faz necessária uma maior compreensão de como tem se dado o processo de envelhecimento segundo a visão do próprio idoso. Esse maior entendimento servirá para subsidiar os profissionais de saúde, para uma abordagem assistencial ampliada do processo de envelhecimento, incluindo o contexto familiar, objetivando uma melhor qualidade do cuidado prestado ao idoso. Nessa perspectiva, este estudo tem por objetivo avaliar a percepção do suporte familiar em idosos residentes em domicílio.
Método
Trata-se de uma pesquisa do tipo analítica, com delineamento transversal, realizada no município de Jequié, interior da Bahia, Região Nordeste do Brasil, no período de setembro a novembro de 2009.
Participantes
A amostra foi constituída por 150 idosos, selecionada de forma aleatória simples, por meio de sorteio com reposição em Unidades de Saúde. O valor da amostra foi calculado com base na média (12,65), desvio-padrão (3,61) e margem de erro de 5%, encontrados nos domínios adaptação familiar e autonomia do Inventário de Percepção do Suporte Familiar no Teste Piloto. Os critérios de inclusão no estudo foram: apresentar condições mentais (pontuação acima de 23 pontos no MEEM) de Sampaio e cols. (2007) para responder ao instrumento da pesquisa e concordar em participar da pesquisa ou ter sua participação autorizada pelo cuidador, firmando o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
Instrumento
O instrumento de coleta de dados foi constituído de três partes. A primeira parte representada pela caracterização sociodemográfica (faixa etária, sexo, escolaridade, tipo de renda, valor da renda, estado civil e ocupação do tempo livre) e condições de saúde (presença de problemas de saúde e sequelas, tipos de sequelas). A segunda parte se referiu ao Mini-exame do Estado Mental (MEEM), para avaliar o estado cognitivo do idoso, sendo o mesmo aplicado ao idoso. A terceira parte foi composta pelo Inventário de Percepção de Suporte Familiar (IPSF), para avaliar o ambiente familiar quanto à adaptação, autonomia e afetividade.
O MEEM inclui 11 itens, divididos em 2 seções. A primeira exige respostas verbais a questões de orientação, memória e atenção e a segunda exige leitura e escrita e cobre habilidades de nomeação, seguir comandos verbais e escritos, escrever uma frase e copiar um desenho (polígonos) (Folstein & Foltein, 1995). Todas as questões são realizadas na ordem listada e podem receber escore imediato somando os pontos atribuídos a cada tarefa completada com sucesso. O escore máximo é de 30 pontos, sendo o ponto de corte para idosos de baixa escolaridade 23 pontos.
O IPSF foi desenvolvido por Baptista (2005) e consiste em construir, validar e fornecer maneiras de mensurar o construto de suporte familiar. É composto por 42 itens, sendo dividido em três dimensões; sendo o fator 1 denominado de Afetivo-Consistente. O segundo fator é denominado de Adaptação Familiar, que é pontuado de maneira invertida. Para efeitos de correção e análise, esse fator tem pontuação invertida, sendo que quando pontuado 0 vale 2, 1 permanece igual e 2 vale 0. A última dimensão é a Autonomia. As questões são do tipo likert de três pontos, nas quais o respondente assinala nunca (0), quase nunca (1) ou quase sempre (2). O fator 1 – Adaptação Familiar é pontuado de maneira inversa aos outros fatores, sendo que ao final da avaliação quanto maior a pontuação, maior o nível de suporte familiar percebido pelo respondente.
Esse instrumento teve sua validade investigada por intermédio de análise fatorial. Os participantes desse estudo foram 1064 estudantes do ensino médio e universitário, com idade variando entre 17 e 64 anos, de instituições particulares e públicas do estado de São Paulo. A maior parte dos participantes foi de sexo feminino. O KMO inicial foi de 0,92 e o teste de esferidade de Barlett foi significativo ao nível de 0,001, sendo que foi explicada 42,80% da variância total. O IPSF foi composto inicialmente por quatro fatores: Inadaptação; Afetividade; Consistência e Autonomia, englobando 43 itens: 14 itens mensurando a percepção de baixo ou inadequado suporte familiar; dez itens representando as relações afetivas intra-familiares, inclusive os interesses dos membros e expressões afetivas verbais e nãoverbais; 11 itens, representando os papéis e regras intra-familiares, bem como as estratégias de enfrentamento familiares para problemas e, por último, oito itens, que representam o quanto o indivíduo sente que possui incentivo e liberdade para se expressar e ter autonomia. No que se refere à investigação da precisão do instrumento, os índices de confiabilidade, representados pelo Alfa de Cronbach, foram de 0,88 para a Inadaptação, 0,86 para a Afetividade, 0,83 para a Consistência, 0,81 para a Autonomia e, por fim 0,93 para todo o inventário (Baptista, 2005).
