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Psicologia em Revista

Print version ISSN 1677-1168

Psicol. rev. (Belo Horizonte) vol.17 no.1 Belo Horizonte Apr. 2011

 

ARTIGOS

 

Chicanas da travessia adolescente

 

Chicanes of adolescent's traverse

 

Ardidez de la travesía adolescente

 

 

Ângela VorcaroI*; Carla CapanemaII**

IFafich/Universidade Federal Minas Gerais.
IIUniversidade Federal Minas Gerais.

 

 


RESUMO

O texto considera a diacronia do trajeto de infans a sujeito por meio do entrecruzamento em trança das três dimensões da realidade psíquica: real, simbólico e imaginário. O acontecimento estruturante do encontro com o real na adolescência reorienta a trançagem R, S, I, sendo o momento em que é possível a hipótese da constituição de um quarto elo, na função de reamarração, que nomeia com a própria singularidade um dos elos anteriores. Como hipótese de trabalho, esta proposta deverá submeter-se à clínica.

Palavras-chave: constituição do sujeito, nó borromeano, adolescência, psicanálise, sinthoma.


ABSTRACT

This text considers the diachronic path from infans to subject through the intersection braid in the three dimensions of psychic reality: Real, Imaginary and Symbolic. The structurant event of the encounter with the real in teenage period reorients the R, S, I, braiding, being this the moment in which is possible to think in the hypothesis of formation of a fourth link by the re-binding function, that nominates one of the previous links according to the its own singularities. As a working hypothesis, this proposal should be submitted to the clinic.

Keywords: constitution of the subject, borromean knot, adolescence, psychoanalysis, symptom.


RESUMEN

El texto considera la diacronía del trayecto de infans a sujeto por medio del entrecruzamiento de las tres dimensiones de la realidad psíquica: Real, Simbólica e Imaginaria. El acontecimiento estructurador del encuentro con lo real en la adolescencia reorienta el cruce R,S,I, constituyendo el momento en que es posible la hipótesis de la constitución de un cuarto eslabón, con la función de reanudar, que nombra con la propia singularidad uno de los eslabones anteriores. Como hipótesis de trabajo esta propuesta debe someterse a clínica.

Palabras clave: constitución del sujeto, nudo borromeo, adolescencia, psicoanálisis, síntoma.


 

 

Introdução

A realidade psíquica de um sujeito qualquer pode ser considerada, com Lacan, no espaço topológico que permite configurá-la por meio da trançagem das dimensões real, simbólica e imaginária. Estas, a despeito de serem sincrônicas, afetam diacronicamente o sujeito em constituição. Sustentamos, no artigo "Desastre e acontecimento na realidade psíquica" (2011), a trajetória do ser desde o nascimento até a sua subjetivação edípica. Na continuidade descontínua que propomos a seguir, consideramos os efeitos da latência, puberdade e da adolescência sobre o sujeito edípico, até que uma estrutura se estabilize e permita destacar uma modalidade singular de gestão do gozo.

 

Latência ou o real da temporalidade

Mais do que uma manifestação fenomenológica da sexualidade, a transposição da masturbação para a realização do ato sexual, operada na passagem da criança ao adulto, a latência implica o tempo para compreender a castração. O tempo, chamado por Freud de latência, exige a consideração de sua incidência como presença do real na estrutura que traz uma lógica que não prescinde da diacronia. E poderemos constatá-la.

Freud introduziu nos "Três ensaios sobre a teoria sexual" o que até hoje se mantém como ponto de impasse entre os adeptos da concepção de sincronia da estrutura do sujeito. Assim se expressou Jacques-Alain Miller (1992, p. 9-10) ao se referir ao significante criança:

Essa vocação de dissolver a criança, é a dificuldade que introduz esta perspectiva lacaniana. Do ponto de vista do inconsciente, se tomarmos a fórmula freudiana de que este não conhece o tempo, pode-se pensar que o inconsciente não conhece a criança tampouco. Assim, a criança seria uma denominação cronológica e quando se é partidário da perspectiva estruturalista, não se pode sustentar que a criança existe.... Há uma definição de criança: é o sujeito cuja libido não se deslocou dos objetos primários. Não vou dizer que é uma excelente definição, mas na libido não é indiferente o fator temporal.

Trata-se da interrogação sobre a condição estrutural da subjetivação e os percalços da temporalidade real, cujas marcas localizam a constituição do sujeito. Apesar de atribuir muita importância à latência e à puberdade, localizando a constituição plena do sujeito apenas na puberdade, Freud afirma que o essencial está cumprido com o Édipo, por volta dos cinco anos:

A inclinação infantil para seus pais é, sem dúvida, a mais importante, porém não a única, das sendas que, renovadas na puberdade, marcam o caminho para a escolha de um objeto. Outros pontos de partida com a mesma origem possibilitam ao homem, apontando-lhe sempre da sua infância, desenvolver mais de uma série sexual e plasmar condições totalmente variadas para a eleição de objeto (Freud, 1989, p. 235-236).

