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Revista Mal Estar e Subjetividade
Print version ISSN 1518-6148
Rev. Mal-Estar Subj. vol.11 no.2 Fortaleza 2011
AUTORES DO BRASIL
ARTIGOS
O sujeito da psicanálise: particularidades na contemporaneidade
The subject of psychoanalysis: particularities in contemporaneity
El sujeito del psicoanálisis: particularidades en la contemporaneidad
Le sujet de la psychanalyse: particularités dans le monde contemporain
Zeila C. Facci TorezanI; Fernando AguiarII
IDoutora pela UFSC. Professora do curso de Psicologia da Unifil/Londrina. End.: R. Assis Vicente, 105. Recanto do Salto. CEP: 86055710 - Londrina - PR. E-mail: zeilatorezan@hotmail.com
IIDoutor e Pós-doutor pela Universidade Católica de Louvain, Bélgica. Professor do Departamento de Psicologia e do PPG em Psicologia da UFSC. End.: R. do Calafate, 79/2004. Pantanal. CEP: 88040-008 - Florianópolis - SC. E-mail: fabs@cfh.ufsc.br
RESUMO
Este artigo objetiva conceituar sujeito e subjetividade, de acordo com as teorias de Freud e Lacan, discutir algumas particularidades presentes nas formas de subjetivação, seus efeitos sobre a existência humana, o adoecimento e o convívio social na atualidade. Em síntese, para a psicanálise, a subjetividade é dividida em duas ordens de funcionamento, relativas ao consciente e ao inconsciente, sendo essencialmente constituída pela sintaxe inconsciente. O sujeito da psicanálise é o sujeito do desejo, delineado por Freud através da noção de inconsciente, marcado e movido pela falta, distinto do ser biológico e do sujeito da consciência filosófica. Esse sujeito se constitui pela inserção em uma ordem simbólica que o antecede, atravessado pela linguagem, tomado pelo desejo de um Outro e mediado por um terceiro. Na atualidade, é possível evidenciar um abalo nessa noção de sujeito de desejo proposta pela psicanálise. Assim, temos o sujeito à mercê de um Outro pouco interditado, pouco marcado por uma falta simbólica e, portanto, imaginariamente passível de completude, o que torna o sujeito suscetível à objetalização. Apatia, alienação e angústia são marcas comuns em que a falta não se instala de maneira efetiva, pondo em questão o estatuto do sujeito do desejo. Imerso num discurso da apologia de uma suposta felicidade plena proporcionada pelo saber científico, saber este que pretende superar todo e qualquer limite e suprir toda e qualquer falta, o declínio da lei da castração se torna evidente e produtor de condutas e atuações delirantes e transgressoras.
Palavras-chave: Subjetividade, atualidade, estados-limite, Freud, Lacan.
ABSTRACT
This article aims to define Subject and subjectivity, according to Freud and Lacan theories, and to discuss some particularities present in modes of subjectification and their effects on human existence, illness and social relationships in contemporaneity. In sum, for psychoanalysis, the subjective is defined by a division of two orders of function, related to the Conscious and to the Unconscious. The Subject of the psychoanalysis is the Subject of desire, delineated by Freud through the notion of Unconscious, marked and moved by the fault, different of the biological being and of the Subject of philosophy conscious. This Subject is constituted by his insertion in a symbolic order that comes before him, crossed by the language, tacked by the Other's desire and mediated by a Third One. In contemporaneity, it is possible to evidence a commotion in this notion of Subject of desire proposed by psychoanalysis. So that, we have a Subject that is at the mercy of an Other not so much interdicted, not so much marked by the symbolic fault and, therefore, imaginarily possible to be completed, making the Subject susceptible of turning in an Object. Apathy, alienation and angst are common traces where the fault is not installed in an effective way, putting in question the status of the Subject of desire. Immersed in an apologetic discourse of a supposed complete happiness brought by the scientific knowledge, knowledge which aims to surpass all and any limit and meet all and any fault, the decline of the Castration Law becomes evident and produces transgressors and delirious conducts and acts.
Keywords: Subjectivity, actuality, borderline, Freud, Lacan.
RESUMEN
En este artículo se pretende conceptualizar el sujeto y la subjetividad de acuerdo con las teorías de Freud y Lacan, discutir algunas peculiaridades en las formas de la subjetividad, sus efectos en las vidas humanas, la enfermedad y la vida social de hoy. En resumen, para el Psicoanálisis, la subjetividad se divide en dos órdenes de operación, el consciente y el inconsciente, siendo esencialmente constituida por la sintaxis inconsciente. El sujeto del Psicoanálisis es el sujeto del deseo, descrito por Freud a través de la noción de inconsciente, marcado y movido por la falta, distinto del ser biológico y del sujeto de la consciencia filosófica. Este sujeto está constituido por la inserción en un orden simbólico que lo precede, atravesado por el lenguaje, tomado por el deseo del Otro y mediado por un tercero. En la actualidad, es posible identificar un estremecimiento en la noción de sujeto del deseo propuesta por el Psicoanálisis. Así, tenemos que el hombre se encuentra a merced de un Outro poco prohibido, poco marcado por la falta simbólica y, por lo tanto, imaginariamente capaz de integridad, lo que lo hace susceptible a la función de objeto. La apatía, la alienación y la ansiedad son las marcas comunes, en las cuales la falta no se instala con eficacia, poniendo en cuestión la condición de sujeto de deseo. Inmerso en un discurso en defensa de una supuesta felicidad proporcionada por el conocimiento científico, conocimiento este que intenta superar todo y cualquier límite y suplir toda y cualquiera falta, el descenso de la ley de la castración se hace evidente y productor de conductas y acciones delirantes y transgresoras.
Palabras-clave: Subjetividad, actualidad,estados-límite, Freud, Lacan.
RÉSUMÉ
Cet article vise à conceptualiser sujet et subjectivité, selon les théories de Freud et de Lacan, et y débattre quelques particularités présentes dans les formes de subjectivité et de ses effets sur l'existence humanine, la maladie et la vie sociale d'aujourd'hui. En résumé, pour la psychanalyse, la subjectivité est définie comme étant divisée en deux ordres de fonctionnement, la conscience et l'inconscient, et essentiellement constituée par la syntaxe inconsciente. Le sujet de la psychanalyse est le sujet du désir, décrit par Freud à travers la notion d'inconscient, marqué et remué par le manque, distinct de l'être biologique et du sujet de la conscience philosophique. Ce sujet est consitué par l'insertion dans une ordre symbolyque qui le précède, traversé par le langage, pris par le désir d'un Autre et par la médiation d'un tiers. C'est possible mettre actuellement en évidence un ébranlement dans cette notion de sujet de désir proposée par la psychanalyse. Il y a ainsi un sujet à la merci d'un Autre quelque peu interdit, quelque peu repéré d'un manque symbolique et donc imaginairement capable d'être complet, ce que lui rend susceptible de devenir un objet. L'apathie, l'aliénation et l'angoisse sont des marques courants ou l'absence ne s'installe pas de manière effective, en mettant en question le statut du sujet du désir. Immergé dans un discours de l'apologie d'un pretendu bonheur complet procuré par le savoir scientifique, savoir qui pretend surmonter tout et n'importe quel limite et suppléer tout et n'importe quel manque, le déclin de la loi de la castration devient evident et producteur de comportements et performances délirants et transgresseurs.
