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Aletheia
Print version ISSN 1413-0394
Aletheia no.41 Canoas Aug. 2013
ARTIGOS EMPÍRICOS
Fatores de risco para mortalidade infantil em Palmas/TO
Risk factors for infant mortality in Palmas/TO
Guiomar Virgínia Vilela Assunção de Toledo Batello; Lígia Braun SchermannI
I Universidade Luterana do Brasil
RESUMO
Estudo caso-controle, com compartilhamento de banco de dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM; 2008-11) e sobre Nascidos Vivos (SINASC) para verificar fatores de risco para mortalidade infantil em Palmas/TO. Todas crianças que foram a óbito antes de completarem um ano de vida (casos) foram selecionadas. Os controles foram as três crianças nascidas subsequentes a cada caso e que não foram a óbito no primeiro ano. Os dados foram analisados através de regressão logística, utilizando modelo hierarquizado de determinação da mortalidade infantil. Fizeram parte do estudo 139 casos e 417 controles. A taxa de mortalidade infantil foi de 11‰ e apresentou como preditores peso ao nascer de 450-1999g (OR=20,81; IC95%:4,32-100,23) e 2000-2499g (OR=5,53; IC95%:2,20-13,92), Apgar de 5º minuto (OR=15,02; IC95%:5,75-39,25), cor de pele branca (OR=3,14; IC95%:1,66-5,95) e presença de gestações anteriores (OR=2,08; IC95%:1,10-3,92). Os resultados enfatizam as condições de nascimento como os fatores mais relacionados ao desfecho estudado.
Palavras-chave: Mortalidade infantil, Fatores de risco, Estudo caso-controle.
ABSTRACT
Case-control study by means of data bank linkage from the Mortality Information System (SIM, 2008-11) and the Information System on Births (SINASC) to identify risk factors for infant mortality in Palmas/TO. All children who died before one year of age (cases) were selected. Controls were the three children born subsequently of each case, who did not die during the first year. Data were evaluated by logistic regression according to a hierarchic model of infant mortality determination.139 cases and 417 controls participated in the study. Infant mortality rate was 11,0‰ and presented as predictors birth weight of 450-1999g (OR=20,81; IC95%:4,32-100,23) and 2000-2499g (OR=5,53; IC95%:2,20-13,92), Apgar at 5 minutes (OR=15,02; IC95%:5,75-39,25), infant race (OR=3,14; IC95%:1,66-5,95) and presence of previous gestations (OR=32,08; IC95%:1,10-3,92). Results emphasize birth conditions as the more related factors to the studied outcome.
Keywords: Infant mortality, Risk factors, Case-control study.
Introdução
A taxa de mortalidade infantil (TMI) é um clássico e eficiente indicador da condição de vida da população, da qualidade dos serviços de saúde e do desenvolvimento de um país (Brasil, 2011; Doldan, Costa & Nunes, 2011; Mombelli, Sass, Molena, Téston & Marcon, 2012).
Ao longo das três últimas décadas, o Brasil experimentou contínuas transformações no que diz respeito ao desenvolvimento socioeconômico, à urbanização e à atenção à saúde da população (Victora et al., 2011). Doldan et al., (2011); Mombelli et al., (2012) e Victora et al., (2011), apontam que nesse período, houve declínio no número de óbitos entre crianças menores de 1 ano de idade no país, que fica evidente ao comparar as taxas registradas em 1980 de acordo com o Fundo das Nações Unidas para a Infância (2013), quando o Brasil apresentava 71 mortes por mil nascidos vivos, com o ano de 2011, cuja taxa é 21 por mil nascidos vivos segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2013). Porém, apesar desse declínio, a taxa de mortalidade infantil ainda é considerada alta, colocando o Brasil no 93º lugar no ranking mundial conforme informações da Central Inteligence Agency (2013), por isso a redução do índice ainda é considerada um desafio para o sistema de saúde e para a sociedade (Doldan et al., 2011).
