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Revista de Etologia
Print version ISSN 1517-2805On-line version ISSN 2175-3636
Rev. etol. vol.6 no.2 São Paulo Dec. 2004
ARTIGOS
Os parentes de nossos parentes: um ensaio sobre a sociedade e as culturas dos chimpanzés sob uma perspectiva antropológica*
Relatives of our relatives: an essay about the society and the cultures of chimpanzees from an anthropological perspective
Eliane Sebeika Rapchan
DCS - Depto. de Ciências Sociais, Universidade Estadual de Maringá
RESUMO
Análises comparativas do comportamento em populações de chimpanzés revelaram a existência de variabilidade assim como de homogeneidade, entre os grupos levando pesquisadores a afirmar que existem "culturas de chimpanzés". Os resultados dessas análises podem produzir um forte impacto sobre as idéias correntes acerca das relações entre natureza e cultura. O presente texto apresenta uma discussão a respeito da noção de "culturas de chimpanzés" à luz da antropologia sociocultural, apontando possibilidades e limites. A perspectiva antropológica pode estimular a reflexão sobre a relevância do método sobre o dado, a idéia de totalidade, a construção da alteridade, a questão do significado nas pesquisas sobre comportamento de chimpanzés ou a importância da organização social nas concepções de cultura.
Descritores: Comportamento Social, Cultura, Antropologia, Chimpanzés.
ABSTRACT
Comparative analyses of the behavior of chimpanzee populations have revealed the existence of intergroup variability as well as commonality and has given some researchers support to affirm the existence of "chimpanzee cultures". Such analyses may generate a strong impact on current ideas about the relationship between nature and culture. In the present paper, I presents some thoughts about the notion of "chimpanzee cultures" from a sociocultural, anthropological point of view, indicating limits and perspectives. Anthropology may stimulate reflection about: the impact of method on the nature of data, the idea of totality, the construction of otherness, the question of meaning in research about the behavior of chimpanzees and the relevance of social organization for the conception of culture.
Index terms: Social Behavior, Culture, Anthropology, Chimpanzees.
Em 1947, Claude Lévi-Strauss publicou As Estruturas Elementares do Parentesco, um trabalho que tornou-se leitura indispensável para qualquer antropólogo, seja por seu impacto, seja por seu propósito: refletir sobre as relações entre natureza e cultura à luz de questões relativas ao tabu do incesto e das estruturas de parentesco, a partir de uma perspectiva, simultaneamente localista e universalista. Nessa obra, o autor (Lévi-Strauss, 1947/1982) assinala um dos aspectos marcantes de seu pensamento: a percepção da fluidez das fronteiras entre o homem enquanto ser biológico e enquanto ser social, o que o levou a considerar que a cultura não pode, pura e simplesmente, ser justaposta ou superposta à vida pelos antropólogos ou pela antropologia. Natureza e cultura são concebidas pelo autor em íntima relação. Por vezes, até confundem suas fronteiras, pois as estruturas que as orientam estão constantemente submetidas a sistemas de transformação (Almeida, 1990), mas seguem sendo, enquanto dualidade, distintas e singulares facetas do humano (Hénnaff, 1991).
Para Lévi-Strauss (1947/1982, pp.43-44), a mais visível antinomia entre natureza e cultura manifesta-se na comparação entre os comportamentos animal e humano pois, de acordo com os dados de que dispunha à época, uso de instrumentos, instituições sociais e valores estéticos, morais e religiosos eram todos de domínio exclusivamente humano. Ele classifica os instintos (tais como o de perpetuação da espécie por meio do sexo), a anatomia que permite o exercício desses instintos e a transmissão hereditária de condutas indispensáveis à sobrevivência do indivíduo e da espécie como fatores que dizem respeito ao comportamento animal, humanos incluídos.
O esforço de reflexão sobre as relações natureza/cultura conduziu, ainda, Lévi-Strauss (1947/1982, pp.44-47) a considerar os resultados das pesquisas realizadas sobre chimpanzés à época da produção de As Estruturas Elementares do Parentesco. Suas interpretações sobre o que, então, se sabia sobre linguagem, vida social e vida sexual dos chimpanzés, somados a alguns dados sobre outros primatas, levaram-no a concluir em favor da inexistência de normas que pudessem orientar a conduta dos chimpanzés. Como se verá adiante, até os anos sessenta, isso era corrente também entre os primatólogos (Reynolds & Reynolds, 1965).
Segundo o autor (Lévi-Strauss,1947/1982, p.47), a universalidade remonta à espécie e, portanto, ao biológico, ao que é inato, à condição humana. O específico é produto da experiência e da cultura. Como herdeiro das idéias da École Sociologique Française, Lévi-Strauss busca as regras sociais. Para ele, a norma, a regra estariam no plano da singularidade, da especificidade, da cultura de determinado grupo. Desse modo, a constatação da ausência de regras de conduta entre os chimpanzés nos trabalhos consultados levou Lévi-Strauss, na década de quarenta do século XX, a recusar a existência de algum comportamento nos chimpanzés que pudesse, de algum modo, remeter a uma expressão aceitável de cultura, apesar dos registros de alguns comportamentos sugerindo semelhanças com os humanos.
A reflexão sobre as relações natureza/cultura levou Lévi-Strauss a associar a emergência dos mecanismos de controle simbólico dos instintos, em especial o tabu do incesto, à emergência da sociedade e da cultura humanas. O sistema de parentesco, universal enquanto instituição e específico nas regras reproduzidas por cada grupo, define os parentes (aqueles com quem se deve cooperar) e os não-parentes (aqueles com quem se deve casar e, por esse meio, estabelecer alianças inter-familiares).
Assim, através do estabelecimento de regras que definem quais relações são incestuosas e quais são preferenciais, a rede de alianças entre famílias é tecida e acaba por constituir a própria sociedade. Sua teoria do parentesco, associada a explicações sobre o tabu do incesto, identifica em todos os grupos humanos uma relação dialética com sua natureza e sua cultura (Lévi-Straus, 1947/1982, 1993) e é impossível tratar das relações natureza/cultura na antropologia sem considerá-la.
Para a antropologia, o debate Natureza/Cultura expressa, entre outras coisas, seus esforços em garantir as fronteiras de sua identidade. Em torno dele, antropólogos sociais e culturais buscaram, pouco a pouco mas rigorosamente, distinguir os fenômenos humanos, que lhes dizem respeito, dos fenômenos biológicos. Paralelamente, a antropologia física sob influência do darwinismo social (Blanc, 1975; Kuper, 1996; Stocking, 1982) amargou seus erros (Lewis, 2001) e foi sucedida pela antropologia biológica, que tem seguido seus próprios rumos (Rodman, 1999), estabelecendo relações de outra ordem com as idéias evolucionistas.
