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Psicologia: ciência e profissão

Print version ISSN 1414-9893

Psicol. cienc. prof. vol.24 no.1 Brasília Mar. 2004

 

ARTIGOS

 

Aprendendo a ser psicoterapeuta1

 

Learning to be a psychotherapist

 

 

Elizabeth Amelio Faleiros *

Federação Brasileira de Psicodrama (FEBRAP)
Universidade Católica de Pelotas, RS

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Este estudo investiga, na perspectiva de Jacob Levy Moreno, a concepção que alunos de Psicologia têm sobre o que é ser psicoterapeuta, quais elementos são necessários para o desenvolvimento dessa tarefa e os fatores impeditivos para realizá-la. Propõe formas de soluções para o desempenho daquela função, favorecendo a reflexão sobre a importância dessa tarefa e a responsabilidade do profissional junto ao paciente. A metodologia utilizada é a qualitativa, pois esta permite abordar dimensões da subjetividade dos sujeitos. Os resultados revelam que os alunos possuem em sua concepção os alicerces básicos, cujos indicadores são apontados por Moreno e por outros autores, percebem os requisitos básicos que constituem a essência do papel de terapeuta, evidenciam críticas realistas sobre os fatores limitadores e sugerem ações pedagógicas para minimizá-los.

Palavras-chave: Psicoterapeuta, Psicoterapia, Relação terapeuta-paciente, Psicodrama.


ABSTRACT

This study aims at investigating, according to Jacob Levy Moreno’s perspective, the conception of Psychology students about what a psychotherapist is, what elements, as basic requirements, are needed for the development of this task and the factors that may hinder the performance of this activity. The study proposes different solutions for the fulfillment of this task, providing reflection about its importance and the responsibility given to the psychotherapist when dealing with the patient. The methodology used is the qualitative approach as it allows working with different dimensions of the patients’ subjectivity. The results show that students have, as their own concepts, the basic foundations according to the indicators mentioned by Moreno and other authors. They also notice the basic requirements that compose the role of a psychotherapist, highlight realistic criticism about the limiting factors and suggest pedagogical actions in order to reduce them.

Keywords: Psychotherapist, Psychotherapy, Relationship therapist – patient, Psychodrama


 

 

Desde Freud, criador do sistema psicanalítico com sua idéia pautada na conservação da energia da libido, mantendo-se constante no psiquismo e caminhando por diferentes tendências até a de cunho existencial, vamos encontrar estudos relacionados à difícil tarefa de tornar-se psicoterapeuta, de acompanhar o crescimento de outro ser humano, dificuldade essa independente das mais variadas abordagens psicoterápicas.

Neste estudo, o enfoque será o de Jacob Levy Moreno, para quem a criatividade no papel de psicoterapeuta deverá estar presente, enriquecendo-o e transformando-o.

A cristalização no papel é a conserva cultural, a estagnação, a permanência no igual, na repetição. Supomos que alunos em formação, em sua maioria em fase final de adolescência ainda afirmando sua identidade, estariam enfrentando um processo de crescimento no papel de terapeuta, podendo experienciá-lo com maior ou menor espontaneidade2.

Ao constatar as naturais e esperadas dificuldades dessa população de futuros profissionais no convívio que vimos tendo como supervisora daqueles, mostrou ser de relevância aprofundar este tema.

A responsabilidade e complexidade da tarefa de responder terapeuticamente ao pedido de ajuda de outro ser humano justifica a necessidade de maior consciência do futuro profissional sobre a concepção a respeito do que é ser psicoterapeuta e sua implicação de ordem prática na qualidade da sua formação profissional.

Os objetivos foram: identificar a concepção dos estagiários de Psicologia Clínica sobre o que é ser psicoterapeuta, esclarecer fatores impeditivos no exercício desse papel e propor formas de possíveis soluções, proporcionar aos estagiários oportunidade de reflexão sobre a importância de sua tarefa e responsabilidade junto ao paciente, investigar as categorias espontaneidade-criatividade, na concepção daqueles, sobre o que é ser psicoterapeuta enquanto papel social a ser desempenhado por eles no contexto terapêutico.

 

Aproximações de um Olhar Sobre um Mar de Pensamentos

“Ser psicoterapeuta é algo de profundo, de misterioso, de sagrado. Ajudar alguém a se ver, a se conhecer, a tomar posse de si mesmo é algo que sem uma profunda humildade dificilmente poderá acontecer” Ribeiro (1986: 240).

Cresce consideravelmente o número de pessoas que busca a psicoterapia na tentativa de resolver dificuldades e alargar possibilidades de viver no mundo atual, já que há um estado permanente de mudanças fazendo com que se sintam inseguras, amedrontadas e sozinhas.

É nesse palco de turbulência que se insere a psicoterapia como mais uma possibilidade capaz de transformação individual, social e política. Assim, faz-se necessária uma reflexão sobre a dimensão do que é ser psicoterapeuta, já que este representa um forte instrumento de mudança.

Autores de renome concordam com a afirmação de Gomes (1995, p. 83) que diz:

“A prática psicoterapêutica é tradicionalmente conhecida como sendo o exercício de uma arte. O terapeuta, no contexto da singularidade de um caso, combina convicções teóricas e sensibilidade pessoal para aliviar o sofrimento psicológico de alguém”.

Independentemente do método adotado, a figura do terapeuta é sempre de grande importância, não só pelo papel que desempenha, mas também pelo simbolismo de que sua função se reveste. Porchat (1982,pp.124-125) faz referência a essa idéia falando de um dos aspectos da situação psicoterápica, o vínculo terapêutico.

“...o terapeuta parece ser, no início, um símbolo para o paciente; ele representa ajuda, não importa o modo como espera ser ajudado.

Essa relação dual que se esboça no mundo interno do paciente desde que ele se propôs iniciar uma psicoterapia já nos conduz aos dois aspectos fundamentais presentes no fenômeno vínculo terapêutico. Por um lado essa relação estará enraizada na realidade: o terapeuta é uma figura física, que se expressa, é uma pessoa real. Por outro, antes mesmo de o paciente conhecê-lo, ele ‘existe’ enquanto expectativa, enquanto ansiedade, esperança, no mundo interno do paciente. Então, antes mesmo de o paciente ter um terapeuta real,ele o tem em seu mundo de fantasia, a seu próprio modo, de acordo com suas necessidades emocionais, de acordo com suas fantasias”.

E Moreno (1974, p. 84) acrescenta:

“A esperança de um herói-terapeuta é, freqüentemente, a causa estimulante que marca o início do tratamento do paciente. Essa esperança se origina de sua necessidade de auxílio e libertação e nem sempre pode ser satisfeita pelo terapeuta. O terapeuta não é um mágico, um curador divino, mas sim um homem”.