Mots-clés: Subjectivité, actualité, états-limites, Freud, Lacan.
O Sujeito da Psicanálise: Particularidades na Contemporaneidade
Este artigo objetiva conceituar sujeito e subjetividade, segundo a leitura de Freud e Lacan, e discutir algumas particularidades presentes nas formas de subjetivação e seus efeitos sobre a existência humana, o adoecimento e o convívio social na atualidade.
As noções de sujeito e de subjetividade constituem a própria essência do que se denomina campo psicanalítico, composto por duas regiões que não admitem um desmembramento absoluto, a saber: o aparelho psíquico e o campo pulsional (Garcia-Roza, 2001). A primeira das duas regiões, o psiquismo, formada pelos sistemas pré-consciente/consciência e inconsciente é, de hábito, compreendida como a própria subjetividade. Entretanto, não há como segmentar completamente uma região da outra e quando falamos do aparelho psíquico, logo há a referência aos representantes pulsionais que constituem esse aparelho em sua articulação ao registro do simbólico e, portanto, à linguagem. Assim, a segunda região, o campo das pulsões, está também implicada na constituição da primeira, o aparelho psíquico.
É pertinente lembrar que o surgimento da psicanálise se dá no seio da modernidade, momento em que o discurso da ciência substitui o discurso teológico, e a noção de subjetividade passa a ser dominada pela razão, portanto, conduzida pela consciência. O autocentramento do sujeito no eu e na consciência é o marco cartesiano, com a célebre formulação "penso, logo sou", que atribui ao eu o seu reinado, subjugando o conceito de inconsciente, ficando este reduzido a uma espécie de consciência desconhecida. A filosofia ocidental define o sujeito como sendo "o sujeito do conhecimento, do direito ou da consciência", e que desde "René Descartes (1596-1650) e Immanuel Kant (1724-1804) até Edmund Husserl (1859-1938), o sujeito é definido como o próprio homem enquanto fundamento de seus próprios pensamentos e atos" (Roudinesco & Plon, 1998, p.742). Esse tipo de posicionamento é indicativo de que "a individualidade é a categoria fundamental que define o ideário da modernidade" (Birman, 2006, p.39); o indivíduo, num encaminhamento claramente narcísico e liberal, delimita, a partir do eu, o seu espaço na relação com o outro. Tais aspectos caracterizavam uma subjetividade unificada e governada pela consciência, e reduziam o conceito de inconsciente a um estado de caráter temporário e adjetivado, uma espécie de adendo desconhecido da consciência.
Nesse contexto, irrompem as figuras de Marx, Nietzsche e Freud, pensadores introdutores de uma série de quebras de ideais e de mitos a respeito dos valores, da ciência e do sujeito produzidos pela modernidade. A esse respeito, Birman (2006) afirma que esses pensadores promoveram uma ruptura com o eixo central da modernidade e desencadearam questionamentos a respeito do reinado do eu e da razão. Com esse prisma de análise, o autor assinala que, com Marx, o decentramento do eu se deu em relação à economia e à política, num reconhecimento das forças produtivas como ordenadoras da sociedade; com Nietzsche, aclararam-se as relações de força e de poder como centrais e reguladoras do humano, também derrubando a primazia do eu e da consciência; e, por sua vez, Freud realizou o abalo do estatuto de soberania do eu, da consciência e da razão com uma nova concepção sobre o inconsciente. Com essa concepção freudiana, na qual o inconsciente passa da condição de apêndice da consciência à estrutura particular e determinante da subjetividade, o sujeito se torna cindido em duas formas de funcionamento, a consciente e a inconsciente, e subjugado à primazia desta.
Assim, um ponto fundamental e inaugural da teoria freudiana é a noção de clivagem da subjetividade, através da formulação do inconsciente enquanto um sistema psíquico regido por leis próprias, instaurando um afastamento e um decentramento de outro sistema, a consciência. Essa divisão em instâncias psíquicas diferenciadas e antagônicas, indicativa de uma subjetividade essencialmente clivada, refere-se a uma cisão de regimes, de dois modos diferentes de funcionamento do psiquismo (Garcia-Roza, 2001). Essa é a proposta de Freud sobre o inconsciente: caracterizá-lo como uma instância psíquica marcada por uma particular maneira de operar, regulado por leis diferentes daquelas ordenadoras da consciência.
Além de ser caracterizado como um sistema com lógica própria e, via de regra, adversa à da consciência, o inconsciente, para Freud, é o que genuinamente constitui a subjetividade, e não apenas um indesejável detalhe da mesma. Nesse caso, o decentramento do eu e da consciência e a quebra da apregoada unidade da subjetividade promovem um novo ordenamento: subjetividade cindida e primordialmente regida pelo inconsciente. É na sua obra Interpretação dos Sonhos, particularmente em seu Sétimo Capítulo, que Freud (1900/2007a) apresenta claramente essa concepção do aparelho psíquico dividido em instâncias, pré-consciente/consciente e inconsciente, e elabora a sintaxe própria do inconsciente1.
Destacamos que a concepção de um modo de operar característico do inconsciente leva à ideia de uma inexistência de arbitrariedade nos acontecimentos psíquicos, pois eles são determinados pela lógica do inconsciente. Isso implica dizer que o inconsciente não é o caos, o mistério, o ilógico, e que as formações do inconsciente - sonhos, chistes, lapsos, atos falhos, apontados na teoria freudiana como formas metafóricas de manifestação do inconsciente - indicam, mais uma vez, a existência de um sujeito não unificado. Trata-se do sujeito do inconsciente, da cisão entre sujeito do enunciado e da enunciação2, noções desenvolvidas por Lacan a partir da obra freudiana.
Outra constatação a respeito do regime de funcionamento do inconsciente, também de particular importância, é apresentada por Garcia-Roza (2000) ao dizer que Freud situa a psicanálise, do início ao fim de seu percurso, no registro da linguagem, delimitando o que chamou de parábola freudiana, a saber, o surgimento do sujeito a partir da linguagem. Essa constatação seria evidenciada através do processo primário e seus mecanismos de condensação e deslocamento, das leis de associação dos traços mnêmicos descritos por Freud (1900/2007a) para a formação dos sonhos, ou, ainda, pela afirmação freudiana de que o sonho importa pelo seu relato; é o discurso sobre o sonho, e não o sonho por si mesmo, que pode ser interpretado como da ordem da realização de um desejo. Dor (1991, p.11-2), ao fundamentar o "retorno a Freud" proposto por Lacan, sintetiza esse aspecto da articulação freudiana no campo da linguagem, afirmando que as descrições de Freud sobre os processos psíquicos inconscientes estão submetidas à linguagem e à sustentação desta na transferência: "é na palavra que o inconsciente encontra sua articulação essencial".