O curioso é que a construção da antropologia social e cultural como disciplinas totalmente autônomas frente às ciências naturais encobriu, inclusive, o fato de seus "pais fundadores", Boas (1940), Lewis, (2001), Malinowski (1978), Mauss (1947/1967, 1974), Hertz e o já mencionado Lévi-Strauss (1947/1982), não terem ignorado as condições postas às culturas pela espécie, pelo ambiente, pelos corpos e pelas mentes de seus membros (Castro, 1995). Lévi-Strauss (1993, p. 26) afirmou, certa vez, que a antropologia social "(...) pertence às ciências humanas, seu próprio nome o proclama; mas, se ela se resigna a fazer seu purgatório junto às ciências sociais, é porque espera acordar entre as ciências naturais na hora do juízo final."
Na prática, desde que o paradigma associado ao evolucionismo cultural e ao darwinismo social mostrou-se impróprio e foi aos poucos descartado (Kuper, 1996), poucos são os antropólogos, forjados no interior das ciências sociais, como Asquith (1995), De Vore (1965), Ingold (1996), Kuper (1994) e Sperber (1985) que têm refletido sobre as relações entre biologia e antropologia, entre espécie humana e cultura.
Esse artigo ocupa-se com um dos aspectos dessa questão. Há mais de quatro décadas, observa-se uma significativa emergência de trabalhos sobre conjuntos de comportamentos de primatas não-humanos que têm utilizado termos e expressões típicos das ciências sociais, tais como "cultura", "poder", "relações sociais" e "tradições". O objetivo do trabalho é refletir sobre a produção dedicada ao comportamento de chimpanzés, particularmente nos aspectos que têm sido caracterizados como sociais e sua relação com o que tem sido chamado de "culturas dos chimpanzés", considerando contribuições que o pensamento antropológico possa trazer e receber.
Por que chimpanzés?
É preciso apresentar os parâmetros que justificam o enfoque e recorte adotados, pois o material produzido sobre comportamento de primatas não-humanos não se restringe aos chimpanzés, nem ao grupo dos chamados "primatas antropóides superiores" (apes): bonobos, chimpanzés, gorilas e orangotangos (Perry & Manson, 2003). Para constatar isso, basta observar o programa de eventos científicos como, por exemplo, a American Society of Primatology divulgado pelo American Journal of Primatology (1999, 2000, 2001, 2002), o balanço do International Symposium "Recent Trends in Primate Socioecology" (Huffman & Yamagiwa, 1999) ou o perfil da produção recente e especializada.
O debate sobre a importância da experiência no comportamento animal está em expansão, seja para primatas não-humanos (McGrew, 1998; Visalberghi & McGrew,1997), seja para pássaros, peixes e cetáceos (Henrich & McElreath, 2003). Apesar de nem todos os pesquisadores dedicados ao estudo do comportamento concordarem que existam evidências suficientes para se afirmar a existência de cultura em seres não humanos (Hrdy, 2001; Galef, 2002; Mithen, 2002; Tuttle, 2001), é ampla a aceitação, por exemplo, da existência de organização social.
Influenciada por princípios evolucionistas, a abordagem fundada na continuidade entre espécies, que adota os estudos comparativos inter-específicos como procedimento padrão (Pavelka, 2002), tem sugerido a existência de cultura entre chimpanzés bem como entre outras espécies de primatas não-humanos (McGrew, 1998), como o bonobo (Stanford, 1998a). Na mesma direção, há referências à vida social dos gorilas (Yamagiwa, 1999) e à existência de tradições entre orangotangos (Schaik, 2001). No Novo Mundo, sobre o gênero Cebus, encontra-se um corpo de literatura sobre tradições comportamentais com respeito a forrageamento e uso de ferramentas (Boinski, Quatrone, & Swartz, 2000; Fragaszy, 2003; Jalles-Filho, Cunha, & Salm, 2001; McGrew, 1998; Ottoni & Mannu, 2001; Visalberghi & Robinson, 1990; Visalberghi & McGrew, 1997).
Esses indícios confirmam o fato de que os primatólogos não pretendem legar aos chimpanzés um lugar especial devido à sua proximidade e semelhança com os humanos. Não há, entre esses pesquisadores intenções em privilegiar os chimpanzés, frente a outros primatas, devido à grande proximidade entre as seqüências do DNA humano e chimpanzé. Em que pesem os debates recentes acerca dos percentuais dessa semelhança, dispersos num gradiente de 98,5% (Hrdy, 2001, p. 412) a 95%, quando se considera a partilha exata de pares de cromossomos em ambas as espécies (Britten, 2002), há grande consenso de que chimpanzés e bonobos sejam nossos parentes mais próximos. Contudo, o debate sobre culturas chimpanzé está na base de um movimento maior que provavelmente influenciará as concepções sobre o humano, a partir da descoberta da importância central dos fenômenos extragenéticos no processo de evolução dos primatas.
Apesar disso, os chimpanzés são a espécie não-humana mais estudada quando o assunto é cultura. Segundo McGrew (1998, p. 309), dentre as abordagens orientadas para o fenômeno "cultura" na ordem dos primatas, de acordo com publicação de 1997 do Primate Information Center sobre a produção bibliográfica do período de 1986-1997, 80% do total era dedicada a cinco gêneros: Cebus, Gorilla, Macaca, Pan e Pongo. Desses, 52% referiam-se aos chimpanzés, Pan troglodytes. Por essa razão, as reflexões desse artigo voltam-se para o material produzido sobre comportamento de chimpanzés. Não se trata de priorizá-lo simplesmente pelas semelhanças genéticas, produzindo a falsa premissa de que a proximidade genética com os humanos os tornaria, de alguma forma, "singulares", mas porque, como se diz sobre alguns temas da antropologia, chimpanzés, considerando o volume e tipo de dado disponível atualmente, bem como as questões que os pesquisadores têm colocado sobre isso, são coisas "boas para pensar".
Por isso, em que pesem as pesquisas em biologia molecular, questionando a singularidade dos humanos enquanto espécie (Foley, 1993) e o debate radical entre Seymour Benzer (Greenspan, 1997), defendendo a existência de conexões possíveis entre genes e comportamento, veementemente recusada por Richard Lewontin (Lewontin, Rose, & Kamin, 1984; Weiner, 2001), é inegável que o comportamento, seja de humanos, seja de outros primatas, é engendrado por variáveis, tais como a interação com seus semelhantes e as condições ecológicas, de modo que os resultados se multiplicam, amplificando o número de variáveis a serem analisadas e gerando pluralidade.
