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Ciências & Cognição
On-line version ISSN 1806-5821
Ciênc. cogn. vol.17 no.1 Rio de Janeiro Apr. 2012
Artigo Científico
Os estilos de aprendizagem na formação de engenheiros gestores
Learning styles in engineering manager education
Corina Alves FarinhaI; Cláudia Maria Sales SenraII; Fabio Wellington Orlando da SilvaII
IEscola de Formação Profissional Newton Paiva, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil;
IICentro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil
Resumo
Este trabalho investiga uma aplicação da metodologia de projetos ao ensino da disciplina Administração na Engenharia, com enfoque na formação de engenheiros gestores. É particularmente analisada a relação entre a dinâmica interna das equipes que desenvolveram os projetos e os estilos de aprendizagem de seus integrantes. De modo geral, os estudantes demonstraram grande interesse pela disciplina e trabalharam intensamente na execução dos projetos. Os grupos de trabalho foram constituídos espontaneamente pelos estudantes. Contrariamente à hipótese inicial, os estudantes não se agruparam buscando compor equipes com estilos de aprendizagem semelhantes, ou seja, grupos homogêneos, mas em todos havia uma distribuição dos diversos estilos de aprendizagem. No que se refere à organização interna dos grupos, a posição de liderança nem sempre foi ocupada por indivíduos extrovertidos/ativos, como poderia supor-se a priori, mas ocorreu de ser assumida por indivíduos introvertidos ou reflexivos. © Cien. Cogn. 2012; Vol. 17 (1): 058-072.
Palavras-chave: metodologia de projetos; engenheiro gestor; estilos de aprendizagem; ensino de ciências.
Abstract
This work studies the application of a project method for teaching the subject management in engineering, with a focus on training engineers managers. It is particularly analysed the relation between the internal dynamics of teams that developed the projects and the learning styles of its members. Overall, the students showed great interest in the subject and worked hard in implementing the projects. The working groups were formed spontaneously by the students. Contrary to initial hypothesis, students were grouped not be looking for teams with similar learning styles, i.e., homogeneous groups, but they all had a distribution of different learning styles. As regards to the internal organization of groups, the leader position was not always occupied by extrovert/active persons, as we can suppose a priori, but it happens that the leadership was introvert or reflective. © Cien. Cogn. 2012; Vol. 17 (1): 058-072.
Keywords: project method; engineer manager; learning styles; science education.
Introdução
Este trabalho investiga uma aplicação da metodologia de projetos ao ensino de uma disciplina de administração, com enfoque na formação de engenheiros gestores. É particularmente analisada a relação entre a dinâmica interna das equipes que desenvolvem os projetos e os estilos de aprendizagem de seus integrantes. A hipótese de partida é que a liderança das equipes seja assumida por indivíduos mais ativos e extrovertidos, e que estudantes de estilos semelhantes tendam a agrupar-se espontaneamente, por meio da identificação de seus comportamentos, apesar de um estudo anterior revelar que as equipes constituídas por estudantes de estilos complementares sejam mais eficientes do ponto de vista da aprendizagem (Almeida & Silva, 2004).
A engenharia é um campo do saber permeado pela cultura técnica. Talvez por isso, a concepção recorrente entre os estudantes quanto às disciplinas da área de humanidades seja revestida pela desconsideração, habitualmente identificadas pela terminologia descontraída de "perfumaria" (Farinha, 2010). Em outras palavras, no entendimento deles, as disciplinas da área humana e social, que exercem uma mediação entre o conhecimento técnico-tecnológico e sua aplicação no mundo do trabalho, pouco ou nada acrescentam à sua formação profissional (Cunha, 1999).
Ao concluir o curso, entretanto, o engenheiro ou deverá trabalhar em uma empresa, como integrante de uma organização, ou como profissional autônomo, relacionando-se com clientes, prestadores de serviço, auxiliares e órgãos da administração direta e indireta. Nesse contexto, as disciplinas outrora relegadas ao desprezo revelam sua utilidade.
O interesse ou não dos estudantes por uma disciplina, contudo, está relacionado a diversos fatores, como a metodologia de ensino adotada pelo docente e a adequação de suas aulas aos seus diferentes estilos de aprendizagem (Felder & Brent, 1999). Complementarmente, a metodologia de projetos (Santos & Silva, 2006), devido ao seu caráter multidisciplinar, instiga o estudante para o desenvolvimento de suas competências por meio da troca de experiências, do relacionamento interpessoal e da relação teoria-prática, da integração dos conhecimentos adquiridos ao longo da vida, na educação formal e não formal, revelando-se uma opção à descoberta e à aquisição de novos saberes de forma criativa e cooperativa.