Lacan fez uma leitura da teoria freudiana contemplando contribuições advindas da tradição filosófica alemã (em especial, de Heidegger e Hegel), da linguística estrutural de Ferdinand de Saussure e do estruturalismo de Lévi-Strauss para fundamentar seu resgate dos fundamentos freudianos, que julgava perdidos ou distorcidos, e para desenvolver suas próprias formulações teóricas, incluindo sua noção de inconsciente e de sujeito. Lacan substituiu a herança do crivo freudiano, calcado na Biologia, na Neurologia e na Física, por outro, que denomina de estrutural e é organizado por três registros: Imaginário, Simbólico e Real. Essa concepção de estrutural é indicativa da "dependência do sujeito a uma ordem que o ultrapassa e que está na sua origem - o Simbólico" (Marini, 1990, p.59), e esse posicionamento e ordenação dos três registros da realidade humana derivam da influência e dos efeitos da teorização de Lévi-Strauss.
Assim, quando Lacan (1964/1988, p.25) postula que "o inconsciente é estruturado como uma linguagem", e, ainda, que "o sujeito é efeito do significante", ele segue os passos de Lévi-Strauss, indicando a existência de um sistema de relações pré-existentes ao sujeito e de uma ordem significante que o antecede, pois o Outro que lhe precede está já tomado pela linguagem. Ao nascer, o homem é inserido em uma ordem humana que lhe é anterior, uma ordem social na qual ele adentra através da linguagem e da família. Assim, a história do sujeito o antecede por um mito familiar que passa a recobri-lo a partir de seu nascimento e através da linguagem - linguagem que é, em essência, sempre equívoca e passível de múltiplas interpretações, facilitadora da construção de um mito individual em referência ao mito familiar. Além do mais, nesse encaminhamento similar ao de Lévi-Strauss, que toma a estrutura da língua como modelo para suas explicações antropológicas dos fenómenos humanos, os aforismos lacanianos acima reproduzidos apontam para a relação e aproximação entre os mecanismos de funcionamento da linguagem e do inconsciente, indicando a existência de regras estruturais comuns entre ambos.
A linguística estrutural introduz e ressalta a importância do eixo sincrónico para o estudo da língua, o que significa dizer que a significação das palavras depende do sistema da língua e que a dimensão diacrónica ou histórica não é suficiente para tal estudo.
É a esse sistema da língua, à estrutura da língua, que Lacan propõe relacionar o funcionamento do inconsciente; e é pela linguagem, pelo discurso, que o inconsciente pode advir. E dessa noção de estrutura, do que, segundo a Linguística, organiza-se como estrutura, como sistema operante na língua, Lacan se apropria, não sem importantes modificações, fundamentalmente, de dois aspectos: o valor do signo e, por conseguinte, a diferença entre significante e significado, e os dois cortes do sistema de linguagem, resultando nos eixos paradigmático e sintagmático que organizam o discurso3.
A partir desses fundamentos estruturalistas, e enfatizando as proposições freudianas, Lacan (1964/1988) formula a tese de que o inconsciente é pré-ôntico e pulsátil: o inconsciente não é objetivado, localizável, nem da ordem da realidade, é pura potência (representação de coisa) para o dizer (articulação entre representação de coisa e representação de palavra). É também através de sua particular tomada de elementos da linguística estrutural que Lacan retoma a descontinuidade - pois é, de acordo com Freud, através do disfarce nos sonhos, no tropeço da fala ou na memória, e ainda na formação sintomática, que teremos a emergência do inconsciente - como caráter inaugural na descoberta freudiana e avança para a indicação de que é na rachadura, no intervalo, na fenda que o inconsciente se manifesta, não apenas no tropeço, e sim em toda cadeia discursiva, seja entre dois significantes ou na passagem de um significante a outro.
Nesse ponto, uma questão se impõe: como se dá a instalação desse potencial para o dizer? Em outros termos, como o inconsciente se estrutura e, portanto, como ocorre a constituição do sujeito, na acepção psicanalítica do termo, sujeito do inconsciente, sujeito do desejo?
A Constituição do Sujeito: Campo Pulsional e Psiquismo
Já vimos, com as contribuições do estruturalismo de Lévi- Strauss, que, para a psicanálise, o processo de constituição subjetiva está intimamente relacionado com a concepção de que o campo do sujeito é efeito, em especial, da linguagem e de uma trama de relações pré-existentes ao nascimento, constituindo o que será o mito fundador de uma história singular. O sujeito, para a psicanálise, é aquele que se constitui na relação com o Outro através da linguagem. É em referência a essa ordem simbólica que se pode falar em sujeito e subjetividade a partir de Freud, e, em especial, após a produção teórica de Lacan.
Portanto, o sujeito não é agente, como ocorre na posição cartesiana, e sim determinado pela função simbólica, assim como a posição do sujeito em relação ao Outro é mediada pelas regras e convenções do registro simbólico (Vallejo & Magalhães, 1991). Para avançar na direção da compreensão de como esse sujeito se constitui, ou seja, de que maneira essa relação com o Outro, intermediada pela linguagem, estrutura o inconsciente e promove a organização subjetiva, é necessária a retomada do conceito de pulsão, pois o inconsciente é formado pelos representantes psíquicos da pulsão, e é no processo de pulsionalização ou erogenização do corpo infantil que poderemos falar de um sujeito em constituição.
Como já observado, o campo pulsional caracteriza uma das duas entrelaçadas regiões - enfatizando que a outra é o aparelho psíquico -, com destaque para o inconsciente, que adquire, em Freud, o estatuto de sistema, com uma posição prioritária e determinante no funcionamento subjetivo, compondo a subjetividade, de acordo com a psicanálise. Acrescentamos, agora, relembrando o leitor e fortalecendo os argumentos que sustentam as noções de sujeito e subjetividade em pauta, que é através do conceito de pulsão, em sua segunda teorização, que uma nova organização tópica e clínica começa a se organizar na obra freudiana. A pulsão, como pura potência dispersa, num mais além do princípio do prazer, assume lugar de destaque na teoria freudiana através dos conceitos de pulsão de morte e de compulsão à repetição, deslocando o foco da ordem, do sentido e da representação - elementos marcantes da primeira tópica - para o que faz limite a essa ordem, para o caos, a desordem. Assim, há algo da subjetividade que se constitui como exterior ao inconsciente, exterior à representação e ao psiquismo, caracterizando a chamada segunda região dessa subjetividade, que é o campo pulsional.
O conceito de pulsão começa a ser construído em 1905, com a publicação dos Três Ensaios da Teoria Sexual (Freud, 1905/2007b), e sofre uma série de modificações e avanços ao longo da obra freudiana. Nessa obra, mas já em acréscimos realizados em 1915, a pulsão é articulada à representação psíquica de estimulações somáticas que fluem continuamente, em oposição às estimulações esporádicas e externas. A pulsão é, então, formulada como um conceito de fronteira entre o psíquico e o somático. Nessa mesma direção de fronteira, limite e articulação entre psíquico e somático, Freud apresenta, ainda em 1905, sua noção de "apoio", que enfatiza a origem somática da fonte pulsional e fundamenta o dualismo pulsional proposto nesse momento, a saber, a oposição entre pulsões sexuais e pulsões de autoconservação ou pulsões do eu. Portanto, esse texto estabelece que as pulsões sexuais se instalam a partir das necessidades e que a sexualidade se torna autónoma, secundariamente, quando o objeto exterior indicado para a auto- conservação é abandonado e a satisfação sexual pode ser obtida de forma autoerótica.