Isso é perceptível nos trabalhos sobre comportamento animal, mesmo enfocando apenas os dedicados aos chimpanzés (Böesch & Tomasello, 1998; Brosnan & De Waal, 2003; De Waal, 2001; Fouts, 1998; Goodall, 2000; Hrdy, 2001; Mason, 2002; McGrew, 2001a, 2001b; Nishida, 2001, 1987; Rumbaugh et al., 2001; Stanford, 1998a; Tomasello, 2001; Whithen et al., 1999; Wrangham et al., 2001; Wrangham & Peterson, 1996; Whrangham & Huffman, 1994). Há excessões (ver Mason, 2002).
A produção dos etólogos sobre chimpanzés, e sobre primatas em geral, não se concentra exclusivamente nas relações entre genética e comportamento. Muitos dos trabalhos atuais, orientados pela coleta de dados a partir de observação, tratam de condutas, soluções adotadas para problemas, recorrências, repasse inter-geracional de conhecimento e inter-relações entre membros do mesmo grupo, espécie ou espécies distintas. Nesse sentido, em etologia, as fronteiras entre o que se entende por "inato" e "adquirido" têm se tornado cada vez mais fluídas (Skrzypczak, 1996).
O volume de dados atualmente disponível sobre comportamento de chimpanzés em seus habitats originais africanos (McGrew, 2001; Tomasello, 2001) corresponde a quase cinqüenta anos de observação continuada, troca entre os pesquisadores envolvidos, pesquisas conjuntas e acompanhamento de chimpanzés identificados (Goodall, 1990, 2000, 2001). Há dados publicados sobre mais de trinta e cinco populações da África subsaariana, do Senegal até Uganda (McGrew, 1998, p. 317), sem falar dos dados coletados em habitats artificiais como parques, zoos e laboratórios para experimentos em cognição (Böesch & Tomasello, 1998; De Waal, 2001a; Fouts, 1998; McGrew, 1998; Parr & De Waal, 1999).
O tipo de dado coletado também é relevante. Provavelmente os estudiosos do comportamento de chimpanzés foram os primeiros a utilizar os termos das ciências sociais - "poder" e "cultura" - para caracterizar fenômenos do comportamento. "Culturas de chimpanzés" são concebidas como tradições comportamentais ontogeneticamente adquiridas (Tomasello, 2001, p. 301), frutos das capacidades dos indivíduos, mas também de seu meio natural e social, bem como de suas experiências e interações com ambos, resultando no repasse desses comportamentos através de gerações, pelo que tem sido definido como "tradição" (Fragaszy, 2003; Nishida, 1987)
Tais tradições são transmitidas no interior do grupo em que são produzidas. Como isso se dá é objeto atual de pesquisas e debates pois transmissão implica cognição e relações ensino-aprendizado que mobilizam processos de imitação, facilitação da observação e do aprendizado e atitude intencional de ensinar (Boesch & Tomasello, 1998; Fragazsy, 2003; Galef, 1992, 2002; Henrich & McElreath, 2003).
Os pesquisadores identificaram, também, pluralidade e variabilidade nessas tradições. Aqui a novidade reside no fato de que, mesmo em ambientes ecologicamente iguais ou muito semelhantes, há indícios de que populações distintas de chimpanzés podem manifestar comportamentos distintos (Boesch & Tomasello, 1998; Wrangham, 2001). Daí se falar em "culturas dos chimpanzés", no plural, e não em "cultura dos chimpanzés".
Por essas razões, caso os argumentos em favor da existência das "culturas dos chimpanzés" se tornem satisfatórios, e certamente há muito que se discutir antes disso, não só as ciências sociais, mas também as ciências biológicas terão que rever seus paradigmas, pois certamente o papel de disciplinas como as antropologias social e cultural, nesse processo, não se restringem ao simples fornecimento de termos e nomes para fenômenos, tais como "cultura", "tradição" ou "organização social".
Sobre alguns aspectos da organização social dos chimpanzés
Do ponto de vista das ciências sociais, relações sociais e cultura não são aspectos independentes da vida coletiva. Ao contrário, estão intimamente relacionados, de um modo tal que os símbolos culturais são produtos das relações sociais e servem para garantir sua reprodução. Por essa razão, observar o que os pesquisadores do comportamento de chimpanzés têm levantado sobre sua vida coletiva pode fornecer elementos importantes para se analisar as "culturas dos chimpanzés".
Há várias expressões correntes que atribuem dimensão social à conduta dos chimpanzés: "social behavior" (American Association of Primatologists, 1999, 2000, 2001, 2002; Rodman, 1999, pp.323-325), "social systems" (Rodman, 1999, pp.320-323), "social relationship"(Baker & Smuts, 2001), "social mechanisms"(De Waal, 2000), "social learning" (Böesch & Tomasello, 1998), "primate society" (Rodseth et al., 1991). Mas, enfim, o que caracteriza uma população chimpanzé como um grupo social, para os estudiosos do comportamento animal?
R. L. Garner, em 1896, realizou um dos primeiros trabalhos de observação orientada sobre chimpanzés e gorilas na África para a New York Zoological Society (Reynolds & Reynolds 1965, p. 394). Seu relatório informa que os grupos são instáveis, há uma aparente ausência de organização social, promiscuidade sexual, faltam hierarquias que os regulem. Em outras palavras, Garner não reconhece indícios de qualquer estrutura ou padrão que oriente as condutas (Reynolds & Reynolds, 1965, pp. 407-408; 420; 423-424).
Toshisada Nishida desenvolve, desde 1965, trabalho no Parque Nacional das Montanhas Mahale e é um dos pesquisadores que, ao lado de Christophe Böesch e Edwiges Böesch, desde 1976 na Floresta de Taï na Costa do Marfim, e Jane Goodal, no Parque Nacional de Gombe na Tanzânia desde 1960, soma o maior tempo continuado dedicado aos chimpanzés na África (Goodall, 2001, pp. xv-xvii). Os trabalhos desses pesquisadores marcam o início do chamado período moderno nas pesquisas.
Daí em diante, basta consultar algumas coletâneas, para se ter uma idéia do volume de pesquisas já produzidas sobre comportamento social de chimpanzés. Some-se isso às referências obtidas em outras fontes e chega-se facilmente à casa das centenas. Nos anos sessenta, Altmann (1967), De Vore (1965), Jay (1968) e Southwick (1963), citados por Rodman (1999, p. 313) produziram coletâneas das primeiras descrições do comportamento social de primatas não-humanos. Depois deles, Primate Societies (Smuts et al.,1987), Primate Social Conflict (Mason & Mendoza, 1993), Chimpanzee Cultures (Wrangham et al., 2001) são algumas das publicações que podem fornecer acesso a uma amostra da produção sobre sociedades chimpanzé em décadas mais recentes.
