SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.73 issue3The act of playing in the clinic with psychotic childrenThe experience of monitoring babies in early childhood education schools through the IRDI Methodology author indexsubject indexarticles search
Home Pagealphabetic serial listing  

Services on Demand

article

Indicators

Share


Arquivos Brasileiros de Psicologia

On-line version ISSN 1809-5267

Arq. bras. psicol. vol.73 no.3 Rio de Janeiro Sep./Dec. 2021

https://doi.org/10.36482/1809-5267.arbp2021v73i3p.157-171 

ARTIGOS

 

Associação entre adversidades na infância e personalidade patológica em adultos

 

Association between childhood adversities and pathological personality in adults

 

Asociación entre adversidades infantiles y personalidad patológica en adultos

 

 

Carolina Palmeiro LimaI; Jaqueline Portella GiordaniII; Clarissa Marceli TrentiniIII

IDoutoranda em Psicologia. Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Porto Alegre. Estado do Rio Grande do Sul. Brasil. https://orcid.org/0000-0001-5103-2203
IIDoutora em Psicologia. Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Porto Alegre. Estado do Rio Grande do Sul. Brasil. https://orcid.org/0000-0002-0231-2812
IIIDocente. Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Porto Alegre. Estado do Rio Grande do Sul. Brasil. https://orcid.org/0000-0002-2607-7132

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

As adversidades na infância são experiências nocivas e recorrentes, fatores de risco para uma série de desfechos negativos na adultez, incluindo transtornos de personalidade. O objetivo principal deste estudo foi examinar a relação entre o escore cumulativo de adversidades e os indicativos potenciais para patologias de personalidade, na amostra total e por grupo com baixo/moderado risco de estresse ou alto risco de estresse devido a eventos do último ano. Participaram 507 pessoas com idades entre 18 e 59 anos (M = 30,5 anos; DP = 10,4). Foi encontrada associação entre o escore cumulativo de adversidades e indicativos potenciais para transtornos de personalidade, sendo o tamanho de efeito maior no grupo com alto risco de estresse. O escore cumulativo de adversidades parece ser um indicador de risco para patologias de personalidade. Salienta-se a necessidade de ações preventivas e de identificação da ocorrência de adversidades, para realização de intervenções.

Palavras-chave: Adversidades na infância; Escore cumulativo de adversidades; Personalidade patológica; Transtornos de personalidade; Risco de estresse recente.


ABSTRACT

Childhood adversities are risk factors for a number of negative outcomes in adulthood, including personality disorders. The main objective of the study was to examine the relationship between the cumulative adversity score and the potential indicatives for personality disorders in the total sample and per group with low/moderate risk of stress and with high risk of stress according to events experienced in the last year. 507 people from 18 to 59 years old (M = 30.5 years, SD = 10.4) participated. It was found association between the cumulative adversity score and the potential indicative for personality disorders, with the largest effect size found in the group with high risk of stress. The cumulative adversity score seems to be an indicator of risk for personality pathologies. The need of preventive actions and identification of childhood adversities is discussed for implementation of interventions.

Keywords: Childhood adversities; Cumulative adversity score; Pathological personality; Personality disorders; Risk of recent stress.


RESUMEN

Las adversidades en la infancia son experiencias nocivas y recurrentes, factores de riesgo para una serie de resultados negativos en la edad adulta incluyendo trastornos de personalidad. El objetivo principal de este estudio fue examinar la relación entre la puntuación acumulativa de adversidades y los indicativos potenciales para patologías de personalidad, en la muestra total y por grupo con bajo/moderado riesgo de estrés y con alto riesgo de estrés debido a eventos del último año. Participaron 507 personas con edades entre 18 y 59 años (M = 30,5 años, DP = 10,4). Se encontró asociación entre la puntuación acumulativa de adversidades e indicativos potenciales para trastornos de personalidad, siendo el tamaño de efecto mayor en el grupo con alto riesgo de estrés. La puntuación acumulativa de adversidades parece ser un indicador de riesgo para patologías de personalidad. Se destaca la necesidad de acciones preventivas y de identificación de adversidades, para la realización de intervenciones.

Palabras clave: Adversidades en la infancia; Puntuación acumulativa de adversidades; Personalidad patológica; Trastornos de personalidad; Riesgo de estrés reciente.


 

 

Introdução

As adversidades ocorridas do nascimento aos 18 anos de vida, referidas neste trabalho pelos termos "adversidades na infância" ou simplesmente "adversidades", são experiências comumente crônicas, que podem causar estresse e danos consideráveis, e que mobilizam a criança ou o adolescente para uma adaptação significativa (McLaughlin, 2016). Além disso, essas vivências adversas têm alta taxa de prevalência, variam muito em intensidade e severidade e têm tendência a coocorrerem (Kalmakis & Chandler, 2014). A pesquisa de Kessler et al. (2010), realizada com 51.945 adultos em 21 países, incluindo o Brasil, demonstrou que é comum a ocorrência de morte de um dos pais, abuso físico, violência entre familiares e presença de transtornos mentais nos pais. Nesse estudo também foram investigadas adversidade econômica, outras formas de abuso como sexual e emocional, presença de doença crônica, situação de privação de liberdade no que concerne aos pais, dentre outras. Cronholm et al. (2015), percebendo a incipiência de determinadas vivências adversas, devido a características enviesadas das amostras anteriores, discutiram a inclusão de eventos como ter passado por situação de acolhimento institucional e bullying, os quais denominaram adversidades expandidas.

Além das discussões acerca de tipologias das adversidades, tem se ressaltado que as estimativas desses eventos adversos podem diferir em se tratando de localizações geográficas e de renda. No estudo de Kessler et al. (2010), a amostra foi dividida por um critério econômico e observou-se que países de renda alta, alta-média e média-baixa tinham prevalências semelhantes de adversidades (38,4%, 38,9% e 39,1%), respectivamente. Por outro lado, uma metanálise recente de 288 estudos, que compreendeu uma amostra de 59.692 sujeitos, de forma semelhante revelou que existe influência de fatores econômicos e geográficos nas estimativas de maus-tratos (Viola et al., 2016). O continente sul-americano foi justamente a região com maiores índices nessa dimensão (Viola et al., 2016). Ainda, a maioria dos estudos de prevalência de adversidades é feita em países da América do Norte e Europa (Soares et al., 2016) e alguns autores têm salientado a importância de investigações no contexto brasileiro devido às suas particularidades socioeconômicas (Raffaelli, Santana, De Morais, Nieto, & Koller, 2018).