Nem por isso Freud deixa de abordar a latência como fator que nomeia como constitucional:

Durante esse período de latência total ou apenas parcial, se edificam os poderes anímicos que mais tarde se apresentarão como inibições no caminho da pulsão sexual e, ao modo de diques, restringirão seu curso (a repugnância, o sentimento de vergonha, as exigências ideais na estética e na moral). Na criança civilizada tem-se a impressão de que o estabelecimento desses diques é obra da educação, e sem dúvida ela contribui muito. Porém, na realidade, essa experiência é de condicionamento orgânico, fixado hereditariamente e pode ocasionalmente ocorrer sem qualquer auxílio da educação (Freud, 1989, p.180-181).

Enfim, Freud afirma literalmente o que permite localizar o caráter bifásico da sexualidade. Nos acréscimos feitos aos "Três ensaios", em 1915, encontraremos outras maneiras de apresentar a questão dos "dois tempos da escolha de objeto":

O seguinte processo pode reclamar o nome de típico: a escolha de objeto se realiza em dois tempos, em duas ondas. A primeira se inicia entre 2 e 5 anos, e o período de latência a detém ou a faz retroceder: se caracteriza pela natureza infantil de suas metas sexuais. A segunda sobrevém com a puberdade e determina a conformação definitiva da vida sexual.... A eleição de objeto da época da puberdade tem que renunciar aos objetos infantis e começar de novo como corrente sensual (Freud, 1989, p. 206).

Na infância, a criança é inscrita primeiramente como objeto do Outro. Dessa perspectiva, como diz Nominé (1999)1, ela é um brinquedo erótico para os pais e goza dessa posição em que é colocada, mas não detém nenhum saber articulado sobre o gozo nesse lugar em que é posicionada. É o que permite dizer que a sexualidade infantil é polimorfa: ela desconhece a finalidade e as modalidades da reprodução sexual.

Não tem acesso nem ao ato sexual nem ao ato discursivo porque, por um lado, a despeito da exigência pulsional, sua condição orgânica impõe uma impossibilidade de realização. Por outro, apesar da exigência do laço social de que fale, sua fala não tem estatuto jurídico, não é reconhecida num estatuto discursivo. Portanto, se a criança goza na infância, é sem domínio do saber sobre o gozo e é o que permite a construção fantasmática em que, a despeito de responder a uma falta do grande Outro, a criança não tem domínio do seu ato.

A sexualidade adulta supõe o encontro com o outro sexo e o saber sobre a procriação. Essa condição de saber sobre o gozo é o que implica no sujeito a responsabilidade sobre seu ato. Entre a sexualidade da criança e a sexualidade adulta, temos o período de latência em que a sexualidade infantil é abandonada, esquecida, e o sujeito trabalha sua inclusão no campo do saber.

O período de latência é condição estrutural necessária à separação entre gozo e saber, é o tempo para compreender a castração a que todo sujeito está submetido. Na latência, a criança procura os meios de responder à existência da falta de saber do Outro, descobrir uma posição em que possa situar um saber em relação à alteridade.

Assim, a aquisição de conhecimento operada pela sua educação conduz a criança a deslocar-se de um gozo autoerótico para enlaçar-se nas modalidades de gozo que o campo social ordena, por meio do aparelhamento que a linguagem produz. O sujeito sai assim da posição infantil em que é objeto de um Outro para construir seu próprio mito em que o grande Outro é não todo, por meio das articulações e hiâncias significantes que o tesouro cultural lhe oferece. É o que permite ao sujeito adolescente estabelecer as condições de gozo sabendo e, portanto, podendo assumir a responsabilidade por seus atos.

Nessa perspectiva, a adolescência é um momento de passagem estrutural em que o sujeito olha por trás de seu período de latência para saber do gozo perdido na infância, aparelhando-se para o gozo no encontro com o outro sexo. Olhar por trás da latência permite confrontar-se à desmontagem da promessa edípica construindo outra versão de sua realização.

Na primeira parte deste trabalho (Vorcaro & Capanema, 2011), traçamos o percurso em que o sujeito se inscreve no simbólico que lhe preexiste. Afinal, do investimento fálico da alteridade na criança, orienta-se a incidência da ordem significante na dinâmica que se instaura a partir da função imaginária do falo, promotora da operação metafórica do Nome-do-Pai que permite ao sujeito evocar a significação do falo (Leite, 1993). Dessa forma, o sujeito carrega o verso da causa que o fende, causa que é o significante que lhe permite inscrição pela perda, que só existe depois que essa simbolização lhe indica o lugar. Entre a experiência da atribuição fálica e sua significação, temos, assim, o lapso da trançagem entre real, simbólico e imaginário. Tal lapso não é apenas contingência temporal, mas, também, formação do inconsciente, na estrutura temporal reversiva em que a castração retroage ao recalcamento originário para lhe conferir significância, no aprés-coup que promove a articulação circular, mas não recíproca.

Se essa trança ordena a estruturalidade de um sujeito constrangido pelas dimensões real, simbólico e imaginário, seus movimentos não se superam, eles se mantêm no constrangimento que os enlaça. O que foi considerado no trançamento como linhas, implicará a retroação que lhe confere sua condição circular. Afinal, as três dimensões se repetem, são incessantes e indestrutíveis, fazem incidir lei e desejo numa determinação recíproca que constrange e sustenta, no sintoma e no fantasma, as condições de gozo de um sujeito, ou seja, sua realidade psíquica, orientada pela versão paterna.