Procedimentos
Os instrumentos foram aplicados pela própria pesquisadora com a ajuda dos agentes de saúde, sendo as visitas ao domicílio do idoso agendadas antecipadamente. Durante a aplicação dos instrumentos, a pesquisadora lia as questões para que os idosos pudessem responder. Foram excluídos os idosos que não apresentavam condições mentais para responder aos instrumentos (pontuação acima de 23 pontos no MEEM).
Os dados coletados foram organizados no Programa Estatístico SPSS versão 13.0. A análise foi feita por meio de estatística descritiva, sendo calculada, para as variáveis categóricas, frequência absoluta e relativa. Para as variáveis quantitativas foram calculados média e desvio padrão. As categorias dos domínios do IPSF foram criadas a partir do valor encontrado na mediana do Manual do IPSF, sendo classificadas as categorias como suporte familiar adequado e suporte familiar inadequado.
Esta pesquisa seguiu os princípios éticos presentes na declaração de Helsinki e na Resolução nº 196/96 do Conselho Nacional de Saúde. Os protocolos de pesquisa foram avaliados e aprovados pelo Comitê de Ética em Pesquisa de Seres Humanos da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (Parecer nº 189/2008).
Resultados
A apresentação dos resultados do presente estudo está estruturada em: caracterização das condições sociodemográficas da amostra estudada (Tabela 1), descrição das condições de saúde (Tabela 2), caracterização da composição familiar e da percepção do suporte familiar (Tabela 3).
Caracterização das condições sociodemográficas da amostra estudada
Dos 150 idosos estudados, 68, 6% eram do sexo feminino, com média de idade de 74,5 (DP 9,42) anos, sendo a idade mínima de 60 anos e a máxima de 106 anos. Em relação ao nível de escolaridade, 61,33% dos idosos eram analfabetos, sendo que 46,7% eram casados e 33,3% viúvos, conforme a Tabela 1.
Em relação à profissão, 48,7% dos idosos eram lavradores e 24,7% domésticas. Deles, 73,3% eram aposentados e apenas 14,7% não possuíam renda própria, sendo que 83,3% recebiam apenas um salário mínimo (R$ 460,00 DEZ/2009). No tocante ao uso do tempo livre, 78, 7% dos idosos relataram não realizar atividades para passar o tempo, de acordo com a Tabela 1.
Descrição das condições de saúde
Quanto às condições de saúde, 94,0% dos idosos relataram apresentar problemas de saúde, porém apenas 76,7% faziam tratamento medicamentoso. As patologias mais frequentes foram: Hipertensão Arterial (HAS), 22,7%, Diabetes associada a HAS, 11,3% e Artrose mais HAS 8,0%. A presença de sequelas foi verificada em apenas 21,3% dos idosos, sendo mais frequentes as sequelas neurológicas (15,3%), dentre elas mão em garra e marcha escavante. Esses resultados podem ser vistos na Tabela 2.
Caracterização da composição familiar e da percepção do suporte familiar
De acordo com a composição familiar, 23,3% dos idosos residiam com o cônjuge, seguido de 18,0% com filhos, 15,3% cônjuge e filho e 10,7% filho e neto. O número de pessoas que residem com os idosos variou entre 1 a 10 pessoas, com média de 2,4 (DP 2,7), sendo que o número de pessoas que contribuíam com a renda familiar variou de nenhuma a 5 pessoas, com média de 1,3(DP 0,9).
Em relação ao IPSF, o domínio Afetividade-Consistência obteve pontuação entre 7 a 42 pontos, com média de 36,8 (DP 7,4), o domínio Adaptação Familiar oscilou entre 6 a 26 pontos, sendo a média de 18,7 (DP 8,4) e o domínio Autonomia variou entre 10 a 16 pontos com média de 14,6 (DP 1,7). Segundo as médias dos valores do IPSF, os idosos apresentaram uma maior frequência de percepção do suporte familiar inadequada nos domínios Afetividade-Consistência (52,0%) e autonomia (58,0%). No domínio Adaptação Familiar, houve uma maior distribuição de idosos com percepção do suporte familiar adequado (67,3%), de a acordo com a Tabela 3.
Discussão
Os idosos analisados apresentaram uma média de idade alta (74 anos) e com predomínio do sexo feminino. Fatores biológicos, sociais e culturais são responsáveis pela maior expectativa de vida das mulheres. No Brasil, elas vivem aproximadamente sete anos a mais que os homens (Zunzunegui, Nunez, Durban, Garcia de Yébones & Otero, 2006).
