SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.29 issue89Phonological awareness, lexical awareness and reading patterns of students with developmental dyslexia author indexsubject indexarticles search
Home Pagealphabetic serial listing  

Services on Demand

article

Indicators

Share


Revista Psicopedagogia

Print version ISSN 0103-8486

Rev. psicopedag. vol.29 no.89 São Paulo  2012

 

ARTIGO ORIGINAL

 

Correlação entre habilidades cognitivo-linguísticas em escolares com dificuldades de aprendizagem

 

Correlation between cognitive-linguistic skills in students with learning difficulties

 

 

Cláudia da SilvaI; Simone Aparecida CapelliniII

IFonoaudióloga, Mestre e Doutoranda em Educação pela Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista (FFC/UNESP), Marília, SP, Brasil
IILivre Docente em Linguagem Escrita pela Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista (FFC/UNESP), Docente do Departamento de Fonoaudiologia e do Programa de Pós-Graduação em Educação da FFC/UNESP, Marília, SP, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

OBJETIVO: Verificar a existência de associação entre habilidades de mesmo domínio cognitivo, do teste de desempenho cognitivo-linguístico - versão coletiva e individual - , em escolares com dificuldades de aprendizagem.
MÉTODO: Participaram deste estudo 57 escolares da 4ª série do ensino fundamental, com idade entre 10 anos e 5 meses a 14 anos e 7 meses, de ambos os gêneros. Como procedimento foi utilizado o Teste de Desempenho Cognitivo-Linguístico, versão coletiva e individual. A versão coletiva é composta por habilidades de escrita, aritmética, processamento auditivo e processamento visual, e a versão individual é composta por habilidades de leitura, consciência fonológica, processamento auditivo, processamento visual e velocidade de processamento.
RESULTADOS: Os resultados deste estudo revelaram coeficiente de correlação positivo entre as variáveis dos subtestes, sugerindo que, quanto maiores os valores de uma variável, tanto maiores os valores da outra.
CONCLUSÃO: A correlação de cada prova das habilidades do Teste de Desempenho Cognitivo-Linguístico apresentou comportamentos paralelos, indicando que, para as provas correlacionadas, o desempenho em uma variável interfere no desempenho da outra, ocasionando, assim, um déficit quanto ao desempenho desses escolares em sala de aula.

Unitermos: Aprendizagem. Transtornos de aprendizagem. Leitura. Escrita.


SUMMARY

OBJECTIVE: The aim this study was to verify the existence of association between skills of same cognitive domain, of the test cognitive-linguistic performance - collective and individual version, in students with learning difficulties.
METHODS: The participants of this study were 57 students from 4th grades of the elementary school, with old between 10 years and 5 months to 14 years and 7 months, of both genders. As procedure was utilized the Test Cognitive-Linguistic Performance - collective and individual version. The collective version is composed for skills of writing, arithmetic, auditory processing and visual processing, and the individual version is composed for skills of reading, phonological awareness, auditory processing, visual processing and processing speed.
RESULTS: The results this study demonstrated positive correlation coefficient among the variables of the subtests, suggesting that the higher the values of a variable, the greater the values of another variable.
CONCLUSION: We can conclude that the correlation of each test of the skills of the Test Cognitive-Linguistic Performance showed parallel behavior, indicating that, to the tests correlated the performance in a variable affects the performance of another, thus causing a deficit in the performance of students in classroom.

Key words: Learning. Learning disorders. Reading. Writing.


 

 

INTRODUÇÃO

A dificuldade de aprendizagem pode ser entendida como um obstáculo ou barreira encontrada por alunos durante o período de escolarização, referente à assimilação ou à captação dos conteúdos propostos em situação de sala de aula. Tais dificuldades podem ser duradouras ou passageiras, e ocorrerem em qualquer momento do processo ensino-aprendizagem, levando os alunos ao abandono da escola, à reprovação, ao baixo rendimento escolar, ao atraso no tempo de aprendizagem ou mesmo à necessidade de ajuda especializada1.