Novas construções sobre a teoria pulsional são apresentadas por Freud (1915/2007c) com o artigo Pulsões e Destinos da Pulsão. Esse texto apresenta os quatro elementos que caracterizam as pulsões sexuais: a fonte, a pressão, o alvo e o objeto. A fonte é corporal e atrelada às zonas erógenas; a pressão é o fator motor, uma força constante que é a própria atividade da pulsão; o alvo da pulsão é sempre a satisfação, a redução da tensão provocada pela pressão, que é sempre parcial; e o objeto é um meio para um fim, a forma de atingir o alvo, é o que há de mais variável, pois a pulsão não tem objeto próprio. Com diferentes zonas erógenas disseminadas por todo o corpo, com uma satisfação sempre parcial, nesse artigo, as pulsões sexuais aparecem marcadas pelo caráter da parcialidade, cuja somatória constitui a sexualidade, num distanciamento da primazia e da totalização do sexual via genitalidade.
Mantendo a ideia de fronteira e limite entre psíquico e somático, a pulsão é afirmada como sendo "(...) un representante [Reprasentant] psíquico de los estímulos que provienen del interior del cuerpo y alcanzan el alma" (Freud, 1915/2007c, p. 117). Essa formulação acaba por equivaler à pulsão e seus representantes-representação - o que é retificado no mesmo ano, no texto intitulado O Inconsciente, no qual se encontra a proposição freudiana de que "una pulsión nunca puede pasar a ser objeto de la conciencia; sólo puede serlo la representación que es su representante" (Freud, 1915/2007d, p.173). Sendo assim, "Pulsões e destinos da pulsão" trata dos destinos dos representantes-representação da pulsão e indica que os afetos, a despeito de sofrerem os efeitos desses destinos, têm os seus próprios encaminhamentos, a saber: a conversão, o deslocamento e a angústia.
Com o artigo Mais Além do Princípio do Prazer (Freud, 1920/2007e), a segunda teoria das pulsões é apresentada, já constituindo também os pilares para a posterior organização da sua segunda tópica, em 1923, e iniciando uma nova forma de pensar a subjetividade. Até então, preocupado com o aparato psíquico e sua ordem, afirmando um predomínio do princípio do prazer, Freud, agora, indaga-se a respeito do que faria obstáculo a esse princípio, e a resposta o leva à formulação do conceito de pulsão de morte, através do qual o caos e o acaso são introduzidos na teorização freudiana.
O texto de 1920 propõe um novo dualismo entre pulsão de vida - que reagrupa as pulsões sexuais e as pulsões do eu - e pulsão de morte. A concepção desta enquanto retorno ao estado anterior à vida dá um caráter conservador à pulsão, em oposição ao apresentado anteriormente, quando a pulsão era identificada com a renovação e a promoção de mudanças. Ainda nesses termos de uma postura conservadora, por buscar manter o estado de coisas, repetir o mesmo, o conceito de compulsão à repetição ganha forma e aponta sua articulação à pulsão de morte como movimento de uma ordem mais primitiva, mais elementar que o campo das pulsões de vida, estando estas articuladas ao aparelho psíquico. Entretanto, Freud (1920/2007e) formula não haver diferença qualitativa entre as pulsões, indicando que as pulsões de vida são numerosas e ruidosas, enquanto a pulsão de morte é silenciosa, invisível e indizível.
Lacan (1964/1988) aborda esse ponto evidenciando que o dualismo não se refere à natureza da pulsão, mas ao seu modo de apresentação. A pulsão é uma só, mas com duas formas de apresentação: uma delas, denominada por Freud de pulsão de vida, refere-se ao campo pulsional que é capturado pelo aparato psíquico, que pode ser inscrito no inconsciente e inserido na ordem do Simbólico; a outra apresentação, denominada por Freud de pulsão de morte, caracteriza o campo pulsional que escapa à representação no psiquismo, estando, assim, fora do Simbólico e inserido no registro do Real. Nesse mesmo texto, Lacan enfatiza o caráter sempre parcial das pulsões e deixa muito claro que o mais importante para a pulsão é o seu circuito, no qual o contorno do objeto se produz. Tal circuito é fechado com o retorno à fonte e o consequente desprendimento e queda do objeto da sua posição temporária de produtor de satisfação pulsional.
Este aspecto - a não existência de um objeto específico para a pulsão - é de extrema relevância por favorecer a delimitação do campo humano em seu distanciamento da noção de necessidade aplicável ao mundo animal. Sobre esse ponto de demarcação de uma diferença radical entre pulsão e instinto, Lacan aprofunda seus comentários e estabelece, na articulação entre os conceitos de inconsciente e pulsão, a concepção, para a psicanálise, de desejo. Assim, é a partir dos pilares freudianos que Lacan, no transcorrer de sua obra, articula ao inconsciente as noções de sujeito do inconsciente/sujeito do desejo, e à consciência o eu/sujeito do enunciado.
Em Freud (1900/2007a), o desejo é caracterizado por um impulso na busca da reprodução de uma satisfação original, mas de forma alucinatória; ou seja, faz referência a um objeto atrelado originariamente à satisfação e não mais encontrado, um objeto perdido e, então, representado na ordem do Simbólico. Assim, o desejo pode se realizar sem nunca se satisfazer - diferentemente do que acontece com a necessidade -, e sempre de forma parcial, na medida em que o encontro com o objeto, tomado pelo desejo circunstancialmente, também produz remissão ao mítico objeto perdido para sempre, reabrindo a insatisfação e relançando o desejo em sua incansável circularidade. Então, no cerne do desejo, está a falta, pois ela é o que continua presente em referência ao objeto perdido e, decididamente, dá ao desejo o estatuto de inconsciente e, portanto, estrangeiro ao eu. A essa ideia freudiana do desejo inconsciente e que tende à realização, Lacan articulou a proposição filosófica fenomenológica do desejo baseado no reconhecimento, no qual o desejo humano é desejo de desejo do outro. Grosso modo, para a psicanálise, o que o homem deseja é ser reconhecido pelo desejo do outro, ser amado, desejado pelo outro, estando a noção de desejo atrelada à de um vazio infindável, para o qual não há objeto que lhe dê cabo.
Uma vez enunciada essa posição desejante do humano e percorridos os elementos essenciais sobre o inconsciente - como sistema fundamental do aparelho psíquico que caracteriza a primeira das duas regiões que compõem a subjetividade -, voltamos à questão de como esse sujeito do desejo e do inconsciente se constitui. Sendo assim, é pertinente e necessário tecer alguns comentários sobre o caminhar da constituição subjetiva, no qual se processam os conceitos teóricos abordados - inconsciente e pulsão -, culminando nas chamadas estruturas clínicas, como veremos a seguir.