A exposição a esses eventos adversos tem sido extensamente associada a transtornos mentais na vida adulta, para uma série de tipologias e em diversos países (Kessler et al., 2010; Green et al., 2010). Com relação às patologias de personalidade, existem evidências principalmente para a associação de determinados transtornos ou traços desadaptativos e adversidades como abuso e negligência (Hernandez, Arntz, Gaviria, Labad, & Gutiérrez-Zotes, 2012). Além do enfoque em dimensões como a de maus-tratos (abuso e negligência) em detrimento de outras experiências adversas como aquelas relacionadas a desajustamento parental e contexto comunitário (Cronholm et al., 2014), igualmente se observa que demasiada ênfase é dada ao transtorno de personalidade borderline, como demonstram os numerosos estudos nesse campo (Bornovalova et al., 2013; Chanen & Kaess, 2012; Hernandez et al., 2012; Infurna et al., 2016; Kuo, Khoury, Metcalfe, Fitzpatrick, & Goodwill, 2015).

Ao se buscar compreender como as adversidades se relacionam com transtornos de personalidade, um montante significativo de pesquisas expõe o problema da pouca especificidade nas associações. Waxman, Fenton, Skodol, Grant e Hasin (2014) demonstraram que cada tipo de maus-tratos era capaz de predizer de três a quatro transtornos de personalidade, e Newmann (2017) apresentou que o abuso emocional predisse de forma significativa seis transtornos de personalidade. Nesse contexto, os pesquisadores têm afirmado que não existe unanimidade quando se trata dos tipos de adversidades mais associados a determinados transtornos de personalidade ou traços desadaptativos (Dugal, Bigras, Godbout, & Bélanger, 2016; Paris, 2018) assim como em outros quadros psicopatológicos (Green et al., 2010).

No estudo de Marackova et al. (2016), cujo desfecho foram os transtornos como depressão ou ansiedade, fundamentou-se a ideia de que o caráter das adversidades pode não ser um bom preditor para explicar os transtornos e, ainda, foi apresentado que o índice de coocorrência seria um melhor estimador do risco subsequente de psicopatologias. Esse tipo de dado reforça a hipótese de que a coocorrência ou "acumulação" de adversidades tenha caráter nocivo e saliente no desenvolvimento e que sua mensuração possa ser uma ferramenta importante para delinear grupos de risco.

Uma investigação clássica no contexto das adversidades foi realizada por Felitti et al. (1998) utilizando o termo "Adverse Childhood Events - ACEs". Buscou-se relacionar sete tipos de adversidades com posterior presença de doenças, com avaliação de comportamentos de risco e com o estado de saúde de 13.494 adultos. Observou-se que indivíduos que relataram um maior número de adversidades tinham até 12 vezes mais chances de ter depressão, alcoolismo ou de abusarem de substâncias, por exemplo. Em uma pesquisa com pacientes com esquizofrenia e controles, observou-se que todos os clusters de personalidade (A, B e C) foram associados a um aumento no número de adversidades (McCabe, Maloney, Stain, Loughland, & Carr, 2012). Pesquisadores também têm identificado valores críticos/severos que aumentam a vulnerabilidade a transtornos mentais, como ter vivenciado cinco ou mais adversidades (Harkonmäki et al., 2007; Montez & Hayward, 2014) e sete ou mais adversidades (Mitchell, Tynes, Umaña-Taylor, & Williams, 2015). É possível que uma estratificação a partir de valores críticos possa auxiliar na compreensão acerca do número potencialmente mais prejudicial de adversidades no contexto de desenvolvimento e na compreensão de quais eventos adversos ocorreriam mais frequentemente em concomitância com um número elevado de outras tipologias.

Variáveis recentes na vida dos indivíduos também têm sido consideradas intervenientes na relação entre adversidades e desfechos em psicopatologias (palavra aqui referida como sinônimo de transtornos mentais). Eventos estressores recentes, como mudanças significativas ou perdas, podem ser particularmente de risco para psicopatologias se considerarmos pessoas que vivenciaram adversidades. Nesse entendimento, destaca-se o modelo apresentado por Hammen, Henry e Daley (2000), chamado de "hipótese de sensibilização ao estresse", no qual é discutido que pessoas que vivenciaram situações traumáticas na infância ou adolescência poderiam ficar mais vulneráveis à depressão ao se depararem com eventos estressores recentes, em comparação com aquelas sem essas experiências no desenvolvimento. A literatura posterior tem apresentado resultados favoráveis: de que eventos recentes estressores podem estar relacionados ou serem interpretados com base nas adversidades vivenciadas ao longo da infância e da adolescência (Glaser, Van Os, Portegijs, & Myin-Germeys, 2006). Outras pesquisas, contudo, não têm encontrado esse efeito, concluindo que adversidades no desenvolvimento não fazem com que pessoas fiquem mais vulneráveis à depressão quando se deparam com eventos de vida recentes como em Comijs et al. (2007). Porém a pesquisa de Comjis et al. (2007) possui limitações devido à idade avançada dos participantes (entre 55 e 85 anos) e os possíveis vieses de memória. Além disso, em geral a relação entre coocorrência de adversidades, eventos estressores na vida adulta e transtornos mentais se encontra incipiente, principalmente quando indicativos de transtornos de personalidade são considerados como a referência em estudo no contexto brasileiro.