Assim, como condição preliminar para um bom desempenho psicoterapeutico, é necessário que tenha consciência de seus problemas, evitando danos ao paciente. “Tal consciência pode ajudá-lo na sua relação com o cliente, pois é mais fácil perceber situações de conflito nos outros quando se viveu situações semelhantes, desde que o perigo de identificação com o cliente não seja bem acentuado e possa estar sob controle” Ribeiro (1986, p. 209).

Outra condição básica é que seja capaz de lidar com as fantasias do próprio poder. Muitos clientes põem-nos à prova, com desafio verbal ou entrega total à nossa ação terapêutica. Ainda segundo o referido autor:

“É então que se é invadido pelo desejo desesperado de curar, de desafiar a enfermidade, talvez para provar a si mesmo a sua capacidade. É inútil dizer que tal atitude entrava a dinâmica do tratamento. Tal atitude, baseada na vaidade pessoal e profissional, além de ser uma contra-transferência inútil, leva a uma predeterminação de metas, a uma diretividade que impede uma normal e natural eclosão da psicodinâmica das vivências neuróticas do cliente.

O psicoterapeuta deve estar preparado para reagir positivamente ante as próprias frustrações, seja quando percebe a dificuldade em que se encontra ante um cliente difícil, seja quando esse cliente lhe revela aspectos negativos da própria personalidade”(1986,p.210).

A segurança emocional deve estar presente, já que a percepção de sua instabilidade pode dificultar o processo psicoterapêutico. O cliente acredita que o psicoterapeuta seja equilibrado, com condições de clareza, de percebê-lo sem interferências pessoais e, assim, ajudá-lo. Porém, é importante também perceber que ninguém tem condições de ser absolutamente seguro emocionalmente. Em algum momento, essas limitações do psicoterapeuta são um fator positivo, pois ajudam o cliente a construir uma imagem mais real das próprias exigências e, ao mesmo tempo, vislumbrar o mundo de maneira não tão “perfeccionista e acabada”.

Quanto aos valores do terapeuta, a neutralidade não deixa de ser um mito; a postura psicoterapêutica não anula sentimentos, vontades, mas exige que o mundo interior do psicoterapeuta não influencie ou oriente o mundo do cliente. Vem daí a importância de o terapeuta ter passado pelo seu próprio processo para estar com o cliente em uma relação fluida, espontânea, sem contaminação pela sua realidade interna.

D`Andrea (1971) confirma essa idéia quando diz que, para ser um bom psicoterapeuta, é necessário previamente passar previamente pela experiência como paciente, como medida profilática do envolvimento emocional.

Especificando-se um pouco mais, quanto à atitude do psicoterapeuta, esta dependerá de seu estilo pessoal, de seu modo de estar no mundo, podendo variar de pessoa para pessoa, de técnica para técnica.

Diante das diferentes orientações de tratamento, vamos restringir-nos ao comportamento do psicoterapeuta de base analítica, já que esta é uma das tendências desenvolvidas no currículo do curso, ao lado da orientação existencial.

Enquanto Freud propõe ao cliente associar livremente, sugere ao analista a regra da “atenção uniformemente suspensa”, deixando a mente livre para receber toda estimulação advinda do cliente. Freud destaca três atitudes fundamentais assumidas pelo analista no processo psicoterapêutico:

• atenção uniformemente suspensa, com o objetivo de facilitar a compreensão do inconsciente do cliente pelo terapeuta.

• comportamento de cirurgião: o psicoterapeuta não está imune a sentimentos e afetos pelo cliente. É importante estar atento a eles para não se impedir de fazer e dizer o que for preciso.

• comportamento de espelho: assim como uma figura nebulosa ou ambivalente, permanece o psicoterapeuta analítico diante do cliente com o fim de intensificar a fantasia deste e, ao mesmo tempo, penetrar nas intenções do psicoterapeuta.

Nas psicoterapias mais recentes, o psicoterapeuta vai-se tornando cada vez mais pessoal; coloca-se com sentimentos de amor, de raiva, cansaço, de interesse, debatendo com o cliente suas atitudes.

Daqui em diante, veremos qualidades e atitudes gerais esperadas do terapeuta em qualquer tipo de psicoterapia; podemos citar: moderação, originalidade, capacidade de percepção interior, flexibilidade, visão ampla e aberta do mundo, humildade e fluidez.

Quanto às qualidades específicas e reconhecidas de um psicoterapeuta, encontramos, na maioria dos estudos:

• empatia, como a capacidade de pensar o pensamento do outro, sentir o seu sentimento, ver e sentir como o cliente vê a partir do seu referencial.

• comunicação autêntica e calorosa, ao invés de agir “como se” estivesse sentindo amor, compreensão. É preciso perceber se é o momento de o cliente receber uma comunicação total.

• concepção positiva da pessoa humana, relacionada com a ênfase no homem, no equilíbrio saudável deste. Essa finalização para a harmonia e unidade poderá estar perturbada, mas nunca destruída, uma vez que ela é própria da natureza humana.

A partir desses princípios, faz-se necessário que o psicoterapeuta se apresente como pessoa real, como gente que sente, que ama, não se colocando tão somente como um foco nebuloso, ambivalente.

Sobre esse aspecto, Fiorini escreve que “o papel do terapeuta não se exerce apenas através do que permite ao paciente ver de seu mundo, mas também através do papel que desempenha nesse mundo” (1976: 113).

• maturidade das emoções, o que implica ter consciência da própria capacidade emocional e afetiva, perceber as limitações e poder lidar conscientemente com os próprios afetos e emoções para não ultrapassar a finalidade dos laços afetivos propostos no tratamento.

• espontânea flexibilidade. É onde se manifesta a criatividade. A espontaneidade aparece através da participação do terapeuta como ser, capaz de sorrir, sentir, mostrar entusiasmo ou cansaço. A flexibilidade seria escutar, perceber, sentir e transformar tudo isso em um gesto psicoterapêutico, voltado para a necessidade do cliente.

 

Por Via de Jacob Levy Moreno

Como já dissemos neste estudo, priorizamos a abordagem moreniana como base de fundamentação e pretendemos investigar as categorias espontaneidade-criatividade, na concepção dos alunos, sobre o que é ser psicoterapeuta enquanto papel a ser desempenhado por eles no contexto terapêutico. Esperamos tornar clara a relação dos mesmos com o papel de terapeuta, indagando se o fazem de maneira espontânea-criativa ou apoiados simplesmente na reprodução de ”conservas culturais”.

Na perspectiva de Moreno, uma das dimensões da existência humana que define o homem seria o inventário de papéis que o mesmo desempenha na sua vida. O indivíduo sente, pensa e age em função de uma multiplicidade de papéis fisiológicos, psicodramáticos e sociais que o definem. Assim, o papel é tido como a menor unidade observável de conduta.