Por isso, o nó borromeano não é a norma para a relação de três funções. R, S, I só incidem num exercício determinado pela versão da nominação paterna, ou seja, o nó borromeano é sempre pai-vertido. O constrangimento que os mantém ligados é sempre enigmático. Essa tripartição tracionada pela relação que a sustém aloca o ponto central, onde se encurralam os cruzamentos de R, S, I. Demarca-se aí a causa vazia da realidade psíquica de um sujeito desejante: o objeto que viria satisfazer seu gozo, mantémse irredutivelmente alhures, é um objeto insensato do qual não há ideia. Atribui-se a tal objeto uma letra:

Não há nada no inconsciente,..., que com o corpo faça acordo. O inconsciente é discordante.... O sujeito é causado por um objeto que só é notável por uma escritura.... Abstração radical escrita com a figura de escritura a da qual nada é pensável. Tudo que é sujeito, sujeito de pensamento que se imagina ser Ser, é determinado pelo a (Lacan, 1974-75).2

 

A nodulação RSI na adolescência

Sônia Alberti (1996, p. 56) afirma que o interesse pela adolescência cresceu a partir do século XIX por meio da literatura, e iniciou-se o movimento "Sturm und Drang", traduzido por ela como "tempestade e pressão". Para a autora, esse movimento retratou a adolescência como um "tempo de tormenta que tem que passar". Anos mais tarde, a psicanálise criou conceitos para lidar com o adolescente, que vão desde a fragilidade egoica até a genitalização da sexualidade, passando por todo tipo de melancolia, perversão e pela tendência a agir.

Freud dedica um capítulo para tratar das transformações da puberdade e sua consequência final: a mudança da sexualidade autoerótica para a que encontra um objeto sexual. Essas transformações repercutem em vários segmentos da vida do jovem, a partir das mudanças na genitália e no crescimento corporal, ligando a pulsão sexual à função reprodutora. A puberdade é, para Freud, "a travessia de um túnel perfurado desde ambas as extremidades" (Freud, 1989, p. 195). Ele nos adverte sobre esse período conturbado, quando o jovem vivencia uma série de realizações psíquicas significativas e, também, uma das mais dolorosas: o desligamento da autoridade dos pais. Há uma reativação do complexo de Édipo por meio das fantasias incestuosas, agora reforçadas pela possibilidade da relação sexual. O adolescente tem de afrouxar os laços familiares para que possa encontrar outros objetos amorosos, que não os de sua infância.

Lacan nos faz lembrar a dimensão traumática da relação sexual. Para ele, o encontro da sexualidade na adolescência, mais do que fazer sentido, traz o malestar instalado diante do encontro com o sexo, que escapa a uma simbolização possível, deixando o sujeito "sem palavras" (Lacan, 2003a, p. 558).

Se, em Freud, os termos "puberdade" e "adolescência" eram utilizados indistintamente, na contemporaneidade a adolescência aparece como um conceito distinto, capaz de designar essa etapa específica da vida do sujeito. Atualmente, vários trabalhos em psicanálise precisam essa distinção. A puberdade é considerada como a época da emergência da genitalidade, na qual temos um despertar pulsional, e a adolescência como a subjetivação dessas transformações, o modo como o sujeito responde a essa irrupção de libido (Stevens, 1998).

Muitas vezes, ela é vista pela sociedade como uma crise (a "crise da adolescência") associada a vários sintomas sociais (violência, agressividade, transgressão, toxicomania, etc.), fomentando discussões internacionais e a criação de normas e leis específicas, na tentativa de regular seus atos.

A equiparação entre adolescência e atuação não é novidade. Alguns psicanalistas têm trabalhado um fenômeno da adolescência nomeado de "tendência a agir", expressão introduzida por André Haim em 1971. Essa tendência é definida como algo que vem em resposta à descoberta das percepções corporais no adolescente (um estranhamento em relação ao próprio corpo) (Alberti, 1996, p. 28).

A "tendência a agir" aproxima-se da ideia, em criminologia, de uma irrupção dos instintos que derrubariam a barreira das forças morais, num transbordamento de libido. Esse conceito "biológico" mostra-se insuficiente para considerar as atuações na adolescência.

Somos advertidos por Lacan (1998) que não se pode pensar o crime fora de sua dimensão sociológica, pois não se trata de um "instinto"; o tipo de crime tem a ver com a lógica da sociedade. Para o autor, falar de um excesso de libido torna-se uma formulação desprovida de sentido, tratando-se mais de uma deficiência que de um excesso. Poderíamos inferir que essa deficiência mencionada por Lacan, mas não desenvolvida em seu texto, seria a própria degradação da função paterna na contemporaneidade?

Lacan (2003b) já falava do declínio social da imago paterna e do grande número de efeitos psicológicos decorrentes desse declínio. Freda (1996) evidencia a importância da figura paterna no processo de desligamento do jovem, pois, para esse autor, a crise da adolescência é a crise do pai. E essa crise faz nascer no jovem uma condição instável do sujeito, podendo-o levar à passagem do pensamento ao ato.