Diante do exposto, o objetivo principal desse artigo foi examinar a relação entre o índice cumulativo de adversidades (através de grupos com baixa/moderada exposição a adversidades e alta/múltipla exposição a adversidades) e o potencial indicativo para patologias de personalidade (através de grupos "sem" e "com" indicativo potencial para patologia de personalidade) em uma amostra de brasileiros com idades entre 18 e 59 anos. Buscou-se avaliar essas relações para a amostra total e por grupo de pessoas com "baixo/moderado risco de estresse" e com "alto risco de estresse" devido a eventos vivenciados no último ano. Secundariamente, objetivou-se caracterizar as prevalências de adversidades na amostra em estudo considerando-se a exposição baixa/moderada ou alta/múltipla a adversidades. A partir da literatura, é esperado que pessoas expostas a maior quantidade de adversidades apresentem significativamente maiores associações com indicativos de transtornos de personalidade. Além disso, é plausível que a estratificação por risco de estresse por eventos recentes possa impactar a relação entre o escore cumulativo de adversidades e indicativos potenciais para transtornos da personalidade.

 

Método

Foi realizado um estudo transversal, com comparação de médias. Esse estudo faz parte de um projeto maior que investigou a relação entre adversidades na infância e na adolescência e características psicológicas e sociais, qualidade de vida e saúde mental na adultez, conduzido pelo grupo de pesquisa Núcleo de Estudos em Avaliação Psicológica e Psicopatologia (NEAPP) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Participantes

A amostra foi composta por 507 pessoas provenientes da população geral brasileira. Os critérios de inclusão para participação foram ter entre 18 e 59 anos de idade e saber ler e escrever.

Instrumentos

a) Questionário de Dados Sociodemográficos e de Outras Adversidades: continha perguntas relativas ao sexo, idade, estado civil, formação educacional e renda dos participantes, bem como quatro perguntas binárias sobre adversidades não inclusas na escala Maltreatment and Abuse Exposure Scale (MAES; Kluwe-Schiavon, Viola, & Grassi-Oliveira, 2016), que foram: uso abusivo de álcool pelos pais, uso de substâncias ilícitas pelos pais, privação de liberdade parental e divórcio parental.

b) Maltreatment and Abuse Exposure Scale (MAES; Kluwe-Schiavon et al., 2016): a escala MAES é uma versão mais simples da Maltreatment and Abuse Chronology of Exposure (MACE; Kluwe-Schiavon et al., 2016) composta apenas pela classificação dos itens através de respostas categóricas (sim ou não). A escala é constituída de 52 itens que avaliam o grau de exposição a dez tipos de adversidades: negligência emocional, abuso emocional não verbal, maus-tratos físicos parentais, abuso verbal parental, abuso emocional dos pares, bullying físico de pares, negligência física, abuso sexual, testemunho de violência interparental e testemunho de violência contra irmãos. A escala original exibiu propriedades psicométricas confiáveis, com escores bons a excelentes na confiabilidade teste-reteste (Teicher & Parigger, 2015). A versão traduzida e adaptada para o português brasileiro foi publicada em 2016 e está sendo validada sob coordenação do Prof. Dr. Rodrigo Grassi Oliveira. Para essa amostra, o instrumento exibiu fidedignidade adequada, com alfa para a escala total de 0,91.

c) Inventário Dimensional Clínico da Personalidade versão triagem (IDCP - Triagem; Carvalho, Pianowski, & Reis, 2017): inventário utilizado para mapear pessoas com potenciais indicativos para transtornos de personalidade, o qual apresentou boas evidências de validade e possui ponto de corte 10, que é sugerido como o mais adequado diante de amostras provenientes da população geral (Carvalho et al., 2017). Para esse estudo, optou-se pela utilização do escore contínuo e de um ponto de corte baseado em percentis da amostra. Para essa amostra, o alfa total da escala foi de 0,81.

d) Social Readjustment Rating Scale (Holmes & Rahe, 1967), versão traduzida por Lipp (1984): instrumento de avaliação de eventos vitais recentes, não necessariamente negativos, os quais demandam esforço para adaptação. O instrumento indica a frequência de ocorrência desses eventos no último ano e atribui um peso a cada tipo de experiência, de acordo com seu potencial de ajustamento. Um dos resultados é um índice de exposição (moderada, média e severa) a eventos considerados potencialmente prejudiciais à saúde ou que requerem algum nível de adaptação. Para esse artigo, dividiu-se esse índice de chance de estresse em grupos de pessoas com até 50% de risco de estresse e de pessoas entre 51% e 80% de risco de estresse.

Procedimentos de coleta dos dados

A amostra foi coletada por conveniência, e realizada de duas formas: Para a coleta online, a pesquisa foi divulgada em redes sociais e coordenações de graduação e pós-graduação de Universidades e Institutos Federais em todo o Brasil, perfazendo um total de 90% dos dados obtidos (n = 455). Uma segunda coleta foi conduzida presencialmente, em núcleos de Educação para Jovens e Adultos (EJA) da cidade de Porto Alegre, no ano de 2018, representando aproximadamente 10% da amostra total (n = 52).

Análise dos dados

Foi feita análise de normalidade através da interpretação dos escores de assimetria e curtose da amostra e do teste Komolgorov-Smirnov. Os escores de assimetria variaram de +1 a -1, contudo, o teste de normalidade foi significativo (p < 0,001). Com base nos dados, preferiu-se pelo uso de testes não paramétricos para esse estudo. Foram feitas análises de frequências relativas e absolutas com vistas à descrição das adversidades e variáveis secundárias. Para calcular o índice cumulativo de adversidades, foi feita a soma da ocorrência de cada tipo de adversidade (que variou de 0 a 14). Posteriormente, com base na literatura estabelecida e em função do tamanho da amostra, optou-se por dividi-la em dois grupos de pessoas com nenhuma ou com até quatro adversidades e de pessoas que relataram a vivência de cinco ou mais adversidades. Para os indicativos potenciais para transtornos de personalidade, com vistas a diminuir efeitos de sensibilidade da escala, optou-se pela seleção dos escores acima do percentil 80 no IDCP - versão triagem, ao invés do ponto de corte originalmente estabelecido pelo instrumento. Para eventos estressores no último ano, a amostra foi estratificada em um grupo com risco baixo/moderado de estresse (até 50% de risco) e um grupo com risco alto de estresse (entre 51% e 80% de risco) conforme recomendado pela escala. Para verificar a relação entre os grupos de adversidades foi utilizado o teste χ2 e uma medida de tamanho de efeito associada (Phi de Cramer), que pode ser interpretada de forma semelhante aos escores de uma correlação. O nível de significância adotado foi de 5%.