Entre algumas de suas definições, Moreno (1975) conceitua o papel como:

“Os papéis são os embriões, os precursores do eu, e esforçam-se por se agrupar e unificar. Distingue os papéis fisiológicos ou psicossomáticos como os do indivíduo que come, dorme e exerce atividade sexual; os papéis psicológicos ou psicodramáticos, como os de fantasmas, fadas e papéis alucinados, e, finalmente, os papéis sociais, como os de pai, policial, médico etc [...] os papéis psicossomáticos, no decurso de suas transações, ajudam a criança pequena a experimentar aquilo a que chamamos o ‘corpo’; que os papéis psicodramáticos a ajudam a experimentar o que designamos por ‘psique’; e que os papéis sociais contribuem para se produzir o que denominamos ‘sociedade’. Corpo, psique e sociedade são, portanto, as partes intermediárias do eu total” (pp. 25-26).

“O papel é a forma de funcionamento que o indivíduo assume no momento específico em que reage a uma situação específica, na qual outras pessoas ou objetos estão envolvidos. O papel é a unidade de cultura; ego e papel estão em contínua interação. Espera-se que todo o indivíduo esteja à altura do seu papel oficial na vida, que um professor atue como professor, um aluno como aluno e assim por diante” (pp. 27-29).

Tornando um pouco mais claras essas idéias, o aparecimento do eu ocorreria a partir dos papéis. Não são os papéis que emergem do eu, mas, ao contrário, o eu é quem surge dos papéis. Rubini afirma: “Moreno entende o papel como a primeira unidade ordenadora e estruturante do eu” (1995, p. 51).

O desenvolvimento dos papéis psicodramáticos e sociais vai coincidir com o estabelecimento da separação entre fantasia e realidade. Sendo assim, Rubini aprofunda um pouco mais esse aspecto ao destacar:

“Com a brecha entre a fantasia e a realidade, o indivíduo adquire a capacidade de iniciar processos de aquecimento3 diferenciados, tanto para o desempenho de um ou de outro tipo de papel. E o fator que vai garantir essa passagem do mundo da fantasia para o da realidade e vice-versa é a espontaneidade como princípio da adequação da ação do indivíduo a seus próprios papéis” (1995, p. 53).

Podemos notar, nas várias definições, que os papéis possuem algo em comum: são fenômenos observáveis, aparecem nas ações, são atuados, representam aspectos tangíveis do eu.

Assim, o conceito de papel é extensivo a todas as dimensões da vida. É empregado para abordar a situação do nascimento, perpassando toda a existência no que se refere à experiência individual e também à participação do indivíduo na sociedade. A teoria dos papéis situa-se no conjunto da teoria moreniana que sempre se refere ao homem em situação, imerso no social, buscando transformá-lo através da ação.

Ao prestarmos atenção em nosso comportamento, ou seja, no nosso encontro com as pessoas, percebemos que a fala e os gestos constituem a face externa da personalidade, compondo os papéis utilizados no dia-a-dia de nossa vida relacional. Assim, tudo que é feito e pode ser visto e se relaciona com alguma coisa fora da pessoa é papel.

Nessa visão, os indivíduos têm participação na realidade social através dos papéis sociopsicodramáticos os quais, por sua vez, são determinados por fatores genéticos e ambientais. Pode-se dizer que o papel é a menor unidade observável e mensurável da expressão sociorrelacional da personalidade, aceita, proposta e estimulada pelo grupo social. Originariamente, o papel nasceu da interação mãe-filho, baseado na complementariedade dos dois; somente existe em função de seu complementar, o contra-papel. Temos, então, que a inter-relação de ambos constitui os vínculos.

Viver os papéis do cotidiano não é viver um faz-de-conta, uma farsa, mas trazer a força da autenticidade e da verdade de cada um para ser digna de ser vivida e para que o indivíduo possa desenvolver sua espontaneidade e criatividade, para não correr o risco de cair na rigidez, impessoalidade, repetindo a conserva cultural que massifica a criação.

Porém, para exercer essa espontaneidade e criar no papel, o indivíduo precisa revelar seu verdadeiro eu, que se dá na relação com o outro. Para melhor compreensão, antes de dar continuidade a esse aspecto, traremos alguns esclarecimentos da teoria moreniana para, posteriormente, retomar a criatividade especifi-camente no papel de psicoterapeuta psicodramático.

Para Moreno, o homem nasce com recursos de espontaneidade, sensibilidade e criatividade como fatores que favorecem o adequado desenvolvimento da vida física, psíquica e relacional. Ao nascer, apresenta, pela primeira vez, sua capacidade de responder adequadamente a uma situação nova. Tal capacidade, fruto de forças hereditárias e ambientais, recebe o nome de espontaneidade e vai permitir o reconhecimento da sensibilidade e da criatividade.

Assim, Moreno a define, operacionalmente, como uma resposta adequada a uma nova situação ou resposta nova a uma situação antiga; no psicodrama, a espontaneidade manifesta-se não só na dimensão das palavras, mas também em outras dimensões de expressão, como a atuação, a interação, a fala, a dança, o canto etc. (Blatner e Blatner, 1996).

Podemos entender o estudo da espontaneidade como uma entidade psicológica independente. Não surge automaticamente e tampouco pré-existentemente, mas é produzida por um ato de vontade, surgindo naturalmente.

É importante deixar claro que o veículo da operação do fator espontaneidade, na criança, desde a situação do nascimento em diante, é a porção de dispositivos físicos de arranque do processo de aquecimento preparatório para um ato. Sendo assim, os estados espontâneos são gerados por vários dispositivos de arranque por meio de técnicas de aquecimento. O corpo e a mente são colocados em movimento, usando atitudes corporais e imagens mentais que levam ao alcance do aquecimento para desencadear uma ação organizada.

Moreno é bem claro sobre as condições favoráveis e desfavoráveis para o surgimento da espontaneidade:

“Um tipo de universo aberto, ou seja, um universo em que é continuamente possível um certo grau de novidade - e é esse evidentemente, o tipo de universo em que surgiu a consciência humana - é uma condição favorável para que o fator e surja e se desenvolva. Não poderia existir num universo fechado à novidade, isto é, determinado por leis absolutas. Se a espontaneidade fosse, por acaso, colocada em tal universo, deteriorar-se-ia rapidamente em virtude da impossibilidade do seu desenvolvimento e ao desuso de sua função... Quanto maior for a probabilidade de repetição de certos eventos, menor será a probabilidade de que surja a espontaneidade...” (1975, pp. 137-138).

Na mesma linha, esclarece Rubini (1995, p. 48): “O homem é um ser que, a partir do impulso da espontaneidade, poderá desenvolver a ‘centelha divina criadora’ que traz em si mesmo.”