A Constituição do Sujeito: Subjetivação e Estrutura
A partir das considerações já tecidas sobre o sujeito ser efeito da relação com um Outro por intermédio da linguagem, está evidenciado que, na leitura psicanalítica sobre a organização subjetiva, é fundamental o lugar em que se é tomado pelo desejo parental. A partir de um necessário e recíproco engodo amoroso - em que, na díade mãe-criança, impera o ser tudo uma para a outra -, as demandas maternas são dirigidas à criança e estabelecem a erogenização do corpo infantil, processo de sexualização do campo pulsional em função da criança ocupar, temporariamente, o lugar de objeto fálico a completar o desejo do Outro. Num aparente paradoxo, ao mesmo tempo em que é necessário ao sujeito ocupar tal lugar mítico de completude, ele deve também deixar de ocupá-lo, inicialmente, em função da constante e infindável circularidade das demandas maternas - desde que, no inconsciente da mãe, já opere o Nome-do-Pai -, e posteriormente, pela efetivação da função paterna ao interditar o desejo da mãe em relação à criança. Cabe ao pai impedir o desejo materno devorador, estabelecendo limite para as demandas maternas, retirando a criança do subjugo ao código materno e inserindo-a no campo da lei da castração. Desse processo, sempre marcado por particularidades e jamais perfeito, no sentido de sempre contemplar falhas em sua efetivação, depende a organização estrutural e, portanto, a modalidade de funcionamento subjetivo.
Nessa direção, a leitura clínica estrutural se opõe ao diagnóstico meramente semiológico e nosográfico, e propõe que a especificidade da estrutura de um sujeito é predeterminada pela economia de seu desejo. O diagnóstico estrutural busca compreender como se dá essa economia, como ela é administrada. Essa economia do desejo se refere ao Édipo, à relação que o sujeito mantém com a função fálica e com a castração. Portanto, quando falamos em estruturas clínicas ou estruturas de personalidade (neuroses, psicoses e perversão), falamos dos avatares transcorridos ao longo da constituição do sujeito, em especial, ao longo dos três tempos do Édipo.
Pensar o Édipo em três tempos é uma proposta de Lacan que incluiu, no Édipo como um todo, os períodos antes denominados por Freud de pré-edípico e de saída edípica ou declínio do Édipo - os quais correspondem, respectivamente, ao primeiro e terceiro tempos do Édipo para Lacan.
O primeiro tempo edípico ocorre nos primórdios da interação mãe-criança, quando esta é tomada imaginariamente pela mãe como o seu objeto de completude; o segundo tempo do Édipo é marcado pela descolagem inicial da criança do lugar de falo para a mãe, momento da castração imaginária, quando a criança rivaliza com o pai o lugar de falo para a mãe; o terceiro e último tempo edípico se caracteriza, inicialmente, pela hipótese infantil de que o pai detém o falo, e, em seguida, culmina na saída do Édipo, com a conclusão de que ninguém é ou possui o falo, pois todos somos faltantes, castrados, e o que homens e mulheres desejam em seus pares é exatamente a falta.
A neurose se dá com a passagem pelos três tempos do Édipo, momento no qual a castração simbólica está decididamente instalada e o recalque funda o sujeito barrado. No outro extremo, aprisionada ao primeiro tempo edípico, à condição de ser o objeto para o Outro, à ausência da castração e sob os auspícios da foraclusão do Nome-do-Pai4, está a psicose; por sua vez, a perversão caminha até o segundo tempo do Édipo, momento em que a castração é vislumbrada como possível na realidade corporal, tempo em que a diferença sexual é conhecida, mas no caso de uma estruturação perversa é negada concomitantemente, instaurando a renegação da castração.
Observamos que o processo de pulsionalização do corpo infantil através das circulares demandas maternas ocorre em dois tempos de trabalho ou duas operações de causação do sujeito: a "alienação" e a "separação". A alienação, ou "véu da alienação", corresponde à primeira volta do circuito pulsional, em que a demanda materna toma a criança como seu objeto pulsional. Parafraseando Harari (1990), a alienação é a operação que determina a captura do sujeito pelo significante, é a ação do Outro que produz a primeira conflituosa e ambígua aparição do sujeito, pois este, para surgir, paga o preço da desaparição sob os significantes do Outro, correndo o risco de aí petrificar-se.
Lacan (1964/1988) propõe o conceito de afanise5 ou fading para designar o referido desaparecimento da condição de sujeito por sua aparição através de um primeiro significante que surge no campo do Outro, marcando, assim, o caráter de divisão do sujeito: "Quando o sujeito aparece em algum lugar como sentido, em outro lugar, ele se manifesta como fading, como desaparecimento" (Lacan, 1964/1988, p. 207). Assim, o sujeito, sob o efeito afanise, é de um lado sentido e, de outro, sem sentido, fato indicativo da inevitável perda que ocorre nessa primeira operação de constituição do sujeito, perda que se traduz naquilo que é inconsciente.
Lacan (1964/1988, p. 203) ainda assinala que a separação, segunda operação de causação do sujeito, é também a segunda e necessária volta do circuito pulsional na relação do sujeito ao Outro e "surge do recobrimento de duas faltas". Considerando que o objeto da pulsão é sempre variável, que não é equivalente ao objeto da necessidade, que é apenas contornado, e não apreendido pela pulsão, o Outro se apresenta como faltante nos intervalos de seu discurso. Nesse ponto, através dos intervalos, das faltas no discurso do Outro, o desejo do Outro é apreendido pela criança como um enigma: o que o Outro quer de mim?
Lacan prossegue com a afirmativa de que, para responder a esse enigma, o sujeito põe em cena a sua própria falta, referente ao seu desaparecimento, propondo a sua própria perda como objeto para o desejo do Outro: pode ele me perder? Assim, uma falta recobre a outra - a falta no Outro e a falta na criança de seu próprio desaparecimento - e desse recobrimento resulta o que Lacan (1964/1988, p.208) denomina de função da liberdade, função que permite ao sujeito libertar-se do efeito afanise. Afinal, se a criança pode ser perdida, se sua vida não é uma necessária oferenda à sustentação de um Outro imaginariamente pleno, ela está liberta da condição de bom objeto para o Outro, liberta do efeito de desaparecimento como sujeito - efeito afanise - através da cristalização aos significantes do campo do Outro.
A partir dessa liberação promovida pela separação, temos, definitivamente, a falta a ser no sujeito, a inscrição do representante pulsional e a aparição do objeto a - objeto causa do desejo que se caracteriza pela ausência e falta, e não por sua presença e materialidade; é o que pode ser perdido no circuito pulsional no momento da separação, convocando a falta e movimentando o desejo -, estabelecendo a condição para que o sujeito possa eleger objetos para o seu desejo a partir da passagem pela condição de objeto pulsional para o Outro.
Por essa via, entende-se a produção sintomática como uma maneira de o sujeito resistir à posição de objeto fálico para o Outro, ou seja, resistir à alienação e a um desejo que não é o seu. Porém, ressalva seja feita, o sintoma sempre comporta, ambígua e imaginariamente, a satisfação da demanda que se supõe no Outro. Esse movimento é radicalizado nos denominados sujeitos em estado-limite, inegáveis cânones da subjetividade contemporânea.
Sinteticamente, o estado-limite corresponde a uma leitura para as frequentes modalidades clínicas da atualidade, vislumbrando a proximidade tanto do funcionamento perverso quanto do psicótico. Essa posição subjetiva está associada a falhas no trabalho de inscrição pulsional, na organização do narcisismo primário e da fantasia, sendo marcada pelo enfraquecimento dos registros imaginário e simbólico. As características centrais dessa posição, que não se define como estrutural, são a somatória da angústia e da depressão, os fenómenos e acting-out, as condutas sociais e sexuais perversas, e os danos à imagem do corpo e aos processos de pensamento (Rassial, 2000).
