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Jornal de Psicanálise
Print version ISSN 0103-5835
J. psicanal. vol.52 no.96 São Paulo Jan./June 2019
HISTÓRIA DA PSICANÁLISE
Nota introdutória: autores das primeiras gerações de analistas da SBPSP
Mônica Jeanine Fischbach Saliby; Maria Helena Teperman; Sandra Moreira Souza Freitas; Equipe da Divisão de Documentação da SBPSP; Evelyn Finguerman PryzantI
IColaboradora
O Jornal de Psicanálise, em conjunto com a Divisão de Documentação e a Diretoria de Comunidade e Cultura, inaugura a partir desta edição a publicação de artigos de analistas das primeiras gerações da SBPSP.
Tais artigos passam a compor a seção "História da Psicanálise", pois além de seu valor científico possuem valor documental. Evidenciam um tempo e um lugar, constituídos como resultado de uma época e de uma sociedade.
Por intermédio destes textos (e de outros documentos: relatos, audiovisuais, fotografias e correspondências que formam o acervo da Divisão de Documentação), temos a oportunidade de manter viva nossa história institucional e acompanhar os caminhos pelos quais fomos nos apropriando do conhecimento psicanalítico e contribuindo com seu desenvolvimento.
A Divisão de Documentação, que hoje se encontra sob a gestão da Diretoria de Comunidade e Cultura, é um centro de pesquisa da nossa história. Seu embrião data do início da década de 1980, com o Projeto Memória. A exposição "Brasil, psicanálise e modernismo", ocorrida no Masp em 1999, paralela à mostra "Freud, conflito e cultura", mobilizou em grande parte do nosso corpo societário a necessidade de um resgate da história do surgimento e da implantação da psicanálise no Brasil, bem como de seu momento político e cultural. Buscando ampliar esta linha de pesquisa, em 2004 foram inauguradas novas instalações na Divisão de Documentação, de acordo com requisitos técnicos específicos da área de acervos.
Assim, a parceria com o Jornal de Psicanálise permite apresentar momentos do processo histórico da nossa instituição. O primeiro texto escolhido ilustra tanto as ideias psicanalíticas quanto o contexto sociopolítico e cultural então vigentes: Virgínia Leone Bicudo, da primeira geração de psicanalistas brasileiros, faz uma leitura sobre a natureza humana para dar embasamento ao movimento social expresso na peça "Roda-Viva", de Chico Buarque de Holanda.
Virgínia se dedicou, ao longo da vida, às questões sociais. Neta de uma escrava, portanto de origem humilde, sobressaiu-se como psicanalista nos altos círculos nacionais e internacionais. Formada em Magistério, Educação Sanitária e Sociologia, defendeu sua dissertação de mestrado em Ciências Sociais "Atitudes raciais de pretos e mulatos em São Paulo" com um capítulo publicado no livro Relações raciais entre negros e brancos em São Paulo (1955), patrocinado pela Unesco, com prefácio de Florestan Fernandes e grande receptividade entre pesquisadores. Em 2010 a dissertação foi publicada como livro pela Editora Sociologia e Política.
Virgínia Bicudo foi a primeira analisanda de Adelheid Koch (primeira analista didata do Brasil, vinda de Berlim, em 1936). Na SBPSP, Virgínia tornou-se membro efetivo em 1945 e analista didata em 1955, sendo a primeira psicanalista não médica no Brasil. Deu continuidade a sua formação em Londres, na Clínica Tavistock e na Sociedade Britânica de Psicanálise, tornando-se amiga de Wilfred Bion.
Com seu trânsito pela intelectualidade paulista, Virgínia foi essencial para a difusão da psicanálise, tendo sempre defendido ideias sobre a função social do psicanalista. Preocupou-se em expandir seus conhecimentos para a sociedade em geral: escrevia para uma coluna da imprensa e foi comentarista de rádio, abordando psicanaliticamente questões da vida diária das pessoas, como inveja, destrutividade, desenvolvimento infantil etc.
Virgínia colaborou com a criação da Revista Brasileira de Psicanálise e, na década de 1960, criou este Jornal de Psicanálise. Participou da fundação da Sociedade de Psicanálise de Brasília, coordenando a formação de seus analistas de 1970 a 1994.
O artigo selecionado, publicado originalmente na Revista Brasileira de Psicanálise, em 1968, vol. 2, n. 2, ilustra sua capacidade de articulação da realidade política e social com a psicanálise e a arte, produzindo sentidos que extrapolam o meio psicanalítico, o que evidencia o valor histórico desta seção e a atualidade metapsicológica do artigo, como o leitor poderá conferir.