Com isto, vemos que a espontaneidade é componente essencial da criatividade. Refere-se mais a uma qualidade sutil da mente do que a uma categoria identificável de comportamento.

Mais especificamente, as qualidades essenciais de um ato espontâneo são: mente aberta, originalidade de abordagem, vontade de tomar iniciativa e integração das realidades exteriores e das intuições interiores, das emoções e das funções racionais. Não é mera impulsividade ou comportamento ao acaso; é preciso haver certa intencionalidade rumo a um resultado construtivo, seja ele estético, social ou prático.

É de se notar a tendência para um elemento de entrega na espontaneidade, como também de inocência, resultando em uma expansão da consciência. Permitir-se esse momento implica abandonar a excessiva censura no funcionamento da mente e a abertura correspondente aos impulsos interiores, às intuições e inspirações. No dizer de Blatner e Blatner (1996, p.76).

“Aumentar a espontaneidade e a criatividade decorre de um relacionamento básico com o inconsciente, que é de respeito, abertura e curiosidade prazerosa. O inconsciente deixa de ser visto apenas como fonte de impulsos anti-sociais, mas sim como um manancial de insights, pistas, imagens e intuições, em suma, o reservatório da criatividade. A grande contribuição do psicodrama é permitir o acesso e utilização desse potencial criativo inato. E ele o faz favorecendo as condições que provocam a espontaneidade, criando um contexto protegido contra as falhas, introduzindo um certo desafio e novidade para criar uma certa ansiedade, um deflagrador de energia para fazer com que as coisas andem e mantendo uma profunda preocupação e respeito pelo problema em pauta. Com o termo ‘aquecimento’, Moreno designava os procedimentos usados para aumentar a espontaneidade dos participantes...”

Os mesmos autores levam em conta a dimensão filosófica no pensamento de Moreno e acrescentam:

“... espontaneidade é a expressão ativa de sua filosofia existencialista. Ë ser receptivo às realidades tal como elas se apresentam no momento presente, não obscurecidas por pressuposições na medida do possível. Embora a cada momento tenhamos expectativas e crenças, podemos mudar nossa atitude passando do dogma para a experimentação, para uma prontidão com a finalidade de modificar e corrigir nossas teorias nos adaptando às percepções atuais. Essa modificação irá catalisar nossa espontaneidade.

A maneira de nos relacionarmos com nossos enganos é elemento-chave na espontaneidade. A idéia é continuar a improvisar como uma experiência que prossegue e, em vez de congelar, fazer de um engano uma retomada que mantém o foco na tarefa. O estado mental desenvolvido por um guerreiro Samurai no Japão dá uma pista:‘não espere nada, esteja preparado para tudo’. A pessoa espontânea lida com a interferência recentralizando e reassumindo uma presença com mente clara no aqui e agora”(1996, p.77).

Vemos, então, que a espontaneidade se dará na medida em que o indivíduo exercitar sua “habilidade” de abrir-se ao universo, dando-se tempo e a devida “receptividade ao inconsciente”.

Tal concepção entende que o existir humano é um viver em coletividade onde o indivíduo se realiza pelo desempenho de papéis na sociedade. É assim que o ambiente afetivo-emocional estabelecido entre a criança e o mundo, através da família, pode agir positivamente, ou, ao contrário, dificultar seu pleno desenvolvimento. Os fatores espontaneidade, sensibilidade e criatividade podem ainda ser perturbados por sistemas sociais constrangedores. A proposta fundamental dos psicoterapeutas psicodramatistas é a de trabalhar no sentido de favorecer a recuperação desses recursos vitais através de relações afetivas transformadoras.

A espontaneidade, a sensibilidade e a criatividade são potencialidades indissociáveis do comportamento humano. Temos todos uma boa reserva de criatividade, mas, para que esse potencial se manifeste e se explicite, torna-se necessário haver espaço para a espontaneidade. O que une e articula a espontaneidade e a criatividade é a sensibilidade, não só como percepção feita através dos órgãos dos sentidos, mas também como fator inato, de ordem afetivo-emocional. Dizendo de outra forma, a sensibilidade é a capacidade de captar as mensagens ocultas nos vários movimentos da vida.

À sensibilidade ou à percepção afetivo-emocional que permeia as inter-relações humanas chamamos fator Tele.

Tele é radical grego que significa “à distância”. É utilizado para designar as percepções que ocorrem no plano afetivo-emocional entre duas pessoas, tornando-as capazes de se perceberem mutuamente. Permite intuir, com sua sensibilidade, o que ocorre na subjetividade uma da outra. É a contrapartida científica do encontro, acontecimento crucial na existência. É no encontro de duas ou mais pessoas que se dá o momento transformador. Não é apenas reunião, é vivência intensa, com elementos amorosos e também hostis.

No entanto, em função de ambiente adverso, os elementos saudáveis da espontaneidade-criatividade vão sendo prejudicados e o indivíduo passa a ter comportamento escravo da rotina, da repetição monótona, com dificuldade em dar respostas adequadas às situações novas do dia-a-dia. Como diz Almeida (1990,p. 40), “As criações e aquisições vão-se tornando repetitivas, de forma rígida, dominadas pela inércia conservadora e recebem o nome de ‘conserva cultural’. É o ato criativo cristalizado.”

Apesar disso, a “conserva cultural” é fato corrente no processo de civilização, dando parâmetros necessários para as pessoas não mergulharem na desorganização pessoal.

Do ponto de vista de Moreno, o homem é sempre considerado em relação com o seu próximo: existir é coexistir, é existir com o outro, mas também é considerado na perspectiva do tempo vivido, intimamente vinculado à inter-relação e à criação. O tempo é um momento transformador (criador) das pessoas envolvidas na relação.

Esse momento caracteriza o encontro e impulsiona a revolução criadora4. Na interação humana, passado e futuro podem realizar-se afetivamente no tempo presente, como se fosse possível uma “parada” especial, com identidade própria, diferente do fluxo contínuo do tempo. As correntes afetivas: amor, saudade, raiva, inveja e o modo como são transmitidas e captadas enriquecem a vivência das pessoas no aqui e agora da experiência relacional. Dessa forma, estamos sempre falando em inter-relação.

Na prática, o psicodrama propõe resgatar e recuperar o homem psicodramático que existe em nós, com sua sensibilidade, genialidade e disposição para continuar criando.

No contexto terapêutico, lança-se mão das técnicas de trabalho para realizar essa tarefa. Para isso, o psicoterapeuta, através do seu papel, tendo por base a proposta da relação télica, intervém com sua personalidade total, já que considera que, em um sentido profundo, os valores vitais do psicoterapeuta estão sempre presentes ou influirão no tipo de intervenção que faça, nos aspectos da comunicação que estruture, nos sentimentos que lhe despertem as mensagens de seu paciente. Aceita a relação terapêutica em termos de um novo vínculo, que terá toda a intensidade presente que ambos podem criar. A correta instrumentação de todos esses elementos faz a riqueza da relação terapêutica.