Com a expectativa então de elevar o interesse da turma pela disciplina, a metodologia de projetos foi escolhida para o ensino de "Administração na Engenharia", lecionada a estudantes de engenharia elétrica, ao longo de um semestre letivo. Os grupos foram constituídos espontaneamente pelos estudantes, com a limitação de, no máximo, quatro indivíduos cada um, com o objetivo de desenvolver um tema bastante genérico, informado no início do semestre.
Além de contribuir para aprimorar o conhecimento relativo ao processo de ensino/ aprendizagem, os resultados deste trabalho são relevantes para o ensino de disciplinas de Administração, aos professores interessados em metodologia de projetos e estilos de aprendizagem, independentemente do conteúdo que lecionam, bem como aos profissionais de empresas responsáveis por seleção e gerenciamento de pessoas.
Os estilos de aprendizagem de Felder
Felder e Brent (1999, p. E17) sugerem que o ensino deva centrar-se no estudante: "Instrução centrada no estudante é uma abordagem ampla de ensino que inclui substituir aulas expositivas por aprendizagem ativa, responsabilizando os estudantes por sua própria aprendizagem e usando aprendizagem em ritmo pessoal e/ou aprendizagem cooperativa (em grupos)".
Essa tomada de posição revela a influência da Teoria de Aprendizagem Significativa, de David Ausubel (1982). Apesar disso, há algumas diferenças entre eles. Por exemplo, Felder e colaboradores consideram a contribuição de características individuais para a forma de aprender, ou seja, os estilos de aprendizagem, um tema que não foi tratado por Ausubel.
Indivíduos diferentes apresentariam características (ritmos) pessoais de natureza distinta em relação ao processo de aprendizagem, que os levariam a utilizar formas diferentes de aprendizagem para construir o conhecimento. Entre essas características, estariam os estilos de aprendizagem. Além disso, verificou-se que estudantes cujos estilos de aprendizagem são compatíveis com os métodos de ensino do professor da disciplina tendem a reter a informação por mais tempo.
Felder e Silverman (1998), baseados em diversas pesquisas de outros autores, formularam um modelo de estilos de aprendizagem com dimensões relevantes para a educação científica. São cinco as dimensões de estilos de aprendizagem: visual/verbal, sensorial/intuitivo, indutivo/dedutivo, ativo/reflexivo, e seqüencial/global. Essas dimensões trabalham como polos opostos, mas isso não quer dizer que a pessoa deva pertencer exclusivamente a um deles, pois há uma gradação, podendo cada pessoa ser classificada na escala como forte, moderada ou fraca, mudar com o tempo sua posição na escala, e variar nessa classificação, dependendo do assunto ou do ambiente de ensino.
Visual ou verbal referem-se à forma de captação da informação. Estudantes visuais obtêm informação preferencialmente a partir de imagens visuais como figuras, diagramas, gráficos e esquemas, enquanto os verbais têm mais facilidade em fixar informação através de material escrito, como palavras escritas e faladas e fórmulas matemáticas.
Sensorial e intuitivo estão ligados à percepção das informações: o sensitivo prioriza as informações provenientes do ambiente, ou seja, obtidas através dos sentidos (o que é tocado, ouvido ou visto); o intuitivo favorece as informações que surgem internamente através de memória, reflexão e imaginação.
As formas como os estudantes organizam a informação podem ser indutiva ou dedutiva. Os indutivos partem de casos específicos até chegar aos princípios e teorias fundamentais por inferência; os estudantes dedutivos preferem começar com princípios e regras gerais e então deduzir as conseqüências e as aplicações.
Estudantes ativos são os que processam a informação realizando alguma atividade, ou seja, experimentando, fazendo montagens, testando o conteúdo; os reflexivos processam a informação introspectivamente, pensando muito mais nas coisas antes de testá-las. Os estudantes ativos trabalham bem em grupos; os reflexivos preferem trabalhar sozinhos ou em pares.
Quanto à compreensão, os estudantes são seqüenciais ou globais: os seqüenciais absorvem as informações à medida que são apresentadas, passo a passo, de forma linear; os globais tem que ter um conhecimento mais completo do conteúdo para que ocorra a aprendizagem, eles precisam de uma visão geral, eles dão saltos "holísticos" em sua compreensão.
