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Estudos e Pesquisas em Psicologia

On-line version ISSN 1808-4281

Estud. pesqui. psicol. vol.8 no.2 Rio de Janeiro Aug. 2008

 

ARTIGOS

 

A leitura no ensino médio e o uso das estratégias metacognitivas

 

The reading in the high school and the metacognitive strategies use

 

 

Janete Aparecida da Silva Marini *, I; Maria Cristina Rodrigues Azevedo Joly **, II

I Pedagoga
Diretora de escola de Ensino Fundamental, Rede Municipal de Jundiaí
II Psicóloga
Docente na graduação e pós-graduação stricto sensu em Psicologia da Universidade São Francisco - São Paulo, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O presente estudo teve por objetivo identificar a freqüência de uso das estratégias metacognitivas de leitura por estudantes do Ensino Médio, verificando a influência das variáveis idade, gênero, série, turno e rede de ensino freqüentada. Participaram 641 estudantes de escolas públicas e particulares, com idade entre 14 e 17 anos.  O instrumento utilizado foi a Escala de Estratégias Metacognitivas de Leitura. A análise dos resultados revelou que as estratégias metacognitivas de leitura do tipo solução de problemas são as mais utilizadas (M=15,38; DP=4,78) entre os participantes.  Os estudantes revelaram usar com mais freqüência as estratégias metacognitivas no durante a leitura (M=26,81; DP=7,91). Verificou-se que as estudantes do sexo feminino fazem mais uso dessas (M=41,12 e DP =11,28) que os estudantes do sexo masculino (M=34,12 e DP= 10,83). Constatou-se diferenças quanto a, idade, rede de ensino, série e turno freqüentado. 

Palavras-chave: Psicometria, Metacognição, Leitura.


ABSTRACT

The present study aimed to identify the frequency of metacognitive strategies usage of students in the high school for reading and verify the influence of the variables age, genere, grade, type of school and period frequented. 641 students took part in the study, coming from public to private schools, aging from 14 to 17 years. The instrument used was the Escala de Estratégias Metacognitivas de Leitura (Metacognitive reading strategies scale). The analyses of the results showed that the problem solving strategies were the most used (M = 15,38; DP = 4,78) among the subjects. The students themselves revealed to use more metacognitive reading strategies during read (M =26,81; DP =7,91). It was also verified that the female students use more the strategies (M = 41,12 e DP = 11,28) than the male ones (M = 34,12 e DP = 10,83). Differences related to age, type of school, grade and period frequented were noticed too.

Keywords: Psychometric, Metacognition, Reading.


 

 

Ler é uma habilidade que possibilita ao indivíduo decodificar, compreender e criticar uma informação escrita, fazendo uso dos conhecimentos e informações adquiridas anteriormente (HARRIS; HODGES, 1995; RUPLEY; WILSON, 1997).  Assim, espera-se que o leitor seja sujeito de sua leitura, competente para autodirigir a compreensão relativa a diversos tipos de textos, fazendo uso da metacognição (KOPKE, 2001; PILGREEN, 2006).

Segundo Jacobs; Paris (1987), o construto metacognição se difundiu na teoria do desenvolvimento cognitivo e da leitura, dando ênfase ao modo como os leitores planejam, monitoram e regulam a própria compreensão. Schraw (1998) afirma que a cognição e a metacognição diferem, pois a primeira envolve as habilidades necessárias para realizar uma tarefa, enquanto que a segunda é necessária para compreender e avaliar o rendimento na realização desta.

Gonzáles (1998) explicita que a função da metacognição está em acionar e ocorrer concomitantemente com a cognição, visto que converte esta última em objeto de reflexão no momento em que ela é executada ou concomitante à leitura em forma de retrospectiva. Isso significa, na perspectiva de Bolívar (2002), que o leitor deva ter conhecimento do seu estilo de pensamento (processos e eventos cognitivos), o conteúdo dos mesmos (estruturas) e habilidade para controlar esses processos. Nesse sentido, a metacognição, quando aplicada ao processo de leitura, pode ser definida como a consciência que o leitor tem sobre o próprio nível de compreensão da leitura e a habilidade para controlar as ações cognitivas por meio de estratégias metacognitivas que facilitem o entendimento de um determinado tipo de texto ou tarefa.