Isso tudo leva-nos a falar da relação terapêutica e não da relação transferencial. No primeiro termo, incluem-se todos os aspectos da relação e não somente aspectos das distorções que na ortodoxia psicanalítica foram tão apregoados. Assim, na relação terapêutica, entram em jogo ambos os aspectos da tele, empatia e transferência, podendo os mesmos nela ocorrer.

No entanto, capacidade transferencial é algo potencial em todo o ser humano.O terapeuta pode perceber transferências próprias estimuladas pela relação com seu paciente. A diferença está em que poderá instrumentalizá-las para compreender, partindo daí, os aspectos profundos de seu paciente, que seriam inacessíveis por outros métodos.

Assim, como ambos são capazes de transferência, são também capazes de tele (relação de percepção correta e recíproca). Sobre essa estrutura é que se edifica fundamentalmente a relação terapêutica. Nessa medida, a cura vai-se dando, pois, onde dominava a transferência, vai-se aos poucos se incrementando o aspecto tele. Bustos (1978, p. 11) contribui para esse aspecto ao destacar:

“É importante esclarecer que tele-transferências estão presentes em toda relação humana. A tele é responsável pelas relações com êxito e podem-se atribuir à transferência os freqüentes desencontros entre os seres humanos. É também um critério de saúde; quanto maior a tele, maior capacidade se terá de realizar vínculos positivos. Tudo o que fazemos em terapia é instrumentar tecnicamente um processo natural.”

Se, para Moreno, a psicoterapia tem como objetivo o encontro, a espontânea e verdadeira relação entre o eu e o tu, cabe então ao “psicoterapeuta favorecer, incrementar relações verdadeiras, télicas, objetivas, entre as pessoas” Ferrari (1984, p.55)

A todo momento, vê-se presente a preocupação de Moreno com a interação, com o compartilhar, com o estar junto para crescer. Dessa forma, tomar para si a postura psicodramática implica internalizar o modelo terapêutico que objetiva a transformação de relações transferenciais em relações télicas.

Diante do pedido de ajuda terapêutica, quando alguém está em conflito estará com sua espontaneidade comprometida, com relacionamentos pouco télicos; conseqüentemente, haverá um exercício de papéis empobrecido pela repetição e cristalização.

Quanto ao papel do psicoterapeuta, ser psicodramatista, antes de mais nada, é uma postura ideológica e filosófica que deve permear toda a atividade profissional. Essa situação, na prática, é vivida como nova para ambos os lados que não sabem o quê e como vai acontecer, deflagrando a quantidade de espontaneidade e a possibilidade de criatividade nos dois lados da situação.

Dessa forma, quanto mais espontâneo e criativo for o psicodramatista, expressando sua inspiração momentânea com originalidade em suas ações, mais facilitará ao cliente mostrar-se em profundidade. Espera-se, então, que crie um clima propício à situação desde o primeiro encontro, de tal maneira que ela se torne um “locus nascendi” da espontaneidade do cliente.

Enquanto interação que está ocorrendo, o fator tele estará mais ou menos presente, podendo facilitar ou dificultar a relação. No decorrer dessa dinâmica, as pessoas jogarão no processo terapêutico os papéis que vêm desempenhando no decorrer de suas vidas, colorindo psicodramaticamente os papéis sociais de cliente-terapeuta que começam a se expressar.

Podemos dizer que esse jogo de papéis vai dar ao psicodramatista condições de perceber a situação em que se encontra o paciente quanto aos fatores tele-transferência e espontaneidade.

Por fim, nessa visão, psicoterapeuta é um modo de ser e estar no mundo, um modo de se expressar diante da vida como uma totalidade, em uma relação de encontro com a existência, sem separar o pensar do agir. O que então “legitimaria” ser psicoterapeuta é o ser do psicoterapeuta, transformando-se este no mais importante elemento do processo.

Sendo assim, se ao término do processo de formação o formando estiver bem consigo, com o outro, o contato com o cliente será feito com maior profundidade, ou seja, será um contato-encontro.

 

Um Caminho Metodológico Qualitativo

Nossa opção recaiu na metodologia de pesquisa e avaliação qualitativa por abranger a amplitude e globalidade do tema.

A intervenção, na realidade, começou pela aproximação para o estabelecimento dos primeiros contatos e, posteriormente, para a aplicação dos questionários do tipo semi-estruturado.

As categorias espontaneidade e criatividade tenderam a emergir da descrição elaborada pelos participantes sobre o que é ser psicoterapeuta. Tivemos presente, também, que outras categorias poderiam surgir com base na experiência daqueles e de suas respostas abertas às questões.

 

Procedimentos de Pesquisa

O movimento de investigação foi composto por três momentos.

• contato pessoal com os sujeitos para que conhecessem o objetivo deste estudo e dessem aquiescência para participar dele;

• entrega dos questionários com questões semi-abertas para que individualmente fossem respondidas por eles;

• encontro para a devolução dos resultados e abertura de outras possíveis categorias que pudessem ter surgido. Esse encontro permitiu também uma reflexão e entendimento de suas limitações e possibilidades de realizar seu papel com criatividade.

Para a elaboração dos questionários, baseamo-nos na pesquisa bibliográfica que fundamentou o projeto. Após a aplicação daqueles em seis psicoterapeutas experientes, chegou-se à fórmula mais apropriada, com seis questões5.

Na análise dos resultados, a procura das categorias de análise puderam vir do elaborado (escrito), momento precioso em que os sujeitos recriaram o próprio trabalho no papel de psicoterapeutas. A escrita foi o meio de captar essas evidências.

Essas categorias foram evidentemente confrontadas à luz do referencial teórico escolhido, em um movimento que estabelece as convergências e as divergências possíveis de acontecer.

Participantes

Responderam ao questionário dezoito alunos, com idade variando entre 23 e 42 anos, de ambos os sexos, de nível socioeconômico médio, o que correspondeu à totalidade de matriculados na disciplina de Estágio em Psicologia Clínica II do Curso de Psicologia da UCPEL.

Tratamento dos dados

A análise dos resultados foi feita sob a ótica da análise de conteúdo categorial, segundo Bardin (1977).

O conteúdo das respostas à pergunta sobre o que é ser psicoterapeuta foi lido e relido várias vezes e organizado do geral para o particular.

Através da livre atenção, buscou-se estabelecer os critérios de classificação em categorias analíticas ou segundo reagrupamento analógico, que se originaram tanto das variáveis teóricas determinadas pela pesquisadora como também de categorias empíricas que puderam ser construídas a partir do grupo estudado.