Nishida foi pioneiro na proposição de um modelo para os grupos de chimpanzés (Stanford, 1998a, p. 400). Antes disso, a concepção vigente era de que relações entre indivíduos chimpanzés davam-se em fluxo constante (Stanford, 1998a, p. 400) e não constituíam um grupo estabelecido sobre relações regulares. Foi ele quem propôs, para os chimpanzés, o modelo da "grupo unitário" ("unit-group") que os pesquisadores ocidentais rebatizaram com o nome "comunidade" ("community") (Stanford, 1998a, p. 400). Stanford (1998a, p. 400) explica que, segundo esse modelo, o grupo possui uma estrutura abrangente, da qual fazem parte, indiferenciadamente, todos os chimpanzés a ele pertencentes.
No interior do grupo, o primeiro padrão de agrupamento estável identificado foi o formado por mães e seus filhotes dependentes. Para além dessa unidade, o grau de mobilidade é maior, e os indivíduos podem agregar-se ao grupo ou deixá-lo, o que fez com que os pesquisadores passassem a identificá-lo como uma sociedade de fusão-fissão (expressão tomada da caracterização de Kummer [1968] para o babuíno Papio hamadryas) (Stanford, 1998a, p. 400). Segundo, ainda, Stanford (1998a, p. 400), esse modelo caracteriza os grupos de chimpanzés como marcados por fortes vínculos sociais entre machos. Essas alianças desempenham papel central na proteção das fronteiras de seu território e no controle das fêmeas. McGrew (1998) indica que foi Goodall quem percebeu que apenas as fêmeas mudam de grupo (ver também Yamagiwa, 1999, pp. 92-93).
Goodall sugeriu posteriormente que há três tipos de laços fortes entre chimpanzés. Em gradação, do mais forte ao mais fraco: as relações mães/filhotes, que se estendem, inclusive, à vida adulta, seguidas pelas relações entre fêmeas aliadas (parentes ou não, que podem, inclusive atuar como alomães (Hrdy, 2001)) e entre machos (irmãos ou aliados) (Goodall, 1991, pp. 203-205).
Na África, as populações chimpanzé organizam-se em unidades de 19 a 106 membros, cada qual formada por vários machos e fêmeas. Os sexos adotam estratégias reprodutivas diversas no interior do mesmo grupo. O padrão fissão-fusão é freqüente, bem como a filopatria, as fortes tendências territorialistas (Yamagiwa, 1999, p. 93).
Comportamento social e cultura
Whiten et al. (1999, 2001) apresentaram uma tipologia dos comportamentos de chimpanzés em Bossou - Guiné, Floresta de Taï - Costa do Marfim, Gombe - Tanzânia, Mahale (Grupo M) - Tanzânia, Mahale (Grupo K) - Tanzânia, Floresta de Kibale - Uganda, Floresta de Budongo - Uganda (Whiten et al. ,1999, p. 683), baseada em extensa revisão da literatura especializada. Os autores registraram indicações de 39 padrões de comportamento, definidos como "costumeiros", quando observados em todos ou nos membros fisicamente capacitados, segundo características de sexo, idade e classe; e "habituais", observados repetidamente em vários indivíduos e consistentes com algum tipo ou grau de transmissão social (Whiten et al., 1999, p. 682), além das categorias "presente" (present) não sendo habitual nem costumeiro, "ausente" (absent), "explicação ecológica" (ecological explanation) cuja ausência é explicada por variações ambientais e "desconhecida" (unknow). Esse inventário é freqüentemente apresentado como referência em outros trabalhos.
No entanto, abordagens comparativas de largo alcance sobre comportamento de chimpanzés, como as de Whiten et al. (1999, 2001), concentram-se na utilização daquilo McGrew (1996) chamou de "cultura material", transformação e uso de materiais para obter alimento ou conforto, e em alguns gestos padronizados. Assim, Whiten et al. (1999) relacionam, por exemplo, o uso de ferramentas: martelos e bigornas de pedra; varas para obter formigas, cupins ou mel; almofadas, sandálias, luvas, pratos, canecas e guardanapos feitos de folhas; espetos; uso de plantas para fins medicinais, como remédios para dor de barriga, bem como as práticas do "hand clasp", "Knuckle-knok", "Branch din", "Branch-slap", "Stem pull-trough", "shrub-bend" e a "Rain dance", talvez o comportamento mais polêmico.
Em direção semelhante, Böesch e Tomasello (1998, p. 593) propuseram uma classificação um pouco distinta, separando os comportamentos em "forrageamento com uso de ferramentas", "comunicação" e "orientação corporal", mas os tipos de comportamento classificados permaneceram basicamente os mesmos, ou seja, objetos e gestos restritos garantem o critério de restrição das variáveis analisadas. São os aspectos relacionados à aquisição, transmissão e variabilidade observáveis nessas variáveis que têm sido utilizados como os argumentos mais fortes em favor da existência de "culturas dos chimpanzés".
Do mesmo modo, Chimpanzee Cultures (2001), é o resultado do exercício comparativo e das discussões realizadas pelos pesquisadores participantes nos dois simpósios "Understanding Chimpanzees", organizados em 1986 e 1991 pela Academia de Ciências de Chicago (Heltne ,2001), um trabalho representativo dos debates e abordagens atuais sobre o tema das culturas dos chimpanzés. Eduardo Ottoni (comunicação pessoal em 27 de maio de 2004) informou que, de fato, ocorreram três simpósios com o mesmo objetivo, sendo o último coincidente com as homenagens prestadas a Jane Goodall por seu trabalho entre os chimpanzés de Gombe.
A coletânea representa os esforços em produzir um arcabouço comum para caracterização dos resultados das pesquisas e, ao mesmo tempo, a gradual padronização dos procedimentos adotados em campo (Heltne,2001, p.xix). Sua proposta é apresentar evidências da ocorrência de aquisição, variabilidade e transmissão de comportamentos duráveis e generalizáveis em populações chimpanzé distintas, mas não apresenta comparações entre esses comportamentos em larga escala.
Todo o material está classificado em três grandes seções: ecologia, relações sociais e cognição. A abordagem dedicada à "ecologia" contempla o uso de ferramentas, alimentação, estratégias de caça, construção de ninhos e o uso de plantas medicinais. Em "relações sociais" encontram-se trabalhos sobre comportamento sexual bonobo sem fins reprodutivos, variabilidade de estratégias reprodutivas, a prática do grooming, atitudes pacificadoras em conflitos, relações entre fêmeas e potencial adaptativo. A seção dedicada à "cognição" trata de compreensão, cultura, raízes biocomportamentais da linguagem, diferenças individuais em habilidades cognitivas e uso de ferramentas.
