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Avaliação Psicológica

Print version ISSN 1677-0471On-line version ISSN 2175-3431

Aval. psicol. vol.15 no.2 Itatiba Aug. 2016

 

 

Revisão de pesquisas brasileiras sobre o Teste de Zulliger publicadas em artigos

 

Literature review of Brazilian research about the Zulliger Z Test

 

Repaso de investigaciones brasileñas acerca del Teste Zulliger publicadas en artículos

 

 

Jucelaine Bier Di Domenico Grazziotin1; Silvana Alba Scortegagna1

Universidade de Passo Fundo

 

 


RESUMO

A escolha de instrumentos psicológicos que possam fornecer dados confiáveis sobre o funcionamento psíquico do indivíduo e os sofrimentos aos quais esteja exposto é condição ética indispensável para o exercício profissional. À luz desse pressuposto, este estudo objetivou verificar o uso do teste de Zulliger no cenário brasileiro considerando os propósitos das investigações e as diferentes faixas etárias, no período de 2004 a 2014. Por meio do método Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses (PRISMA), foram encontrados 15 artigos relacionados a estudos de normatização, validade e precisão, com a utilização do Zulliger no Sistema Compreensivo (73%) com indivíduos adultos (80%), crianças (20%) e idosos (13%). Os resultados mostram que embora o número de publicações tenha se expandido, são escassos os trabalhos de investigações com o uso do instrumento, especialmente com crianças e idosos, o que deve ser incentivado.

Palavras-chave: avaliação psicológica; teste projetivo; validade; Zulliger.


ABSTRACT

A choice of psychological tools that can provide reliable data on an individual’s psychological functioning and the suffering to which one has been exposed is an indispensable ethical condition for professional practice. In light of this assumption, this study aimed to verify the use of the Zulliger Z Test in the Brazilian context, considering the purposes of the investigation and the different age groups, between 2004 and 2014. Through the Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses method (PRISMA), we found 15 articles related to standardization studies, validity and accuracy, with the use of Zulliger in the Comprehensive System (73%), with adults (80%), children (20%), and the elderly (13%). The results show that although the number of publications has expanded, there is little research work using the instrument, especially with children and elderly, which should be encouraged.

Keywords: psychological assessment; projective test; validity; Zulliger.


RESUMEN

La elección de instrumentos psicológicos que puedan fornecer datos confiables acerca del funcionamiento psíquico de la persona y los sufrimientos a los cuales esté expuesto, es condición ética necesaria para el ejercicio profesional. Bajo este supuesto, este estudio tiene como objetivo verificar el uso del Test de Zulliger en el escenario brasileño considerando las intenciones de las investigaciones y las distintas franjas de edad, entre el periodo de 2004 a 2014. A través del método Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses (PRISMA), fueron encontrados 15 artículos relacionados a estudios de regulación, validez y precisión, en la utilización del Zulliger en el Sistema Comprensivo (73%) en personas adultas (80%), niños (20%) y mayores (13%). Los resultados muestran que aunque el número de publicaciones sea grande, son pocos los trabajos de investigación que utilizan el instrumento, especialmente con niños y mayores, lo que debe ser fomentado.

Palabras-clave: evaluación; test proyectivo; validez; Zulliger.


 

 

Em 1948, a partir do método de Herman Rorschach, Hans Zulliger, um psicólogo suíço, desenvolveu o teste de Zulliger para avaliação da personalidade. Em seu trabalho como psicólogo das forças armadas na Suíça, constatou a necessidade de dispor de técnicas de avaliação psicológica que pudessem ser aplicadas com maior celeridade, para a realização de seleção de oficiais.

Então, em 1942, Zulliger realizou experiências com novas manchas de tinta em diversos grupos e concluiu o trabalho com três cartões, aplicados a 800 pessoas. Foi então, estruturada a técnica de aplicação coletiva, denominada de Zulliger Diapositive – Test, em 1948, e para o emprego individual definida de Der Zulliger Talfen test, em 1954 (Vaz, 2002; Zulliger & Salomon, 1970).