Os efeitos da incidência do adolescer na constituição subjetiva demonstramse contundentes. Na adolescência, a aquisição de compleição corporal e o encontro com o outro sexo possibilitam abordar diretamente o que, até então, restringia-se ao plano da fantasia e da expectativa, tornando-se realizável. Na temporalidade de seu adolescer, o sujeito constata, por seus atos e por suas inibições, que ele não equivale à posição que lhe foi atribuída por outro, seus referentes parentais, nem ao lugar que, ele mesmo, supunha ter. Nos hiatos de seus processos identificatórios, o sujeito realiza sua incomensurabilidade e se vê em posição de ter que contar consigo mesmo e constituir a credibilidade que o orienta nos laços sociais. O tornar-se crível para si mesmo, ainda que carregado dos aspectos ficcionais daí decorrentes, permite ao sujeito sustentar a perspectiva de posicionar, organizar, qualificar, classificar, equacionar, enfim, numa palavra, tratar essas decorrências do ato de nomear o campo da realidade que o afeta.

É por tais considerações que se pode localizar aí o enodamento entre as dimensões humanas do real, do simbólico e do imaginário, que Lacan (2007) nomeou como sinthoma estrutural do sujeito, ou seja, aquilo que esse sujeito constituiu e diferiu, a partir do processamento de suas identificações com os que, para ele, fizeram funções parentais. Esse sinthoma estrutural é a modalização singular inventada pelo sujeito, a que este se refere por nela crer, posto que constitui a rede de elementos tensionados que configuram sua constelação psíquica. Se Freud a nomeou "realidade psíquica", ela consiste, por seu perfil sempre singular, o que Lacan (2007) convencionou localizar por meio da expressão pluralizada Nomes-do-Pai.

As considerações de Jean-Jacques Rassial (1999) sobre a articulação entre o real, o simbólico e o imaginário na adolescência nos permitem estabelecer a hipótese de a passagem da criança ao adulto configurar o estabelecimento de um quarto elo na trança borromeana, distinguido por Lacan como sinthoma. Rassial (op. cit.) esclarece os constrangimentos do real, do simbólico e do imaginário na adolescência.

O real: sendo o corpo constituído no imaginário, apoiado no simbólico, a ocorrência da puberdade fisiológica marca a presença do real no corpo, pois implica a transformação que extrapola a imagem previamente concebida. O acontecimento do acidente do corpo joga o sujeito no mundo sob o modo de desamparo. Mas o real também incide com a constatação do impossível da relação sexual. A criança, até então sustentada na promessa de que, ao preço de uma renúncia provisória, teria acesso ao verdadeiro gozo, depara o fato de que, embora possa ter acesso à genitalidade, o objeto de seu desejo e o Outro não são reconciliados no ato sexual: o gozo sexual é parcial, e o real do fracasso o espreita. O aspecto catastrófico desse acontecimento é primário, e é sobre ele que o sujeito elabora respostas.

O imaginário: um novo desenvolvimento imaginário que sustente a imagem do corpo e a consistência do Outro, por meio de uma redistribuição do mundo objetal será necessário na adolescência, para que o sujeito não caia no real. O imaginário secreta seu limite egoico: a impotência. Para dar sentido à vida, é preciso pagar o preço de um dano irreparável à imagem infantil do corpo.

A ênfase na genitalidade leva o adolescente a dar ao Outro a consistência imaginária do Outro sexo. Entretanto, o Outro se configura sobre três avatares, na adolescência, seja ao voltar-se ao Outro do Outro (os pais dos pais, a tia, a genealogia e a história da família); seja atribuindo uma nova função de Deus, que garantiria esse lugar Outro (arrebatamentos místicos e religiões); seja na consideração da consistência da sociedade: atraente e ameaçadora, visada e rechaçada, numa direção política como engajamento utopista, mesmo que o mais tarde, o alhures ainda desempenhem seu papel de sutura na utopia.

O adolescente deve imaginariamente integrar os infinitos com os quais se defronta, devido à constatação da fragilidade dos alicerces que ordenavam para a criança. A consistência do Outro é exigida: mais solidez que os pais e capacidade de integrar a medida do infinito.

O simbólico: a mudança de posição na cadeia de gerações que localiza o adolescente como virtualmente pai. O sujeito passa da extensão mínima da cadeia simbólica à sua extensão máxima: há que por à prova que o microcosmo familiar não é fundador, é apenas uma fórmula imaginária delegada socialmente de uma estrutura simbólica e que o laço social é outra fórmula. Daí se funda o interesse pelas teorias, sistemas e a ideologia, denunciando as incoerências contradições internas do discurso ou contradições entre o dizer e o fazer.

O significante, o que representa o sujeito, é também posto em questão: daí as manifestações de apelidos, gírias, até o mutismo, pondo a prova o simbólico, interrogando o que quer dizer falar ou de modo performativo (juramentos, declarações de amor).