Diante disso pode-se perguntar: por que comparações de comportamento em larga escala, como mostram os trabalhos de Whiten et al. (1999, 2001) e Böesch e Tomasello (1998), concentram-se nos dados "cultura material" e num elenco restrito de gestos? Uma das poucas exceções a esse procedimento foi o trabalho de Rodseth et al. (1991), produzido, aliás, há mais de dez anos. O texto apresenta, justamente, exercícios de socioecologia comparativa (Rodseth et al., 1991, p. 223-226) com o intuito de promover um diálogo com a antropologia social, via Lévi-Strauss, a fim de pensar a comunidade humana como uma sociedade primata.
Ou seja, ao contrário do que ocorre nas ciências sociais, pouca atenção tem sido dada às relações sociais no que se refere às abordagens sobre culturas dos chimpanzés. Apesar de enfocar os aspectos relacionados à aquisição, transmissão e variabilidade, os pesquisadores operam, principalmente, nos âmbitos da produção e uso de ferramentas, dos aspectos ecológicos e da cognição. São raras as análises comparativas sobre relações sociais a fim de atingir as manifestações culturais.
A questão é que, do ponto de vista das ciências sociais, o engendramento da cultura depende profundamente das relações sociais em seu conjunto. A cultura material ou a unidade familiar, separadamente, são aspectos da vida social que, aliás, não existem isoladamente. É até possível tomá-los separadamente, e momentaneamente, por estratégia de pesquisa, mas enquanto fenômenos, sociedades e culturas humanas operam integrando todas suas dimensões simultaneamente.
A ênfase nos aspectos que definem o que se entende por cultura dos chimpanzés, sustenta-se menos nos padrões de organização social e mais em aspectos da "cultura material" e dos gestos e atitudes, cujas características podem ser circunscritas através de um grau relativamente alto de precisão. Isso pode ocorrer porque esses últimos dados são mais facilmente organizáveis e manipuláveis, enquanto que os dados sobre comportamento social, como as relações mães-filhotes por exemplo, implicam na utilização de um número muito grande de variáveis, o que apresenta enormes dificuldades de comparação, nos moldes comparativos que os estudos atuais sobre comportamento de primatas costumam usar. São relativamente raras as iniciativas de comparação de grupo a grupo sobre comportamentos fundados em inter-relações chimpanzés (Baker & Smuts, 2001).
Em resumo, cientistas sociais primam pela apreensão da totalidade da população estudada e, por isso, operam com muitas variáveis que, aliás, são flutuantes: história, dados populacionais e econômicos, relações indivíduo/coletivo, instituições, movimentos sociais, universo simbólico são dimensões em que os dados não são tratados separadamente, mas de modo integrado a fim de oferecer pistas à compreensão do todo. Cientistas naturais, por sua vez, procuram restringir as variáveis para poder controlar suas correlações, o que favorece tratamentos estatísticos e comparações inter-específicas. Cada informação é classificada sob uma definição suficientemente restrita, mas geral em sua aplicação, a fim de facilitar o manuseio de dados e resultados.
A outra pergunta que, então, destaca-se daí é: Será que as práticas correntes de coleta e tratamento de dados sobre primatas podem dar conta de comportamentos complexos, sutis e dinâmicos? Ou será preciso valer-se de outros meios? A saída que a antropologia sociocultural adotou, para lidar com muitas variáveis complexas, dinâmicas e históricas, na abordagem de populações humanas, foi a prática etnográfica. Essa questão será retomada adiante.
Outro aspecto problemático na questão das culturas dos chimpanzés está relacionado à sua transmissão, que tem sido freqüentemente associada ao aprendizado social (Böesch & Tomasello, 1998). Contudo, apesar dos registros acerca da variabilidade de comportamentos para cada diferente grupo de chimpanzés (McGrew, 1998; Whiten et al., 1999; Wrangham & Peterson, 1996, pp. 19-22; Wrangham et al., 2001), não há indícios consistentes de que chimpanzés adultos transmitam direta e intencionalmente informação para seus filhotes (Böesch & Tomasello, 1998; McGrew, 1998, p. 322). O trabalho de Christophe Böesch (1991), que descreve mães chimpanzé em atividade de quebrar castanhas com seus filhotes, é freqüentemente citado para exemplificar essa questão pois, segundo o pesquisador, apesar das atitudes da mãe no sentido de facilitar o aprendizado, não foi possível registrar qualquer atitude que indicasse intenção de ensinar.
O contra-argumento dos etólogos é que, em se tratando de culturas humanas, muito do que se aprende não passa pelos canais de ensino sistemático (McGrew, 1998, p. 322). Enquanto isso, ao lado da maior parte dos cientistas sociais, primatólogos como Galef (1992, 2002), Hrdy (2001) Tuttle (2001) permanecem céticos, aceitando a possibilidade de existência de organização social mas aguardando mais evidências sobre existência de culturas dos chimpanzés.
Sendo assim, cabe apresentar outra questão: os aspectos isolados da vida coletiva dos chimpanzés são resultado dos recortes dos pesquisadores ou se apresentam assim, enquanto fenômeno?
O arqueólogo evolucionista Steven Mithen (2002) defende a segunda possibilidade e oferece interpretações distintas para as evidências que têm sido interpretadas pelo viés da cultura dos chimpanzés. Ao contrário dos pesquisadores que adotam a perspectiva da existência de culturas dos chimpanzés, Mithen acata a possibilidade de existência de tradições entre grupos chimpanzés, com relação por exemplo ao uso de instrumentos ou ferramentas, porque as "diferenças (entre grupos distintos) não podem ser explicadas apenas por argumentos genéticos ou ecológicos" (Mithen, 2002, p. 122). Contudo, segundo o autor, essas "tradições" seriam profundamente distintas das culturas humanas pois, para nós, a variabilidade cultural assenta-se em diferentes modos de fazer algo manifesto em diferentes populações humanas. A variabilidade identificada entre chimpanzés corresponde, por sua vez, a presença ou ausência de determinada prática ou fenômeno.
A hipótese de Mithen consiste na defesa de que, enquanto nos humanos os diferentes domínios da mente (social, lingüístico, técnico e naturalista) estão plenamente integrados, possibilitando o deslocamento de elementos e conhecimento de um a outro, isso não ocorre entre chimpanzés e nossos antepassados hominídeos. Ou seja, enquanto os seres humanos podem transpor o conhecimento naturalista que possuem sobre animais para seu universo simbólico e lingüístico (mitologia), social (parentesco, totemismo) e técnico (produção de cultura material a partir de matéria-prima animal), o mesmo não ocorre entre outros primatas pois seus domínios mentais estão isolados entre si (Mithen, 2002, pp. 117-145). Exatamente aí estaria a capacidade humana de produzir símbolos e atribuir-lhes significados. Assim, a diferença entre a mente de um chimpanzé e a mente humana não seria apenas de grau, mas arquitetônica ou estrutural (Mithen, 2002, pp. 137-142).