Desse período em diante, o instrumento construído por Zulliger, composto por três pranchas com manchas de tinta, é utilizado em avaliações da personalidade de forma coletiva ou individual. Por apresentar qualidades semelhantes ao Rorschach e oferecer uma aplicação e análise mais rápida, seu uso ganhou notoriedade nas avaliações em empresas e clínicas.

A análise das respostas permite inferir características psicológicas salientes. A primeira prancha combina tonalidades pretas e brancas e oferece dados sobre a capacidade de adaptação inicial da pessoa diante de uma situação nova. A segunda contém estímulos coloridos, verdes, marrons, e tonalidades claras e fortes de vermelho, e auxilia na compreensão dos aspectos afetivos do indivíduo. A última prancha assemelha-se à prancha III do Rorschach, sua configuração geral facilita a percepção de figuras humanas, e revela aspectos do relacionamento interpessoal, do potencial criativo e empático do indivíduo (Vaz, 2002; Villemor-Amaral & Primi, 2012).

O instrumento é usado sob diferentes denominações: Z-Teste (Rodrigues & Alchieri, 2009; Someonoff, 1990; Vaz, 2002); Teste Z (Zulliger & Salomon, 1970) e Teste de Zulliger (Mahmood, 1990; Villemor-Amaral & Primi, 2012). Também, não existe um único sistema para codificação e interpretação das respostas e, dentre os diversos disponíveis, destacam-se o de Klopfer (Candiani, 2004; Lucena, Hazboun, Martins, & Alchieri, 2010; Rodrigues & Alchieri, 2009) e o Sistema Compreensivo (ZSC) (Di Domenico-Grazziotin & Scortegagna, 2012, 2013; Ferreira & Villemor-Amaral, 2005; Franco & Villemor-Amaral, 2009, 2012a, 2012b; Villemor- Amaral & Cardoso, 2012; Villemor-Amaral & Machado, 2011; Villemor-Amaral, Machado, & Noronha, 2009; Villemor-Amaral & Quirino, 2013) que apresentam os principais estudos na última década.

O sistema Klopfer, desenvolvido por Bruno Klopfer em 1936, é um dos modelos norte-americanos que possibilita uma integração dos dados quantitativos e qualitativos, e que alia uma compreensão evolutiva e clínica do indivíduo (Vaz, 2002). Os estudos pioneiros do Zulliger com esse sistema datam da década de cinquenta (Maza, 1952) e as primeiras pesquisas brasileiras de validade referem-se à década de 1960. Destaca-se, nesse contexto, a de Macedo (1968), realizada com adolescentes, a de Xavier (1985), com a população infantil, e a de Primi, Guntert, e Alchieri (2002), com adultos.

A maior parte das pesquisas brasileiras foi realizada no sistema de Klopfer até 2004, mas a partir de 2005, o ZSC começou a ganhar popularidade. Esse sistema foi desenvolvido nos Estados Unidos, na década de 1970, por John Exner Jr., com o objetivo de obter uniformidade na aplicação, na codificação e na interpretação do Rorschach, de qualificar a comunicação entre os pesquisadores e reunir os aspectos positivos dos cinco grandes sistemas: Beck, Hertz, Piotrowzki, Rapapport/Shafer, Klopfer (Exner, 2003). Isso gerou unificação nas normas de codificação em linguagem comum e completo cruzamento das informações: a forma de organização cognitiva, as habilidades e dificuldades afetivas, a autopercepção e as relações interpessoais.

O ZSC é especialmente reconhecido no que diz respeito à interpretação do comportamento, na medida em que avalia não somente as dificuldades e os conflitos, mas também as habilidades e os recursos internos que uma pessoa dispõe para lidar com os problemas. Isso é possível em razão de gerar informações sobre a estrutura e a dinâmica psíquica da personalidade, envolvendo aspectos cognitivos, afetivos, interpessoais e de autoimagem (Exner, 2003; Franco & Villemor-Amaral, 2012b; Villemor-Amaral & Primi, 2012).