 

A ordem dos significantes é abalada em três níveis:

  • significante mestre: a submissão ao adulto, por meio da ordem parental, não mais garante a identidade, o desejo escapa dessa captação;
  • significante fálico: não garante uma relação válida com o outro sexo. Será preciso fundar a intersubjetividade aquém ou além desse significante;
  • Nome-do-Pai: não é mais sustentado pela relação familiar, vai ter que ser validado destacado do pai da realidade e de todo pai imaginário, podendo então se escrever no plural: a mulher, o sintoma, etc.

Enfim, na adolescência, o significante se confessa enganador, e o simbólico, frágil.

Momento lógico de apropriação do sintoma sexual, a operação que se efetua na adolescência obedece ao que é recalque secundário de representações insuportáveis para o eu, mas também vem completar, confortar, validar o impasse fundador do recalque originário, pois faz o sujeito entrar numa história possível, remetendo à pré-história (infância) os traços disso que o produz. Abre-se assim uma nova temporalidade, em que a adolescência enfim confirma que a presença do Outro não é segura, sendo que a efetivação da apropriação do sintoma sexual marca o fim do funcionamento psíquico da adolescência.

 

A construção do sinthoma

O nó borromeano dimensiona o ponto: os três círculos do nó determinam um ponto central, grafado com a letra a. Em cada uma das três dimensões que constituem a nossa realidade e das quais depende nossa representação, a consistência circular de cada elo do nó delimita os campos de "ex-sistência™: o fora que não é um não dentro. A "ex-sistência" se define pelo apagamento de toda consistência de sentido. Para que algo "ex-sista", é preciso situar buraco em cada um dos elos, pois só o buraco permite que cada elo se ate. Assim, diferentemente da noção filosófica de existência, a "ex-sistência", fragmentada por um hífen, em Lacan, torna-se tangível. A "ex-sistência" suporta-se do buraco de cada um dos elos R, S, I. Portanto, em cada um, a circularidade consistente que define o sentido de cada registro circunda seu buraco. Assim, a consistência do simbólico contorna o recalcado, a consistência do real admite o buraco, e a consistência do imaginário é vazada pelos orifícios corporais por onde transitam as pulsões (Vorcaro, 1997, 2009).

Os três termos R, S, I também se diferenciam, a título de "ex-sistência", a propósito do gozo que faz o real. À vista do real, o gozo é o que "ex-siste" ao sentido. O "ex-" é o que gira em volta do consistente e lhe faz intervalo, propiciando modalidades diversas do atar nesse intervalo.

O objeto a é o cerne do gozo que se sustenta com o nó borromeano. É o objeto só reconhecível pelos resíduos de seu esfacelamento em objetos pulsionais identificáveis corporalmente como manifestações do corpo:

O parceiro desse eu que é o sujeito, sujeito de qualquer frase de pedido é, não o Outro, mas o que vem se substituir a ele na forma da causa do desejo - que eu diversifiquei em quatro, no que ela se constitui diversamente, segundo a descoberta freudiana, em objeto da sucção, objeto da excreção, o olhar e a voz. É enquanto substitutos do Outro que esses objetos são reclamados e se fazem causa do desejo (Lacan, 1982, p. 171).

A insuficiência que qualquer gozo, que venha em suplência, implica é constrangimento imposto pelo objeto a enquanto o inatingido gozo a mais (mais-gozar), alocado no exterior mais central da escrita do nó borromeano.

O nó escreve as condições de gozo e permite contar os seus resíduos. Cada uma das intersecções entre os círculos notam as ramificações do gozo, por falta do gozo pleno que não há, em que o trabalho de operar as relações com o a se distingue: "a realidade é abordada com os aparelhos do gozo.... aparelho, não há outro senão a linguagem. É assim que, no ser falante, o gozo é aparelhado.... Isso quer dizer que o gozo é anterior à realidade (Lacan, 1982, p. 95).

Assim, a partir do ponto a, o planeamento do nó permite acrescentar três funções que trazem gozo. A extensão dessas modalidades de gozo implica o triádico freudiano, inibição, sintoma e angústia, considerado por Lacan como termos tão distintos quanto os registros R, S, I (Vorcaro, 1997). Assim:

- Função do sentido: na articulação de S com I. A extensão do sentido implica a inibição (no ponto em que algo do imaginário deixa de se imiscuir no simbólico). A inibição é sempre inibição de função corporal, concebida como parada de funcionamento imaginária no ser falante.

O nó resulta de algo que lhe é externo: o sentido, que se adquire ao se tomar essas letras como real, simbólico e imaginário. O termo sentido é reduzido por Lacan ao que há nele de mais próprio: nomeia alguma coisa. O sentido nomeia a "diz-mansão" dessas coisas vagas que se fundam no real.

Localizado na junção do imaginário com o simbólico e suportado pela "ex-sistência" correlata ao real, está o vago gozo do sentido, do corpo que fala: "se pensarmos que não há o Outro do Outro, ou pelo menos que não há gozo desse Outro do Outro, precisamos de fato fazer em alguma parte a sutura... tudo isso para fazer sentido" (Lacan, 2007, p. 70). O funcionamento significante enquanto reduzido à dimensão pura do simbólico é o registro do equívoco, já que é encadeamento de termos envergáveis em todos os sentidos. Na cadeia simbólica, os Uns "são todos feitos da mesma maneira, de não serem outra coisa senão Um" (Lacan, 1982, p. 194).