Cantalice (2004) pontua que os pesquisadores concordam que as estratégias metacognitivas de leitura são habilidades usadas para promover a compreensão. Caracterizando-se por serem planos flexíveis que podem ser adaptados a situações diferentes, variando de acordo com a complexidade do texto. São também formas deliberadas de construção de significado, que são utilizadas quando não há compreensão (BROWN; PALINSCAR, 1984; CARREL, GADJUSEK; WISE, 1998; KLETZIEN, 1991; SCALLON, 2000). Já Bolívar (2002) considera que as estratégias metacognitivas de leitura são um conjunto de ações, técnicas e recursos que podem ser usados antes, durante e após a leitura, com o objetivo de promover a compreensão do texto, indicando ao aluno a direção e a autoregulação da própria aprendizagem.

O uso de estratégias metacognitivas possibilita ao leitor, por exemplo, fazer uma análise global do texto antes da leitura, olhando o título, os tópicos e as figuras e gráficos, realizando predições, relacionando-os com seu conhecimento prévio. Durante a leitura as utiliza para a compreensão da mensagem do texto escrito, selecionando as informações relevantes, ligando-as e fazendo uma análise das predições e hipóteses levantadas antes da leitura para confirmá-las ou refutá-las. Depois da leitura sua utilização facilita realizar uma análise geral com o objetivo de rever e refletir sobre o conteúdo lido, buscar a importância do texto, o significado da mensagem, verificar as diferentes perspectivas apresentadas para o tema e a aplicação das informações para solucionar problemas (DUKE; PEARSON, 2002; KOPCKE, 1997).

Pelo conceito de estratégia metacognitiva de leitura apresentado, entende-se como bom leitor ou leitor hábil aquele que utiliza estratégias cognitivas e metacognitivas, usando atividades de planejamento e estratégias flexíveis de automonitoramento na leitura. Assim, os leitores que sabem o que são estratégias de leitura, como usá-las e quando elas são apropriadas, são considerados pela literatura como leitores estratégicos (DUKE; PEARSON, 2002; JOLY; PAULA, 2005; KLETZIEN, 1991; MOKHTARI; REICHARD, 2002; PARIS, LIPSON; WIXSON, 2001; SIMPSON ; NIST, 2000). 

Diante do exposto, verifica-se que para atingir o propósito da leitura, ou seja, para a compreensão do texto é preciso que o leitor se relacione com o texto e construa significado quando se depara com conhecimentos novos (COLLINS, 1998). Para tanto, o leitor precisa aprender a adaptar e a usar estratégias metacognitivas de leitura, de acordo com o tipo e a complexidade do texto a ser lido, sendo tais aspectos investigados por pesquisadores da área.

No âmbito internacional, muitas pesquisas têm sido realizadas enfocando o uso das estratégias metacognitivas de leitura, o mesmo não ocorre no Brasil, sendo esse campo, ainda pouco explorado. Serão apresentados a seguir alguns estudos sobre esse tema.

Lorch, Lorch e Klusewitz (1993) realizaram um estudo com o objetivo de verificar como os universitários analisavam seu rendimento durante a leitura. Como procedimento foi solicitado aos estudantes que descrevessem situações de leitura e às suas respectivas ações. A análise dos dados coletados identificou 10 categorias de situações de leitura com diferentes demandas cognitivas. Observou-se que as estratégias metacognitivas relatadas pelos estudantes variaram em função do tipo de texto e da complexidade da tarefa. Os autores do estudo elaboraram uma proposta de tipologia para situações de leitura que podem servir como referências para o estudo de quais dessas estratégias devem ser usadas em cada situação específica.

Kletzien (1991) realizou um estudo com 48 estudantes do Ensino Médio, divididos em dois grupos. Um composto por leitores habilidosos e o outro por leitores pouco hábeis, com o objetivo de avaliar o uso das estratégias metacognitivas de leitura para a compreensão de textos expositivos elaborados pela técnica de Cloze. Ambos os grupos leram três passagens dos textos citados e com grau crescente de dificuldade. O grupo de leitores habilidosos leu os trechos originais e o grupo de leitores pouco hábeis leu uma versão simplificada do mesmo texto, de modo que o grau de dificuldade fosse semelhante para ambos os grupos. Todos os sujeitos relataram uma dependência forte do vocabulário-chave, uso de inferências e de conhecimentos prévios na estruturação das respostas em todos os três níveis de dificuldades. Os leitores habilidosos usaram mais estratégias metacognitivas globais. Observou-se que no grupo dos leitores pouco hábeis o uso das estratégias foi diminuindo à medida que a complexidade dos textos foi aumentando, e no grupo dos leitores habilidosos o uso das estratégias metacognitivas se manteve o mesmo, independente da complexidade do texto.