Uma alternativa à hipótese de Mithen, considerando que a fragmentação dos aspectos da vida social não esteja no objeto, mas no método, talvez seja a adoção de outras abordagens sobre o comportamento de chimpanzés, sem necessariamente abandonar as que são usadas atualmente. Essa será a discussão desenvolvida a seguir.
Etnografias sobre chimpanzés?
Boa parte das discussões apresentadas nesse artigo possui validade temporária pois as pesquisas em comportamento de primatas têm trazido novos elementos todo o tempo. Além disso, as reflexões interdisciplinares sobre o assunto são ainda germinais, particularmente no que diz respeito às ciências sociais, e todos sabemos quantas dificuldades decorrem desse tipo de iniciativa. Contudo, uma reflexão sobre o que se busca em termos de comportamento de chimpanzés - a cultura - e como se busca - o método - pode ser interessante para a configuração atual das pesquisas.
Antes de mais nada, é preciso oferecer uma explicação, mesmo que breve e extremamente simplificada do que é uma etnografia, no sentido antropológico. O trabalho de campo intenso, prolongado e continuado, realizado pessoalmente pelo próprio pesquisador, é um procedimento atual e universalmente adotado pela antropologia (Castro, 1995; Geertz, 1978), desde sua crítica ao evolucionismo cultural e ao darwinismo social (Stocking, 1982). Originalmente adotado por Boas (1940) e Malinowski (1978), esse procedimento substituiu, quase totalmente, a utilização de dados coletados por curiosos, viajantes, aventureiros, administradores coloniais e missionários que costumavam olhar as práticas das populações tribais a partir de seu arraigado etnocentrismo (Lévi-Strauss, 1993).
Esse procedimento resultou em três conseqüências, a longo prazo: (1) a lenta, mas gradual e eficiente superação do etnocentrismo dos antropólogos (Kuper, 1996); (2) a emergência de um comprometimento pessoal do antropólogo com as populações estudadas, apesar de todas as polêmicas, ainda atuais, sobre o assunto (Hénnaff, 1991; Oliveira, 1996); (3) a produção de um tipo de texto (o texto etnográfico) em que são patentes as decorrências advindas do fato de que o pesquisador é da mesma escala de grandeza do pesquisado (Mauss, 1974), a intersubjetividade como um dos fatores centrais na produção da objetividade do conhecimento antropológico (Oliveira, 1996) e a busca da construção, através do texto, da totalidade da vida coletiva da população estudada (Mauss, 1947/1967).
Assim, ironicamente para a antropologia social e cultural, Jane Goodall, através de seu texto sensível e poético, revela alguns dos procedimentos de pesquisa adotados, os quais se mostram incomodamente semelhantes aos usados pelos antropólogos na produção de suas etnografias (Castro, 1995; Geertz, 1978; Lévi-Strauss, 1986,1993; Malinowski, 1978; Oliveira, 1996; Rapchan, 2002).
Goodall (1991) procura, com empatia, apresentar os dados obtidos por contato, interação e observação prolongados integrando-o de modo a mostrar como as barreiras existentes entre chimpanzés e humanos são fluídas, num esforço, de certo modo, muito parecido com o de alguns antropólogos do início do século XX, como Boas (1940) e Malinowski (1978), que se empenharam em demonstrar e comprovar o pertencimento à humanidade (Kuper, 1996), o potencial e as capacidades de povos tribais não europeus, introduzindo-os, por meio do registro etnográfico detalhado, numa alteridade viável aos horizontes da condição humana.
Aliás, Goodall não apenas pretende demonstrar semelhanças, proximidades, singularidades e diferenças entre humanos e chimpanzés como, cada vez mais, tem atuado em sua defesa (Fouts, 1998; Goodall,1991), conseguindo crescente adesão dos primatólogos a essas causas, cujas atitudes diante dos primatas não-humanos têm mudado radicalmente, desde a década de sessenta (Durkelow, 1999). Provavelmente, como já mencionado, o compromisso dos pesquisadores dedicados aos primatas com o destino desses seres, provavelmente, se tornará cada vez mais intenso e profundo, quanto maior for o tempo dedicado às pesquisas, mais intensos forem os contatos e mais se souber sobre eles. O mesmo ocorreu na história da antropologia sociocultural.
O estabelecimento de vínculos pessoais (Fouts, 1998; Goodall, 1991, 2000; Smuts, 2001) e compromissos éticos e políticos dos pesquisadores com as populações ou indivíduos chimpanzé pesquisados (Buning, 1995; Cavalieri & Singer, 1995; Chapman & Lambert, 2000; Crockett et al., 1999; Dukelow, 1999; Erwing et al., 2001; Kyes & Howell, 1999; Spruit, 1995; Veira & Brent, 2000) e se manifestam, especialmente, nos esforços conservacionistas.
Isso significa, provavelmente, que esses pesquisadores não se relacionam com os chimpanzés apenas como objetos de conhecimento, mas também como seres que possuem o direito à proteção enquanto seres vivos e que precisam também de garantias da preservação de seu modo de vida. Considerando o que os trabalhos de pesquisa têm indicado, e de modo semelhante ao que ocorre com as populações humanas, que o desaparecimento de um grupo chimpanzé pode significar a destruição de uma maneira única de ser.
O "Great Ape Project" (Cavalieri & Singer, 1995) e a "Declaração dos Direitos dos Primatas Não-Humanos" (Spruit, 1995) são outras expressões da mobilização em defesa diante dos riscos decorrentes da caça, destruição de habitats, confinamento e isolamento em laboratórios para testes médicos (Dukelow, 1999; Fouts, 1998; Goodall, 1991), vivissecação e utilização pela indústria de entretenimento (circos, fotografia, publicidade). Talvez isso aponte para a produção de uma outra fronteira para a alteridade que venha a incluir humanos e primatas não-humanos no plano das identidades, a partir da construção de patamares comuns em que repousem suas singularidades e reconhecimento de semelhanças, (Joulian, 1995; Pieterse, 1995; Rapchan, 2003).
Ou seja, os esforços dos antropólogos até a primeira metade do século XX, em favor de incluir os mais diversos grupos étnicos na concepção corrente e vigente de humanidade, podem estar em vias de se repetir entre os etólogos e primatólogos, ao menos entre aqueles que de algum modo têm proposto uma revisão sobre o papel e o lugar dos chimpanzés diante dos humanos. Nesse sentido, a proposta de Morris Goodman (1999) de rever a classificação do gênero Homo em favor da inclusão dos gêneros Pan, trogloditas (chimpanzés) e Pan paniscus (bonobos), em seu interior soma-se às outras referências apresentadas.