A baixa escolaridade da maioria dos participantes no presente estudo, em que 61,3% dos idosos eram analfabetos, leva à necessidade de uma adequação das ações de educação em saúde, para que haja uma maior compreensão e motivação por parte destas pessoas. Algumas características como, analfabetismo, aposentadoria e alterações do estado nutricional podem levar a uma maior dependência do idoso em relação a outras pessoas (Collins, Rooney, Smalley & Havens, 2004).
No presente estudo, 83,3% dos idosos relataram receber um salário mínimo. Isso enfatiza a necessidade da existência de programas voltados à prevenção e ao tratamento das doenças como subsídio para que o indivíduo possa se autocuidar, uma vez que a renda recebida por estes idosos tem por finalidade cobrir todas as suas despesas mensais (Doimo, Derntl & Lago, 2008; Silveira, Caldas & Carneiro, 2006).
A hipertensão arterial, doença mais relatada pelo grupo de idosos do grupo de convivência, é considerada umas das causas mais comuns de morbidade e mortalidade prematura. Além da alta prevalência, constitui fator de risco para complicações cardiovasculares, estando diretamente associada à incapacidade e dependência, repercutindo negativamente na qualidade de vida do idoso (Reis & cols, 2007).
A predominância de residentes idosos nas famílias dos entrevistados confirma a literatura, que destaca que hoje é comum um idoso cuidando do idoso, muitas vezes, os dois sendo carentes de cuidados. A falta de uma política social que ampare os idosos dependentes faz com que a família assuma grande parte dos cuidados com seus segmentos dependentes, este cuidado traduz-se, em parte, pela co-residência que, em certas situações, beneficia as gerações mais novas e, em outras, as mais velhas (Silveira & cols, 2006).
O envelhecimento é um processo complexo, pluridimensional, revestido não apenas por perdas, mas também por aquisições individuais e coletivas, fenômenos inseparáveis e simultâneos. Por mais que o ato de envelhecer seja individual, o ser humano vive na esfera coletiva e, como tal, sofre as influências da sociedade de uma maneira geral, da família em particular, interferindo na maneira de compreender o seu processo de envelhecimento/velhice e/ou o dos seus familiares (Herédia, Casara & Cortelletti, 2007).
No IPSF, a maioria dos idosos apresentou pontuação baixa nos domínios Afetividade- Consistência e Autonomia e pontuação alta no domínio Adaptação-familiar, demonstrando desta forma que os idosos avaliados se sentiam bem integrados em sua família e que recebiam cuidados adequados. Isso ficou evidenciado ainda que as famílias desses idosos não estivessem preparadas para atender suas necessidades de saúde/doença adequadamente.
A eficácia do suporte familiar varia de acordo com singularidades e performances dos membros do núcleo familiar, como ações, atitudes e comportamentos que carregam grande carga de emoções, assim como cada um percebe este suporte recebido. Nesse sentido, cada família possui tendências ou componentes funcionais que mantêm a saúde emocional, e as tendências ou componentes que predispõem à enfermidade de seus membros (Ferés-Carneiro, 1996).
O domínio Afetividade-Consistência envolve questões a respeito da expressão de afetividade entre os membros, seja verbal ou não, interesse, simpatia, acolhimento, consistência de comportamentos e habilidades na resolução de problemas. A percepção do suporte familiar inadequada, relatada pela maioria dos idosos neste domínio, demonstra que as famílias não são capazes de vivenciar emoções apropriadas frente a uma variedade de estímulos, tanto de bem-estar quanto de emoção de emergência, a exemplo do processo de envelhecimento na família. Dessa forma, fica evidenciado que essas famílias possuem vínculos emocionais comprometidos, não havendo disponibilidade de tempo e tomada de decisão entre os membros. Fica evidenciado, ainda, não haver caráter da clareza nos papéis e regras dos integrantes da família, bem como a habilidade nas estratégias de enfrentamento de situações-problema (Dias & Baptista, 2008).
O domínio Adaptação Familiar questiona os sentimentos negativos em relação ao grupo familiar, como raiva, isolamento, exclusão, falta de compreensão, entre outros, que apontam a ausência de adaptação no grupo. Os dados encontrados neste estudo revelam que a maioria das famílias não possui habilidade de transformar a estrutura de poder e as regras de relacionamentos em resposta a situações de estresse.