Rinaudo e Fernández (2002) realizaram uma pesquisa com 98 estudantes argentinos do Ensino Médio, visando investigar a relação entre o uso de estratégias metacognitivas de leitura, o nível de compreensão e o rendimento acadêmico. Foi utilizado um questionário com 119 questões, com o objetivo de identificar as estratégias metacognitivas mais freqüentemente usadas pelos estudantes. O segundo instrumento utilizado foi uma prova de compreensão em leitura com 50 itens de múltipla escolha com quatro alternativas de resposta.  Foi também analisada a relação entre o uso das estratégias metacognitivas e a média dos estudantes nos componentes curriculares.

A análise descritiva dos dados revelou índices de uso de estratégias metacognitivas de leitura acima de 60% para a escala.  A análise do uso dessas e o rendimento acadêmico mostrou relações positivas moderadas e o estudo das diferenças dos três subgrupos por rendimento acadêmico (baixo, médio e alto), permitiu observar diferenças significativas nas variáveis consideradas, sustentando os pressupostos teóricos de que o uso das estratégias metacognitivas de leitura facilita a aprendizagem. No que tange à incidência do uso dessas estratégias com o grau de compreensão o estudo não encontrou evidências claras de correlação entre seu uso e a melhora em leitura.

No campo do desenvolvimento de instrumentos que avaliem o uso das estratégias metacognitivas de leitura vale destacar o estudo de Mokhtari e Reichard (2002), que desenvolveram um instrumento de auto-relato, intitulado Metacognitive Awareness of Reading Strategies Inventory1 (MARSI). O objetivo foi criar um instrumento que permitisse avaliar em que grau o estudante é ou não consciente dos vários processos envolvidos na leitura. A análise psicométrica do instrumento revelou coeficiente alfa de Cronbach variando entre 0,89 a 0,93 e o índice de fidedignidade global foi de 0,93, mostrando assim, alta confiabilidade do instrumento. O scree plot identificou subescalas e itens que poderiam ser refinados ou excluídos. A versão final do instrumento ficou com 30 itens distribuídos entre os fatores de estratégias globais, solução de problemas e suporte. Essa versão foi aplicada então em 443 estudantes. A correlação entre os fatores e o índice de fidedignidade total da escala foi a = 0,89. Esse estudo apontou que os leitores hábeis usam as estratégias metacognitivas globais e de solução de problemas com maior freqüência que os leitores pouco hábeis. Fato não observado para as estratégias metacognitivas de apoio. As relações entre habilidade de leitura e o tipo de estratégia metacognitiva usada pelos alunos foram consideradas como evidências de validade do instrumento.

No Brasil o estudo de Joly, Cantalice e Vendramini (2004), com 1038 estudantes universitários, teve por objetivo verificar as qualidades psicométricas de uma Escala de Estratégias Metacognitivas de Leitura para Universitários (EMeL&–U).  Os resultados revelaram que, quanto às qualidades psicométricas, a escala é válida e fidedigna (a=0,91). A análise fatorial indicou a presença de três fatores &– estratégias metacognitivas globais, estratégias metacognitivas de suporte eestratégias metacognitivas de solução de problemas. As estratégias metacognitivas apontadas pelos estudantes como as menos utilizadas encontravam-se no momento anterior a leitura (M=2,2), indicando que os universitários da amostra não fazem uma análise geral do texto antes da leitura. Houve um predomínio da releitura como estratégia metacognitiva utilizada durante e após a leitura. Esse fato pode indicar que estratégias metacognitivas de leitura para solução de problemas são as mais usadas quando os textos lidos são difíceis de serem compreendidos.

Estudo realizado por Carvalho (2006), no Ensino Fundamental, teve por objetivo avaliar as estratégias metacognitivas de leitura utilizadas por alunos de 2ª a 4ª séries de escolas públicas e particulares. O instrumento utilizado foi a escala de Estratégias Metacognitivas de Leitura &– Ensino Fundamental I (EMeL-EFI). Os resultados demonstraram que os estudantes das quartas séries obtiveram  escores mais altos em relação às demais séries, nos três fatores da escala e apresentaram também as freqüências médias mais altas nos diferentes momentos de leitura. As estratégias metacognitivas de leitura mais usadas foram apontadas como sendo as que pertencem à categoria de solução de problemas. A análise comparativa realizada revelou correlações significativas para todos os fatores com os três momentos de leitura, exceção feita às 2as e 4as séries no fator global, após a leitura. Os participantes que freqüentavam a escola estadual e as meninas revelaram maior freqüência no uso de estratégias metacognitivas de leitura.