Assim, se o estilo "quase etnográfico" de apresentação de dados sobre primatas da pioneira Goodall, e de outros como Altman e De Vore (Rodman, 1999, p. 314), atraiu pouquíssimos adeptos entre os etólogos e primatólogos nas gerações posteriores, mais influenciados pela ecologia comportamental e pela sociobiologia (Rodman, 1999, p. 314), uma outra conseqüência do convívio prolongado e continuado com as populações pesquisadas agarrou-os pelas pernas: de modo análogo aos antropólogos (Hénnaff, 1991; Lévi-Strauss, 1993), a experiência de pesquisa os tem transformado profundamente levando-os a se importar com o futuro daqueles que pesquisam, gerando mobilização maciça em favor da proteção daqueles que pesquisam e da garantia plena e integral de suas vidas. Outro impacto gerado por esse tipo de procedimento de pesquisa inclui, aliás, os próprios esforços em favor da identificação do comportamento de chimpanzés com a vida coletiva humana, seja através das pesquisas propriamente ditas, seja pela adoção dos termos já consagrados na definição da humanidade: cultura, organização social, poder, tradição.
Segundo Raymond Corbey (1995, p. 4), o que tem sido revelado pelas pesquisas sobre primatas aponta para a percepção de outros domínios em sua existência, o que aproxima esse objeto do caráter ontológico das ciências humanas, ao mesmo tempo em que coloca questões sobre a adoção dos procedimentos metodológicos mais adequados para compreendê-lo: deve ele ser fragmentado, dissecado e analisado, como as ciências naturais fizeram por décadas, ou deve ser observado a partir de sua complexidade e ser estudado como um ser inteligente que interage com os pesquisadores, o que solicitaria, necessariamente, uma aproximação hermenêutica?
Há muito o que se discutir sobre o que seria uma abordagem hermenêutica numa pesquisa sobre primatas e não há espaço aqui para isso. Contudo, há fatores relacionados à história dos estudos sobre comportamento que podem ser analisados por essa perspectiva. Desde seus primeiros trabalhos, Goodall transgrediu os parâmetros vigentes na primatologia, ao utilizar pronomes restritos aos humanos para se referir aos chimpanzés que pesquisava, ao usar noções como "infância", "adolescência", "personalidade", "mente" dirigidas a esses primatas e antropomorfizar emoções primatas em termos humanos, ao registrar o que entendia ser sua organização social e suas histórias de vida (Goodall, 1991, pp.19-21, 28) e dando-lhes nomes próprios. Apesar de etólogos, como Hebb (citado por Mitchell & Hamm, 1997) e o próprio Lorenz (1995), terem proposto a antropomorfização do comportamento animal antes dela, o trabalho de Goodall extrapolou os limites então aceitos para esse tipo de pesquisa.
Mais recentemente, Barbara Smuts (2003) apresentou uma reflexão falando da importância de sua experiência pessoal no trabalho de pesquisa sobre primatas e de sua interação com eles. McGrew (1998, p. 317) refere-se a "etnografia dos chimpanzés" por considerar que trata-se de trabalhos voltados a estudar as culturas dos chimpanzés. É difícil concordar com McGrew, considerando os fatores já mencionados. No entanto, chamar a esses trabalhos de "etnografia" é uma iniciativa que vem somar-se às já mencionadas conseqüências advindas tanto da longa permanência em campo dos pesquisadores, quanto dos resultados das pesquisas.
Não agrada à maioria dos antropólogos que outros, que não eles mesmos, adotem o método etnográfico com o intuito de produzir material a partir do desenvolvimento de trabalhos de campo longos, contínuos e em profundidade. Para os candidatos a esse modo de fazer pesquisa, a sugestão, geralmente, é: tornem-se antropólogos. Contudo, antropólogos sociais e culturais não costumam ir a campo estudar primatas. Por outro lado, o tipo de informação trazido pela etologia somado às afirmações da existência de cultura entre primatas coloca inúmeras questões para a própria antropologia. Esse, talvez, seja mais um dos casos em que diferentes disciplinas precisam operar em suas fronteiras.
Se o limite para a produção de cultura não estiver na própria evolução da mente dos chimpanzés, tal como propõe Mithen (2002), provavelmente a melhor saída seja adotar abordagens que consigam comprovar a integração dos aspectos do comportamento de chimpanzés relacionados ao conhecimento técnico, naturalístico, social e comunicacional, observando se há interrelações entre esses domínios, bem como produção e circulação de significados. Fragaszy (2003), ao rever os procedimentos adotados para o estudo de "tradições" em primatas não-humanos identifica as atuais dificuldades como resultados de uma combinação entre lógica pobre, confusão conceitual e inabilidade para coletar dados apropriados.
A noção de cultura, atualmente utilizada para identificar aspectos do comportamento de chimpanzés, tem a vantagem de ser restrita e, por isso, amplamente aplicável para todos os casos (Tomasello, 2001; Wrangham et al, 2001). Em contrapartida, a mesma restrição produz um conhecimento fragmentado e afasta os pesquisadores da possibilidade de identificar sentidos, caso eles existam. Contentar-se com isso, diante da riqueza apresentada pelo comportamento dos primatas talvez implique em abdicar de um conhecimento mais profundo e bloquear diálogos futuros com a antropologia social e cultural.
Cultura em vários sentidos: Possibilidades e limites
A pergunta que salta aos olhos, diante dos resultados obtidos por essas pesquisas, passada a euforia da descoberta de toda a riqueza que se pode atingir, em vários planos do conhecimento, a partir da observação do comportamento, como bem observa Tuttle (2001), é: o que significa afirmar que os chimpanzés têm cultura?
Tuttle defende que, antes de responder à questão, há procedimentos a serem adotados. Antes de mais nada, é preciso que os primatologistas voltem-se à toda extensa discussão sobre cultura produzida no interior da antropologia, e que remonta à 2a. Guerra Mundial (Kuper, 1999). Caso contrário, muito pouco se avançará a partir das pesquisas empíricas no que diz respeito ao discernimento relativo à existência de capacidades culturais em primatas não humanos e, principalmente, no que se refere à existência e caracterização de capacidades filogenéticas das culturas humanas (Tuttle, 2001, p. 407).
Em segundo lugar, somente através, e a partir, da condução de pesquisas, produzidas sob o enfoque do comportamento de primatas não-humanos com o objetivo de discernir se há sentidos simbolicamente codificados nesses comportamentos, será possível falar na existência de cultura chimpanzé e apreciar as singularidades produzidas por suas mentes (Tuttle, 2001, p. 408).