Não existe um consenso, entre os vários autores, sobre a definição de dificuldades de aprendizagem, nem o como, o porquê ou o quando ela se manifesta. Segundo a literatura, as dificuldades de aprendizagem escolar se caracterizam por um grupo heterogêneo de manifestações, ocasionando baixo rendimento acadêmico nas tarefas de leitura, escrita e de cálculo matemático, e que frequentemente, são acompanhadas de déficits em habilidades sociais e problemas emocionais ou de comportamento, podendo levar ao desenvolvimento de sentimentos de baixa autoestima e inferioridade2. Assim, essa condição, quando persistente e associada a fatores de risco, presentes no ambiente familiar e social mais amplo, pode afetar negativamente o desenvolvimento do indivíduo e seu ajustamento em etapas subsequentes3,4.

Torna-se importante considerar, entre as causas dos problemas de aprendizagem, questões referentes às dificuldades na apropriação do sistema alfabética de escrita da Língua Portuguesa. Pois, para que ocorra a apropriação do sistema de escrita é necessário que a criança desenvolva os componentes cognitivo-linguísticos e suas habilidades. Tais habilidades incluem atenção, reflexão, manipulação, armazenamento da informação e capacidade de pensar a respeito dos aspectos constituintes da própria língua, capacidade essa conhecida como consciência fonológica5-7.

Dessa forma, para que ocorra o domínio do sistema alfabético da escrita é necessária a percepção de que as palavras escritas são formadas por unidades menores que a sílaba, ou seja, o escolar deve compreender que as letras correspondem a segmentos sonoros sem significados, os fonemas; para que consiga realizar com êxito a correspondência grafofonêmica8-10.

Ao ingressar na escola, a criança domina o sistema linguístico, em sua modalidade oral, e apresenta suas habilidades cognitivo-linguísticas adequadas para o aprendizado. Mas, ainda assim, a criança não tem noção de quais aspectos fonológicos serão necessários para ler e escrever, e precisa atentar-se para elementos até então imperceptíveis, os fonemas. De fato, a consciência fonológica evolui de uma atividade inconsciente e desprovida de atenção para uma reflexão intencional e com atenção dirigida. Essa evolução parte do desenvolvimento conjunto do aspecto cognitivo-linguístico por meio da construção de memórias lexicais e fonológicas, que têm em sua subjacência o desenvolvimento do processamento auditivo e visual11.

Para o pleno domínio do sistema lingüístico, tanto na modalidade oral como na escrita, é necessário um processamento auditivo íntegro. O processamento auditivo refere-se à eficiência e à eficácia com a qual o sistema nervoso central utiliza as informações auditivas, sendo responsável por agrupar, identificar e selecionar os sons de acordo com a sua similaridade ou diferença12. Da mesma forma que o processamento visual é responsável por captar informações do ambiente visual, identificando, selecionando e distinguindo de forma aprimorada e detalhada os estímulos13.

A habilidade de processar símbolos visuais deve se caracterizar pela rapidez em decodificar símbolos (letras), de forma precisa e sucessiva, sendo considerada, por diversos pesquisadores, um aspecto importante para alcance do reconhecimento automático das palavras durante a leitura. Quanto maior a habilidade de reconhecer palavras escritas, rápida e acuradamente, mais adequados estão os componentes cognitivos envolvidos, entre eles, a memória fonológica de trabalho, o acesso ao léxico mental, a organização e o processamento das informações visuais, a retenção e a manipulação das informações14-16.

Dessa forma, tarefas que envolvem a habilidade de identificar, refletir e manipular segmentos linguísticos, abrangendo a capacidade de operar rimas, aliteração, sílabas e fonemas, além da capacidade de reflexão para consultar e comparar, que avaliam o desempenho de escolares e permitem analisar as capacidades e habilidades cognitivo-linguísticas e prever as condições de processamento subjacentes de informações - auditivas e visuais - que importam no desenvolvimento dessas habilidades17,18.

Alterações no desempenho cognitivo-linguístico podem influenciar a percepção dos segmentos da fala e no reconhecimento de elementos necessários para a formação e identificação de palavras. Por isso, torna-se de grande importância verificar se escolares com dificuldades de aprendizagem apresentam algum déficit em habilidades cognitivo-linguísticas. Além disso, a análise de variáveis que compõem essas habilidades pode confirmar a presença de alterações que poderão comprometer o futuro aprendizado escolar19,20. Assim, a hipótese levantada neste estudo é que as habilidades cognitivas-linguísticas quando alteradas se correlacionam, podendo, assim, justificar a presença das dificuldades de aprendizagem nos escolares.