No ano 2000, a Organização das Nações Unidas – ONU, ao analisar os problemas mundiais, estabeleceu os Oito Objetivos do Milênio, nomeados no Brasil como Oito Jeitos de Mudar o Mundo cuja quarta meta estabelecida é reduzir a mortalidade infantil em 2/3 até o ano de 2015 (Barufi, Haddad & Paez, 2012; Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, 2013). Com a atual taxa, o Brasil tem se aproximado dessa meta.
Os padrões da taxa de mortalidade infantil são distintos em regiões geográficas, seja entre países, estados ou entre regiões (Fischer, Lima, Rosa, Osório & Boing, 2007). Países desenvolvidos como Suécia e Japão, por exemplo, apresentam TMI menor que 3 óbitos para cada mil nascidos vivos. Em contrapartida, Afeganistão e Somália, que são subdesenvolvidos, registram 121 e 103 óbitos por mil nascidos vivos, respectivamente (Central Inteligence Agency, 2013).
As desigualdades na TMI também estão presentes nas diferentes regiões e estados do Brasil (Fischer et al., 2007). Segundo dados da Rede Interagencial de Informações para Saúde (Brasil, 2010), em 2010, a Região Sul do país registrou a menor taxa de mortalidade infantil, onde, por exemplo, o estado de Santa Catarina obteve taxa de 11,2 óbitos por mil nascidos vivos. Já o estado do Amapá, situado no norte do país, registrou a maior TMI, de 25,4 por mil nascidos vivos. A região Norte também registrou taxas elevadas, como o estado de Tocantins, com 20,5 por mil nascidos vivos (Brasil, 2010). A cidade de Palmas, capital desse Estado e foco desta pesquisa, registrou 4.455 nascidos vivos e 49 óbitos no ano de 2010 (Brasil, 2013a).
Frente a esse cenário, o Governo Federal, juntamente com o Ministério da Saúde, lançaram em 2008 o Pacto Pela Redução da Mortalidade Infantil com o objetivo de acelerar a redução das desigualdades no Nordeste e na Amazônia Legal, diminuindo 5% ao ano a mortalidade infantil (crianças menores de um ano deidade), especialmente quanto ao componente neonatal (Brasil, 2013b).
Estudos nacionais têm utilizado dados secundários do Sistema de Informação de Mortalidade – SIM e Sistema de Informação de Nascidos Vivos – SINASC para identificarem fatores associados à mortalidade infantil pelo fácil acesso e confiabilidade dos dados, além do seu baixo custo (Doldan et al., 2011; Nascimento, Leite, Almeida, Almeida & Silva 2012; Santos, Andrade, Silva, Carvalho & Mesas, 2012). O estudo desses fatores possibilitam o planejamento de ações em saúde direcionadas para os subgrupos mais vulneráveis (Mombelli et al., 2012).
Devido às grandes desigualdades sociais que existem em nosso país, é importante a análise do cenário atual por meio da investigação de fatores de risco regionais. Frente a isso, o presente trabalho pretende identificar os fatores associados à mortalidade infantil em crianças menores de um ano de idade em Palmas/TO.
Método
Estudo de delineamento tipo caso-controle, realizado na cidade de Palmas/TO, abrangendo todas as crianças que nasceram vivas, em instituições hospitalares e filhas de mães residentes em Palmas, no período de 1º de janeiro de 2008 a 31 de dezembro de 2010, e que foram a óbito antes de completarem seu primeiro ano de vida (0 a 364 dias). Os dados foram obtidos do Sistema de Informação sobre Mortalidade – SIM e Sistema de Informação sobre Nascidos Vivos – SINASC, fornecidos pela Secretaria Municipal de Saúde de Palmas – SEMUS. Foi realizado o compartilhamento dos bancos SIM e SINASC através do pacote estatístico SPSS (StatisticalPackage for the Social Sciences) 18.0for Windows, utilizando como identificador o número da declaração de nascido vivo. As informações registradas no SINASC foram consideradas padrão ouro, sendo essas mantidas em caso de divergência nos dados entre os bancos.
