SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.6 issue2Processos de escolha e orientação profissional: uma reflexão teórica e prática author indexsubject indexarticles search
Home Pagealphabetic serial listing  

Services on Demand

article

Indicators

Share


Avaliação Psicológica

Print version ISSN 1677-0471On-line version ISSN 2175-3431

Aval. psicol. vol.6 no.2 Porto Alegre Dec. 2007

 

RESENHAS

 

Desafios da orientação sexual na infância

 

 

Marjorie Cristina Rocha da Silva *

Universidade São Francisco

 

 

Silva, M. C. P. (org.) 2007. Sexualidade começa na infância. São Paulo: Casa do Psicólogo, 250 p.

O livro se propõe a abordar o início da sexualidade na infância sob vários enfoques, tais como: curiosidade e aprendizagem, educação e orientação sexual nos tempos de hoje, características da sexualidade infantil nos primeiros anos de vida; além de ponderações sobre algumas práticas de orientação sexual e dicas para ler, assistir e refletir sobre essa temática. Ao longo da leitura é possível perceber, em seus quatorze capítulos, a importância de se pensar, posicionar e discutir propostas dessa temática, principalmente no que se refere ao papel que deve ser assumido pela família e escola.

O primeiro capítulo do livro foi escrito por Maria Cecília P. da Silva e retrata, a partir de um enfoque psicanalítico, a importância do brincar como meio de descoberta do mundo e de si mesmo. Também, enfatiza a importância do professor explorar a criatividade e curiosidade de seus alunos, de maneira a possibilitar o aparecimento das fantasias e desejos infantil a respeito do mundo, e também como meio facilitador do processo de aprendizagem.

As mudanças ocasionadas nas estruturas familiares e nas concepções de crianças e adolescentes nas últimas três décadas, além do tipo de ensino necessário para lidar com as mesmas foram descritas por José O. Outeiral. Este autor também ressalta o surgimento da chamada "des-invenção" da infância, adolescência e, em conseqüência, do mundo adulto e da formação de rótulos para os que não se "adaptam" às exigências de cada época. De tal modo, ressalta o papel da escola como sustentadora do sonho, da utopia, desejos, do brincar e, como espaço para ensinar e pensar.

Maria Cecília P. da Silva discute, no terceiro capítulo, as características da sexualidade infantil de zero a seis anos, associadas ao desenvolvimento emocional como um todo. A partir das idéias de Freud e de seus discípulos, que se dedicaram a estudar o desenvolvimento precoce do psiquismo, a autora ressalta a necessidade de compreender as fases do desenvolvimento de uma forma articulada, sendo que todas elas irão compor, de uma forma ou de outra, a sexualidade adulta.

O tema da masturbação infantil, abordado pelas autoras Francisca V. Vergueiro e Rosa Maria M. Galli traz primeiramente um panorama histórico dos seus diferentes significados. Posteriormente levanta questões referentes aos motivos desencadeadores na infância e o quanto o tema deve ser tratado com naturalidade, apesar da necessidade de se colocar limites referentes em que deva ocorrer de forma mais privativa. Ressalta, porém, a necessidade de se investigar o porquê, em algumas situações, da masturbação excessiva e compulsiva.

No quinto capítulo, as autoras Adriana C. Barbosa e Priscila de O. Galvani apresentam o tema da homossexualidade infantil, por meio de uma visão histórica do amor homossexual e da investigação da história do preconceito. A partir de quatro relatos de caso, demonstram a importância do brincar e do fantasiar como expressão do mundo infantil, e ressaltam que a atitude infantil não é indício que comprove a homossexualidade, e sim, deste seu mundo ainda em constituição.

Em relação à violência sexual infantil, as autoras Maria Cecília P. da Silva, Patrícia O. de Souza e Zélia dos Santos analisam a temática, a fim de discutir de que forma pensar nos relatos de casos, em termos de fantasias ou realidade. A postura dos terapeutas é de total abertura e crédito aos discursos, a fim de permitir o aparecimento e o trabalho de fantasias de incesto ou dos relatos de experiências traumáticas. O trabalho de orientação sexual é tratado como um dos veículos principais de prevenção deste tipo de violência, sendo vários os agentes envolvidos como pais, profissionais e essencialmente, a escola. Deve-se, entretanto, conhecer as várias formas de violência sexual, como abordar e proteger a identidade da criança, modos de identificar essa ocorrência, e entender as possíveis conseqüências desta violência.

No capítulo A sexualidade em crianças portadoras de deficiência, as autoras Carina A. Gambale, Maria Cecília P. da Silva e Patrícia O. de Souza retratam, inicialmente, as principais dificuldades relacionadas à deficiência e o quanto esta se apresenta de forma ameaçadora e desorganiza por fugir do esperado. No que se refere ao desenvolvimento sexual na criança portadora de deficiência, pontuam que, de modo geral, os comprometimentos na área sexual da criança estão relacionados ao contexto social e aos aspectos emocionais. Em acréscimo, a orientação sexual tem como maior desafio mediar as relações e ser elemento facilitador, a fim de auxiliar na compreensão e respeito a cada indivíduo e modo de sexualidade, podendo assim evitar o agravamento das suas limitações. As autoras finalizam o capítulo com dicas sobre como desenvolver um trabalho de orientação sexual.