A notoriedade do Rorschach no Sistema Compreensivo (SC) motivou pesquisadores a desenvolver estudos para adaptar o ZSC (Brinkmann, 1998; Mattlar et al., 1990; Zdunic, 2003). Os primeiros registros acerca desses estudos datam da década de 1990 e, dentre os países que desenvolveram pesquisas para avaliar em que medida era possível extrapolar a aplicabilidade do Rorschach-SC e utilizar parâmetros normativos adaptados a diferentes populações, destacam-se a Inglaterra e a Finlândia (Mahmood, 1990; Matlar et al., 1990), a Itália (Liz, Rossi, & Rossi, 1990), o Chile (Brinkmann, 1998) e a Argentina (Zdunic, 2003). Nos últimos 10 anos, outros estudos foram realizados no Peru (Carpio & Lugón, 2011) e em Portugal (Fazendeiro & Novo, 2012).

No Brasil, considerando as diferenças culturais existentes entre os países e os avanços científicos quanto aos procedimentos de validação do teste, Franco, Cardoso, Villemor-Amaral, e Primi em 2009 (2012), conduziram o estudo de normatização do ZSC para a população brasileira, com amostras procedentes do estado de São Paulo, entre a faixa etária de 18 a 83 anos. A partir de então, os procedimentos de investigação da personalidade começaram a contar com parâmetros normativos para melhor direcionar a interpretação dos dados obtidos, o que contribuiu para asseverar o compromisso ético profissional com o indivíduo e a sociedade.

Não se pode deixar de destacar que a ciência e a prática da avaliação psicológica se expandiram muito nas duas últimas décadas. Esse fato se justifica por inúmeros motivos, entre os quais a forte relação entre pesquisas e instrumentos psicológicos, uma vez que elas se valem de instrumentos para observar construtos e validar as interpretações sobre o comportamento (Primi, 2010).

A avaliação psicológica, especialmente quando amparada no uso de instrumentos válidos, auxilia na compreensão do indivíduo e do contexto em que se insere. Entretanto, todo planejamento avaliativo deve respeitar as características dos indivíduos, possíveis comprometimentos, considerar as particularidades de cada segmento da população, como, por exemplo, eventuais diferenças existentes entre as faixas etárias e as etapas do desenvolvimento (Bastos-Formighieri & Pasian, 2012; Grazziotin, 2015; Villemor-Amaral & Quirino, 2013). Além de atentar-se para as particularidades das pessoas e de aspectos da formação profissional qualificada, é necessário observar as características do próprio instrumento, como a fundamentação teórica, o sistema interpretativo sobre os elementos da pauta da investigação, normatização, precisão e validade (Koich, 2014; Nunes, 2011; Nunes & Primi, 2010; Primi, Muniz, & Villemor-Amaral, 2012).

Tanto do contexto internacional (Butcher, 2010) quanto brasileiro (Koich, 2014; Wechsler et al., 2014), a aplicação dos métodos projetivos na avaliação da personalidade tem sido reconhecida. Apesar dos avanços alcançados e do estudo da personalidade ser considerado uma das áreas mais consolidadas da Psicologia, não se pode acreditar que ela se encontra em nível de excelência, sobretudo quando comparada às potências internacionais (Noronha & Reppold, 2010; Wechsler et al., 2014).

Em se tratando do teste de Zulliger, apesar da sua importância na avaliação da personalidade em diversos contextos, não foi encontrado nenhum estudo de revisão de literatura que abordasse, especificamente, a sua utilização. Aliado a isso, Grazziotin (2015) e Gregoleti (2015) ressaltam a necessidade de estudos com Zulliger em adultos mais velhos, em razão do envelhecimento da população estar aumentando consideravelmente. Sendo assim, o objetivo desta revisão é verificar os artigos publicados com o uso do teste de Zulliger no cenário brasileiro, considerando as diferentes faixas etárias e os seus propósitos.