Para cada caso foram selecionados três controles, consistindo em nascimentos subsequentes registrados no SINASC, de acordo com o número sequencial da declaração de nascido vivo – DNV. Para aqueles com informações incompletas, realizou-se busca de informações nos prontuários das instituições de saúde onde as crianças haviam nascido ou ido a óbito, bem como através de contato telefônico com as mães. Mesmo com esta sistemática, em alguns controles não foi possível obter as informações necessárias e tiveram que ser substituídos por outros próximos. No intuito de avaliar se as substituições realizadas durante o processo de seleção dos controles resultou no comprometimento de sua representatividade, foi realizada a análise estatística da distribuição das variáveis estudadas dos controles não selecionados e dos controles selecionados e nenhuma apresentou significância estatística.
As variáveis estudadas foram: sociodemográficas materna (idade, estado civil, escolaridade e ocupação), referentes à atenção à saúde na gestação e parto (gestações anteriores, tipo de parto, tipo de gravidez, consultas pré-natal, tipo de hospital de nascimento e antecedente de filhos mortos) e referentes às condições de nascimento do recém-nascido (sexo, idade gestacional, peso ao nascer, Apgar de 5º minutos e cor da pele).
Para a detecção dos prováveis fatores de risco para mortalidade infantil foi realizada análise de regressão logística. Inicialmente foi realizada a análise bivariada com distribuição de frequência, cálculo do OR bruto, intervalo de confiança de 95% e da significância estatística. Em seguida, foi realizada análise multivariada, incluindo as variáveis que obtiveram p≤0,20 na análise bivariada. A entrada das variáveis ocorreu conforme o modelo hierarquizado (Figura 1), que permite verificar se a associação entre o desfecho e o fator em estudo é direta ou mediada pelo efeito das outras variáveis (Victora, Huttly, Fuchs e Olinto, 1997). Os efeitos das variáveis que se encontram em um mesmo nível hierárquico funcionam como fatores de confusão para as demais do mesmo nível e para as de níveis inferiores. Por sua vez, estas últimas podem exercer um efeito mediador das influências das variáveis de níveis superiores. Permaneceram, no modelo final, as variáveis com p<0,05. A análise dos dados foi realizada no pacote estatístico SPSS 18.0 for Windows.
O estudo foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa do Centro Universitário Luterano de Palmas – CEULP/ULBRA, e obteve aprovação sob parecer N°22/2012.
Resultados
No período de 1º de janeiro de 2008 a 31 de dezembro de 2010, encontram-se registrados no SINASC, 12.634 nascidos vivos, filhos de mães residentes na cidade de Palmas, capital do estado de Tocantins. Desse total, 157 evoluíram a óbito antes de completarem seu primeiro ano de vida. Durante a checagem dos dados do SIM com informações do SINASC, e também com fichas de investigação de óbito na Secretaria Municipal de Saúde, 18 casos foram excluídos: 09 por não terem nascidos em Palmas, 04 por se tratar de óbito fetal codificados como não fetal e 05 por terem nascido antes do período delimitado para o estudo. Restaram 139 óbitos ocorridos no período, que representaram uma taxa de mortalidade infantil de 11 óbitos/mil nascidos vivos. Destes óbitos, 58(42%) ocorreram no período neonatal precoce (até o 6º dia de vida), 35 (25%) no período neonatal tardio (entre o 7º e 27º dia de vida) e 46 (33%) no período pós-neonatal (entre o 28º dia ao 364º dia de vida).
Para cada caso foram selecionados 03 controles, sendo estes os nascidos subsequentes ao caso, conforme registro do SINASC, resultando um total 417 controles. Admitindo um poder de 80%, nível de significância de 95%, relação caso/controle de 1:3 e odds ratio (OR) de 2.25, o número de casos e controles permite a realização de comparações.
Em ambos os grupos, a maioria das mães tinha entre 20 e 34, era solteira, separada judicialmente ou viúva, possuía oito anos ou mais de estudo e exercia a ocupação de dona de casa ou estudante. Em relação à história obstétrica, casos e controles tiveram maior prevalência de presença de gestações anteriores e, em relação ao tipo de parto, os casos apresentaram prevalência ligeiramente superior de parto cesáreo enquanto os controles, de parto vaginal. Da mesma forma, o número de consultas pré-natal de até 6 teve maior prevalência para os casos e 7 ou mais consultas, para os controles. A maioria de casos e controles apresentou gravidez única e nenhum antecedente de filho morto. O parto ocorreu, na maior parte das vezes, em estabelecimento público (Tabela 1).