Considerações éticas

O estudo está em conformidade com todos os procedimentos éticos requeridos, sendo que o projeto que originou a presente pesquisa foi aprovado no Comitê de ética em pesquisa, sob número 85159718.7.0000.5334 do Certificado de Apresentação para Apreciação ética (CAAE) e com parecer favorável de número 2.609.341.

 

Resultados

A amostra total foi composta por 507 participantes, 392 mulheres (76,6%) e 115 homens (22,5%) com idades entre 18 e 59 anos (M = 30,5 anos; DP = 10,4 anos). A maioria proveniente do estado do Rio Grande do Sul (73,4%), seguido pelo Paraná (4,3%), Mato Grosso (3,9%) e São Paulo (3,2%). A maioria dos entrevistados reportou ensino superior completo ou pós-graduação (n = 421), referiu ser branca (n = 389), estar solteira (n = 291), e ter renda mensal média de 2,772 reais (DP = 2,746). Características sociodemográficas atuais e escore de eventos estressores no último ano são apresentados na Tabela 1.

Com relação à prevalência de adversidades na amostra total (N = 507), as maiores prevalências referiram-se às experiências de negligência emocional (42,4%), abuso emocional de pares (42,2%) e testemunho de violência contra irmãos (38,9%), enquanto as menos frequentes se referiram ao uso de substâncias ilícitas pelos pais (6,1%) e ocorrência de privação de liberdade parental (3,0%). Ressalta-se que 11,4% da amostra não relatou ter vivido nenhuma adversidade ao longo do desenvolvimento. Na Figura 1 são descritas as prevalências referentes às adversidades vivenciadas pelos participantes.

Foi comum que os indivíduos referissem a vivência de múltiplas adversidades ao longo da infância e da adolescência, com 88,8% das pessoas referindo ao menos um episódio ou vivência adversa significativa dentre os 14 tipos investigados. Além disso, 36,9% revelou a vivência de cinco ou mais tipologias de adversidades.

A partir da estratificação por grupos de coocorrência, no qual o primeiro se referiu a pessoas que vivenciaram entre nenhuma e quatro adversidades (Exposição baixa/moderada a adversidades, n = 320) e o segundo, composto por pessoas que relataram cinco ou mais adversidades (Exposição alta/múltiplas adversidades, n = 187), observou-se que no grupo com exposição alta, determinadas tipologias foram mais frequentes. Por exemplo, 86,7% dos indivíduos cujos pais foram privados de liberdade relataram cinco ou mais adversidades. De forma semelhante, 84,0% das pessoas que testemunharam violência interparental estavam no grupo com exposição alta/múltipla a adversidades, assim como, 81,8% das pessoas que vivenciaram abuso verbal parental.

Já os indicativos de personalidade patológica foram computados através do IDCP. A média da escala foi de 11,9 (DP = 4) variando entre 1 e 25. Através do ponto de corte, foi feita análise entre os grupos de personalidade (G1 = Sem indicativos potenciais para transtornos de personalidade, n = 440; e G2 = Com indicativos potenciais para transtornos de personalidade, n = 67) e os grupos de adversidades (Exposição baixa/moderada a adversidades, n = 320; Exposição alta/múltiplas adversidades, n = 187). O teste χ2 foi utilizado para examinar as diferenças. Os resultados demonstraram que o grau de exposição a adversidades diferiu entre os dois grupos de personalidade χ2 (1, N = 507) = 30,408, p < 0,001, ϕ = 0,245, com maior probabilidade de pessoas com exposições múltiplas a adversidades no grupo com indicativos potenciais para transtornos da personalidade e de pessoas com exposição baixa/moderada de adversidades no grupo sem indicativos potenciais para patologias de personalidade.

Por fim, foram conduzidas análises de associação por grupo de risco (baixo/moderado risco de estresse e alto risco de estresse). No grupo com até 50% de risco de estresse (n = 355), ocorreu igualmente associação significativa entre o grau de exposição a adversidades no desenvolvimento e personalidade χ2 (1, N = 355) = 7,848, p = 0,005, ϕ = 0,149, porém com tamanho de efeito pequeno. Já no grupo daqueles que apresentavam entre 51 e 80% de risco de estresse, devido aos eventos no último ano, o grau de exposição a adversidades diferiu entre os dois perfis de personalidade, do mesmo modo que nas análises anteriores, mas com maior tamanho de efeito observado nas comparações χ2 (1, N = 152) = 20,045, p < 0,001, ϕ = 0,363. Na Tabela 2, são apresentadas as estatísticas para a amostra total e para os dois grupos derivados a partir do risco de estresse.

 

Discussão

Têm se verificado que o escore cumulativo seria um razoável fator de risco para psicopatologias como depressão e ansiedade (Marackova et al., 2016). Os resultados principais do presente estudo acrescentam informações úteis ao contexto brasileiro revelando que essa acumulação de vivências adversas também pode ser um indicativo de risco em personalidade patológica, já que uma associação significativa foi encontrada. Embora uma relação causal não tenha sido mensurada, ressalta-se a hipótese de que a coocorrência de adversidades possa aumentar as chances de efeitos deletérios no desenvolvimento da personalidade e na sua manifestação na vida adulta, servindo como um bom indicador quando não existe a possibilidade de mensuração do peso relativo de cada evento adverso para cada indivíduo. Especificamente, a discussão enfatiza dois resultados principais, de que existe associação entre maiores coocorrências de adversidades e indicativos potenciais para transtornos de personalidade e de que o risco de estresse alto devido aos eventos vivenciados no último ano pode estar relacionado com aumento na associação entre adversidades e personalidade. Secundariamente, observou-se que pessoas com cinco ou mais adversidades apresentavam prevalências elevadas para tipologias específicas de eventos adversos na infância.