Ainda no nível universitário destaca-se o estudo de Abreu (2006), com estudantes de diferentes cursos com os objetivos de identificar a freqüência de uso das estratégias metacognitivas de leitura, verificar o rendimento em resolução de problemas e buscar evidências de validade para a escala de estratégias metacognitivas de leitura para universitários (EMel-U),  por meio da correlação com o teste GfRI- Software para Avaliação Componencial Dinâmica da Inteligência Fluida.  Os resultados mostraram uma freqüência média total de uso das estratégias de 59,80 que equivale ao uso de 49,54% das estratégias metacognitivas de leitura apresentadas pelo instrumento, sendo as estratégias metacognitivas de leitura do fator de solução de problemas as mais utilizadas. Quanto ao gênero, observou-se que as estudantes do sexo feminino utilizam significativamente mais estratégias metacognitivas de leitura do que os participantes do sexo masculino. Verificou-se por meio do Teste de correlação de Pearson, que os fatores da escala apresentam correlações significativas, altas e positivas entre si e com o escore total.

Estudo exploratório realizado com a escala de Estratégias Metacognitivas de Leitura &– Ensino Médio (EMeL-EM) foi realizado por Joly, Santos e Marini (2006), com 487 estudantes do Ensino Médio de escolas públicas e particulares, com idade variando de 14 a 21 anos. A EMeL&–EM é composta pelos fatores estratégias metacognitivas de solução de problemas, estratégias metacognitivas de suporte à leitura e estratégias metacognitivas globais. Esses fatores explicam 39,43 % da variabilidade da escala. A precisão total da escala é de α= 0,92 e de α=0,85 para estratégias metacognitivas globais e de solução de problemas e α=0,84 para as de suporte à leitura. A pontuação na correção varia de zero a trinta e oito pontos.

O objetivo do estudo foi verificar o uso de estratégias metacognitivas de leitura por estudantes do Ensino Médio antes, durante e após a leitura. Os resultados apontaram a média geral dos participantes nos diferentes itens da escala de estratégias de leitura em 43,18 pontos. As estratégias que apresentaram maior pontuação média foram - Reler trechos quando encontro uma informação que tenho dificuldade, Ler com atenção e devagar para ter a certeza que estou entendendo, Concentrar-me na leitura quando o texto é difícil e Verificar se atingi o objetivo que estabeleci para a leitura. Os resultadosindicaram que os estudantes do Ensino Médio tendem a usar mais freqüentemente as estratégias metacognitivas de solução de problemas.

O momento de leitura que apresentou itens com menor pontuação média foi após a leitura. Quanto ao tipo de estratégia metacognitiva utilizada, as de suporte à leitura foram apontadas como sendo as de menor uso. Isso pode indicar que os estudantes, em sua maioria, não utilizam materiais de referências para melhorar a compreensão do texto, frente a dificuldades por eles identificadas após a leitura. Isto ocorre provavelmente pelo maior uso que fazem das estratégias metacognitivas de solução de problemas.  Em relação ao gênero, os participantes do sexo feminino demonstraram utilizar com maior freqüência essas estratégias. Quanto ao tipo de escola freqüentada, não foram observadas diferenças significativas.

Considerando a relevância da leitura como uma habilidade cognitiva que pode ser avaliada por meio do uso de estratégias metacognitivas de leitura e a escassez no Brasil tanto de investigações dessa natureza quanto de instrumentos psicométricos adequados, principalmente enfocando o Ensino Médio, os objetivos da presente pesquisa foram identificar a freqüência de uso das estratégias metacognitivas de leitura pelos estudantes. Ao lado disso, verificou-se se o gênero, a faixa etária, série e tipo de escola freqüentada influenciam o uso desse tipo de estratégias.