Lebrun (2010) considera o estado-limite como um dispositivo provisório, como uma fase de latência prolongada por sujeitos incapazes de se posicionarem em alguma das posições estruturais em virtude da inoperância do Nome-do-Pai, da falta de apoio na representação fálica. Amigo (2007) faz uma leitura centrada da organização da fantasia, indicando que o estado-limite pode ser interpretado como um fracasso estável da fantasia, que não termina de se constituir.
Assim, as manifestações clínicas no estado-limite denominadas de fenómenos (pânico, bulimia, anorexia, adições, melancolização, fenómenos psicossomáticos, o ato de se cortar, cleptomania) são marcas da aparição do campo pulsional, que, diferentemente do sintoma neurótico, definido pelo retorno das inscrições pulsionais recalcadas, não se encontra efetivamente simbolizado. Frente à insuportável angústia de ser tomado na posição de objeto que completa o Outro, o sujeito aparece através do fenómeno, num ato de recusa e repugnância ao desejo do Outro, ao mesmo tempo em que se confirma existente através da posição de alienação que lhe é tão conhecida.
Em alguma medida, também é possível identificar uma função semelhante na recorrência ao delírio na paranoia, pois este se organiza numa tentativa de cura, buscando estabelecer significações onde elas faltam para o sujeito, constituindo, assim, uma barreira ao seu completo desaparecimento. Sem o intuito de construir generalizações, é plausível afirmar algo em comum entre as formas de subjetivação acima referidas, a saber: a luta pelo advento do sujeito, pela sustentação, ainda que de maneira frágil e distorcida, do lugar de sujeito.
Sendo um dos objetivos deste artigo a discussão de algumas particularidades presentes nas formas atuais de subjetivação e sendo o estado-limite uma expressão, parafraseando Lebrun (2010), do mal-estar na subjetivação em nossos tempos, vejamos alguns aspectos característicos do discurso social contemporâneo e seus enlaces com a constituição e funcionamento subjetivos.
Uma Nova Ordem Discursiva
A vida é feita de poucas certezas - talvez de uma só, como diz a sabedoria popular - e assim também o campo das humanidades entende a atividade de pesquisa e a produção de saber: nada de garantias ou busca de verdades absolutas e definitivas, o que permite a existência de diferentes e até contraditórias leituras e interpretações sobre uma mesma questão. É o que tem acontecido quando o tema é a modernidade ou a pós-modernidade, e as condições e questões relativas ao sujeito e à subjetividade em nosso tempo, seja ele moderno ou pós-moderno. As diferenças a respeito dessa temática parecem apontar, fundamentalmente, para duas formas opostas de interpretação: uma delas, com predomínio norte-americano, aposta numa ruptura com a essência da modernidade, indicando o fim desta e a construção de uma pós-modernidade; a outra, primordialmente europeia, avalia a existência de uma radicalização dos pressupostos organizadores da modernidade e, portanto, a continuidade desta e de seu projeto (Birman, 2006).
Certamente, existem exceções nos pensamentos americano e europeu a respeito da contemporaneidade, mas a referida ordenação de focos de interpretação se deve ao fato de a modernidade ter sido um projeto europeu. Portanto, ela marcaria a identidade europeia, sendo mais aceitável a ideia de um desdobramento da modernidade e da manutenção de seu projeto estrutural. Por sua vez, a proposição norte-americana de uma ruptura radical com a modernidade e do nascimento de um novo modelo, denominado de pós-moderno, estaria calcada no ideário de uma hegemonia da cultura americana como fundadora de um novo tempo histórico (Birman, 2006).
Todos devem estar lembrados que Freud (1929/2007f), já se ocupando dos aspectos concernentes ao enlace entre o sujeito e a cultura, indicou e preconizou as dificuldades relativas à organização social no artigo O Mal-estar na Cultura. Nesse texto, ele afirma que a cultura tem como uma de suas funções regular as relações dos homens entre si, mas que sua instauração depende exatamente da renúncia à satisfação pulsional, especialmente a renúncia à agressividade. Assim, a insatisfação é colocada como uma condição prévia para a cultura e denominada de frustração cultural. No mesmo artigo, enuncia que a perda da felicidade, através do sentimento de culpabilidade engendrado pela cultura, é o preço pago pela evolução cultural.
Freud (1929/2007f) considera a vida muito pesada, e que o sofrimento nos ameaça por três vias: a decadência do próprio corpo, o mundo exterior e as relações com os outros. Ao destaque para o sofrimento advindo dos relacionamentos humanos, soma- -se a constatação de que a finalidade de evitar o sofrimento se sobressai àquela da busca pelo prazer, a despeito de considerar que a procura de uma satisfação ilimitada é uma norma de conduta tentadora. Freud elege três formas principais de diminuição desse sofrimento: distrações que fazem parecer pequena a nossa miséria, satisfações substitutivas que a reduzem, e os narcóticos que nos tornam insensíveis a ela. Refere-se, também, no decorrer do trabalho, ao isolamento social como uma maneira de evitar o sofrimento advindo do relacionamento humano.
Entretanto, Lebrun (2004) alerta para a leitura que, a seu tempo, Lacan faz do mal-estar na civilização. Observa que Freud, ao menos de certa forma, compartilhava do movimento cientificista de sua época, enquanto Lacan - já espectador dos efeitos maléficos do tecnocientificismo - concebeu o discurso da ciência como responsável pelo fadado mal-estar. É necessário considerar que a mudança de um discurso teológico, antes organizador da Antiguidade, para um discurso científico é essencial para a estruturação da modernidade, e é a partir dessa premissa que Lebrun (2004) formula a hipótese de que o discurso da ciência é o responsável pelas dificuldades presentes na modernidade e, sobretudo, na atualidade, para o exercício e eficácia da função paterna e da lei da castração. Uma nova forma de funcionamento do laço social se estabeleceu com o nascimento da ciência moderna: a autoridade de Deus é abalada e em seu lugar se estabelece o saber, um saber que se pretende totalizador, capaz de dominar a realidade e transpor os limites humanos.
Em outras palavras, a ciência moderna desbanca a autoridade religiosa, a tradição e o lugar do Mestre em sua relação com a transmissão do saber. Nesse novo laço social, o saber é norteador - mas agora de forma acéfala, pois não mais enunciado por um Mestre - e encaminha a busca, imaginariamente, de um domínio pleno da realidade. Ao discurso da ciência, nada escapa e este não comporta o efeito atrelado à função paterna de fazer corte, limite, e instituir a falta, a não-completude. Assim, temos as consequências nefastas da falência, da queda do Outro e, portanto, da lei da castração em nossa cultura. Privados da alteridade radical do Outro, os homens são arrancados do domínio da Lei, arremessados em relações de horizontalidade permeadas por um ideário de pretensa igualdade.