Esse funcionamento só é operante na interpolação do imaginário, que neles encontra equivalências, reciprocidades e dessemelhanças, produzindo valores designativos e assim permitindo, ao dizer, um laço que ultrapassa a mera jaculação de termos deslizantes um a um:

Na medida em que o inconsciente se sustenta nesta alguma coisa que é por mim definida, estruturada como o simbólico, é do equívoco fundamental com esta coisa que se trata, sob o termo simbólico.... O equívoco não é o sentido. O sentido é aquilo por que alguma coisa responde, é diferente do simbólico, e esta alguma coisa, não há meios de suportá-la senão a partir do Imaginário (Lacan, 1974-75).3

O sentido, somos reduzidos a imaginá-lo. Em seu parentesco com a boa forma, o sentido é o efeito desse funcionamento significante em que o imaginário lhe dá continuidade de substância: "o homem pensa com a ajuda das palavras. E é no encontro entre estas palavras e seu corpo que algo se esboça [...] ali se coloca o sentido (Lacan, 1973-74). O sentido é o curso, a direção do ciframento nas manipulações do pensamento que permitem a metáfora e a metonímia:

Não há trinta e seis sentidos que se descubram no extremo do inconsciente: é o sentido sexual, quer dizer muito precisamente o non-sens.... Este sentido sexual só se define por não poder se inscrever.... E a linguagem é feita assim. É alguma coisa que o mais longe que vocês cultivarem o ciframento não chegará jamais a abandonar o que é do sentido, porque ele está lá neste lugar. É o que faz com que a relação sexual não possa se escrever...4

O equívoco ou o tropeço que a linguagem permite jogam contra esse gozo de sentido que a linguagem também permite. A opacidade do sentido se deve a sua função de substituição à falta e, nessa medida de suplência, o sentido responde pelo real, "o próprio do sentido é que aí se nomeia alguma coisa, e isso faz surgir a diz-mansão, a diz-mansão dessa coisa vaga que são as coisas, e que tomam seu assento no real" (Lacan, 1974-1975)5. Na inibição, ocorre o estancamento do funcionamento imaginário em que o sentido se torna uma exterioridade ao corpo.

- Função do gozo fálico: no cruzamento R e S. A extensão do gozo fálico faz sintoma (esse efeito do simbólico no real que é signo de algo que não vai bem no real) (Lacan, 1974-75)6. O estatuto da noção de saber (dependente da continuidade fomentada pelas gerações e que domina desde a antiguidade) é interpelado por Lacan, com base na consideração do modo de saber do inconsciente como emergência de um saber próprio a cada um. Para Lacan, tocamos em uma forma completamente distinta de saber no real. O saber que aparece no buraco definido pela consistência do simbólico não se apresenta sob a forma de saber imanente ao real, ou seja, de que o real saberia o que fazer. O saber do real se define sob a forma da onipotência e sabedoria de Deus. Por isso o buraco suportado pela consistência do simbólico. Um saber supõe, necessariamente, a relação com o simbólico. Pode-se figurar o sintoma refletindo o real: é algo que não funciona, mas se mantém da linguagem. O sintoma é definido pelo gozo que o inconsciente de cada um determina. Para Lacan, a noção de sintoma foi estabelecida por Marx, ao analisar os efeitos do capitalismo: despojamento do homem que reduz sua essência a nada, produzindo a crença de ser o messias do futuro. Considerando incontestável a relação do sintoma com a fé do homem, Lacan substitui a crença do homem em veicular um futuro ideal, pelo homem crente: determinado pelo modo singular de seu inconsciente gozar. O neurótico testemunha escapar à noção divina de trindade desejando o inferno. Perversão falha, a neurose se caracteriza por insistir sempre na miragem de uma satisfação que jamais atinge. Portanto, a religião, recalcando não ser verdade que Deus seja, é mais verdadeira que a neurose. A religião diz que Deus "ex-siste", ele é a "ex-sistência" por excelência, ele é o recalcamento em pessoa. Deus é o que o faz com que, a partir da linguagem, não se possa estabelecer relação entre os sexuados. Deus comporta o conjunto dos efeitos da linguagem. Assim, para Lacan, a despeito de Freud não crer em Deus, ele perpetua a religião, consagrando-lhe como neurose ideal (Lacan, 1974-1975).7

Acredita-se nas tradições religiosas porque elas têm o gozo em seu horizonte. Para Lacan, o ponto ideal do gozo é o falo. Elidido, um real do gozo "ex-siste" com esse falo, pois o falo consiste valendo-se de sua ausência. É devido ao gozo que aí "ex-siste", que o falante o acentua tanto. Tudo que o falante conhece dos dois é a potência, aparência pela qual o real se mantém apenas um: real que "ex-siste", real como real, real em segunda potência. E um elevado a segunda potência é igual a um (Lacan, 1974-1975).8

O afeto de "ex-sistir" que define o inconsciente é suportado pelo sintoma. A função do sintoma é cifrar aquilo que pode ser escrito do inconsciente. O sintoma, racionalização de cada sujeito, não cessa de se escrever. O sintoma se define nesse algo que roça com o inconsciente: acredita-se, crê que pode dizer alguma coisa (Lacan, 1974-1975).9

Sintoma é o signo de alguma coisa que não vai bem no real. A capacidade de o analista operar sobre o sintoma deve-se ao fato de o sintoma ser efeito do simbólico no real.