 

MÉTODO

Participaram da pesquisa 641 estudantes do Ensino Médio de escolas públicas (47,2% dos sujeitos) e escolas particulares (52,9% dos sujeitos) do interior de São Paulo, sendo 43,2 % estudantes do 1º ano, 38,8 % do 2º ano e 17,9% do 3º ano do referido grau de ensino. Quanto ao gênero 50,4% dos participantes eram do sexo feminino e 49,6 % do sexo masculino. A idade dos participantes variou de 14 a 19 anos, com média de 15,67 e desvio padrão de 1,19 anos. Quanto ao horário de aula em que freqüentavam a escola, 73,6% de estudantes estudavam no período diurno e 26,4% no período noturno.

Após a autorização da direção das escolas e do Comitê de Ética em Pesquisa foi entregue com antecedência o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido aos participantes para que fossem assinados pelos seus responsáveis e devolvidos ao coordenador do curso, esses foram entregues ao aplicador no dia da coleta de dados.

O primeiro instrumento utilizado foi a Escala de Estratégias Metacognitivas de Leitura &– Ensino Médio (EMeL - EM) (Joly, 2005), e tem por objetivo avaliar o tipo e a freqüência de estratégias metacognitivas de leitura que os jovens estudantes utilizam antes, durante e depois da leitura de textos informativos. É composta por 39 afirmações do tipo Likert com três opções de freqüência &– nunca (0 ponto), algumas vezes (1 ponto) e sempre (dois pontos). A escala está dividida em três fatores, sendo quinze estratégias metacognitivas globais (questões 1, 2, 3, 4, 5, 6, 18, 19, 21, 22, 24, 26, 29, 36); dez estratégias metacognitivas de suporte à leitura (questões 12, 13, 16, 27, 32, 33, 34, 37, 38, 39) e quinze estratégias metacognitivas de solução de problemas (questões 7, 8, 9, 10, 11, 14, 15, 17, 20, 23, 25, 28, 30, 31, 35). Esses fatores explicam 39,43 % da variabilidade da escala.

A escala está dividida em estratégias que podem ser utilizadas antes (questões 1,2,3 e 4) durante (questões de 5 a 30) e depois da leitura (questões de 31, 32, 33, 34, 35, 36, 37, 38 e 39). A precisão total da escala é de α= 0,92 e de α = 0,85 para estratégias metacognitivas globais e de solução de problemas e α = 0,84 para as de suporte à leitura. A pontuação na correção varia de zero a trinta e oito pontos. A escala aplicada em grupos de 30 a 35 alunos na própria sala de aula que leram e responderam sozinhos o instrumento, a duração da aplicação foi de 50 minutos.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A pontuação dos sujeitos nos diferentes itens da escala de estratégias metacognitivas de leitura variou de zero a dois, não havendo concentração de resposta no limite inferior ou superior. A pontuação média foi de um ponto, indicando que houve variabilidade de respostas.

 

Tabela 1 &– Distribuição da freqüência percentual de respostas dos sujeitos na escala

 

Verifica-se na Tabela 1 que a maior variabilidade da escala foi verificada no item 28 &– Ler em voz alta quando o texto é difícil (DP= 0,81) e a menor para o item 23 &– Concentrar-me na leitura quando o texto é difícil (DP=0,47). Os dois itens indicam o uso de estratégias metacognitivas de leitura associadas às dificuldades que os estudantes encontram para compreender o texto, revelando que utilizam as estratégias metacognitivas do fator solução de problemas para monitorar sua compreensão e identificar as contradições e possíveis inconsistências do texto, conforme apontado por Paris, Lipson e Wixson (2001) e por Simpson e Nist (2000). No entanto, vale destacar que esse uso ainda assim, foi pequeno, pois das quinze opções de estratégias metacognitivas de solução de problemas da escala, apenas cinco delas (itens 8, 10, 17, 21 e 23) foram apontadas com percentual de uso acima de 50%.

Quanto à opção de resposta, o item 33 &– Fazer lista dos tópicos mais importantes do texto foi apontado como “nunca” utilizado por 53,5% dos participantes, levando-nos a inferir que os estudantes da amostra não fazem uso das estratégias metacognitivas após a leitura, o mesmo fato se repete nas estratégias que podem ser usadas antes de começar a leitura, como pode ser observado no item 01 &– Fazer perguntas sobre o conteúdo do texto, queé “algumas vezes” utilizado por 60,4% dos respondentes.