Para o tratamento dos resultados, foram considerados aspectos importantes do que se esperou encontrar, assim como diferenciados, presença ou ausência deles, os quais puderam sugerir o realçar de um sentido que se encontra em segundo plano, como valores, crenças, costumes e maneiras de atuar, entre outros.

Os dados referentes às outras questões norteadoras da pesquisa foram também considerados para o tratamento dos resultados.

No entanto, na tentativa de superar o formalismo da análise de conteúdo e possivelmente complementar a interpretação dos dados, os mesmos puderam ser tratados segundo alguns procedimentos da técnica hermenêutico6-dialética7, principalmente no que tange à análise final, utilizada por essa metodologia.

Para Macnaughton (1996), os resultados poderão ajudar outros pesquisadores a reconhecerem-se em situações similares a essas, nas suas próprias circunstâncias.

Com este estudo, esperamos alcançar os objetivos propostos e trazer contribuições à concepção dos sujeitos no sentido de chegar a uma conceituação mais clara acerca dessa tarefa e, possivelmente, a partir dos resultados, encaminhar ações voltadas para a realidade acadêmica do Curso de Psicologia da UCPEL, no sentido de uma formação que vá além do informar didático-científico, atingindo o preparo de profissionais criativos nessa arte-ciência que é a psicoterapia.

Resultados

Ao tomarmos todo o material para a análise, em movimento do todo para as partes e, depois, reagrupando as partes por semelhanças, voltando a “todos” unitários, chegamos às categorias de análise, que se vão desdobrando em subcategorias ou indicadores mais freqüentes.

O quadro geral dessas significâncias pode ser organizado por duas grandes vertentes de análise, que são:

• relatos convergentes e que reforçam a perspectiva de Moreno, bem como de outros autores de semelhante visão.

• relatos não-convergentes.

A primeira vertente desdobrou-se em subcategorias que emergiram com maior freqüência e vigor de expressão escrita sobre o papel do psicoterapeuta, abrangendo:

• proporcionar momentos de reflexão e de entendimento a partir do estabelecimento de laços com o paciente, vislumbrando assim novos caminhos;

• ser continente para as angústias e sentimentos daquele;

• ter flexibilidade, desejo de crescimento constante, responsabilidade e dedicação profissional associadas ao prazer;

• consciência de suas limitações;

• é desafio constante exigindo tempo e dedicação no preparo profissional;

• ter capacidade de relacionamento e ética profissional;

• respeitar o paciente como pessoa desejante, não apenas como doente;

• envolver inter-relação, manter uma postura, ter compreensão dinâmica da situação-conflito;

• aceitar o paciente com suas dificuldades sem criticá-lo ou rejeitá-lo, tentando ser continente;

• descobrir dentro de cada um a grandeza do ser humano;

• colocar-se no lugar do outro, ser homem que ri, chora, cria, que se emociona e amar intensamente a vida;

• fazer uso de técnicas de acordo com a necessidade do paciente, auxiliando no processo de encontro;

•entender a linguagem corporal do paciente; não idealizar o paciente conforme seu juízo de valor.

A segunda vertente desdobrou-se em outras subcategorias não convergentes que emergiam com menor freqüência, como o papel do psicoterapeuta, restrito à:

• aplicação de técnicas diversificadas e especializadas ao tratamento de distúrbios mentais;

• importância do uso de técnicas que ajudarão as pessoas a serem mais felizes.

Poderíamos dizer que aqui está a base estrutural do fenômeno estudado ou a base do conteúdo para a concepção do que é ser psicoterapeuta que o mundo desses alunos em treinamento pôde sugerir.

Parece que essa base estrutural deva obedecer a uma certa “consistência conceitual”, revelando que os indicadores que aparecem com maior freqüência são apontados por Moreno e outros autores aqui referidos.

Outros indicadores parecem revelar ainda mais evidências referidas no item Aproximações de um olhar sobre um mar de pensamentos, quando, em seu desenvolvimento, a maioria dos autores remete-nos a temas ligados à grande importância atribuída pelo paciente à figura do terapeuta.

Preliminarmente, uma das condições para seu bom desempenho seria ter resolvido os próprios problemas, tendo consciência deles, a fim de não provocar maior sofrimento no paciente.

Lidar com as fantasias do próprio poder também é uma das condições básicas, e não entrar no jogo para provar para si mesmo a sua capacidade de curar o paciente faz parte de não incrementar uma contra-transferência inútil que poderia ser nociva ao tratamento.

Apesar de ser importante a presença da segurança emocional no psicoterapeuta, também é necessário o cliente perceber que ninguém tem condições de ser absolutamente seguro o tempo todo, notando que aquele poderá estar sujeito a eventuais momentos de instabilidade emocional.

Ainda, ligada às qualidades específicas e reconhecidas de um psicoterapeuta, encontramos a concepção positiva de a pessoa humana ser voltada para a normalidade e o equilíbrio. De posse dessa ênfase, o terapeuta auxiliará no reaparecimento dessas forças adormecidas no paciente, podendo este redimensionar sua vida no sentido de retomar seu próprio poder, para o próprio equilíbrio e harmonia.

Nas palavras dos estagiários, podemos encontrar alguma sintonia com o que foi acima apontado:

• dedicar-se ao paciente, sem deixar que seus conteúdos interfiram na relação transferencial;

• ter os conflitos internos resolvidos para ter flexibilidade e manter comunicação eficiente; consciência de suas limitações;

• descobrir dentro de cada um a grandeza do ser humano;

• saber ouvir imparcialmente, compreender e confortar acreditando no potencial de saúde do paciente.

Ainda, alguns dos muitos indicadores que mais convergem para Moreno parecem estar mais próximos do item Por via de Jacob Levy Moreno. Assim, como é revelado em suas escritas, os estagiários sinalizaram:

• respeitar o paciente como pessoa desejante, não apenas como doente;

• estabelecer boa relação terapeuta-paciente, já que a via do desenvolvimento do tratamento é o afeto, ter amor pelo que faz;

• estabelecer inter-relação, manter uma postura, ter compreensão dinâmica da situação-conflito;

• colocar-se no lugar do outro, ser homem que ri, chora, cria, que se emociona e amar intensamente a vida;

• proporcionar momentos de reflexão e de entendimento a partir do estabelecimento de laços com o paciente, vislumbrando, assim, novos caminhos;

• ter flexibilidade, desejo de crescimento constante, responsabilidade e dedicação profissional associados ao prazer;

• aperfeiçoamento técnico e sobretudo humano; fazer uso de técnicas de acordo com a necessidade do paciente, auxiliando no processo de encontro.

Verificamos que essas respostas refletem dimensões de atitudes, comportamentos propostos por Moreno na relação do homem com seus papéis. A valorização desses aspectos é trazida por ele quando ressalta a importância da interação humana, pois, nessa visão, existir é co-existir. É existir com o outro. Moreno costuma dizer que a dimensão do homem vai além do ser psicológico, bio-lógico e natural. Para ele, “o homem é um ser cósmico”, e, sendo assim, é co-responsável pelo crescimento do outro, “da humanidade”.