 

Método

O presente estudo seguiu as recomendações propostas pelo Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses PRISMA (Moher, Liberati, Tetzlaff, Altman, & PRISMA, 2009). Como critérios de elegibilidade, foram incluídos todos os artigos publicados com crianças, adolescentes, adultos e idosos que tivessem utilizado o teste de Zulliger. Excluíram-se estudos estrangeiros e os que apenas citavam o teste de Zulliger, mas não o utilizaram como instrumento de avaliação psicológica. O desfecho avaliado foi a pertinência da utilização do Zulliger no processo de avaliação psicológica em diferentes faixas etárias.

Estratégia de busca

Para realizar este trabalho foi feito um levantamento (entre os meses de julho e dezembro de 2014) dos artigos científicos brasileiros completos que utilizaram o teste de Zulliger, publicados entre janeiro de 2004 e dezembro de 2014. A razão da escolha desse período foi para abranger publicações de ao menos uma década considerada representativa da produção mais recente. A análise dos estudos envolvendo o desfecho pretendido foi efetuada nas bases de dados da PePSIC, Index Psi periódicos e LILACS via Biblioteca Virtual em Saúde – Psicologia Brasil (BVSPsi Brasil). A escolha dessas bases de dados deveu-se a sua pertinência e abrangência no que diz respeito ao tema de investigação proposto. Além disso, conduziu-se uma busca manual nas referências de estudos publicados sobre o instrumento. Os termos ¨Zulliger” e “teste de Zulliger”, em língua portuguesa, foram utilizados como descritores.

Seleção dos estudos e extração dos dados

Os títulos e resumos de todos os artigos identificados pela estratégia de busca foram avaliados, independentemente, pelas autoras deste estudo. Todos os resumos que não forneceram informações suficientes sobre os critérios de inclusão e exclusão foram avaliados na íntegra e selecionados de acordo com os critérios de elegibilidade. As referidas autoras conduziram de forma individual, a extração dos dados no que diz respeito às características metodológicas dos estudos, características dos participantes, características do teste e desfecho.

 

Resultados

Os resultados da busca nas bases de dados no período de janeiro de 2004 a dezembro de 2014 totalizaram 31 publicações. Após a leitura dos resumos, 12 estudos foram excluídos por estarem duplicados entre as bases, três por não contemplarem amostras brasileiras e um por não utilizar o Zulliger como instrumento de avaliação psicológica. Desse modo, na Figura 1 são apresentados os critérios de inclusão.

A leitura e a análise de todos os artigos, na íntegra, possibilitaram a verificação e a sistematização dos dados em vários elementos de investigação, separados em aspectos formais e de conteúdo. Na Tabela 1, são apresentados os artigos publicados com o teste de Zulliger datados de 2004 a 2014.

Como pode ser observado na Tabela 1, o número de publicações na área no período de 2004 a 2014 foi de 15 artigos, com maior concentração a partir de 2009. Nos anos que antecederam, entre 2004 e 2008, houve apenas dois artigos publicados (13%) e, entre 2009 e 2014, ocorreram 13 publicações (87%).

Entre os instrumentos psicométricos utilizados em associação com o teste de Zulliger, observa-se o uso de entrevistas e/ou questionários, em quatro artigos (Ferreira & Villemor-Amaral, 2005; Lucena et al., 2010; Rodrigues & Alchieri, 2009; Villemor-Amaral et al., 2009); utilização de instrumentos neuropsicológicos como a Escala de Inteligência Wechsler para Adultos (WAIS III), Lista de Rey, o Miniexame do Estado Mental (MEEM) em um artigo (Coelho, Bastos, Camara, & Landeira-Fernandez, 2010); medidas diagnósticas com o uso da entrevista clínica semiestruturada (SCID-I) em um artigo (Franco & Villemor-Amaral, 2012a); escalas psicométricas de habilidade social como o IHSDel Prette em dois artigos (Di Domenico-Grazziotin & Scortegagna 2012, 2013); instrumentos gráficos, como o Teste de Criatividade Figural Infantil, em um artigo (Tavella & Villemor-Amaral, 2014).