Os itens que apresentaram menor pontuação média foram os item 03 &– Organizar um roteiro para ler, pertencente ao fator global eoitem 33 &– Fazer lista dos tópicos mais importantes do texto, que pertence à categoria de estratégias metacognitivas de suporte à leitura. Comparando-se o item 03 com o 33, verifica-se que ambos descrevem procedimentos relacionados aos processos de pensamento relativos ao “como usar estratégias metacognitivas” tais como sublinhar um texto, fazer resumo, destacar os aspectos mais importantes do texto. Revelam, além disso, o nível de conhecimento que o estudante tem sobre a própria cognição segundo Bolívar (2002), Brown e Palinscar (1984), Jacobs e Paris (1987), Scallon (2000) e Schraw (1998).

 

Tabela 2 &– Freqüência ponderada de uso das estratégias por fator e momento de leitura no Ensino Médio

 

Observa-se na Tabela 2 que as estratégias metacognitivas de solução de problemas foram as mais utilizadas pelos estudantes do Ensino Médio, como se verificou no estudo de Carvalho (2006), realizado com estudantes de 2ª, 3ª e 4ª séries do Ensino Fundamental, na pesquisa de Joly, Santos e Marini (2006) realizado com estudantes do Ensino Médio e na de Joly, Cantalice e Vendramini (2004) realizada com universitários. Destaca-se que os leitores hábeis usam estratégias metacognitivas de solução de problemas com maior freqüência do que os pouco hábeis, conforme o apontado por Mokhtari e Reichard (2002). Provavelmente esse tipo de estratégia é o mais utilizado independentemente do nível de escolaridade do aluno, ficando sugestão de novas pesquisas que confirmem ou refutem esse fato.

As estratégias metacognitivas de suporte à leitura foram apontadas pelos estudantes como sendo menos utilizadas, embora ações como, “Fazer um resumo do texto” e “Listar as informações que entendi”, estejam entre as que são mais ensinadas na escola pelo professores. Esse resultado leva-nos a supor que os estudantes não costumam ver as estratégias metacognitivas de leitura como facilitadora da compreensão ou então não sabem como e quando usá-las, conforme afirmam Duke e Pearson (2002), Kopcke (1997), Kletzien (1991), Paris, Lipson e Wixson (2001) e Simpson e Nist (2000).

Os estudantes afirmaram usar estratégias de leitura mais freqüentemente durante a leitura (M=26,81). Antes da leitura, foi o momento que apresentou menor freqüência média (Tabela 2). Fato semelhante aconteceu no estudo de Joly, Cantalice e Vendramini (2004) realizado com estudantes universitários que verificou um uso significativo de estratégias metacognitivas durante a leitura pelo leitor, a fim de compreender melhor o conteúdo do material lido. Quanto ao desvio padrão, o uso de estratégias antes da leitura apresentou a menor dispersão (DP=1,73) e durante a leitura foi encontrada a maior dispersão (DP=7,91).

Vale destacar, tendo como base os resultados obtidos no momento de leitura, que para atingir a compreensão plena de um texto, o leitor precisa de acordo com Gonzáles (1998) saber combinar esquemas prévios e mantê-los ativados por tempo suficiente relacionando-os por meio do uso das estratégias com as informações novas presentes no texto que lhe possibilitem compreendê-lo em sua totalidade, monitorando e avaliando o processo de leitura, sendo essa relação entre as informações realizadas antes, durante e depois da leitura, que nesse estudo apresentaram baixa freqüência de respostas.

 

Tabela 3 &– Freqüência ponderada de uso das estratégias nas séries do Ensino Médio por fator e momento de leitura

 

Ao analisar na Tabela 3 as freqüências médias das estratégias, em relação à série freqüentada pelos participantes, os resultados demonstraram que os estudantes das primeiras séries obtiveram escores mais altos em relação aos das segundas e terceiras nos três fatores.

Na verificação dos resultados considerando-se a ANOVA por séries verificou-se que houve diferença significativa entre as séries do Ensino Médio para o uso das estratégias metacognitivas (F[2,638]=4,47;p=0.012; α≤0,05). O teste Tukey post hoc (HSD) revelou diferenças no uso entre os estudantes das primeiras séries em relação aos das segundas para os fatores de suporte e solução de problemas. Quanto ao fator global, foram observadas diferenças entre a primeira série em relação aos das terceiras, sendo o uso maior entre os estudantes da primeira série.