No que concerne às prevalências de adversidades considerando-se a divisão entre o grupo com baixa/moderada exposição a adversidades e o grupo com alta/múltiplas exposições a adversidades, destacou-se nessa pesquisa que mais de 80% das pessoas que vivenciaram adversidades como privação de liberdade parental, testemunho de violência interparental e abuso verbal parental haviam relatado a vivência de múltiplas adversidades. A ocorrência dessas tipologias no grupo com maior exposição pode denotar que alguns comportamentos parentais potencialmente prejudiciais tendem a se relacionar com a maior cronicidade desses eventos. Em consonância com os resultados apresentados nesse estudo, Finkelhor, Ormrod e Turner (2009) evidenciaram que crianças e adolescentes com polivitimização podem ser menos propensos a viverem em famílias "intactas" no que concerne a eventos adversos. Esses dados vão ao encontro do entendimento de que ao longo do desenvolvimento, principalmente em crianças, o ambiente familiar é um espaço central na vida desses indivíduos e se esse ambiente está vulnerável, eles têm pouca ou nenhuma autonomia para efetuar mudanças nesse sistema, ficando expostos a esses múltiplos eventos adversos. No caso das tipologias associadas à violência, Tavares (2004) reforça que, por serem mais dependentes, são as crianças que mais sofrem com a violência intrafamiliar.

Ainda, alinhado ao resultado secundário desse artigo, frisa-se a necessidade de atentar para aquelas tipologias de adversidades mais frequentes. Para essa amostra, observou-se que a maioria das experiências de natureza emocional obtiveram índices altos de ocorrência, independentemente dos grupos de personalidade. Negligência emocional obteve os índices mais elevados (42,4%) seguida por escores altos para abuso emocional de pares (42,2%). Além disso, abuso emocional não verbal e abuso verbal parental também apresentaram prevalências altas nessa amostra (variando de 34% a 37% de ocorrência). Considerando-se que experiências envolvendo questões emocionais podem estar virtualmente presentes ou serem basais em outros tipos de maus-tratos (Claussen & Crittenden, 1991), é possível discutir dois aspectos importantes sobre essa dimensão de adversidades. Em primeiro lugar, cabe ressaltar que eventos de risco de natureza emocional ainda tendem a ser tratados com leviandade no imaginário social, quando comparados com outras formas de maus-tratos que são mais visíveis (como abuso físico) ou que violam mais fortemente códigos morais (como abuso sexual) (Clarke, 2015). Essas prevalências acerca de variáveis "emocionais" são preocupantes na medida em que a banalização ou invisibilidade desses aspectos por parte da sociedade pode justamente dificultar reportar tais acontecimentos, cujos efeitos nocivos têm sido descritos em pesquisas empíricas e revisões posteriores (Jaffee, 2017; Kessler et al., 2010). Esse quadro de desvalorização das experiências emocionais aponta para a necessidade de intervenções que mobilizem a comunidade e os profissionais com o intuito de conscientizar para a magnitude que tais experiências podem abranger na saúde mental de crianças, adolescentes e adultos (Jorm & Mulder, 2018), bem como proporcionar conhecimento das leis e dos caminhos possíveis para efetivação de notificações diante da ocorrência de violência (Calza, Dell'Aglio, & Sarriera, 2016).

Em segundo lugar, as altas prevalências de abuso emocional de pares também denotam a urgência de que sejam incluídas variáveis para além do trauma e do contexto intrafamiliar nas pesquisas de adversidades, como já vinha sendo pontuado por Cronholm et al. (2015). Essas adversidades "expandidas" têm sido descritas como variáveis que podem auxiliar a compreender outros fatores de risco no entorno da criança ou do adolescente. Senra, Lourenço e Pereira (2011) apresentaram, por exemplo, que um terço daqueles que vivenciaram bullying também eram vítimas de violência doméstica. Além disso, em estudos longitudinais, uma boa relação com pares tem sido apontada como um fator de resiliência no desenvolvimento (Fergusson & Horwood, 2003). Nesse sentido, intervenções na escola que visem a identificar aspectos relacionados ao bullying podem propiciar o mapeamento de crianças ou adolescentes potencialmente mais vulneráveis a outras dimensões de violência.

No que diz respeito aos resultados principais desta pesquisa, considerando-se a pouca especificidade das tipologias para o entendimento da personalidade patológica (Paris, 2018), o presente trabalho sinaliza que o escore cumulativo é um indicador aceitável na relação com indicativos potenciais para transtornos de personalidade e que a cronicidade dessas vivências adversas no desenvolvimento pode ser um agravante para quadros patológicos de personalidade. Na infância e na adolescência, o desenvolvimento da personalidade, embora envolva em parte vulnerabilidades genéticas, está relacionado com a interação entre fatores de risco e fatores protetivos, que "moldam" modo como o indivíduo compreende o mundo e suas relações (Cohen, Crawford, Johnson, & Kasen, 2005). Por exemplo, determinados traços de personalidade, a depender do contexto, podem mitigar ou aumentar a sensibilidade a adversidades no desenvolvimento (Fergusson, & Horwood 2003). No caso de uma criança com maior tendência a emoções negativas (altos níveis de neuroticismo), esse traço de personalidade poderia ser um fator de risco já que a criança poderia estar mais sensível aos efeitos dos eventos adversos (Fergusson, & Horwood 2003). Essas características de personalidade, portanto, poderiam estar implicadas em desfechos psicopatológicos, principalmente em face da acumulação de adversidades. No estudo de Warmingham, Handley, Rogosch, Manly e Cicchetti (2019), observa-se que essa acumulação pode ser particularmente nociva, já que crianças expostas ao caráter crônico e a esses múltiplos eventos adversos demonstraram maiores níveis de comportamentos externalizantes, depressão, ansiedade e desregulação emocional, até mais do que aquelas com exposição a subtipos específicos ou a apenas uma tipologia, como negligência. Por outro lado, com a clareza de que não é determinante ou exclusivo, é plausível ponderar que um ambiente altamente caótico ou ameaçador, como aquele provavelmente produzido por múltiplas adversidades, diminua as chances de crianças e adolescentes serem resilientes com os recursos que detêm, inclusive porque esses indivíduos podem encontrar dificuldades de desenvolver esses recursos (que podem estar relacionados a padrões adaptativos de personalidade) se o ambiente não propicia espaço de tempo hábil e oportunidades para adequada reorganização frente a necessidades psicossociais.