O campo do gozo fálico (GΦ) incide na experiência da apropriação dessa significância fálica: "Um corpo, isso se goza. Isso só se goza por se corporizar de maneira significante" (Lacan, 1982, p. 35).

O ser se perde em sujeito por um significante e para outro significante, inscrevendo o desejo nessa contingência corporal suportada pela função fálica. A relação entre dois significantes faz surgir um sujeito na sua configuração, algo se subtrai, e o significante é disso o substituto, tomado ao próprio gozo fálico. Esse significante-mestre é a ordem significante que permite a subsistência de toda a cadeia simbólica, em que a significância fálica diferencia-se do efeito de sentido por designar a relação do simbólico com o real. Em sua modulação privilegiada, o gozo fálico se impõe a toda modulação da experiência.

O gozo dito do falo, na medida em que ele sai da relação do simbólico com o real. O gozo dito fálico não é certamente, em si mesmo, o gozo peniano. O gozo peniano advém a propósito do imaginário, isto é, do gozo do duplo, da imagem especular, do gozo do corpo. Ele constitui propriamente os diferentes objetos que ocupam as hiâncias das quais o corpo é o suporte imaginário. O gozo fálico, em contrapartida, situa-se na conjunção do simbólico com o real. Isso na medida em que o sujeito que se sustenta no falasser, que é o que designo como sendo o inconsciente, há capacidade de conjugar a fala e o que concerne um certo gozo, aquele dito do falo, experimentado como parasitário, devido a essa própria fala, devido ao falasser (Lacan, 2007, p. 54-55).

O sintoma, ao conjugar o gozo com sua proibição, corresponde à função paterna, é efeito do simbólico no real que simboliza o gozo fálico e protege o sujeito do desejo do Outro.

- Função do gozo Outro: no cruzamento I e R. A extensão do gozo Outro produz angústia ao ampliar a intrusão do real no imaginário. A angústia é algo que parte do real, é isso que, do interior do corpo, "ex-siste" quando há alguma coisa que o desperta, que o atormenta. A angústia dá seu sentido à natureza do gozo que se produz entre o real e do imaginário. Um outro corpo é sempre o signo do mais extremo embaraço. O que se pode fazer, afora despedaçá-lo? Se buscamos o que pôde ser bordeado, esse gozo do outro corpo, enquanto ele seguramente faz buraco, encontramos a angústia. Portanto, além do sentido, que faz buraco no simbólico e da "ex-sistência", que se metaforiza pelo gozo fálico que faz buraco no real, a chave do buraco é o gozo do Outro, o gozo que interessa não ao Outro do significante, mas ao Outro do corpo, o Outro do outro sexo. Um corpo é o que resiste, o que consiste antes de se dissolver. O Outro corpo é signo do mais extremo embaraço, só se pode despedaçá-lo. Por isso, é a angústia que bordeia o gozo do Outro corpo, que faz buraco. A angústia é o que "ex-siste" do interior do corpo, quando algo o atormenta, o desperta (Lacan, 1974-1975)10. O gozo do Outro (GA), localizado na intersecção do real com o imaginário, refere-se ao gozo para além do falo, gozo imaginado pelo sujeito como pertencente ao Outro, posto que nada confere aval ao gozo do corpo do Outro. Um solitário que se conta sem ser, que não se soma a nenhum Outro numa relação de pleno gozo. É o que implica que a função do Outro só possa ser situada como uma diferença que participa do Um sem adicioná-lo a si, ou seja o Outro é o Um-a-menos.

A impossibilidade real que extorque o gozo fálico é suposta pelo sujeito como parasita que faz prevalecer o obstáculo que irrompe à plenitude do gozo fálico, onde se distingue uma referência de gozo como pertencente ao Outro: "Ao se marcar de que distância ele [o gozo] falta, aquele de que se trataria se fosse isso, ele não somente supõe aquele que seria isso, ele suporta supor, com isso, um outro" (Lacan, 1982, p. 152). Acrescenta-se, portanto, ao gozo fálico, o gozo que se situa alhures, gozo Outro, ou seja, gozo que está fora do corpo, sendo-lhe sempre anômalo. "O Outro do Outro real, ou seja, impossível, é a ideia que temos do artifício, na medida em que ele é um fazer, um fazer que nos escapa, isto é, um saber que transborda em muito o gozo que podemos ter dele" (Lacan, 2007, p. 62).

Na angústia, a incidência da indeterminação (real) de outro gozo que invade imaginariamente o sujeito, o reduz a ser seu objeto. Lacan acentua o buraco que faz frente ao simbólico, grafando GA, gozo do Outro. Comenta que se trata aí do uso gramatical do genitivo (gozo que pertence ao Outro), não do subjetivo (é enquanto Outro que se goza), nem do objetivo (gozar do Outro como objeto), corrigindo assim a noção freudiana de Eros como fusão ou união.