Os recém-nascidos casos e controles tiveram maior prevalência do escore de Apgar aos 5 minutos de 8 a 10, de cor não branca e de sexo masculino. Os casos apresentaram menor idade gestacional e baixo peso ao nascer, observando-se o contrário para os controles onde 93,3% nasceram de 37 ou mais semanas de gestação e 67,6% apresentaram peso igual ou superior a 3000g (Tabela1).
Na análise bivariada, nenhuma das variáveis sociodemográficas materna, apresentou associação com mortalidade infantil. Já em relação às variáveis referentes à atenção à saúde na gestação e no parto, os casos tiveram 8,87 mais chance de serem de gravidez múltipla (OR=8,878; IC95%:2,78-28,35), em comparação aos controles e mães que realizaram até 6 consultas pré-natal duplicaram a chance de óbito para suas crianças com OR de 2,30 (IC95%:1,54-3,44). Presença de gestações anteriores, tipo de parto, antecedentes de filhos mortos e de hospital de nascimento não apresentaram significância estatística na comparação entre casos e controles (Tabela 1).
As variáveis referentes às condições de nascimento estiveram, em sua maioria, associadas ao risco de óbito infantil na análise bivariada, exceção observada somente para o sexo e a cor da pele da criança, esta última apresentando uma significância tangencial para o óbito infantil (p=0,050). Idade gestacional menor ou igual a 31 semanas foi a de maior associação ao risco de óbito com OR de 71,07(IC95%:29,20-172,99) seguida de 32 a 36 semanas, que apresentou 10 vezes mais chance de óbito (OR=10,20; IC95%:5,48-18,99). As crianças nascidas com muito baixo peso (450-1999g) obtiveram um OR de 61,88 (IC95%:30,29-126,43) mostrando-se fortemente associada ao risco de óbito. Já as que pesaram entre 2000-2499g, apresentaram 6,27 vezes mais chance de irem a óbito quando comparadas as de peso igual ou superior a 3000g. Crianças com peso ao nascer entre 2500-2999g não apresentaram risco significativo de ir a óbito. O peso de nascimento teve uma tendência linear com aumento de 3,6 vezes mais chance de óbito a cada diminuição de peso. Ainda, crianças com escore de Apgar de 5º minuto até 7 tiveram 29,7 vezes mais chance de óbito do que aquelas com Apgar de 7 ou mais.
Os resultados da análise multivariada, obtidos por regressão logística, estão apresentados na Tabela 2. As variáveis que permaneceram no modelo final associadas de forma independente ao risco de mortalidade infantil em Palmas, com significância estatística observada menor a 5% foram: peso ao nascer de 450-1999g (OR=20,81; IC95%:4,32-100,23) e 2000-2499g (OR=5,53; IC95%:2,20-13,92), Apgar de 5º minuto (OR=15,02; IC95%:5,75-39,25), cor da pele da criança (OR=3,14; IC95%:1,66-5,95) e presença de gestações anteriores (OR=2,08; IC95%:1,10-3,92).
Crianças com peso entre 450-1999g tiveram 20,8 vezes mais chance de ir a óbito em comparação as crianças com peso ao nascer igual ou superior a 3000g, e para as que nasceram com peso entre 2000-2499g, o OR foi de 5,53. O escore de Apgar ao 5ª minuto também se associou fortemente ao risco de óbito infantil. Crianças com escore menor ou igual a 7 apresentaram 15 vezes mais chance de óbito do que aquelas com escore entre 8 e 10. Cor da pele da criança e presença de gestações anteriores igualmente mantiveram-se como preditoras do óbito infantil. Casos apresentaram 3 vezes mais chance de serem da cor branca do que não branca e 2 vezes mais chance de serem filhos de mães com uma ou mais gestações anteriores do que de mães sem histórico de gestação anterior.