Com relação aos eventos estressores no último ano, para essa amostra, todos os resultados apontam para associação entre maiores escores de adversidades e indicativos patológicos para transtornos de personalidade. Contudo, o alto risco de estresse devido a esses eventos no último ano explicaria em parte um aumento no tamanho de efeito da associação entre o número de adversidades e ter ou não indicativos de patologia de personalidade. A partir dos resultados do presente estudo, é plausível, portanto, pensar que aquelas pessoas expostas tanto a esses fatores distais (adversidades) quanto proximais (eventos recentes), em maior quantidade, poderiam ter padrões de personalidade mais precários. Esses resultados são consistentes com pesquisas cujos desfechos são outros transtornos mentais. Por exemplo, a ocorrência de um ou mais eventos recentes tem sido associada com maior risco de psicose e têm se observado um efeito cumulativo entre as adversidades e os eventos recentes (Mansueto & Faravelli, 2017). Sob essa ótica, autores têm apresentado resultados semelhantes para depressão e afetos negativos (Glaser et al., 2006; Hammen et al., 2000). Por outro lado, como a personalidade dificilmente é tida como o objeto principal do estudo ou variável dependente, necessário ter clareza da possibilidade de que a exposição a eventos estressores recentes possa culminar em uma superestimação dos escores em medidas de personalidade patológica, ainda mais diante de mensurações retrospectivas.

 

Conclusões

Com essa pesquisa se vislumbra a possibilidade de que a natureza cumulativa das adversidades esteja relacionada com indicativos potenciais para transtornos de personalidade e de que os eventos estressores contribuam para o aumento dessa relação. Além disso, é possível que determinadas tipologias de adversidades possam ser mais frequentes em situações de alta coocorrência desses eventos adversos no desenvolvimento. Pontua-se como limitações para essa pesquisa o fato de ser um estudo transversal, com uso de algumas medidas retrospectivas. Além disso, não foram controladas variáveis como características sociodemográficas atuais e possíveis fatores de proteção e apenas o índice cumulativo de adversidades foi utilizado para as análises com personalidade. No que diz respeito a essa última variável, foram mensurados indicativos potenciais para transtornos de personalidade e não efetivamente transtornos de personalidade. Recomenda-se que futuros estudos busquem investigar o tema em pessoas com diagnóstico para transtornos de personalidade ou mesmo avaliar traços patológicos de personalidade, como forma de lançar luz sobre as possíveis especificidades das associações nesse campo.

Além disso, embora a inclusão de um número maior de tipologias tenha auxiliado a construir um índice cumulativo com menos vieses, é necessário que futuras pesquisas possam também levar em consideração o período do desenvolvimento em que as adversidades ocorreram, bem como a severidade e a duração desses eventos ao longo da infância e da adolescência. Outra questão importante é que futuros estudos sobre acumulação de adversidades podem discutir o número de eventos que caracterizariam uma cronicidade nociva já que os pesquisadores têm apresentado a hipótese de que através do enfrentamento de experiências adversas, circunscritas a um nível baixo ou moderado de exposição, as pessoas poderiam se tornar até mesmo mais resilientes a esses eventos (Seery, Holman, & Silver, 2010). Para a prática, frisa-se que o entendimento sobre a relação entre adversidades na infância, personalidade e risco de estresse devido a eventos recentes pode justamente auxiliar profissionais e pesquisadores a distinguir perfis de risco para transtornos de personalidade e se essa acumulação de adversidades deixaria as pessoas mais suscetíveis ao longo do ciclo vital, com vistas ao planejamento de intervenções.

 

Referências

Bornovalova, M. A., Huibregtse, B. M., Hicks, B. M., Keyes, M., McGue, M., & Iacono, W. (2013). Tests of a direct effect of childhood abuse on adult borderline personality disorder traits: A longitudinal discordant twin design. Journal of Abnormal Psychology, 122(1), 180-194. https://doi.org/10.1037/a0028328        [ Links ]

Calza, T. Z., Dell'Aglio, D. D., & Sarriera, J. C. (2016). Direitos da criança e do adolescente e maus-tratos: Epidemiologia e notificação. Revista da SPAGESP, 17(1), 14-27. https://doi.org/10.1590/S0103-05822011000200002        [ Links ]

Carvalho, L. D. F., Pianowski, G., & Reis, A. M. (2017). Development and diagnostic accuracy of the screening of the dimensional clinical personality inventory. Psicologia: Ciência e Profissão, 37(4), 1011-1024. https://doi.org/10.1590/1982-3703003082016        [ Links ]

Chanen, A. M., & Kaess, M. (2012). Developmental pathways to borderline personality disorder. Current Psychiatry Reports, 14(1), 45-53. https://doi.org/10.1007/s11920-011-0242-y        [ Links ]

Clarke, S. (2015). Emotional abuse and emotional neglect in childhood: Subtypes, ecological correlates, and developmental tasks of emerging adulthood (tese de doutorado). University of Minnesota, Minneapolis, MN, USA. Recuperado de http://hdl.handle.net/11299/175399        [ Links ]

Claussen, A. H., & Crittenden, P. M. (1991). Physical and psychological maltreatment: Relations among types of maltreatment. Child Abuse & Neglect, 15(1-2), 5-18. https://doi.org/10.1016/0145-2134(91)90085-R        [ Links ]