 

 

 

 

A aplicação do teste de Zulliger combinada a outros instrumentos projetivos, como as Pirâmides Coloridas de Pfister (TPC), foi constatada em três artigos (Franco & Villemor-Amaral, 2009, 2012b; Villemor-Amaral & Quirino, 2013); e com o Método de Rorschach-SC, também, em três artigos (Franco & Villemor-Amaral, 2012a; Villemor-Amaral & Cardoso, 2012; Villemor-Amaral & Machado, 2011). Em relação aos parâmetros interpretativos mais utilizados, destaca-se o Sistema Compreensivo, com 11 ocorrências (73%), seguido do sistema Klopfer, presente em três trabalhos (20%).

No que diz respeito às características dos participantes e aos objetivos das investigações, foram encontrados apenas três artigos (20%) publicados com a população infanto-juvenil. O primeiro, de Rodrigues e Alchieri (2009), utilizou o Zulliger no sistema Klopfer para investigar a afetividade de crianças com síndrome de Down. O segundo, de Villemor-Amaral e Quirino (2013), empregou o ZSC, com não pacientes e buscou verificar a validade do instrumento por meio da correlação entre respostas do ZSC e do TPC. O terceiro, de Tavella e Villemor-Amaral (2014), utilizou o ZSC para verificar aspectos cognitivos, afetivos e de criatividade. Percebe-se que diferentemente do que ocorre a respeito da população infanto-juvenil, o maior número de publicações é voltado à população adulta.

O período de 2004 a 2014 aponta 12 artigos com participantes na faixa etária adulta (80%), sendo que seis publicações (40%) não ultrapassam 47 anos de idade. Entre os que investigaram a precisão do teste de Zulliger, destaca-se o estudo de Candiani (2004) com participantes de até 30 anos de idade, com a utilização do sistema Klopfer, e o de Villemor-Amaral et al. (2009), com indivíduos de até 47 anos, utilizando-se do ZSC. Os demais estudos versam sobre a validade do ZSC, no contexto empresarial com indivíduos de até 43 anos de idade (Di Domenico-Grazziotin, & Scortegagna, 2012, 2013; Ferreira & Villemor-Amaral, 2005) e, no contexto clínico, da toxicomania, com pessoas até 45 anos de idade (Franco & Villemor-Amaral, 2012b).

O número de publicações com amostras de adultos de até 60 anos ou próximos a essa idade foi menor do que aquelas cujos trabalhos foram desenvolvidos a partir do estudo com adultos jovens. Pode ser observada a ocorrência de quatro publicações (27%), das quais, o primeiro artigo (Lucena et al., 2010), investiga aspectos psicossociais e de personalidade, com o uso do Zulliger no sistema Klopfer, com indivíduos de até 60 anos de idade. Os demais estudos foram desenvolvidos no Sistema Compreensivo: Villemor-Amaral e Machado (2011) buscaram verificar se os indicadores do DEPI do Rorschach se aplicam ao Zulliger com pessoas de até 57 anos de idade; Franco e Villemor-Amaral (2012a) verificaram se as constelações do Rorschach se adaptam ao Zulliger, envolvendo indivíduos de até 60 anos de idade; Villemor-Amaral e Cardoso (2012) verificaram a validade da variável EB no Zulliger, com a população de adultos em idades variadas.