Dessa forma, ao enfatizar a importância da relação interpessoal, mostra que é justamente nessa interação de reciprocidade que o encontro moreniano poderá existir, revitalizando a identidade das pessoas presentes. Quando Moreno afirma que o eu só existe na relação com o tu, faz-nos lembrar, antes de mais nada, da importância do vínculo com o paciente para o desenvolvimento criativo deste em seus vários papéis. Em outras palavras, seria estar com o outro trazendo a força da autenticidade e da verdade de cada um na relação, onde cada qual intui com sua sensibilidade o que ocorre na subjetividade do outro, para não cair na rigidez e impessoalidade que levaria à “conserva cultural”, podendo massificar a criação.Assim, ao revelar o verdadeiro eu, que se dá na relação com o outro, estaria exercendo sua espontaneidade e criando no papel, com respostas adequadas para o momento. Ainda, permitir-se momentos de espontaneidade implica também abandonar a excessiva censura no funcionamento da mente e promover a abertura correspondente aos impulsos interiores, às intuições e inspirações. Mais uma vez, vemos essas tendências acompanharem aquelas revelações dos estagiários.

Vemos assim que, fundamentalmente, a proposta de Moreno é trabalhar com o homem no sentido de favorecer a recuperação de seus recursos vitais (espontaneidade, sensibilidade e criatividade) através de relações afetivas transformadoras.

Mais uma vez, a marca do calor humano está sempre presente na proposta moreniana com o objetivo de transformar relações transferenciais em relações télicas, ou seja, relações verdadeiras, objetivas, entre as pessoas.

Os eixos que servem de apoio ao pensamento de Moreno, a espontaneidade em sua dimensão individual e o fator tele em sua projeção social, conjugando-se ambos no papel, são também revelados de maneira implícita pelos estagiários ao falarem de suas tarefas enquanto psicoterapeutas, pontuadas em suas escritas.

De outro lado, a tendência de o indivíduo apoiar-se na “conserva cultural”, na relação do trabalho com seu papel, também é apontada por Moreno, como as ações de forma repetitiva e cristalizada que, em alguns momentos, podem ser úteis para dar início à organização de uma ação.

Na segunda vertente, vemos indícios da reprodução da”conserva cultural”, apesar de esta se manifestar em menor freqüência, quando os estagiários revelam:

aplicação de técnicas diversificadas especializadas ao tratamento de distúrbios mentais;

com o uso de técnicas ajudará as pessoas a serem mais felizes.

É pertinente considerar que os procedimentos morenianos para o desempenho do papel de psicoterapeuta são, antes de tudo, uma postura ideológica e filosófica a permear toda a atividade profissional e que, na prática, essa situação será vivida como nova para o terapeuta e o paciente, que não sabem “a priori” o quê e como vai acontecer, desencadeando, assim, a espontaneidade necessária e a possibilidade, em ambos, de criar.

O trabalho terapêutico está sempre voltado para o processo, o vir-a-ser com ênfase no desenvolvimento da criatividade, como dimensões valorizadas da experiência e comportamento.

A partir desta análise, consideramos que os indicadores apresentados revelam uma rede de aspectos que, entrelaçados, vão dar suporte para que o papel de psicoterapeuta possa emergir com espontaneidade e criatividade.

Os resultados analisados até aqui referem-se às categorias propostas neste estudo.

A seguir, serão apresentados agrupamentos de outros resultados relevantes:

Sobre as qualidades/requisitos esperados de um psicoterapeuta:

• amar o ser humano sem discriminação e preconceitos.

• ter responsabilidade, ter conhecimentos de outras linhas de trabalho, além da própria.

• ter ética profissional, discrição. Empatia, flexibilidade.

• ter humildade, conhecimento teórico, disponibilidade.

• manejar com próprias resistências, trabalhar dentro de um enquadre técnico.

• ter autocrítica e estudo constante.

• ser sigiloso, reconhecer os próprios erros, manejar com a contratransferência.

• ter experiência de tratamento.

• suportar frustrações, ser espontâneo, ter simplicidade, criatividade.

Esses achados parecem apontar para características básicas essenciais, sugeridas pela maioria dos autores tanto de orientação ortodoxa quanto de tendências mais atuais que tratam do tema.

Sobre dificuldades encontradas no atendimento junto ao paciente:

• Não ter experiência do próprio tratamento.

• Abandono do tratamento pelos pacientes.

• Insegurança quanto a como proceder.

• Inexperiência e falta de bom preparo.

• Mobilização a partir do que ouvia do paciente.

• Grande ansiedade.

• Local inadequado do atendimento.

• Não basta querer ajudar o paciente, é preciso ter e buscar conhecimentos, entendimento e compreensão.

• Não soltar-me durante a sessão, faltando espontaneidade.

• Tranferência erótica do paciente, entender a dinâmica.

• Pouco conhecimento de técnicas, não saber fazer compreensão dinâmica.

Sobre sugestões para melhorar a qualidade do treinamento do papel de psicoterapeuta no curso e na prática de estágio:

• trabalhar, nas disciplinas, situações que mais tarde encontraremos com o paciente.

• vinculação da teoria e prática desde o início do curso, no sentido de se trabalhar o papel do psicólogo antes de se chegar aos estágios.

• realizar vivências em sala de aula enquanto sessões fictícias.

• propiciar o curso dê possibilidade para que todo aluno possa ter experiência psicoterápica enquanto paciente, mediante convênios da UCPEL com clínicas de psicoterapia.

• apresentar desde o início do curso, discussão de casos clínicos, maior treinamento para psicodiagnóstico, maior carga horária para o estágio de clínica, bem como realizar estágios em hospital psiquiátrico.

• apresentar a diversidade de teorias psicoterápicas no curriculum.

• trabalhar situações práticas, o papel de terapeuta em disciplina como ética profissional.

De modo geral, afirmaram que é preciso um treinamento maior para atuarem com naturalidade e eficácia.

Dos dezoito entrevistados, doze tiveram experiência de tratamento psicoterápico, com duração que variou de seis meses a quatro anos. As abordagens de tratamento foram: psicoterapia psicanalítica, psicodrama e Onto-psicologia.

 

Palavras Conclusivas

As categorias espontaneidade e criatividade receberam através da pesquisa junto aos entrevistados confirmação significativa.

Surgiram enquanto subcategorias ou indicadores de maior freqüência e revelaram uma base estrutural que obedecia a certa consistência conceitual.

Outras ainda surgiram enquanto categorias empíricas e não-convergentes na qualidade de “conserva cultural”, porém, manifestando-se com menor freqüência.