Na elaboração dada por Lacan ao real, ao simbólico e ao imaginário, Deus é a mulher tornada toda. É uma aspiração do homem de que "ex-sistam" mulheres que ordenem a castração. O problema é que não há, a mulher não "ex-siste", o que não implica que haja quem ordene a castração. Lacan afirma que a ideia da suplência da mulher irreal que não "ex-siste", é a errância que remete à trilha do Nome-do-Pai, pai como nomeante (Lacan, 1974-1975).11

As estruturas subjetivas são orientadas singularmente pela especificidade da nominação paterna com a qual o sujeito se sustém (Lacan, 1974-1975).12

O sujeito pode constituir invenções para o atamento borromeano em suprimento aos pontos de fracasso do enodamento, em que a função da metáfora paterna não teve incidência, nas versões (pére-versions) que amarram RSI para suportar a modalização subjetiva. Como testemunham o autismo, as psicoses ou a debilidade, contingências do percurso do trançamento borromeano, explicitam modalidades que escapam à condição borromeana da estrutura.

O estabelecimento do quarto elo (o sinthoma) distinto de R, S, I, que suporta a nominação paterna, aponta que esse quarto elo pode ser considerado como a possibilidade de suplência à estrutura borromeana de três elos e, ao mesmo tempo, a condição de estruturação, já que esta depende da versão paterna que o sujeito constitui na passagem adolescente. O quarto elo promove o enodamento borromeano por contingência de toda modalização neurótica capaz de sustentar uma estruturação subjetiva. Assim, Brancion (1996) generaliza a análise de Joyce, feita por Lacan, e considera que o sinthoma é o modo particular de inscrição da função do Nome, reparação de um ponto fraco da estrutura em qualquer sujeito (Chatel de Brancion, 1996).

Efetivamente, o engate dos três elos no nó borromeano admite o acréscimo de um quarto elo que se ata as três dimensões, repetindo uma delas e, ao mesmo tempo, mantendo borromeana toda a cadeia. Esse quarto elo imita a função que o matemático Peano designou como zero, ou seja, este um que não é sucessor de nenhum, estruturando a série de números inteiros n+1. Essa função do mais-um que, quando suprimido desfaz a série, pois todos os outros se libertam, poderá, talvez, ter sua suplência por meio do acréscimo do mais-um, o sinthoma, desde que repita sua função no nó. Acrescentado como quarto elemento a série borromeana de três, o sinthoma permite a retirada do primeiro, mantendo as mesmas condições borromeanas. Essa constatação, feita co base na manipulação do nó, permite alçar a afirmação de Lacan no Seminário RSI (Lacan, 1974-1975)15 de que qualquer abordagem do real é tecida pelo número. Afinal, a abstração relativa à consistência de RSI é, para Lacan, feita dessa mesma consistência nada natural do número (Vorcaro, 1997).

Inventando a realidade psíquica, afirma Lacan, Freud fez um nó com quatro a partir de seus três. E ela tem nome: complexo de Édipo, que ata e assim sustenta a corda do simbólico, do imaginário e do real. Sem o complexo de Édipo, nada da maneira como ele se atém ao real, ao simbólico e ao imaginário se sustenta. Se Freud elide a redução ao imaginário, ao simbólico e ao real como atados todos três entre si, ele instaura o Nome-do-Pai, idêntico à realidade psíquica, realidade religiosa, enlaçando R, S e I. O complexo de Édipo, para Lacan está aí implícito.

 

 

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Texto recebido em abril de 2011
aprovado para publicação em maio de 2011

 

 

*Psicanalista, membro da Association Lacanienne Internationale, doutora em Psicologia Clínica PUC-SP, professora do Departamento de Psicologia da Fafich/UFMG. E-mail: angelavorcaro@uol.com.br.
** Psicanalista, doutoranda em Psicologia pela UFMG (área de concentração: Estudos Psicanalíticos), membro correspondente da Escola Brasileira de Psicanálise (MG). E-mail: cacapanema@uol.com.br.
1 Nominé, B. (1999). Conferência realizada em São Paulo..
2 Lacan, J. (1974-1975). O Seminário XXII: RSI, 21 de maio, 1975, inédito..
3 Lacan, J. (1974-5). O seminário XXII: RSI, inédito..
4 Lacan, J. (1973-4). Seminário XXI: Les non dupes errent, inédito..
5 Lacan, J. (1974-1975). O seminário XXII: RSI, inédito..
6 Lacan, J. (1974-1975). O seminário XXII: RSI, inédito..
7 Lacan, J. (1974-1975). O seminário XXII: RSI, inédito..
8 Lacan, J. (1974-1975). O seminário XXII: RSI, inédito..
9 Lacan, J. (1974-1975). O seminário XXII: RSI, inédito..
10 Lacan, J. (1974-1975). O seminário XXII: RSI, inédito..
11 Lacan, J. (1974-1975). O seminário XXII: RSI, inédito..
12 Lacan, J. (1974-1975). O seminário XXII: RSI, inédito..

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