Dentre as publicações que contemplam trabalhos realizados com a inclusão de idosos, foram encontrados somente dois artigos (13%). O primeiro, de Franco e Villemor Amaral (2009), teve por objetivo correlacionar indicadores afetivos e cognitivos do ZSC e TPC. O estudo abrangeu a ampla faixa etária entre 19 e 83 anos. O segundo, de Coelho et al. (2010), buscou analisar o desempenho em outros testes neuropsicológicos (WAIS III, lista de Rey, MEEM), não sendo, por conseguinte, o teste de Zulliger, o principal foco de estudo. Foram utilizados 20 prontuários de pacientes com idade de 60 anos e mais. É interessante assinalar que apesar dessa ferramenta ter sido validada para a faixa que abrange a população de idosos, as pesquisas voltadas a essa população são praticamente inexistentes.

 

Discussão

Embora o número de publicações na área da avaliação psicológica tenha se expandido, observa-se que ainda são escassos os artigos que contemplam o Zulliger. A existência de algumas lacunas que deflagram esse cenário merece ser discutida. Em 10 anos (2004-2014) constatou- se 15 artigos, apenas dois referentes ao período de 2004 a 2008, com um aumento no número de trabalhos entre 2009 e 2013, especialmente em 2012, com o uso do instrumento no Sistema Compreensivo.

Esse resultado deve-se, possivelmente, ao fato dos estudos de normatização e validade do ZSC para a população brasileira terem sido realizados recentemente, em 2009. Tal acontecimento registra um marco importante a nível nacional e no contexto da avaliação psicológica, uma vez que é um sistema amplamente reconhecido por integrar diversos aspectos da personalidade em um só método e por unificar a comunicação entre pesquisadores (Exner, 2003; Mahmood, 1990; Matlar et al., 1990).

Um aspecto que enriquece os estudos realizados com o Zulliger diz respeito ao fato de que foram seguidos por pesquisas de validade e de precisão. Tais estudos podem ser verificados nos diversos contextos e na busca de compreender dinâmicas de psicopatologias e estilos de personalidade (Candiani, 2004; Ferreira & Villemor- Amaral, 2005; Villemor-Amaral et al., 2009; Villemor- Amaral & Machado, 2011; Di Domenico-Grazziotin & Scortegagna, 2012, 2013; Franco & Villemor-Amaral 2012a, 2012b; Villemor-Amaral & Cardoso, 2012; Lucena et al., 2010). Isso demonstra esforços dos psicólogos brasileiros em atender às normas estabelecidas pelo Conselho Federal de Psicologia em 2001, para garantir a qualidade dos testes (Wechsler et al., 2014).

A associação do Zulliger com outros instrumentos validados para a população e o contexto estudado, com resultados positivos, igualmente asseguram a sua relevância. Estudos com o Rorchach SC (Franco & Villemor-Amaral, 2012a; Villemor-Amaral & Cardoso, 2012; Villemor-Amaral & Machado, 2011), o IHS-Del Prette (Di Domenico-Grazziotin & Scortegagna, 2012, 2013) e o Pfister (Franco & Villemor-Amaral, 2009, 2012b; Villemor-Amaral & Quirino, 2013) são destacados.

No entanto, é interessante observar que embora a literatura aponte a ocorrência de estudos nacionais do Zulliger com crianças a partir da década de 1980 (Xavier, 1985) e com adolescentes a partir de 1960 (Macedo, 1968), foram raras as publicações com o instrumento voltadas a essa faixa etária no período analisado (2004-2014). Essa questão, possivelmente se deve ao fato do ZSC, o qual teve o maior número de publicações nos últimos 10 anos, ainda não estar validado para essa faixa etária.

Esse resultado aponta para a necessidade de se conduzir esses estudos, uma vez que, também, são restritos os instrumentos projetivos válidos para a avaliação psicológica de crianças. Alia-se a isso o fato de, na infância, insurgirem conflitos, os quais podem se tornar cada vez mais complexos na adolescência, e o teste de Zulliger, por suas características lúdicas, fortalecidas pela presença das manchas de tinta com diversas tonalidades e cores, poder facilitar o processo avaliativo (Villemor-Amaral & Quirino, 2013; Tavella & Villemor-Amaral, 2014).