Quanto aos elementos que constituem a essência do papel, foram apontados pelos entrevistados como requisitos básicos e essenciais para o exercício da função de psicoterapeuta, coincidindo com as recomendações de autores de destaque aqui citados.

Na medida em que os expressaram pela escrita, parece que já os incorporaram como principais valores norteadores, sugerindo que, em nível perceptual-cognitivo, ocupam um espaço no mapa de referência dos sujeitos pesquisados.

Fizeram críticas realistas, propondo ações pedagógicas para minimizar dificuldades e sugeriram voltar o processo da aprendizagem para viver na práxis a interação terapeuta-paciente, com situações experienciais, processuais e não tanto conceituais, passivas e de memorização, onde tomam para si um produto final dado pelo professor.

Feitas essas considerações, pôde ser constatado que os principais alicerces norteadores que dão base para a estruturação do papel de psicoterapeuta emergiram na escrita dos estagiários.

Vimos que os resultados apresentaram coerência entre suas descrições e aspectos levantados na literatura; revelaram, também, maturidade e entendimento de suas limitações e possibilidades de realizar o papel de psicoterapeuta na realidade, com elementos potencializadores para o desenvolvimento da espontaneidade-criatividade, já que os valores básicos para a sua realização estão presentes. Com isso, o fato de alguns se encontrarem em processo final de adolescência aparentemente não demonstrou ser um obstáculo para o desenvolvimento do papel de terapeuta.

De um modo geral, perceberam a necessidade de crescimento pessoal e treinamento especializado contínuo como parte do processo da construção do papel de terapeuta, sugerindo ser este não um produto final, mas, sim, um processo sempre em construção.

 

A Aprendizagem ou Treinamento do Papel de Terapeuta

Detectados esses aspectos da realidade e não esquecendo a solicitação dos estagiários, propomos, nos moldes dos princípios do método dialógico-existencial com base na relação télica, o desenvolvimento do trabalho em supervisão como possibilidade de respostas a dificuldades, o despertar e a liberação da espontaneidade-criatividade no papel em desenvolvimento de terapeuta.

Sendo assim, o supervisionando, no ato de exercer os papéis, redescobre sua espontaneidade, tomando consciência de sua capacidade de recriar o papel.

Considerando o fazer do supervisor junto ao supervisionando, o treinamento de papel é uma técnica bastante utilizada por ser facilitadora, pois faz com que o supervisionando desenvolva o papel de terapeuta com criatividade ao exercê-lo e treiná-lo, porém em uma situação mais protegida, podendo ser apontados pelo supervisor e/ou grupo os acertos ou falhas no seu desempenho, de maneira que essas pontuações possam contribuir para o crescimento profissional.

Enfim, nessa abordagem, a dinâmica da supervisão bipessoal e/ou grupal tem a intenção de dar ao estagiário as oportunidades de compreender a dinâmica interna de seus pacientes e a análise da relação télico-transferencial, contando com matriz acolhedora, que serve de continente e proporciona uma busca pela formação da identidade profissional, que reflete e deixa fluir questionamentos e incertezas a fim de não permanecer na armadilha da vaidade e onipotência, pois, se não, quantas vezes nos acharíamos os donos da verdade?

Na medida em que os estagiários estivessem aprendendo em contato com o problema, iriam adquirir maior flexibilidade no ato do desenvolvimento de descobertas para possíveis soluções. Não podemos esquecer que o mundo está cada vez mais a pedir um profissional criativo, flexível, com capacidade de adaptar-se com rapidez às mudanças configuradas pelo novo século.

É claro que toda essa disponibilidade para o novo deverá ser mediada, modulada por padrões de comportamento ético, levando o profissional a autodefinir seu limite de competência.

E, assim, concluímos com Moreno, ao enaltecer o potencial da criatura humana:

“Como poderei Eu, o criador,
não fazer com que cada instante
fosse mais perfeito
e mais intenso do que o último?

Cada novo momento é mais perfeito
do que aquele
que Eu acabei de viver
Cada ser que eu crio
é mais perfeito
do que aquele
que acabei de criar

Meu momento mais perfeito
Meu momento mais intenso
deve ser meu último momento!"
(1992, p. 92)

 

Referências

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Endereço para correspondência
Elizabeth Amelio Faleiros
Rua Gen. João Antonio da Silveira, 117
96055-050 Pelotas, RS

Tel: +55-53-223.1867. Cel. +55-53-91180981

E-mail: elizafal@terra.com.br

Recebido em 26/12/02
Aprovado em 02/01/04

 

 


*Psicóloga, psicodramatista, supervisora pela Federação Brasileira de Psicodrama (FEBRAP), professora de Teoria e Técnica Fenomenológica Existencial e supervisora na área clínica na Universidade Católica de Pelotas, RS. Mestre em Saúde Mental pela Universidade Católica de Pelotas (UCPel).
1 Esta pesquisa faz parte da Dissertação de Mestrado apresentada em novembro de 1999, como requisito para obtenção do título de Mestre em Saúde Mental da Universidade Católica de Pelotas, RS.
2 Espontaneidade: do latim “Sponte”- de livre vontade. No sentido moreniano, é a capacidade de o indivíduo adaptar-se adequadamente a novas situações ou dar respostas novas a situações já vividas.
3 Aquecimento: conjunto de procedimentos utilizados na preparação de um organismo para que esteja em condições propiciadoras para a ação. Na psicoterapia, com o uso de técnicas apropriadas, os indivíduos são ajudados a entrar em uma área de investigação psicológica.
4 Revolução Criadora: proposta moreniana de recuperação da espontaneidade e da criatividade a partir do rompimento com padrões de comportamento estereotipado que levam à automatização do homem.
5 Questionário:
I-Identificação: não há necessidade de se identificar pelo nome. Idade ( ) Sexo ( )
II-Descreve com tuas próprias palavras o que é ser psicoterapeuta. (No mínimo 15 linhas)
III-Quais as qualidades/requisitos esperados de um psicoterapeuta que te parecem importantes?
IV-Quais as dificuldades encontradas por ti no atendimento junto ao paciente?
V-Já tiveste, ou estás tendo experiência de tratamento psicoterápico como paciente?
Sim ( ) Não ( )
Em caso afirmativo :
Qual o período de duração ?_________ Sob qual abordagem ?__________
VI-O que sugeres para que possa melhorar a qualidade do treinamento do papel do psicoterapeuta no curso e na prática de estágio ?

6 Hermenêutica: refere-se à explicação e interpretação de um pensamento, sendo empregada na interpretação de textos; penetra no seu tempo e, pela compreensão, busca o sentido do mesmo ( Minayo, 1993).
7 Dialética: refere-se à arte de raciocinar, enfatizando a diferença, o contraste e a ruptura do sentido (Minayo, 1993).