Discussão
A taxa de óbitos em crianças menores de um ano de idade, residentes na cidade de Palmas/TO, nascidas entre 2008 e 2010, foi de 11 por mil nascidos vivos, sendo considerada baixa (menos de 20 por 1000 nascidos vivos) conforme critérios do Ministério da Saúde (Brasil, 2006). Essa taxa encontra-se entre as menores registradas no Brasil, semelhante à Região Sul, que atingiu 11,6 por mil nascidos vivos em 2010 (Brasil, 2010), sendo que o indice aceitável preconizado pela Organização Mundial de Sáude é de 10 mortes a cada mil nascidos vivos.
O peso ao nascer, Apgar no 5º minuto de vida, cor da pele da criança e presença de gestações maternas anteriores foram os quatro fatores associados ao risco de mortalidade infantil das crianças nascidas em Palmas/TO no presente estudo.
O maior impacto na mortalidade infantil foi o peso ao nascer; especialmente o muito baixo peso chegou a elevar a chance de óbito dos recém-nascidos em 20,8 vezes. Esta constatação, já esperada, corrobora com outros estudos tanto nacionais (Doldan et al., 2011; Kassar, 2010; Lima, Sousa, Griep & Primo, 2012; Zanini, Moraes, Giugliani & Riboldi, 2011), quanto internacionais (Mathews & MacDorman, 2011; Sovio, Dibden & Koupil, 2012; Titaley, Dibley, Agho, Roberts & Hall, 2008). Em uma pesquisa realizada com dados secundários (SIM e SINASC) sobre fatores de risco para mortalidade infantil em 5 cidades brasileiras, o baixo peso ao nascer demonstrou forte associação com as mortes em menores de um ano (Maia, Souza & Mendes, 2012).
O peso ao nascer se reflete em outros fatores como a condição socioeconômica e morbidade materna, qualidade da assistência de saúde prestada à mãe, comportamento materno em relação aos cuidados de saúde, não devendo, portanto, ser avaliado como fator de risco isolado (Mendes, Olinto & Costa, 2006; Nascimento, Costa, Mota & Paim, 2008; Nascimento et al., 2012; Soares & Menezes, 2010). Fatores biológicos também se relacionam ao baixo peso ao nascer, como o retardo de crescimento intrauterino e prematuridade. Ambas as condições são passíveis de identificação e prevenção no prénatal e podem indicar falhas na assistência pré-natal.
O fator de risco baixo peso ao nascer tem sido comumente associado ao nascimento pré-termo na determinação da mortalidade infantil (Lima et al., 2012; Mathews & MacDorman, 2011; Matijasevich et al., 2008; Schoeps et al., 2007; Victora et al., 2011). As principais causas dessa associação se devem a desnutrição, infecções, prematuridade iatrogênica, rotura de membranas e hipertensão (Lima et al., 2012), levando ao nascimento da criança com idade gestacional menor que 37 semanas, e muitas vezes associada ao baixo peso ao nascer devido à interrupção precoce da gravidez. No presente estudo, a idade gestacional perdeu significância estatística no modelo final de análise multivariada, permanecendo somente o peso ao nascer associado à mortalidade infantil. Em estudo longitudinal realizado com recém-nascidos de muito baixo peso em quatro maternidades na cidade do Rio de Janeiro (Duarte & Mendonça, 2005) e estudo de coorte de base populacional realizado na cidade de Passo Fundo (Geib, Fréu, Brandão & Nunes, 2010), foram encontrados resultados semelhantes, onde idade gestacional também perdeu a significância estatística no modelo final, permanecendo o peso de nascimento. Ressalta-se que o tamanho amostral pode ter sido pequeno, sugerindo a necessidade de confirmação em estudos futuros com maior tamanho amostral.