Contudo, há de se considerar que a ausência de parâmetros normativos do Zulliger para a população infantil no Brasil e em outros países, limita a sua utilização. Outras dificuldades operacionais do teste dizem respeito a necessidade de autorização dos responsáveis legais pela criança para a sua aplicabilidade, além de ser mais trabalhoso evidenciar a validade das técnicas projetivas quando comparado às objetivas.

Em relação aos resultados encontrados sobre os artigos publicados com a população adulta, podem-se fazer algumas reflexões. Primeiramente, é importante assinalar que a quantidade mais significativa de publicações (11 artigos) inclui adultos jovens, fato justificado, possivelmente, pelo desenvolvimento histórico do instrumento.

O surgimento do teste de Zulliger deu-se pela necessidade de fazerem-se avaliações mais rápidas do que aquelas realizadas com a utilização do Rorschach, especialmente no contexto militar, organizacional e de seleção de pessoal (Brinkmann,1998; Fazendeiro & Novo, 2012; Primi et al., 2002; Someonoff,1990; Vaz, 2002; Villemor-Amaral & Primi, 2012; Zdunic, 2003; Zulliger & Salomon, 1970). Estudos de validade foram realizados no âmbito empresarial (Di Domenico Grazziotin & Scortegagna, 2012, 2013; Ferreira & Villemor-Amaral, 2005) e de precisão no contexto institucional (Candiani, 2004; Villemor-Amaral et al., 2009), com amostras de até 47 anos, média de idade de 30 anos.

Entretanto, percebe-se que à medida que a idade avança diminuem as publicações, sendo escassas aquelas que incluem participantes de 57 anos (Villemor- Amaral & Machado, 2011) e de 60 anos (Franco & Villemor-Amaral, 2012a; Lucena et al., 2010; Villemor- Amaral & Cardoso, 2012). Os estudos que incluíram indivíduos nessas faixas de idades referem-se principalmente a investigações clínicas (Lucena et al., 2010) e de adaptações do Rorschach SC ao ZSC (Franco & Villemor-Amaral, 2012a; Villemor-Amaral & Machado, 2011; Villemor-Amaral & Cardoso, 2012). A utilização do instrumento com idosos (de 60 anos ou mais) foi encontrada somente em dois artigos (Coelho et al., 2010; Franco & Villemor Amaral, 2009).

Diante desses resultados, ao menos duas considerações merecem ser feitas. Em primeiro lugar, o avanço da idade demanda outras necessidades e a quase inexistência de pesquisas com idosos com o uso de métodos projetivos como o Zulliger, deve ser destacado. Como uma técnica expressiva verbal, que permite de modo indireto obter informações sobre as características de personalidade, entende-se que ele pode ser um recurso útil capaz de auxiliar a compreender como o idoso lida com as mudanças físicas, cognitivas, afetivas, tanto na velhice saudável quanto associada às doenças crônicas ou agudas. Em segundo lugar, o destaque deve ser ratificado por não ser um achado totalmente novo.

Historicamente, no XIII Congresso Internacional de Rorschach e outras técnicas projetivas, realizado em Paris em 1990, Leopoldo Bellak já ressaltava o aumento da longevidade da população e a importância de se adaptar, normatizar, esses instrumentos para os idosos (Verdon, 2011). Recentemente, a necessidade do desenvolvimento de estudos para entender o complexo processo do envelhecimento, as demandas psicológicas envolvidas e direcionar medidas efetivas para essa população, também foi mencionada por outras pesquisadoras (Bastos-Formighieri & Pasian, 2012).