Por outro lado, para os antropólogos sociais e culturais, a noção de cultura está longe de ser consensual. Em primeiro plano, a própria classificação da antropologia em social e cultural remete a diferentes proposições surgidas na formação histórica da disciplina. Antropólogos sociais produzem uma abordagem em que a cultura é mais um dos aspectos da vida coletiva. Para eles, a cultura é algo que produz e é produzido na dinâmica das relações simbólicas, do parentesco, da economia e da política (Kuper,1999). Ou seja, o peso do que se entende por cultura, por assim dizer, é mais relativo na tradição antropológica européia, que engendrou a antropologia social (Lévi-Strauss, 1947/1982; Mauss, 1974; Malinowski, 1978), do que na norte-americana, que produziu a antropologia cultural (Boas, 1940, Lewis, 2001).
Para a antropologia cultural, a cultura é o eixo central de sua reflexão. A busca de "padrões" (Benedict, s.n.) e a preocupação com a definição do que seja cultura (Geertz, 1978; Kröeber & Kluckhohn, 1963; Kuper, 1999), sua noção central, caracterizam sua prática. De modo semelhante, a ênfase dada a fenômenos individuais e coletivos também é distinta para a antropologia social e para a cultural.
Esses fatores podem ser relevantes para se analisar a adoção da noção de cultura no estudo do comportamento dos primatas, considerando, inclusive, o fato de serem muito mais comuns as referências de etólogos a antropólogos culturais como Benedict (McGrew, 1998, p. 321), Geertz (Rodseth et al, 1991), Kröeber (McGrew, 1998, p. 320), Murdock (Rodseth et al, 1991, p.228) ou Washburn (McGrew, 1998, p. 321), do que a abordagens orientadas para um diálogo com a antropologia social, através de, por exemplo, Bourdieu (McGrew, 1998), Ingold (McGrew, 1998) ou Lévi-Strauss (Böesch & Tomasello, 1998; Fragaszy, 2003; Rodseth et al, 1991).
A adoção, por parte dos estudiosos do comportamento de primatas, da noção de cultura como comportamento padronizado relativamente autônomo com relação aos aspectos da vida social, como apontado anteriormente, pode ser um indício dessa influência. A exploração dessa questão demanda maiores reflexões e será feita em outra oportunidade.
Contudo, é possível adiantar que, embora as trajetórias intelectuais dos pesquisadores não constituam fatores determinantes, a observação da formação acadêmica, nacionalidade e fatores correlatos pode também fornecer indícios para a análise das escolhas feitas pelos pesquisadores no tocante à abordagem das culturas dos chimpanzés. Ou seja, o acesso dos pesquisadores dedicados ao comportamento de chimpanzés à antropologia cultural americana pode ter sido facilitado por seus locais de formação acadêmica e pelo maior acesso à publicações em língua inglesa que, somados à predominância de pesquisadores oriundos dos Estados Unidos da América, podem fornecer pistas sobre o modo como a questão das culturas dos chimpanzés têm sido abordadas.
Outros pesquisadores têm contribuído com a ampliação de nosso conhecimento acerca dos sentidos e representações produzidos pelo conhecimento humano sobre primatas, observando a questão por ângulos diversos. Segundo esses autores (Dougherty, 1995; Spencer,1995; Stoczkowski, 1995; Wolker, 1995), a autoridade de Aristóteles e Galeno (século II a.C.) foi profícua em estabelecer marcos distintivos entre a humanidade e a animalidade que se aliaram aos produtos e influências da teologia judaico-cristã, estenderam-se pela Idade Média, atravessaram o Iluminismo e chegaram às concepções científicas dos séculos XIX e XX.
Essas idéias concorreram na produção de fronteiras e limites entre o que o pensamento ocidental classifica como "humano" e "animal" e, conseqüentemente, por natureza (Turner,1990). Em contrapartida populações dotadas de outros referenciais simbólicos e culturais, como africanos e japoneses (cf. Asquith, 1995; Joulian, 1995; Ohnuki-Tierney, 1995; Richards, 1995) pensam, classificam e representam os primatas não-humanos de formas muito distintas.
A questão é: o que pode significar toda a imensa produção de pesquisas e reflexões em várias áreas tais como a história da ciência, a epistemologia, a primatologia, a etologia, a filosofia da ciência, a paleoarqueologia, a arqueologia evolutiva, a ecologia, a ética, a psicologia comparada, a psicologia evolutiva e algumas áreas da antropologia ,que se movimentam firmemente, como uma vaga que parece borrar com consciência as fronteiras entre o que as sociedades produzidas, a partir do que as heranças greco-latina e judaico-cristã chamaram de "humano" e "não humano", revendo e questionando sistematicamente muito do que foi considerado atributo exclusivamente humano, como formas de comunicação, vínculos inter-geracionais e grupais, cultura, relações de poder, engenhosidade, habilidades, memória, capacidade de aprendizado, consciência etc.?
Se o debate entre três abordagens distintas: (1) a importância da experiência adquirida, da cultura e da vida social; (2) a seleção, evolução, adaptação e (3) a herança genética é tão antigo quanto os próprios pesquisadores que as produziram (Kuper, 1994), a abordagem do comportamento de primatas não-humanos, nos moldes em que tem sido feito, merece uma reflexão que transcenda as fronteiras disciplinares.
Ao mesmo tempo, é importante nunca esquecer das conseqüências relacionadas ao lugar e papel dos aspectos biológicos na história da antropologia social e cultural constitui-se em capítulo à parte de uma história complexa, marcada por implicações sérias. Essa discussão não pode jamais ser ignorada. As trágicas conseqüências de todas as decisões pautadas em projeções feitas sobre grupos humanos a partir de traços fenotípicos, estereótipos ou de alguma característica supostamente inata e hereditária resultaram em escravidão, etnocídio (Poliakov, 1974), genocídio, imperialismo (Said, 1990, 1995), esterelização e segregação (Blanc, 1994; Kuper, 1994). Nenhum de nós pode permitir que isso se reproduza.
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Endereço para correspondência
Eliane Sebeika Rapchan
DCS - Depto. de Ciências Sociais, Universidade Estadual de Maringá
Av. Colombo, 5690
87020-900, Maringá, PR, Brasil
E-mail: elianesebeika@yahoo.com.br
Recebido em 17 de janeiro de 2004
Revisão recebida em 20 de setembro de 2004
Aceito em 10 de janeiro de 2005
* Esse artigo é um dos produtos do projeto de pesquisa "Noções de Cultura: Antropologia e Pesquisas Comportamentais Sobre Primatas Superiores - Uma Abordagem em Antropologia do Conhecimento" desenvolvido com Apoio do CNPq na modalidade Apoio à Pesquisa (APQ) Proc. 471037/2001-0 de Dezembro/2001 a Dezembro/2003. Em sua elaboração, de maneiras distintas, pude contar com as colaborações de César Ades (IP-USP), Renato da Silva Queiroz (FFLCH-USP), Walter Neves (IB-USP) e com a leitura crítica de um parecerista anônimo da Revista de Etologia. Além disso, o diálogo com Alexandre Locci Martins, como sempre, apontou novos olhares.