Verifica-se que nas segundas séries há uma diminuição no uso das estratégias que se mantém praticamente inalterada na terceira série, demonstrando assim, que os resultados são melhores quando o aluno entra no Ensino Médio e vão diminuindo conforme avançam na escolaridade. Situação semelhante acontece quando se analisa o momento de leitura no qual os participantes fazem uso das estratégias metacognitivas. No estudo de Joly, Santos e Marini (2006), realizado com a EMeL &– EM, também foram verificadas diferenças significativas entre a primeira série do Ensino Médio e terceira e quarta séries.

Verifica-se com base nessas pesquisas que, conforme os estudantes avançam na escolaridade, há diminuição do uso das estratégias de leitura, cabendo refletir “Por que há diminuição na freqüência de uso das estratégias? Os estudantes lêem mesmo ou se preocupam mais em buscar os conceitos que estão no texto e se preocupam menos com a compreensão das informações contextualizadas? Por que deixam de regular sua cognição?”

Dentre as possíveis hipóteses para responder a essas questões, pode-se considerar  que o ensino de estratégias metacognitivas de leitura não tem sido realizado nas escolas de nível médio e que essa ausência implique numa baixa freqüência de uso. É relevante analisar o quanto isso afeta diretamente a capacidade de compreensão em leitura dos estudantes, sejam eles do Ensino Médio ou do Ensino Superior. É sabido que o treino de professores para o ensino de estratégias metacognitivas de leitura tem surtido efeito na freqüência de uso pelos estudantes. Vale ressaltar também os bons resultados alcançados por Bolívar (2002) no treino para o uso de estratégias diretamente com os estudantes.

 

Análise inferencial dos resultados da Escala de Estratégias Metacognitivas de Leitura

Na Tabela 4 verifica-se que os escores obtidos nas análises estatísticas entre os fatores, momento de leitura e gênero demonstraram diferenças significativas para o uso das estratégias.

 

Tabela 4 &– Estatística descritiva do teste t de student para as estratégias metacognitivas de leitura por fator, gênero e momento de leitura

* significativo a p< 0,01; M = média; DP = desvio padrão; t e p = índices estatísticos

 

As participantes do sexo feminino revelaram uso mais freqüente das estratégias metacognitivas de leitura, sendo que esse maior uso apresenta grau de significância para todos os fatores da escala (Tabela 4). Com base nesse resultado as participantes do sexo feminino do presente estudo podem ser consideradas leitoras estratégicas.

Observa-se que na diferença para o uso das estratégias por gênero e momento de leitura (Tabela 4) que as estudantes do sexo feminino, também se destacaram, sendo a diferença altamente significativa durante a leitura e no escore total e com pouca variabilidade nas resposta. Antes da leitura foi o único momento onde não foram observadas diferenças significativas. Pode-se ter como hipótese explicativa desse resultado, que o uso de ações de planejamento características desse momento de leitura, pois envolvem de acordo com Brown e Palinscar (1984), Carrel, Gadjusek e Wise (1998) e Scallon (2000) a seleção de estratégias apropriadas para atingir os objetivos, foram relatadas como estratégias que pouco fazem parte dos hábitos de estudo dos participantes desse estudo, pois os mesmos não foram ensinados/treinados para quais e quando podem fazer uso dessas.

 

Tabela 5 &– Estatística descritiva do teste t de student para as estratégias metacognitivas de leitura por fator e tipo de escola freqüentada

* significativo a p< 0,05; M = média; DP = desvio padrão; t e p = índices estatísticos

 

As análises comparativas da Tabela 5 apontaram diferenças significativas entre as escolas públicas e particulares para o uso das estratégias metacognitivas de leitura. Destaca-se a diferença do maior uso das estratégias metacognitivas Global e Solução de problemas, nas escolas particulares, tal como no estudo de Mokhtari e Reichard (2002). Considerando a realidade e as carências da escola pública brasileira, pode-se inferir que os estudantes das escolas particulares tem aprendido a usar mais as estratégias metacognitivas de leitura.

 

Tabela 6 &– Estatística descritiva do teste t de student para as estratégias metacognitivas por momento de leitura e turno freqüentado

significativo a p< 0,05; M = média; DP = desvio padrão; t e p = índices estatísticos

 

Verifica-se, na Tabela 6, que os estudantes do período diurno fazem maior uso das estratégias metacognitivas de leitura, havendo diferenças significativas para o momento de antes e durante a leitura. Após a leitura não foram observadas diferenças de uso entre os estudantes do diurno e noturno que fossem significativas. Com base nesse resultado, levanta-se como hipótese que tanto os estudantes que estudam durante o dia, como os que estudam à noite não fazem uso de atividades de avaliação para verificarem os resultados obtidos com a leitura, tampouco sínteses e resumos, conforme pontuado por Carrel, Gadjusek e Wise (1998), Scallon (2000), Schraw (1998) e Schmitt (2000).