Cohen, P., Crawford, T. N., Johnson, J. G., & Kasen, S. (2005). The children in the community study of developmental course of personality disorder. Journal of Personality Disorders, 19(5), 466-486. https://doi.org/10.1521/pedi.2005.19.5.466        [ Links ]

Comijs, H. C., Beekman, A. T., Smit, F., Bremmer, M., Van Tilburg, T., & Deeg, D. J. (2007). Childhood adversity, recent life events and depression in late life. Journal of Affective Disorders, 103(1-3), 243-246. https://doi.org/10.1016/j.jad.2007.01.012        [ Links ]

Cronholm, P. F., Forke, C. M., Wade, R., Bair-Merritt, M. H., Davis, M., Harkins-Schwarz, M. et al. (2015). Adverse childhood experiences: Expanding the concept of adversity. American Journal of Preventive Medicine, 49(3), 354-361. https://doi.org/10.1016/j.amepre.2015.02.001        [ Links ]

Dugal, C., Bigras, N., Godbout, N., & Bélanger, C. (2016). Childhood interpersonal trauma and its repercussions in adulthood: An analysis of psychological and interpersonal sequelae. In G. El-Baalbaki, & C. Fortin (Eds.), A multidimensional approach to post-traumatic stress disorder: From theory to practice. London: IntechOpen.         [ Links ]

Felitti, V. J., Anda, R. F., Nordenberg, D., Williamson, D. F., Spitz, A. M., Edwards, V. et al. (1998). Relationship of childhood abuse and household dysfunction to many of the leading causes of death in adults: The adverse childhood experiences (ACE) study. American Journal of Preventive Medicine, 14(4), 245-258. https://doi.org/10.1016/S0749-3797(98)00017-8        [ Links ]

Fergusson, D. M., & Horwood, L. J. (2003). Resilience to childhood adversity: Results of a 21-year study. In S. S. Luthar (Ed.), Resilience and vulnerability: Adaptation in the context of childhood adversities (pp. 130-155). Cambridge: Cambridge University.         [ Links ]

Finkelhor, D., Ormrod, R. K., & Turner, H. A. (2009). Lifetime assessment of poly-victimization in a national sample of children and youth. Child Abuse & Neglect, 33(7), 403-411. https://doi.org/10.1016/j.chiabu.2008.09.012        [ Links ]

Glaser, J. P., Van Os, J., Portegijs, P. J., & Myin-Germeys, I. (2006). Childhood trauma and emotional reactivity to daily life stress in adult frequent attenders of general practitioners. Journal of Psychosomatic Research, 61(2), 229-236. https://doi.org/10.1016/j.jpsychores.2006.04.014        [ Links ]

Green, J. G., McLaughlin, K. A., Berglund, P. A., Gruber, M. J., Sampson, N. A., Zaslavsky, A. M. et al. (2010). Childhood adversities and adult psychiatric disorders in the national comorbidity survey replication I: Associations with first onset of DSM-IV disorders. Archives of General Psychiatry, 67(2), 113-123. https://doi.org/10.1001/archgenpsychiatry.2009.186        [ Links ]

Hammen, C., Henry, R., & Daley, S. E. (2000). Depression and sensitization to stressors among young women as a function of childhood adversity. Journal of Consulting and Clinical Psychology, 68(5), 782-787. https://doi.org/10.1037/0022-006X.68.5.782        [ Links ]

Harkonmäki, K., Korkeila, K., Vahtera, J., Kivimäki, M., Suominen, S., Sillanmäki, L. et al. (2007). Childhood adversities as a predictor of disability retirement. Journal of Epidemiology & Community Health, 61(6), 479-484. https://doi.org/10.1136/jech.2006.052670        [ Links ]

Hernandez, A., Arntz, A., Gaviria, A. M., Labad, A., & Gutiérrez-Zotes, J. A. (2012). Relationships between childhood maltreatment, parenting style, and borderline personality disorder criteria. Journal of Personality Disorders, 26(5), 727-736. https://doi.org/10.1521/pedi.2012.26.5.727        [ Links ]

Holmes, T. H., & Rahe, R. H. (1967). The social readjustment rating scale. Journal of Psychosomatic Research, 11(2), 213-218. https://doi.org/10.1016/0022-3999(67)90010-4        [ Links ]

Infurna, M. R., Reichl, C., Parzer, P., Schimmenti, A., Bifulco, A., & Kaess, M. (2016). Associations between depression and specific childhood experiences of abuse and neglect: A meta-analysis. Journal of Affective Disorders, 190, 47-55. https://doi.org/10.1016/j.jad.2015.09.006        [ Links ]

Jaffee, S. R. (2017). Child maltreatment and risk for psychopathology in childhood and adulthood. Annual review of clinical psychology, 13, 525-551. https://doi.org/10.1146/annurev-clinpsy-032816-045005        [ Links ]

Jorm, A. F., & Mulder, R. T. (2018). Prevention of mental disorders requires action on adverse childhood experiences. Australian & New Zealand Journal of Psychiatry, 52(4), 316-319. https://doi.org/10.1177/0004867418761581        [ Links ]

Kalmakis, K. A., & Chandler, G. E. (2014). Adverse childhood experiences: Towards a clear conceptual meaning. Journal of Advanced Nursing, 70(7), 1489-1501. https://doi.org/10.1111/jan.12329        [ Links ]

Kessler, R. C., McLaughlin, K. A., Green, J. G., Gruber, M. J., Sampson, N. A., Zaslavsky, A. M. et al. (2010). Childhood adversities and adult psychopathology in the WHO world mental health surveys. The British Journal of Psychiatry, 197(5), 378-385. https://doi.org/10.1192/bjp.bp.110.080499        [ Links ]

Kluwe-Schiavon, B., Viola, T. W., & Grassi-Oliveira, R. (2016). Cross-cultural adaptation of the maltreatment and abuse chronology of exposure (MACE) scale to brazilian portuguese. Trends in Psychiatry and Psychotherapy, 38(1), 33-39. https://doi.org/10.1590/2237-6089-2015-0051        [ Links ]