Esses estilos de aprendizagem são reconhecidos por meio de um questionário preenchido pelo próprio indivíduo, o Index of Learning Styles (Solomon & Felder, 2001; Felder, 2001; Almeida & Silva, 2004; Lopes, 2002). Esse questionário é constituído por 44 questões objetivas relativas aos itens pesquisados e, dependendo do resultado, o estudante é classificado em uma das duas possibilidades de cada dimensão, com a intensidade forte, moderada ou fraca. A inclusão em uma categoria não é definitiva, pode alterar-se com tempo, pode sofrer influências do meio ambiente, mas reflete uma tendência do estudante naquele momento.
A principal sugestão de Felder a partir dessa classificação não é que os professores verifiquem individualmente os estilos de aprendizagem dos estudantes, pois em qualquer turma sempre haverá uma distribuição de todos eles. A sugestão é que adaptem suas aulas, ou seja, seu estilo de ensino, para atender aos diversos estilos de aprendizagem, por meio de algumas modificações nas atividades propostas. Nas aulas tradicionais, apenas algumas categorias seriam contempladas como, por exemplo, ou os estudantes verbais, ou intuitivos, ou dedutivos etc. Felder propõe que todas as habilidades correspondentes a essas categorias sejam trabalhadas em sala de aula, pois os estilos de aprendizagem são desenvolvidos continuamente ao longo da vida acadêmica. Por isso, aconselha atividades que estimulem todas as dimensões, ampliando as habilidades dos estudantes e dos futuros profissionais.
Do que foi visto, depreende-se que o principal foco desses autores é mudar a prática didática do professor com seus alunos, dentro da visão vigente na época, do ensino centrado no aluno, introduzido pela pedagogia cognitiva. Com esse objetivo, propõem a utilização de diversos recursos didáticos e atividades a serem desenvolvidas com os alunos, que, segundo eles, têm produzido ganhos reais em desempenho de aprendizagem.
O modelo de Felder baseou-se em estudos prévios desenvolvidos por outros pesquisadores, entre os quais os de Myers-Briggs (Myers & Myers, 1997; Myers & Briggs, n.d.). O Myers-Briggs Type Indicator (MBTI), padronizado em 1962, é um instrumento usado para identificar características e preferências pessoais, elaborado com base nos tipos de personalidade de Jung, descritos na próxima seção.
Outro instrumento de avaliação do tipo de personalidade é o teste da figura humana de Karen Machover (1967), que será aplicado neste trabalho simultaneamente ao Index de Felder, a título de comparação. Seja qual for o teste, porém, é mister esclarecer que eles não fazem afirmações categóricas a respeito dos indivíduos, apenas indicam preferências ou tendências atuais.
Os tipos psicológicos de Jung
Carl Gustav Jung (1875-1961) caracterizou os tipos psicológicos a partir de sua prática clínica e do estudo do comportamento de personagens históricos (Jung, 1991). Ele comparou as características de algumas obras teóricas da filosofia e da literatura, desde a Grécia antiga até seus dias, reconhecendo a existência de lados opostos em todos os grandes temas de discussão do pensamento ocidental. Estudou também as classificações de tipos de personalidade efetuados por outros autores, como, por exemplo, a do médico Galeno, que viveu no séc. II d.C. Essa é uma taxonomia de tipos ideais, ou seja, as pessoas reais resultam de uma combinação entre eles. Tipos ideais poderiam ser comparados às interações básicas da Física (gravitacional, eletromagnética, fraca e forte): em certos experimentos ou situações predomina ou ressalta-se uma das interações, mas todas elas estão sempre presentes em todos os casos reais.
Jung dividiu os indivíduos em dois tipos de personalidade: o extrovertido e o introvertido. O extrovertido seria orientado para o objeto, ou seja, para o exterior, enquanto o introvertido seria orientado para elementos subjetivos, ou seja, para seus processos internos. Além desses dois tipos, ele identificou quatro funções psicológicas que chamou de fundamentais: pensamento, sentimento, sensação e intuição. Cada uma dessas funções pode ser vivenciada tanto de maneira introvertida quanto extrovertida. Por sensação, entendem-se percepções dos órgãos sensoriais; pensamento é o conhecimento intelectual e a lógica de formação de conclusões; sentimento é uma função que nos indica o que é apropriado ou não; a intuição, a percepção latente ou inconsciente.
O ideal para Jung seria que todas essas funções se manifestassem equilibradamente, o que na maioria das vezes não ocorre. Geralmente uma ou outra dessas funções ocupa o primeiro plano, enquanto as demais ficam em segundo plano. Dessa forma, há pessoas que seriam classificadas mais adequadamente no tipo sensação, que percebem mais a realidade em que estão vivendo, sem refletir sobre essa realidade ou considerar os sentimentos que lhe estão relacionados. Outras pessoas seriam mais do tipo pensamento, determinadas pelo que pensam, não conseguindo adaptar-se a situações sobre as quais não têm conhecimento intelectual. Outras ainda deixam-se guiar pelo sentimento, buscando somente as vivências agradáveis e evitando as que não são. Há ainda aquelas que não se preocupam nem com a realidade, nem com as idéias, nem com os sentimentos relacionados, mas são atraídas exclusivamente pelas possibilidades, são os tipos intuitivos.