Para identificar possíveis alterações no desempenho cognitivo-linguístico e testar a hipótese proposta nesta pesquisa, este estudo fez uso de um teste para avaliar diferentes aspectos do processamento cognitivo-linguístico, visando conhecer o perfil das associações e auxiliando na identificação de habilidades alteradas em crianças com dificuldades de aprendizagem da 4ª série do ensino fundamental.

Em decorrência do exposto, este estudo teve como objetivo verificar a existência de associação entre habilidades de mesmo domínio do Teste de Desempenho Cognitivo-Linguístico em escolares com dificuldades de aprendizagem.

 

MÉTODO

Participaram deste estudo 57 escolares da 4ª série do ensino fundamental de uma escola municipal do interior paulista, sendo 38 (66,7%) do gênero masculino e 19 (33,3%) do gênero feminino, com idade entre 10 anos e 5 meses e 14 anos e 7 meses.

Como procedimento foi aplicado o Teste de Desempenho Cognitivo-linguístico, em sua versão coletiva e individual21. A versão coletiva é composta pelas habilidades de escrita, aritmética, processamento auditivo e processamento visual, e a versão individual é composta pelas habilidades de leitura, consciência fonológica, processamento auditivo, processamento visual e velocidade de processamento. Dessa forma, para que todas as habilidades analisadas neste estudo pudessem ser avaliadas, tornou-se necessário a aplicação da versão coletiva e individual, pois algumas habilidades presentes em uma versão não constam na outra.

Os escolares selecionados para a aplicação do Teste de Desempenho Cognitivo-Linguístico - versão coletiva e individual - foram indicados pelos professores, seguindo os critérios de inclusão de desempenho não satisfatório em sala de aula, em dois bimestres consecutivos (média de nota abaixo de 7,0), desempenho abaixo do esperado em relação ao seu grupo classe, histórico escolar de dificuldades em aprendizagem nos anos anteriores em avaliação de leitura e escrita, assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e ausência de queixa auditiva ou visual descritas nos prontuários escolares dos participantes deste estudo.

Como critério de exclusão foram consideradas a presença de deficiência sensorial (visual ou auditiva), motora ou cognitiva e a não assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Para a realização deste estudo, foram utilizados os seguintes procedimentos:

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

Conforme resolução do Conselho Nacional de Saúde CNS 196/96. Anteriormente ao início da aplicação do procedimento, os pais ou responsáveis pelos escolares selecionados assinaram o termo de Consentimento Livre e Esclarecido, autorizando a realização do estudo.

Teste de Desempenho Cognitivo-Linguístico - versão coletiva

Foi aplicada a versão coletiva do Teste em todos os escolares deste estudo. Essa versão é composta dos seguintes subtestes:

  • Reconhecimento do alfabeto em sequência: composto por todas as letras do alfabeto, em que o escolar deveria escrever o alfabeto em sequência;
  • Cópia de formas: composto de quatro diferentes formas geométricas, em que o escolar deveria realizar a cópia das quatro formas geométricas;
  • Ditado: composto de 30 palavras reais e 10 não palavras, em que o examinador pronunciou um total de 40 palavras que o escolar deveria escrever;
  • Memória de curta duração: composto por 14 sequências de dígitos, que contêm de dois a nove dígitos cada sequência, em que o escolar deveria escrever os dígitos após ouvir o examinador pronunciar a sequência completa.