O segundo fator associado à mortalidade infantil nesse estudo foi o Apgar de 5º minuto menor ou igual a 7, elevando em 15 vezes mais a chance de óbito. Diversas pesquisas encontraram resultados semelhantes (Doldan et al., 2011; Geib et al., 2010; Lima et al., 2012; Maia et al., 2012; Zanini ., 2011). O Apgar está relacionado intimamente com a qualidade do atendimento prestado no momento do parto, assim a assistência com qualidade deficiente pode vir a resultar em hipóxia perinatal e consequente sofrimento fetal, podendo levar a baixa pontuação, mesmo em bebês a termo e com peso adequado para a idade gestacional (Doldan et al., 2011; Soares & Menezes, 2010). Utilizando categorização diferente de nosso estudo, pesquisas detectaram forte associação da mortalidade infantil com Apgar ≤6 (Ribeiro, Guimarães, Lima, Sarinho & Coutinho, 2009; Santos et al., 2012).
A cor branca da pele da criança, mostrou-se como fator de risco para o óbito infantil após ajuste para variáveis confundidoras. Esse resultado foi inesperado, pois a cor da pele negra e/ou parda tem sido apontada como determinante da mortalidade infantil, especialmente em estudos conduzidos nos EUA (Mathews & MacDorman, 2011) dentre outros (Maia et al., 2012; Mathews & MacDorman, 2011; Menezes, Hallal, Santos, Victora & Barros, 2005; Oliveira, Gama & Silva, 2010). Tal associação deve ser vista com cautela devido à possibilidade de ter ocorrido viés de informação, uma vez que a cor da pele da criança é aquela referida pela mãe. Igualmente, a população da cidade de Palmas é composta por pessoas vindas de diversas regiões do país e de vários grupos raciais, dificultando a mensuração padronizada dessa variável. No censo de 2010, há um predomínio da cor de pele parda (55,4%), seguido da cor branca (32,4%), preta (9,4%), amarela (2,6%) e indígena (0,2%).No presente estudo, a cor de pele parda constituiu 76,3% das crianças, sendo responsável por 98,8% das crianças não brancas (somente uma indígena e quatro negras) e pode, portanto, estar superestimada. Apenas um dos estudos revisados mostrou fator protetor para mortalidade neonatal em recém-nascidos filhos de mães não brancas (Nascimento et al., 2012).
As diferenças raciais nas taxas de mortalidade infantil podem retratar, em parte, os diversos fatores de risco sociodemográficos e comportamentais em relação à mãe. Alguns autores, em diferentes contextos, citam que os grupos raciais com alta taxa de mortalidade infantil tendem a ter características maternas associadas como: baixas condições financeiras, dificuldades no acesso aos serviços de saúde principalmente no momento do parto, número de consultas pré-natal inadequado, serem mães sem companheiro, adolescentes, tabagistas, com maior número de filhos anteriores e ainda baixo nivel de escolaridade (Kitsantas & Gaffney, 2010, MacDorman & Mathews, 2011; Matijasevich et al., 2008).
A presença de gestações anteriores ao parto atual mostrou-se relacionada à mortalidade infantil, elevando em 2 vezes mais a chance de óbito. Corroborando com essa informação, estudos realizados no Rio de Janeiro (Oliveira et al., 2010), Pelotas (Menezes et al., 2005) Suécia (Sovio et al., 2012), Indonésia (Titaley et al., 2008), EUA (Hessol & Fuentes-Afflick, 2005) e Paquistão (Manzar, Manzar, Yaqoob, Ahmed & Kumar, 2012) associaram o número de filhos tidos anteriormente maior ou igual a três com óbito neonatal. Assim, esse fator pode ser associado à menor atenção da mãe aos cuidados necessários exigidos para manter a saúde da criança, como a realização de consultas pré-natal e também ao intervalo interpartal curto (<2 anos), podendo resultar em efeitos adversos tanto na gestação quanto no parto. A alta paridade é um fator tradicionalmente associado à baixa condição socioeconômica materna, podendo levar ao precário cuidado de saúde ao bebê (Menezes et al., 2005), como também estar relacionada à maior idade materna e nascimentos múltiplos, fatores que elevam a chance de óbito (Mathews & MacDorman, 2011). Contrariamente aos achados acima, alguns estudos encontraram tal associação em primíparas, ao relacionar o risco de mortalidade às intercorrências obstétricas que ocorrem com maior intensidade no primeiro parto, como no caso de distócias (Alberto, Lima, Rodrigues & Machado, 2011; Engmann et al., 2012).