Segundo Jung, quando uma dessas funções predomina, as outras atuam de forma inconsciente, sem serem percebidas ou controladas. Assim também ocorre com a outra unilateralidade apresentada, presente em todos os tipos de função, que são a atitude introvertida e extrovertida: quando uma prevalece, a outra a contrabalança de forma inconsciente no indivíduo.
Uma das formas de reconhecer os tipos psicológicos é por meio da aplicação de um teste de personalidade. Nesta pesquisa, foi usado o teste da figura humana de Karen Machover (1967). Essa técnica consiste em pedir que o indivíduo desenhe uma figura humana em uma folha de papel em branco, uma folha A4, por exemplo. A análise do desenho leva em conta diversos aspectos: a localização do desenho na página; a pressão aplicada no papel ao desenhar; as características do traço; o tamanho da figura, as simetrias e movimentos no desenho etc. Os resultados desses testes foram usados para reconhecer as características dos integrantes dos vários grupos de trabalho, complementando o Index de Felder. Um estudo anterior (Senra, 2009; Senra, Lima e Silva, 2008) revelou as seguintes correlações entre as categorias obtidas pelos Testes de Felder/Machover, ao serem aplicados simultaneamente aos mesmos indivíduos: Correlação direta - 71% entre ativo/extrovertido e 60% entre reflexivo/introvertido; correlação por similaridade, ou seja, por analogia entre os atributos - 67% entre intuitivo/intuição e 52% sensitivo/sensação.
Metodologia de projetos
Os projetos nascem a partir da busca pela solução de problemas. A sugestão de aplicação dessa metodologia ao ensino não é recente. No século XVI, Bacon (1561-1626) contribuiu para a criação da ciência moderna e para a reforma educacional (Bacon, 1948, 1963, 2006; Oliveira, 2002; Santos & Silva, 2006). Ele propôs uma universidade em que se priorizasse a criação, a reflexão, a associação teoria-prática e a construção coletiva do conhecimento, ou seja, o fazer e o refletir sobre o próprio fazer. Do ponto de vista pedagógico, preconizava o cultivo da dúvida sistemática, a participação ativa do discente no processo ensino-aprendizagem, conceitos que permanecem atuais, inspirando propostas para a renovação do ensino, como a metodologia de projetos.
A metodologia de projetos é uma pedagogia ativa e proporciona aprendizagem significativa, atendendo à formação técnica e humana do aluno. Trata-se de um recurso didático que possibilita o desenvolvimento de novos métodos e concepções de ensino, inovando os conteúdos curriculares.
A metodologia de projetos possibilita ao professor o desenvolvimento de pesquisa, uma vez que a sala de aula é um campo empírico rico em experiências a serem estudadas, contemplando tanto a aquisição de novos saberes quanto o aprimoramento da prática pedagógica
Retomando Bacon, este propôs a formação de organizações de ensino facilitadoras do desenvolvimento do espírito crítico, da liberdade de pensamento, da experiência sistematizada, da atividade docente não repetidora de conceitos aceitos desde a antigüidade e descritos nos livros, mas como guia no processo de crescimento da ciência. Assim, o discípulo conheceria sua força e contribuiria efetivamente para que a natureza revelasse seus mistérios em função do bem-estar da humanidade. Atualmente, há nas diversas propostas de ensino características marcadamente baconianas, demonstrando a permanência e o vigor de enunciados elaborados há cerca de quatro séculos. Entre elas, cita-se a Metodologia de Projetos (MP).
Tradicionalmente, Kilpatrick (1871-1965) é apontado como um dos precursores da MP, na década de 20 do século passado. Ele foi discípulo de Dewey (1859-1952), no qual encontram-se algumas proposições ainda no séc. XIX. Nos anos 60, principalmente devido a Bruner, e nos anos 70, devido a Stenhouse, os projetos adquiriram maior relevância e apareceram como uma alternativa ao ensino passivo e eminentemente livresco que então predominava. Ao longo desse percurso, a MP recebeu diversas interpretações e, já em 1934, Marti (1934) reconhecia pelo menos 17 delas.