Esses dados, referentes ao apoio social da família ao idoso, são relevantes em decorrência da fragilidade das políticas públicas e sociais voltadas ao atendimento deste segmento etário. Esse apoio informal pode ter diferentes funções que se interrelacionam: 1. emocional: caracterizado por expressões de afeto e amor; 2. instrumental: destinado ao provimento de necessidades materiais em geral, ajuda para trabalhos práticos (limpeza de casa, preparação de refeições, provimento de transporte) e/ou ajuda financeira; 3. de informação: direcionado à aconselhamentos, sugestões, orientações que podem ser usados para resolver problemas; 4. de interação social positiva: marcado pela disponibilidade de pessoas para promover diversão, companhia, descontração (Herédia & cols, 2007; Luzardo & Walkman, 2004). O apoio social é prestado pelas famílias aos seus idosos, ancorado nas características sócio-afetivas e na dinâmica relacional definidas ao longo da história pelos membros familiares que coabitam o mesmo espaço e, portanto, promovem apoios diversos uns aos outros (Caldas, 2003).
No domínio Autonomia, são avaliadas as relações de confiança, liberdade e privacidade entre os membros. Diante dos dados encontrados neste estudo, fica evidenciado que os idosos entrevistados não possuíam incentivo e liberdade para se expressar e ter autonomia no ambiente familiar, além de apresentarem comprometimento das relações de confiança e privacidade (Dias & Baptista, 2008). A perda da autonomia para o idoso representa uma morte social que anuncia a morte física do indivíduo e com a qual a sociedade moderna, secularizada e racional, tem enormes dificuldades de lidar (Pavarini & cols, 2006).
De acordo com a média dos valores dos domínios do Inventário do Suporte de Percepção Familiar, boa parte dos idosos entrevistados apresentou comprometimento dos domínios Afetividade-Consistência e Autonomia. Assim, é importante que opções assistenciais sejam oferecidas às famílias dos idosos com o objetivo de adequar cada vez mais a assistência às necessidades emanadas pelos idosos, contribuindo para a melhoria da qualidade das práticas de saúde dirigidas aos idosos, especialmente neste momento histórico em que o percentual desta população cresce em ritmo acelerado em nosso país.
Discussão
Diante dos resultados apresentados no presente estudo, evidencia-se que boa parte dos idosos entrevistados apresentou comprometimento dos domínios Afetividade-Consistência e Autonomia do Inventário de Percepção do Suporte Familiar. Esse fato demonstra, em parte, a falta preparo das famílias na prestação de cuidados aos idosos.
Entre as limitações deste estudo, se pode apontar a não associação da percepção do suporte familiar a outras variáveis, bem como a não divisão da amostra por sexo, uma vez que pode haver diferença da percepção do suporte familiar entre os sexos. Nessa perspectiva, sugere-se que novos estudos sejam realizados, levando em consideração essas variáveis.
A possibilidade de viés de seleção no estudo está minimizada, uma vez que se trata de uma amostra selecionada a partir de uma população homogênea no que diz respeito aos parâmetros socioeconômicos encontrados no Nordeste Brasileiro, ou seja, os indicadores sociais demonstram baixos extratos de classes economicamente desprovidas. Ressalta-se que os resultados do presente estudo não podem ser generalizados para toda a população do interior da Bahia, pois a amostra estudada era homogênea quanto aos aspectos sociodemográficos, conforme dados apresentados. Além disso, este estudo descreve especificamente a realidade de idosos da área periférica de uma cidade do interior do Nordeste, de modo que novas investigações são fundamentais para ajudar também a traçar o perfil funcional de idosos residentes em outras áreas periféricas, visando oferecer informações que possam subsidiar o desenvolvimento de programas e intervenções no campo da saúde na terceira idade, tanto dos idosos quanto de seus familiares.
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Recebido em agosto de 2010
Reformulado em julho de 2011
Aceito em agosto de 2011
Sobre os autores:
Luciana Araújo dos Reis: fisioterapeuta, doutora em Ciências da Saúde/PPGCSA-UFRN, pós-doutora em Saúde Pública/ISC-UFBA e docente Adjunta da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia. E-mail: cianareis@hotmail.com.
Gilson de Vasconcelos Torres: enfermeiro, doutor em Enfermagem/EERP-USP, docente do Programa de Pós- Graduação em Ciências da Saúde/CCS-UFRN, orientador da pesquisa. E-mail: gvt@ufrnet.br.
Luana Araújo dos Reis:graduada em Enfermagem pela Faculdade de Tecnologia e Ciências (FTC), mestranda em Enfermagem/UFBA.
Marcos Henrique Fernandes: fisioterapeuta, doutor em Ciências da Saúde/PPGCSA-UFRN, docente da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia.
Thaiza Teixeira Xavier Nobre:fisioterapeuta, doutora em Ciências da Saúde/PPGCSA-UFRN, docente da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
1Correspondência:
Rua i, nº15 – Urbis III – Jequiezinho – 45200-000 – Jequié-BA