Kátia Rodrigues Antunes e Solange de Souza Q. Matos abordam, no oitavo capítulo, a temática AIDS, Crianças e as Escolas. O texto apresenta uma reflexão a respeito do extenso histórico de mudanças, lutas e conquistas relacionadas à epidemia da AIDS, e traz questões a respeito do impacto do trabalho e dos tabus em crianças soropositivas. Ressalta-se que o trabalho de orientação sexual deve favorecer a diminuição do sofrimento e da discriminação, respeitando-se a diversidade e promovendo a inclusão social e educacional destas crianças.

No que se refere ao trabalho de sexualidade na escola e os pais, Carina Alvarez Gambale, Francisca Vieitas Vergueiro e Maria Cecília P. da Silva, discorrem sobre o quanto o trabalho de orientação sexual pode ser dificultado pela reação dos pais e quais os limites entre o que cabe à família e o que é tarefa da escola. Entende-se que a abordagem oferecida deve acontecer a partir de uma visão pluralista de sexualidade e que o papel da escola é de abrir espaços para que a pluralidade de concepções, valores e crenças possa existir. Assim, ao atuar como um profissional desta área, o professor deve ter discernimento para não transmitir valores pessoais, crenças e opiniões como verdades absolutas.

Como ser multiplicador, texto escrito por Lucimar M. Cabral França, Maria Cecília P. da Silva e Rodrigo de Marco Veinert avalia as concepções a respeito do professor multiplicador e seu modo de engajamento na área de orientação sexual. Os autores ressaltam que, de maneira geral, o maior objetivo do multiplicador é possibilitar a criação de espaços sistemáticos que permitam discutir, refletir, pensar estratégias, veicular informações, e construir um conhecimento coletivo com relação à sexualidade junto com a equipe de trabalho.

Maria Cecília Pereira da Silva aborda sobre a Orientação sexual nos Centros de Educação Infantil (CEIs) por meio do relato de um trabalho realizado na Rede Municipal de Educação de São Paulo. A autora relata sobre as expectativas e dificuldades na implantação do projeto, o papel das supervisões enquanto um espaço de reflexão para as práticas realizadas e os desdobramentos do trabalho relacionados à prevenção de dificuldades de aprendizagem e de problemas emocionais graves.

Em Uma experiência de avaliação cooperativa, Mary Ann Norris C. Rondas descreve alguns desafios e propostas de avaliação dos projetos de orientação sexual. A autora parte de uma experiência de avaliação cooperativa em um Projeto de orientação sexual para educadores da Rede Municipal de Ensino do Estado de São Paulo, para dar uma perspectiva mais ampla a respeito das etapas de avaliação necessárias e as devidas evoluções e repercussões apresentadas no projeto.

Letícia de Jesus M. Gonçalves, Mary Ann Norris C. Rondas e Rosely Aparecida Pereira contribuíram com o texto Reflexos do Projeto: atividades realizadas pelos educadores nos Centros de Educação Infantil. Nele, as autoras se propuseram a apresentar relatos de algumas atividades desenvolvidas por educadoras, com crianças de diferentes faixas etárias. Assim, foi possível verificar que as educadoras estavam aprendendo os conteúdos trabalhos no curso e nos encontros e, principalmente, utilizando as dinâmicas e orientações fornecidas; o que possibilitou notar mudanças nas práticas anteriormente realizadas entre educadoras, alunos, pais e direção escolar.

No último capítulo, intitulado Relato de duas experiências de supervisão, Rosely Aparecida Pereira e Maria Cristina Domingues Pinto discorrem sobre os percursos, expectativas e descobertas realizadas a partir de experiências de supervisão. Concluem que essas experiências mostraram as riquezas encontradas e compartilhadas de indagações, experimentações e de novas formulações para antigas situações para todos do grupo.

Os textos do livro abordam temas muito atuais e pertinentes, permitindo uma ampla visão a respeito dos conceitos, aplicações e diversidades presentes no processo de orientação sexual. As diversificadas visões dos autores permitiram também uma compreensão mais global das peculiaridades do trabalho entre as educadoras, o projeto e direção escolar, a intervenção junto aos alunos e o papel dos pais neste processo. Também se verificou a importância das supervisões e relatos de caso como meios de discussão e crescimento dos grupos de trabalho. Os autores defendem que os conceitos aprendidos e as experiências vividas na infância serão determinantes na vivência da sexualidade adulta e, portanto, trata-se de uma literatura essencial, principalmente, para pais e professores ansiosos em estar preparados para lidar com o tema com seriedade e naturalidade.

 

 

Sobre a autora:

* Marjorie Cristina Rocha da Silva: Psicóloga e Doutoranda em Psicologia pelo Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Psicologia da Universidade São Francisco. E-mail: silvamarjorie@yahoo.com.br

Creative Commons License All the contents of this journal, except where otherwise noted, is licensed under a Creative Commons Attribution License