Teste de Desempenho Cognitivo-Linguístico - versão individual

Foi aplicada a versão individual do Teste em todos os escolares deste estudo. Essa versão é composta dos seguintes subtestes:

  • Leitura de palavras: composta de 70 palavras reais, em que o escolar realizou a leitura em voz alta, enquanto o examinador anotou as palavras lidas corretamente em um minuto;
  • Leitura de não palavras: composta de 10 não palavras, em que o escolar realizou a leitura em voz alta, enquanto o examinador marcou o tempo despendido na leitura e as palavras lidas corretamente;
  • Consciência fonológica: composta de 10 subtestes de aliteração, 20 subtestes de rima. O escolar foi orientado, pelo examinador, a ouvir uma sequência de três palavras e escolher duas palavras que apresentassem aliteração ou rima; e 12 subtestes de segmentação silábica, em que o escolar foi orientado, pelo examinador, a ouvir uma palavra e, em seguida, dizer o número de partes (sílabas) que compõem a palavra falada;
  • Processamento auditivo: composto de subtestes em que o escolar realizou a discriminação de sons, a repetição de números, a repetição de palavras e a repetição de não palavras, em que o examinador determinou a atividade a ser realizada em voz alta e o escolar realizou as atividades também em voz alta;
  • Processamento visual: composto de subtestes de memória visual com oito sequências de cartões, composta por dois a oito cartões cada sequência, em que o examinador apresentou uma sequência por vez para o escolar, este observava a sequência e, em seguida, deveria reproduzi-la com os cartões apresentados pelo examinador;
  • Velocidade de processamento: composta por dois subtestes, um subteste era composto por um quadro com quatro figuras diferentes, que se repetiam em ordem aleatória, e um subteste com números de zero a nove, também apresentados aos escolares em ordem aleatória. Nos dois subtestes, o escolar nomeou rapidamente figuras e números apresentados pelo examinador.

A coleta de dados foi realizada em uma escola pública de uma cidade do interior paulista, em período contrário ao de estudos dos escolares. O Teste de Desempenho Cognitivo-Linguístico - versão coletiva e individual - foi realizado em duas sessões, com duração de 50 minutos cada.

Os resultados foram analisados estatisticamente com nível de significância de 5% (0,050 - significância adotada) para a aplicação dos testes estatísticos, utilizando o programa SPSS (Statistical Package for Social Sciences), em sua versão 17.0. O teste utilizado para análise estatística foi o Teste de Análise de Correlação de Spearman, com o intuito de verificar o grau de relacionamento entre as provas de cada habilidade do teste aplicado. Os resultados estatisticamente significantes foram marcados com um asterisco (*).

Este estudo foi realizado após a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista - CEP/FFC/UNESP/Marília - São Paulo, sob protocolo nº 2596/2007.

 

RESULTADOS

A análise dos resultados do Teste de Desempenho Cognitivo-Linguístico, individual e coletivo, será realizada por meio de tabelas, de acordo com as habilidades propostas no procedimento, conforme descritas a seguir:

  • Habilidade de leitura: será descrita a análise de correlação dos escolares nas provas de reconhecimento do alfabeto, leitura de palavras, leitura de não palavras e leitura de palavras corretas em um minuto;
  • Habilidade de escrita: será descrita a análise de correlação dos escolares nas provas de ditado de palavras, ditado de não palavras e ditado total;
  • Habilidade de consciência fonológica: será descrita a análise de correlação dos escolares nas provas de aliteração, rima e segmentação silábica;
  • Habilidade de processamento auditivo: será descrita a análise de correlação dos escolares nas provas de discriminação de sons, repetição de palavras, repetição de não palavras, sequência de números e sequência de números invertidos;
  • Habilidade de processamento visual: será descrita a análise de correlação dos escolares nas provas de cópia de formas, memória visual com dois cartões, memória visual com três cartões, memória visual com quatro cartões e memória visual com cinco cartões;
  • Habilidade de velocidade de processamento: será descrita a análise de correlação dos escolares nas provas de nomeação de figuras e nomeação de números.

A análise foi realizada buscando-se correlacionar as variáveis de mesmo domínio, ou seja, para a habilidade de leitura houve a correlação somente entre as variáveis que compõem essa habilidade, ocorrendo o mesmo com a habilidade de escrita, consciência fonológica, processamento visual, processamento auditivo e velocidade de processamento.

A Tabela 1 apresenta a correlação entre as variáveis que compõem a habilidade de leitura. Quando aplicada a Análise de Correlação de Spearman, foi possível observar que ocorreu coeficiente de correlação positiva, indicando moderada correlação entre as variáveis: leitura de palavras e leitura de não palavras (coeficiente de correlação: 0,603), e entre as variáveis: leitura de não palavras e palavras lidas corretamente em um minuto (coeficiente de correlação: 0,605); e forte correlação entre as variáveis: leitura de palavras e palavras lidas corretamente em um minuto (coeficiente de correlação: 0,826), sugerindo que, quanto menos palavras o escolar leu por minuto, menos correta foi sua leitura de palavras e de não palavras.