Como se pôde observar, além das características dos indivíduos, é preciso referenciar o instrumento, os parâmetros normativos, os estudos de precisão e de validade (Koich, 2014; Nunes, 2011; Nunes & Primi, 2010; Primi et al., 2012). Nesse cenário, os resultados dessa pesquisa evidenciaram alguns estudos do Zulliger (Franco et al., 2012; Primi et al., 2012; Vaz, 2002; Villemor-Amaral & Primi, 2012) sendo imprescindível que ocorra um avanço, especialmente com o prosseguimento de pesquisas tanto normativas quanto de precisão e validade com a população infantil e de idosos.

A utilização do ZSC também poderia ser ampliada para o âmbito coletivo, com o incremento desses estudos, conforme vem sendo apreciado no âmbito internacional (Fazendeiro & Novo, 2012). Ademais, nota-se que os estudos de validade do ZSC foram realizados fundamentalmente na região sudeste do Brasil, o que leva a sugerir a condução de pesquisas em outras regiões e estados do país.

Indo um pouco além, na era da globalização, a Psicologia pode contribuir substancialmente para entendimento alargado dos padrões de personalidade transcultural. Um imperativo da avaliação da personalidade é que os instrumentos devem ser cuidadosamente avaliados e testados para a utilidade e validade em outras culturas. Pode-se dizer que apenas um estudo com o Zulliger (Franco & Villemor-Amaral, 2012b) contempla, em parte, essa questão. Sugere-se o incremento de investigações voltadas para esse objetivo.

O seguimento da busca do refinamento das qualidades psicométricas do instrumento deve, ainda, ser fomentado em áreas diversas. Por exemplo, no contexto forense, em função do aumento da demanda (Butcher, 2010) e pela falta de estudos com o uso do teste, associado a outras técnicas. Em se tratando do Sistema Compreensivo é preciso instituir a nota Z, que se encontra estabelecida nos parâmetros normativos da Argentina (Zdunic, 2003), mas que no Brasil não possui dados suficientemente consistentes em termos quantitativos, sendo sua análise feita de maneira qualitativa. Além disso, é preciso organizar novas proporções das variáveis que compõem o Tipo de Vivência EB (Villemor-Amaral & Cardoso, 2012), garantindo maior confiabilidade a esse indicador.

Portanto, ao atingir o objetivo proposto, esta revisão sobre as publicações de artigos brasileiros com o uso do Zulliger mostrou-se relevante ao trazer informações sobre o desenvolvimento histórico da utilização do instrumento na última década, apontar lacunas, e direcionar caminhos para novos estudos. No entanto, algumas limitações precisam ser explicitadas. Entre elas, a inclusão de apenas estudos em português, de não terem sido consultados documentos como dissertações e teses, de capítulos de livros, bem como os dados da literatura de anais de congressos. Trabalhos futuros poderiam estender essa investigação abordando as regiões do Brasil em que os estudos foram realizados e relacionar as revistas em que foram publicados.

 

Referências precedida de um asterisco indicam estudos incluídos na revisão

Referências

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recebido em setembro de 2015
reformulado em fevereiro de 2016
aprovado em março de 2016

 

 

Sobre os autores

Jucelaine Bier Di Domenico Grazziotin: é psicóloga, mestra em Envelhecimento Humano pela Universidade de Passo Fundo-RS e especialista em Avaliação Psicológica e Gestão Empresarial pela mesma instituição.
Silvana Alba Scortegagna: é psicóloga, doutora em Psicologia pela Universidade São Francisco – Itatiba, SP, e docente dos Programas de Pós-Graduação em Envelhecimento Humano e em Administração, da Universidade de Passo Fundo-RS.


1Endereço para correspondência: Universidade de Passo Fundo, Programa de Pós-Graduação em Envelhecimento Humano, BR 285, Caixa Postal 611, Bairro São José, 99052-900, Passo Fundo-RS. E-mail: jucelainegraz@terra.com.br, silvanalba@upf.br


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