 

Tabela 7 &– ANOVA por idade para as estratégias metacognitivas por fator e momento de leitura

*significativo a p < 0,05; gl = grau de liberdade; F e p = índices estatísticos

 

Considerando-se a ANOVA por idades observou-se que as estratégias diferiram significativamente. Foi realizado também o teste Tukey, post hoc para verificar possíveis diferenças entre as idades. Identificou-se que entre os estudantes de 14 e 16 anos ocorre diferença. Quanto ao momento de leitura, foram observadas diferenças significativas para essa mesma faixa etária para o uso de estratégias depois da leitura.

Em síntese verificou-se, com base nos resultados obtidos, que as estratégias de solução de problemas são as que os estudantes do Ensino Médio mais utilizam (M=15,38), essa freqüência destaca-se durante a leitura, indicando que é prioritariamente nesse momento que o leitor se depara com a dificuldade de compreensão do texto e recorre às estratégias que conhece e domina para resolvê-las. Os estudantes das 1ªs séries relataram maior uso de estratégias (M= 39,21), quando comparados com os das segundas e terceiras séries. Quanto ao gênero verificou-se maior freqüência de uso entre as jovens estudantes (M=41,12). A escola particular (M=38,83) apresentou pouca diferença quanto ao uso em relação à pública (M= 36,32) e os estudantes do período diurno (M=38,83) relataram usar mais estratégias que os que estudam à noite.

 

Considerações finais

A literatura tem apontado a leitura como uma das mais importantes habilidades cognitivas. O ato de ler é de fundamental importância para a inserção plena do indivíduo na sociedade. No entanto, ler é, além de decodificar os signos, um processo de compreensão, pois pressupõe que haja uma interação do leitor com o texto. Nessa tarefa as estratégias metacognitivas de leitura são facilitadoras, pois permitem que para a realização da tarefa o leitor as utilize para planejar, monitorar e avaliar sua compreensão, não importando se o texto é acadêmico ou não, o que se busca sempre é entender aquilo que se lê (HARRIS & HODGES, 1995; PILGREEN, 2006; RUPLEY & WILSON, 1997).

Considerando essa lacuna, o presente estudo buscou identificar a freqüência de uso das estratégias metacognitivas de leitura entre os estudantes do Ensino Médio. Os resultados obtidos indicaram que os estudantes da amostra fazem pouco uso das estratégias metacognitivas de leitura. Levantam-se como hipóteses que os estudantes não foram treinados para fazer uso das estratégias metacognitivas de leitura e para quando devem usá-las, as respostas dos participantes para a escala se relacionam muito mais a uma aprendizagem informal, do que tendo sido efetivamente ensinada pelos professores.

Confirmando as pesquisas realizadas anteriormente, as estratégias metacognitivas de solução de problemas apresentaram maior relato de uso pelos estudantes, sendo durante a leitura o momento no qual eles mais afirmam utilizá-las. Infere-se, com base nesse resultado, que como não se ensinam na escola “o quê”,como”, “porque” e “para que usar” os estudantes utilizam as estratégias metacognitivas de leitura apenas quando encontram dificuldades ou problemas no texto que precisam resolver para dar continuidade à leitura e atingir a compreensão. Sugere-se que novas pesquisas sejam realizadas utilizando a EMeL para avaliação pré e pós teste de alunos que possam ser submetidos ao treino para o uso de estratégias metacognitivas de leitura.

 

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Endereço para correspondência
Janete Aparecida da Silva Marini
E-mail: janmarini@terra.com.br
Maria Cristina Rodrigues Azevedo Joly
E-mail: cristina.joly@saofrancisco.edu.br

Recebido em: 25/04/2007
Aceito para publicação em: 21/11/2007
Acompanhamento do processo editorial: Anna Uziel

 

 

Notas

* Mestre em Avaliação Psicológica Educacional pela Universidade São Francisco.
** Doutora em Psicologia Educacional e do Desenvolvimento Humano pela Universidade de São Paulo-USP.
1 Inventário de Consciência Metacognitiva das Estratégias de Leitura.

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