Na Tabela 2, foi possível verificar a correlação entre as variáveis que compõem a habilidade de escrita e entre as variáveis da habilidade de consciência fonológica. Quando aplicada a Análise de Correlação de Spearman, foi possível observar que ocorreu coeficiente de correlação positivo, com forte correlação entre as variáveis: ditado de palavras e ditado de não palavras (coeficiente de correlação: 0,712), ditado de palavras e ditado total (coeficiente de correlação: 0,974), e ditado de não palavras e ditado total (coeficiente de correlação: 0,847), indicando que, quanto maior o número de erros cometidos no ditado de palavras, maior o número de erros no ditado de não palavras e, consequentemente, no ditado total.

Para a habilidade de consciência fonológica, exposta na Tabela 3, houve coeficiente de correlação positivo entre as variáveis rima e aliteração (coeficiente de correlação: 0,590), indicando uma correlação moderada entre essas variáveis que, ao serem contrapostas, apresentaram comportamentos paralelos, ou seja, quanto maior o número de erros cometidos na atividade de rima, maior foi o número de erros cometidos na atividade de aliteração.

Na Tabela 4, foi possível observar que, na análise de correlação entre as variáveis da habilidade de processamento auditivo, quando aplicada a Análise de Correlação de Spearman, houve coeficiente de correlação positivo, porém com fraca correlação entre as variáveis: repetição de palavras e repetição de não palavras (coeficiente de correlação: 0,372), sugerindo que, quanto melhor o desempenho para a discriminação de palavras, melhor o desempenho para a discriminação de não palavras.

 

 

Na Tabela 5, foi realizada a análise de correlação entre as variáveis da habilidade de processamento visual. Ao ser aplicada a Análise de Correlação de Spearman, observou-se que ocorreu coeficiente de correlação positivo, com correlação moderada entre as variáveis: memória visual com dois cartões e memória visual com três (coeficiente de correlação: 0,659), e com quatro cartões (coeficiente de correlação: 0,579); memória visual com três cartões e memória visual com quatro (coeficiente de correlação: 0,672) e com cinco cartões (coeficiente de correlação: 0,502), e, também, entre as variáveis: memória visual com quatro cartões e memória visual com cinco cartões (coeficiente de correlação: 0,554), indicando que, quanto maior o número de erros com dois cartões, maior o número de erros cometidos com o uso de três e quatro cartões. Houve coeficiente de correlação positiva, porém com correlação do tipo fraca apenas entre a memória visual com dois e com cinco cartões (coeficiente de correlação: 0,394), sugerindo um desempenho paralelo entre as variáveis, mas que não forma um grau de associação perfeito.

A Tabela 6 apresenta a análise de correlação entre as variáveis da habilidade de velocidade de processamento. De acordo com os resultados, quando aplicada a Análise de Correlação de Spearman, observa-se que ocorreu coeficiente de correlação positivo, com correlação moderada entre as variáveis: nomeação de figuras e nomeação de números (coeficiente de correlação: 0,406), indicando que, quanto maior o tempo despendido para a nomeação de figuras, maior foi o tempo necessário para a nomeação de números.

 

 

DISCUSSÃO

Os resultados revelaram que, para a habilidade de leitura, quanto menor o número de palavras que o escolar leu por minuto, menos correta foi sua leitura. Tal resultado sugere uma dificuldade em identificar/reconhecer as letras para que ocorra a rápida decodificação da palavra à leitura. Assim, os resultados parecem apontar para o fato de que o processo de decodificação contribui para que o escolar forme a representação da palavra, fazendo uso de informações armazenadas na memória, permitindo a rápida realização da leitura. À medida que aumenta a frequência do contato com a leitura, as representações se estabilizam, possibilitando recuperação cada vez mais automática e rápida da palavra, o que sugere que os escolares que apresentam dificuldades na identificação e na decodificação das palavras podem apresentar alterações no armazenamento e na recuperação da informação5,10,22-24.