Kuo, J. R., Khoury, J. E., Metcalfe, R., Fitzpatrick, S., & Goodwill, A. (2015). An examination of the relationship between childhood emotional abuse and borderline personality disorder features: The role of difficulties with emotion regulation. Child Abuse & Neglect, 39(1), 147-155. https://doi.org/10.1016/j.chiabu.2014.08.008        [ Links ]

Lipp, M. E. N. (1984). Stress e suas implicações. Estudos em Psicologia (Campinas), 1(3/4), 5-19.         [ Links ]

Mansueto, G., & Faravelli, C. (2017). Recent life events and psychosis: The role of childhood adversities. Psychiatry Research, 256, 111-117. https://doi.org/10.1016/j.psychres.2017.06.042        [ Links ]

Marackova, M., Prasko, J., Matousek, S., Latalova, K., Hruby, R., Holubova, M. et al. (2016). The impact of childhood adversities on anxiety and depressive disorders in adulthood. Neuro Endocrinology Letters, 37(7), 478-484.         [ Links ]

McCabe, K. L., Maloney, E. A., Stain, H. J., Loughland, C. M., & Carr, V. J. (2012). Relationship between childhood adversity and clinical and cognitive features in schizophrenia. Journal of Psychiatric Research, 46(5), 600-607. https://doi.org/10.1016/j.jpsychires.2012.01.023        [ Links ]

McLaughlin, K. A. (2016). Future directions in childhood adversity and youth psychopathology. Journal of Clinical Child & Adolescent Psychology, 45(3), 361-382. https://doi.org/10.1080/15374416.2015.1110823        [ Links ]

Mitchell, K. J., Tynes, B., Umaña-Taylor, A. J., & Williams, D. (2015). Cumulative experiences with life adversity: Identifying critical levels for targeting prevention efforts. Journal of Adolescence, 43(1), 63-71. https://doi.org/10.1016/j.adolescence.2015.05.008        [ Links ]

Montez, J. K., & Hayward, M. D. (2014). Cumulative childhood adversity, educational attainment, and active life expectancy among US adults. Demography, 51(2), 413-435. https://doi.org/10.1007/s13524-013-0261-x        [ Links ]

Neumann, E. (2017). Emotional abuse in childhood and attachment anxiety in adult romantic relationships as predictors of personality disorders. Journal of Aggression, Maltreatment & Trauma, 26(4), 430-443.         [ Links ]

Paris, J. (2018). Childhood adversities and personality disorders. In W. J. Livesley, & R. Larstone (Eds.), Handbook of personality disorders: Theory, research, and treatment (2a ed., pp. 301-308). New York: Guilford.         [ Links ]

Raffaelli, M., Santana, J. P., Morais, N. A., Nieto, C. J., & Koller, S. H. (2018). Adverse childhood experiences and adjustment: A longitudinal study of street-involved youth in Brazil. Child Abuse & Neglect, 85, 91-100. https://doi.org/10.1016/j.chiabu.2018.07.032        [ Links ]

Seery, M. D., Holman, E. A., & Silver, R. C. (2010). Whatever does not kill us: Cumulative lifetime adversity, vulnerability, and resilience. Journal of Personality and Social Psychology, 99(6), 1025-1041. https://doi.org/10.1037/a0021344        [ Links ]

Senra, L. X., Lourenço, L. M., & Pereira, B. O. (2011). Características da relação entre violência doméstica e bullying: Revisão sistemática da literatura. Gerais : Revista Interinstitucional de Psicologia, 4(2), 297-309.         [ Links ]

Soares, A. L. G., Howe, L. D., Matijasevich, A., Wehrmeister, F. C., Menezes, A. M., & Gonçalves, H. (2016). Adverse childhood experiences: Prevalence and related factors in adolescents of a Brazilian birth cohort. Child Abuse & Neglect, 51, 21-30. https://doi.org/10.1016/j.chiabu.2015.11.017        [ Links ]

Tavares, M. D. L. (2004). Abordagem da violência intrafamiliar no programa saúde da família. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Violência faz mal à saúde. Brasília: Ministério da Saúde, 205-17.         [ Links ]

Teicher, M. H., & Parigger, A. (2015). The 'maltreatment and abuse chronology of exposure' (MACE) scale for the retrospective assessment of abuse and neglect during development. PLoS One, 10(2), 1-37. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0117423        [ Links ]

Viola, T. W., Salum, G. A., Kluwe-Schiavon, B., Sanvicente-Vieira, B., Levandowski, M. L., & Grassi-Oliveira, R. (2016). The influence of geographical and economic factors in estimates of childhood abuse and neglect using the childhood trauma questionnaire: A worldwide meta-regression analysis. Child Abuse & Neglect, 51, 1-11. https://doi.org/10.1016/j.chiabu.2015.11.019        [ Links ]

Warmingham, J. M., Handley, E. D., Rogosch, F. A., Manly, J. T., & Cicchetti, D. (2019). Identifying maltreatment subgroups with patterns of maltreatment subtype and chronicity: A latent class analysis approach. Child Abuse & Neglect, 87, 28-39. https://doi.org/10.1016/j.chiabu.2018.08.013        [ Links ]

Waxman, R., Fenton, M. C., Skodol, A. E., Grant, B. F., & Hasin, D. (2014). Childhood maltreatment and personality disorders in the USA: Specificity of effects and the impact of gender. Personality and Mental Health, 8(1), 30-41. https://doi.org/10.1002/pmh.1239        [ Links ]

 

 

Endereço para correspondência:
Carolina Palmeiro Lima
psi.carolinalima@gmail.com

Jaqueline Portella Giordani
jaquelinegiordani@gmail.com

Clarissa Marceli Trentini
clarissatrentini@terra.com.br

Submetido em: 26/04/2019
Aceito em: 01/04/2020

Creative Commons License All the contents of this journal, except where otherwise noted, is licensed under a Creative Commons Attribution License