Legislando em causa própria, o homem de hoje aposta todas as suas cartas na máxima de que todo o gozo é possível e deve ser alcançado. Essa mensagem, ou talvez seja melhor dizer ordem, é veiculada na cultura pelas mais diversas vias e está em alto grau acoplada aos progressos técnico-científicos. Cada vez mais, a tecnologia, em nome da ciência, ou ainda, a ciência em nome do avanço tecnológico, trabalha no sentido da manipulação, do controle, da racionalização e, portanto, da exclusão do sujeito. Assim, numa assepsia subjetiva, a vida e muitos dos aspectos relativos a ela se tornam bens propagados como necessários para o acesso ao gozo. Esse movimento elide a condição sine qua non da subjetividade humana, que se refere à inexistência de um objeto que satisfaça o desejo humano e, logo, à uma subjetividade constituída por um vazio insuperável. Como diz Lacan (1959-60/1997, p. 280), "a dimensão do bem levanta uma muralha poderosa na via do nosso desejo", identificando, assim, a necessidade de "um repúdio radical a um certo ideal do bem". Nesse sentido, é apropriada a consideração de que propor um gozo impossível como ideal a ser atingido produz mais angústia do que gozo, mais violência do que fruição (Kehl, 2002). Afinal, é a interdição do incesto, da satisfação pulsional direta e, portanto, do gozo, que possibilita a ascensão ao prazer. Para a psicanálise, essa instauração da lei da castração constitui os sujeitos, que, marcados pela falta, tornam-se sujeitos do desejo.
Em conjunto com esse novo ordenador social, o discurso da ciência, temos a instalação do eixo central da modernidade, que é a categoria do indivíduo e a regulação do espaço social em torno dessa mesma categoria e, cada vez mais, na direção liberal da anulação da falta, do limite e da diferença. Em direção a um ideal perverso de recusa da castração e de desconhecimento da alteridade? Ou em direção à loucura, em que a Lei já elidida não tem como operar? As duas opções têm-se apresentado como possíveis perante o declínio da lei simbólica da castração e a ascensão do saber ao lugar da verdade, encaminhamentos representados pelas barbáries presentes em nosso cotidiano nos níveis social, político e individual.
O Sujeito e a Subjetividade no Contemporâneo
Mesmo que sob diferentes e contraditórias interpretações ou denominações, as descrições da contemporaneidade reconhecem a existência de modificações importantes que afetam o sujeito, indicativas de uma fase de transição, ainda que seja por uma radicalização dos pressupostos modernos, nos quais, em alguma medida, uma nova etapa de pensamento, logo, da organização do conhecimento, está se desenvolvendo. Certamente, tais transformações englobam toda a existência humana e se tornam, cada vez mais, perceptíveis em nosso cotidiano.
Ninguém contestará que nosso social está, atualmente, profundamente modificado: ademais, sua evolução se dá de modo tão rápido que com frequência nos sentimos impotentes quanto a identificar as articulações de onde procedem todas as mudanças a que assistimos. Citemos, sem impor ordem, a mundialização da economia, a desafetação do político, o crescimento do individualismo, a crise do Estado providência, os excessos da tecnologia, o aumento da violência ao mesmo tempo que a evitação da conflitualidade, a escalada do juridismo... (Lebrun, 2004, p.13)
O autor também referencia as novas formas de adoecimento, evocando o que denomina uma clínica do social, no sentido de que essas respostas de subjetivação correspondem diretamente às transformações no funcionamento familiar, às torções dos papéis feminino e masculino e à derrocada da instância paterna.
Nesse contexto de transformações, a leitura de Dufour (2005) propõe o fim do que identifica como o duplo sujeito da modernidade, a saber, o sujeito crítico kantiano e o sujeito neurótico freudiano. O encaminhamento do capitalismo em sua faceta neoliberal seria produtor de extrema de dessimbolização em virtude do imperativo das trocas mercadológicas fundamentadas exclusivamente no valor monetário das mercadorias, numa recusa de qualquer valor simbólico que pudesse estar aí associado, seja de ordem moral, tradicional ou transcendental. Dessa forma, haveria o predomínio de um "sujeito precário, acrítico e psicotizante" (Dufour, 2005, p.21) em nossos dias, uma vez que não há mais lugar para o sujeito crítico e conduzido por um imperativo moral de liberdade e nem para a culpabilidade neurótica. Isso não significa que todos rumamos para a estruturação psicótica, e sim que os sujeitos estariam demasiadamente abertos às mudanças e flutuações identitárias e desgarrados do simbólico, favorecendo os já aqui referenciados estados-limite. É ainda necessário assinalar, em conjunto com o autor, a existência de resistências, pois os sujeitos não se entregam sem combate às mudanças impostas pela nova ordem social.
Nessa teorização dos estados-limite, o modelo e parâmetro fundamental para a compreensão da subjetividade e das manifestações clínicas na atualidade é tomado de Freud, com sua proposição sobre as neuroses atuais. Conforme esse modelo, nas neuroses atuais não há intermediação psíquica da excitação sexual e, portanto, esta afeta o corpo de forma direta. Cancina (2004) propõe que a neurastenia pode ser, dentre as neuroses atuais freudianas, considerada uma espécie de paradigma da subjetividade contemporânea, pois, além da sua descrição clínica corresponder quase completamente aos estados atuais de sofrimento, do ponto de vista metapsicológico, encontra-se a semelhança no que se refere à manifestação direta, sem mediação simbólica, de um campo pulsional carente de representação.
Haveria nesses quadros, atualmente denominados pela psiquiatria de fadiga crônica, uma "derrota das estratégias operatórias significantes, espécie de falha da simbolização, assim como das formações inconscientes clássicas" (Cancina, 2004, p.252). Em outras palavras, as formações puramente sintomáticas falham, abrindo espaço para os fenómenos, em virtude do fracasso de algumas inscrições pulsionais, no sentido de sua não habilitação para o jogo combinatório dos processos de condensação e deslocamento, e para a posterior articulação com os representantes de palavra. Tal fracasso se estabelece a partir de uma posição materna pouco marcada pela castração simbólica, que resulta em investimentos sobre a criança de demandas pulsionais não eficazes. Nesses casos, os processos de alienação - ser tomado como objeto da demanda pulsional - e separação - momento da queda desse lugar de objeto para a demanda pulsional, com a consequente inscrição do representante pulsional - são falhos. Tais falhas se devem a intervalos não muito bem estabelecidos entre os dois momentos; ao excesso na fase da alienação e, portanto, uma fraca separação; ou à carência na operação da alienação.
Também a respeito dos novos posicionamentos subjetivos produzidos na contemporaneidade, vale comentar a recente formulação de Melman (2008) sobre o favorecimento, na atualidade, do que ele denomina de paranoia social ou paranoia da vida cotidiana. Os dispositivos sociais atuais colaborariam para os sujeitos agirem de forma delirante, de acordo com o modelo estrutural paranoico. A paranoia é definida como "a certeza para um sujeito de ter o saber da verdade, da verdade absoluta" (Melman, 2008, p.13), e essa verdade é salvadora, capaz de reparar tudo o que não vai bem nas instâncias familiares, sociais e políticas. Todos seríamos tentados por essa possibilidade de um saber sobre a verdade que o paranoico possui. Aí se encontraria a nossa vulnerabilidade à paranoia, em muito favorecida, hoje em dia, pelo discurso da ciência que apregoa o acesso a um saber ilimitado, um saber capaz de promover o domínio pleno da realidade e em que a categoria do impossível é elidida. Além do mais, ao primar pela exclusão do sujeito e da subjetividade, a ciência tornar-se-ia perseguidora e ameaçadora para esse sujeito.