Os resultados da análise de correlação da habilidade de escrita indicaram que houve correlação positiva entre todas as provas, demonstrando que, quanto maior o número de erros em ditado de palavras, maior o número de erros no ditado de não palavras e no ditado total. Esses resultados sugerem a presença de alterações no mecanismo de conversão fonema-grafema e em seu armazenamento, resultando em uma escrita lentificada e em confusão entre letras e palavras similares que ocasiona erros na escrita18.

A codificação da palavra em um sistema de escrita alfabético pode ser produzida por meio de um processo envolvendo a mediação fonológica direta através da rota fonológica, ou por meio de um processo visual direto, envolvendo a representação das palavras conhecidas e armazenadas no léxico de input visual, sendo essa a rota lexical. Assim, o escritor faz uso das duas rotas para escrever palavras e não palavras, e a possível alteração em uma dessas rotas, ou até mesmo nas duas, pode limitar o desempenho linguístico, caracterizando um desempenho insatisfatório aos escolares com dificuldades de aprendizagem quanto à escrita de novas palavras4,11,23,25.

Em relação à habilidade de consciência fonológica, destaca-se que, quanto menos rimas o escolar identificou, menos aliterações também foi capaz de identificar, pois de acordo com a análise de correlação, essas habilidades apresentaram um comportamento paralelo entre si. Tal resultado pode ser indicativo de que e habilidade de consciência fonológica não é utilizada e enfatizada com os escolares em contexto de sala de aula, o que torna mais difícil sua percepção em relação à identificação isolada e/ou em sequências sonoras. Entretanto, ressaltamos que, quando a criança atinge a idade escolar e ingressa na escola, ela já apresenta domínio fonológico na linguagem oral, porém ainda não existe consciência das correspondências existentes entre a linguagem oral, a leitura e a escrita, que são as chamadas correspondências letra/som, que usualmente serão adquiridas no decorrer do aprendizado escolar7,23.

Na correlação das habilidades do processamento auditivo foi possível verificar que, quanto melhor o desempenho para a repetição de palavras, melhor foi o desempenho para a repetição de não palavras, o que nos leva a concluir que, nesta tarefa, os escolares com dificuldades de aprendizagem processaram auditivamente as informações, fizeram uso da memória auditiva, responsável por armazenar e/ou recuperar a informação auditiva, e o uso da percepção auditiva, responsável pela recepção e interpretação dos sons ou palavras recebidas26.

Os achados deste estudo, em relação à habilidade de velocidade de processamento, indicam a presença de correlação positiva, portanto, para esses escolares, essas variáveis apresentam comportamento paralelo, de forma que, quanto maior o tempo despendido em nomeação de figuras, maior o tempo necessário para a nomeação de números. Estudos realizados anteriormente sugerem que a habilidade de nomear séries de estímulos rapidamente, como figuras e dígitos, envolve a habilidade de recuperar relações símbolo-nome-som arbitrárias, e que quando esta habilidade está alterada pode ocasionar problemas no processamento da informação em escolares com dificuldades de aprendizagem27-29.

Destaca-se, ainda, que a correlação entre as variáveis que compõem a habilidade de processamento visual foi positiva, indicando comportamento paralelo para a memória visual com uso de cartões. O processamento visual envolve alguns componentes como a memória de trabalho, a organização espacial e o processamento da informação visual. Dessa forma, torna-se difícil para escolares com dificuldades de aprendizagem apresentar desempenho satisfatório em provas que requerem o armazenamento de informações, uma vez que, devido ao possível comprometimento no processamento visual, há uma alteração na estocagem da informação, o que leva a um baixo desempenho em provas desse nível15.

Em decorrência disso, para que ocorra um desempenho satisfatório nessas habilidades, é necessária a participação de componentes como a memória fonológica de trabalho, o acesso ao léxico mental, a organização e o processamento das informações visuais e auditivas, a retenção e a manipulação de informações. De acordo com a literatura, a memória de trabalho e o acesso fonológico ao léxico mental ocorrem de forma conjunta e inter-relacionada, de forma que, ao ocorrer alterações no desenvolvimento desses componentes, o desempenho cognitivo-linguístico também será alterado30,31.