Outros estudos ainda apontam ocupação da mãe (Nascimento, et al., 2008), estado civil materno (Maia et al., 2012; Schoeps et al., 2007; Sovio et al., 2012), número de consultas pré-natal (Nascimento et al., 2008; Kitsantas & Gaffney, 2010; Lima et al., 2012; Nascimento et al., 2012; Santos et al., 2012; Shoeps et al., 2007; Soares & Menezes, 2010), tipo de parto (Mombelli et al., 2012; Santos et al., 2012; Ribeiro et al., 2009; Soares & Menezes, 2010) e vínculo do hospital de nascimento (Nascimento et al., 2008; Lima et al., 2012; Maia et al., 2012; Ribeiro et al., 2009; Zanini et al., 2011) como fatores associados à mortalidade infantil. No presente trabalho, essas associações não foram observadas. No entanto, chama a atenção o alto nível de escolaridade das mães tanto dos casos quanto dos controles, sendo 80% delas com 8 anos ou mais de estudo. Em estudos nacionais semelhantes, realizados nas cidades de Foz do Iguaçu/PR (Doldan et al., 2011), e Salvador/BA(Nascimento et al., 2008), o percentual de mães com 8 anos ou mais de escolaridade foi cerda de 46,4% e 38,6 a 40,5%, respectivamente. Esse indicador positivo pode ter amenizado o impacto dos fatores sociodemográficos maternos, tendo em vista que a escolaridade é considerada um indicador da condição socioeconômica da família, relacionando-se diretamente aos cuidados de saúde. Alguns estudos confirmaram que mães com maior escolaridade apresentaram menor risco de óbito infantil (Santos et al., 2012; Mendes et al., 2006).
O razoável nível de escolaridade das mães pesquisadas nesse estudo pode ser justificado por Palmas ser a mais nova capital do país e estar em constante crescimento, atraindo jovens que associam trabalho e ascensão social a estudo. Nela, muitos migrantes buscam a realização profissional na área de formação frente às oportunidades oferecidas.
Apesar de não ser um fator associado à mortalidade infantil nesse estudo, chama atenção a elevada prevalência de partos cesáreos, tanto nos casos (52,5%) como nos controles (48,9%), o que está muito além do preconizado pela Organização Mundial de Saúde (15% de todos os partos), mas que retrata uma realidade nacional, como observado nos estudos realizados em municípios do Paraná (Mombelli et al., 2008), de Serra/ES (Lima et al., 2012) e Fortaleza/CE (Nascimento et al., 2012).
Em síntese, a mortalidade infantil em Palmas/TO foi determinada principalmente por fatores relacionados às condições de nascimento do recém-nascido. Apesar da taxa de mortalidade infantil se encontrar baixa nesta capital, ainda é um desafio aos gestores de saúde continuar a reduzi-la. As ações devem ser voltadas para garantir a qualidade da atenção pré-natal, do parto e nascimento, capacitando os profissionais da saúde para exercê-la. Cuidados prestados com eficiência e qualidade permitem produzir diagnóstico em tempo hábil da fragilidade da criança, permitindo realizar intervenções necessárias a evitar a ocorrência do óbito infantil.
Através da identificação dos fatores de risco para mortalidade infantil, este estudo possibilita, também, o monitoramento da prevalência e das mudanças na magnitude desses fatores em coortes de nascidos vivos posteriores ao ano de 2010 em Palmas/TO.
Por fim, cabe ressaltar que a utilização de banco de dados secundários pode propiciar viés de informação, o que se constitui em uma limitação do presente estudo.
Referências
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Endereço para contato
E-mail: guivilelatoledo@hotmail.com
Recebido em dezembro de 2013
Aceito em abril de 2014
Guiomar Virgínia Vilela Assunção de Toledo Batello: Mestre em Saúde Coletiva – Universidade Luterana do Brasil (ULBRA).
Lígia Braun Schermann: Orientadora, Professora Adjunta do Curso de Psicologia e do Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva – Universidade Luterana do Brasil (ULBRA).