Melman (2008) ainda salienta o fato de tendermos a defender e proteger a nossa subjetividade, nossa identidade - que se encontra fortemente abalada nesse contemporâneo marcado pela indiferenciação e pela globalização -, e, assim, nos sentimos ameaçados pela diferença e pelo que possa estar além das nossas fronteiras. Esse posicionamento é aplicado à fragilidade e dificuldade dos laços sociais na atualidade, assim como às condutas de violência extremada e gratuita manifestadas no cotidiano.
Na atualidade, os laços sociais se tornam cada vez mais frágeis com a intensificação de ao menos dois mecanismos já considerados importantes por Freud (1929/2007f) na busca humana de diminuição do sofrimento: o isolamento e a intoxicação. A intoxicação, tanto pelas drogadicções quanto pela "medicalização do espírito" (Roudinesco, 2000, p.21), parece se destacar nesta dita "era da individualidade", exatamente com o sentido que Freud lhe atribui, isto é, tornar-nos insensíveis à nossa miséria. Entretanto, a miséria contemporânea tem suas particularidades e a via da intoxicação busca promover a dessubjetivação e o desaparecimento do sujeito, ao mesmo tempo em que permite que ele se afirme, num afastamento da angustiante posição de objeto, na qual se sente convocado em virtude da presença de um Outro pouco interditado e passível de uma falta imaginária e não simbólica.
Talvez também o incremento do misticismo, que hoje se constata, tenha um efeito similar ao caráter delirante e impositivo atribuído por Freud (1927/2007g) à religião no início do século XX. Ele considerava que a religião impedia o livre jogo de cada um a respeito dos percursos a serem traçados na busca da felicidade ao definir um caminho único para alcançar a felicidade e evitar o sofrimento. Nesse sentido, é particularmente interessante que esse texto, "O futuro de uma ilusão", seja encerrado com uma explícita referência à dualidade Eros e pulsão de morte, e com a aspiração de que o primeiro se sobreponha à segunda. Aspiração reafirmadora do posicionamento freudiano de Eros a serviço da cultura, capaz de reunir os indivíduos e de constituir a humanidade, em oposição à agressividade destrutiva da pulsão de morte.
Mais do que nunca, a busca de uma suposta felicidade plena e ideal se faz presente no discurso social, em contraposição aos intensos sofrimentos que fazem parte da miséria humana contemporânea. Entretanto, parafraseando Garcia-Roza (1990), é necessário considerar a relativização de Lacan sobre a ideia da pulsão de morte como não mais identificada à agressividade, mas sim à criação. Com esse enfoque, a tendência totalitária e unificadora de Eros levaria a um distanciamento da singularidade, com o aumento da indiferenciação. Com a eliminação da diferença, extingue-se o sujeito e aplaca-se o desejo, que é pura diferença, ao passo que a pulsão de morte, como potência destrutiva, impede esse movimento totalitário (e mortífero) de Eros, através de sua característica disjuntiva, criadora e renovadora.
A partir dessa perspectiva de análise, é possível pensar, a título interpretativo dos fenómenos contemporâneos, que o predomínio de Eros, preconizado por Freud, é constatado no mundo de hoje, mas, em vez da promoção de laços que construam a cultura, esse predomínio resulta na busca da individualidade como vã tentativa de diferenciação, singularidade e subjetivação. A ideologia da igualdade e a busca do gozo todo (também enunciado como um direito), ambos pertencentes ao registro do imaginário, parecem ir ao encontro do projeto de Eros na medida em que propiciam a derrocada do sujeito.
Considerações Finais
Em síntese, a subjetividade, para a psicanálise, é definida como dividida em duas ordens de funcionamento, relativas ao consciente e ao inconsciente, e essencialmente constituída pela sintaxe inconsciente. O sujeito da psicanálise é o sujeito do desejo, estabelecido por Freud através da noção de inconsciente, marcado e movido pela falta; distinto do ser biológico e do sujeito da consciência filosófica. Esse sujeito se constitui por sua inserção em uma ordem simbólica que o antecede, atravessado pela linguagem, tomado pelo desejo de um Outro e mediado por um terceiro.
É possível evidenciar um abalo, introduzido na atualidade, dessa noção de sujeito de desejo proposta pela psicanálise, um abalo associado ao conceito de sujeito em estado-limite. Assim, identificamos um sujeito à mercê de um Outro pouco interditado, pouco marcado por uma falta simbólica e, portanto, imaginariamente passível de completude, o que torna o sujeito suscetível à objetalização. Apatia, alienação e angústia são marcas comuns, em que a falta não se instala de maneira efetiva, pondo em questão o estatuto do sujeito do desejo. Imerso num discurso da apologia de uma suposta felicidade plena proporcionada pelo saber científico, saber que pretende superar todo e qualquer limite e suprir toda e qualquer falta, o declínio da lei da castração se torna evidente e produtor de condutas e atuações delirantes e transgressoras.
Referências
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Recebido em 29 de julho de 2010
Aceito em 01 de dezembro de 2010
Revisado em 05 de dezembro de 2010
1 Refiro-me ao processo primário, mecanismo característico do funcionamento do inconsciente, em contraposição ao processo secundário, que define o funcionamento do pré-consciente e da consciência. No processo primário, a energia escoa livremente de uma representação para a outra, segundo os mecanismos de condensação - uma única representação contempla o significado de várias outras, que formam uma cadeia - e deslocamento - quando uma representação recebe todo o valor e significado de outra (Laplanche e Pontalis, 2001).
2 O sujeito do enunciado é aquele que se apresenta no discurso em uma relação de exterioridade com o sujeito da enunciação, o qual, por sua vez, não é expresso no enunciado, no discurso manifesto (Vallejo & Magalhães, 1991).
3 A relação entre significado (conceito) e significante (imagem acústica) constitui o chamado signo linguístico, ordenado por uma separação entre seus dois elementos. Essa separação é interpretada por Lacan pela via de uma autonomia do significante em relação ao significado, autonomia que leva à consideração de uma supremacia do primeiro em relação ao segundo, numa subversão da proposição inicial de Saussure. O eixo paradigmático é o responsável pelas seleções, pelas escolhas das palavras, a partir das quais se admitem substituições por semelhança: um termo leva a outro por similitude, equivalendo ao processo metafórico. O eixo sintagmático é o eixo no qual ocorre o trabalho de combinação das palavras escolhidas, em que as substituições podem ocorrer por contiguidade, equivalendo ao processo metonímico. (Dor, 1991).
4 Segundo Roudinesco e Plon (1998), o termo foi criado por Lacan para designar o significante da função paterna, função de interdição do desejo materno e inscrição da lei da castração e da falta.
5 Lacan se apropria desse termo usado por Ernest Jones, mas com diferente significação. A definição de Jones indicava o desvanecimento do desejo, enquanto, para Lacan, o conceito remete ao "desaparecimento da condição de sujeito, em função e em virtude daquilo que o constitui como tal" (Harari, 1990, p. 239).