 

CONCLUSÃO

Os dados deste estudo permitiram concluir que as habilidades de mesmo domínio cognitivo avaliadas no Teste de Desempenho Cognitivo-Linguístico mostram-se correlacionadas positivamente, indicando que os desempenhos nessas habilidades estão associados e que uma habilidade interfere no desempenho da outra, sendo esta, portanto, uma possível explicação para a ocorrência das dificuldades de aprendizagem.

Os dados deste estudo sugerem a necessidade de que em contexto escolar sejam oferecidas estratégias de atenção auditiva e visual, percepção e discriminação de sons e sílabas, identificação e decodificação de sons em letras para formação de sílabas, palavras e frases, para que, desta forma, os escolares com dificuldades de aprendizagem possam superar as suas defasagens em situação de sala de aula.

 

REFERÊNCIAS

1. Bartholomeu D, Sisto FF, Rueda FJM. Dificuldades de aprendizagem na escrita e características emocionais da criança. Psicol Estud. 2006;11(1):139-46.         [ Links ]

2. Capellini SA, Butarelli APKJ, Germano GD. Dificuldades de aprendizagem da escrita em escolares de 1ª a 4ª séries do ensino público. Rev Educ Quest. 2010;37(23):146-64.         [ Links ]

3. Finestack LH, Fey ME, Catts HW. Pronominal reference skill of second and fourth grade children with language impairment. J Commun Disord. 2006;39(3):232-48.         [ Links ]

4. Salles JF, Parente MAMP, Freitas LBL. Leitura/escrita de crianças: comparação entre grupos de diferentes escolas públicas. Paidéia. 2010;20(47):335-44.         [ Links ]

5. Gray A, McMcutchen D. Young readers' use of phonological information: phonological awareness, memory and comprehension. J Learn Disabil. 2006;39(4):325-33.         [ Links ]

6. Araújo MR, Minervino CASM. Avaliação cognitiva: leitura, escrita e habilidades relacionadas. Psicol Estud. 2008;4(13):859-65.         [ Links ]

7. Hogan TP, Bowles RP, Catts HW, Storkel HL. The influence of neighborhood density and word frequency on phoneme awareness in 2nd and 4th grades. J Commun Disord. 2011;44(1):49-58.         [ Links ]

8. Gindri G, Keske-Soares M, Mota HB. Memória de trabalho, consciência fonológica e hipótese de escrita. Pró-Fono Rev Atual Cient. 2007;19(3):313-22.         [ Links ]

9. Camargo Z, Navas ALGP. Fonética e fonologia aplicada à aprendizagem. In: Zorzi JL, Capellini SA, orgs. Dislexia e outros distúrbios de leitura e escrita: letras desafiando a aprendizagem. São José dos Campos: Pulso; 2008. p.127-58.         [ Links ]

10. Piasta SB, Wagner RK. Learning letter names and sounds: effects of instruction, letter type, and phonological processing skill. J Exp Child Psychol. 2010;105(4):324-44.         [ Links ]

11. Apel KWJ, Masterson J. Effects of phonotactic and orthotactic probabilities during fast mapping on 5-year-olds' learning to spell. Dev Neuropsychol. 2006;29(1):21-42.         [ Links ]

12. Pinheiro FH, Oliveira AMR, Germano GD. Avaliação e intervenção com a habilidade auditiva nos transtornos de aprendizagem. In: Capellini SA, Silva C, Pinheiro FH, orgs. Tópicos em transtornos de aprendizagem. São José dos Campos: Pulso Editorial;2011. p.66-78.         [ Links ]

13. Fusco N, Okuda PMM, Capellini SA. Avaliação e intervenção com a habilidade visomotora em escolares com dislexia e distúrbio de aprendizagem. In: Capellini SA, Silva C, Pinheiro FH, org. Tópicos em transtornos de aprendizagem. São José dos Campos:Pulso Editorial;2011. p.79-89.         [ Links ]

14. Cardoso-Martins C, Pennington BF. Qual é a contribuição da nomeação seriada rápida para a habilidade de leitura e escrita? Evidência de crianças e adolescentes com e sem dificuldade de leitura. Psicol Refl Crít. 2001; 14(2):387-97.         [ Links ]

15. Swanson HL, Kehler P, Jerman O. Working memory, strategy knowledge, and strategy instruction in children with reading disabilities. J Learn Disabil. 2010;43(1):24-47.         [ Links ]

16. Furnes B, Samuelsson S. Phonological awareness and rapid automatized naming predicting early development in reading and spelling: results from a cross-linguistic longitudinal study. Learn Ind Differ. 2011; 21(1):85-95.         [ Links ]

17. Ferrante C, Borsel JV, Perreira MMB. Análise dos processos fonológicos em crianças com desenvolvimento fonológico normal. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2009;14(1):36-40.         [ Links ]

18. Ukrainetz TA, Nuspl JJ, Wilkerson K, Beddes SRB. The effects of syllable instruction on phonemic awareness in preschoolers. Early Child Res Q. 2011;26(1):50-60.         [ Links ]

19. Capovilla AGS, Capovilla FC, Suiter I. Processamento cognitivo em crianças com e sem dificuldades de leitura. Psicol Estud. 2004;3(9):449-58.         [ Links ]

20. Capellini SA, Sampaio MN, Kawata KHS, Padula NAMR, Santos LCA, Lorencetti MD, et al. Eficácia terapêutica do programa de remediação fonológica em escolares com dislexia do desenvolvimento. Rev CEFAC. 2010;12(1):27-39.         [ Links ]

21. Capellini SA, Smythe I. Protocolo de avaliação de habilidades cognitivo-linguísticas. Livro do profissional e do professor. Marília: Fundepe;2008.         [ Links ]

22. Wanzek J, Vaughn S. Response to varying amounts of time in reading intervention for students with low response to intervention. J Learn Disabil. 2008;41(2):126-42.         [ Links ]

23. Snellings P, Van Der Leij A, Jong PF, Blok H. Enhancing the reading fluency and comprehension of children with reading disabilities in an orthographically transparent language. J Learn Disabil. 2009;42(4):291-305.         [ Links ]

24. Silva C, Capellini SA. Desempenho cognitivo-linguístico de escolares com distúrbio de aprendizagem. Psicol Estud. 2011;16(1):131-7.         [ Links ]

25. Batista AO, Gonçalves BAG, Nobre MS. Avaliação e intervenção na disortografia. In: Capellini SA, Germano GD, Cunha VLO, org. Transtornos de aprendizagem e transtornos da atenção. São José dos Campos: Pulso; 2010. p.77-90.         [ Links ]

26. Dawes P, Bishop DV, Sirimanna T, Bamiou DE. Profile and aetiology of children diagnosed with auditory processing disorder (APD). Int J Pediatr Otorhinolaryngol. 2008; 72(4):483-89.         [ Links ]

27. Cheng X, Schafer G, Akyürek EG. Name agreement in picture naming: an ERP study. Int J Psychophysiol. 2010;76(3):130-41.         [ Links ]

28. Piai V, Roelofs A, Schriefers H. Semantic interference in immediate and delayed naming and reading: attention and task decisions. J Mem Lang. 2011;64:307-23.         [ Links ]

29. van Weerdenburg M, Verhoeven L, Bosman A, Balkom H. Predicting word decoding and word spelling development in children with Specific Language Impairment. J Commun Disord. 2011;44(3):392-411.         [ Links ]

30. Rodrigues A, Befi-Lopes DM. Memória operacional fonológica e suas relações com o desenvolvimento da linguagem infantil. Pró-Fono Rev Atual Cient. 2009;21(1):63-8.         [ Links ]

31. Vaessen A, Gerretsen P, Blomert L. Naming problems do not reflect a second independent core deficit in dyslexia: double deficits explored. J Exp Child Psychol. 2009;103(2):202-21.         [ Links ]

 

 

Endereço para correspondência:
Cláudia da Silva
Rua Goiás, 391, apt. 22 - Edifício Bounganville - Cascata
Marília, SP, Brasil - CEP: 17509-140.
E-mail: claudiasilvafono@yahoo.com.br

Artigo recebido: 3/4/2012
Aprovado: 30/7/2012

 

 

Trabalho realizado na Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista (FFC/UNESP), Marília, SP, Brasil.