Ao discutir a evolução da MP, Hernandez (1998) comenta as quatro condições de Dewey para o que denomina de ocupações construtivas: a) interesse do aluno, com definição de objetivo e atividade; b) atividade com algum valor intrínseco; c) a presença de problemas que despertem curiosidade, criem a demanda por informações e a necessidade de continuar aprendendo; d) margem de tempo para a execução do projeto. Kilpatrick, em seguida, procurou atuar mais no campo da prática do que do intelecto, preconizando atividades práticas para os alunos, sobretudo manuais.
Desde seu aparecimento, a MP tem sido alvo de estudos, mas, apesar das diversas interpretações correntes, há pressupostos comuns, entre os quais citam-se: a visão do professor como orientador, não mais como um depositário do saber; a realização de projetos de trabalhos por parte dos estudantes; a liberdade dos estudantes para definir os temas de pesquisa; uma finalidade útil para os projetos; o desenvolvimento do pensamento criativo; o envolvimento de múltiplos recursos para a consecução dos objetivos propostos e a socialização dos resultados obtidos, pois o ensino, assim como a própria ciência, é uma construção coletiva.
A MP é uma pedagogia ativa, com vistas a uma aprendizagem significativa, em que o estudante percebe que o material a ser estudado relaciona-se com seus próprios objetivos. Ela permite ao estudante conhecer sua força, tornando-se protagonista de sua aprendizagem, um parceiro de pesquisa com seu mestre. O projeto envolve essencialmente três etapas: a problematização, o desenvolvimento e a síntese. Na primeira etapa, ocorre a escolha do tema, um desafio a ser enfrentado pelo grupo, que mereça o investimento de tempo, esforço, recurso, ligado a uma necessidade real; na segunda, os alunos planejam e executam estratégias para responder ao desafio proposto, recorrendo a diversos meios e espaços, como bibliotecas, entrevistas, oficinas etc.; na última etapa, o conhecimento obtido é elaborado, avaliado, socializado e serve como ponto de partida para outros projetos. Nesse ponto, os objetivos propostos devem ser cuidadosamente discutidos, verificando se foram ou não atingidos.
Na proposta baconiana, o conhecimento deveria ter utilidade prática na vida dos indivíduos. Os benefícios do conhecimento devem objetivar o bem-estar humano em termos individuais e coletivos. Não seria benéfico ao homem entender algo na teoria que não lhe fosse aplicável na prática e, conseqüentemente, não melhorasse sua vida cotidiana dessa maneira, a união teoria-prática é indispensável ao progresso do conhecimento.
Nesse contexto, a metodologia de projetos foi adotada como uma estratégia de ensino dos conteúdos da área de administração de empresas aos alunos do curso de engenharia elétrica.
Parte empírica
A pesquisa foi realizada com 19 estudantes da disciplina Administração na Engenharia, oferecida no 50 período de engenharia elétrica de uma instituição pública. Do ponto de vista metodológico, trata-se de uma pesquisa experimental, do tipo participante, em que pelo menos um dos autores esteve diretamente envolvido com os estudantes, na qualidade de docente da disciplina, tendo sido observados todos os procedimentos éticos de praxe em pesquisa com seres humanos.
O objetivo da pesquisa é esclarecer se há ou não uma influência relevante dos tipos psicológicos individuais (estilos de aprendizagem) sobre as características do trabalho desenvolvido por cada grupo e as relações internas entre seus elementos. Para isso, a turma foi dividida em grupos, de no máximo quatro elementos, formados espontaneamente pela livre escolha dos participantes, de acordo com suas preferências pessoais.
O trabalho proposto foi a criação virtual de uma empresa para o desenvolvimento de um projeto. Do ponto de vista da disciplina, isso permitiria a aquisição de conhecimentos de gestão, necessários à formação do futuro engenheiro.
Na primeira aula, foi divulgada a tarefa a ser realizada: criar uma empresa para o desenvolvimento de um projeto denominado Máscara, seguindo as instruções contidas em uma folha de tarefa escrita. Eles foram então avisados de que não haveria informações adicionais para a realização do trabalho, ou seja, o grupo deveria desenvolver o projeto sem a ajuda docente no tocante a especificações de qualquer tipo. Isso deriva da liberdade de ação inerente à metodologia e ao fato de que a atividade também visava a analisar o impacto da tarefa nos alunos. Os conteúdos teóricos para subsidiar o trabalho haviam sido abordados nas aulas precedentes.
O tema ficou deliberadamente vago para não cercear a criatividade dos participantes e permitir a manifestação de sua diversidade. Nessa aula e na seguinte, os estudantes buscaram resolver o problema proposto, desenvolvendo ideias sobre o produto; na terceira aula, apresentaram a síntese do trabalho à turma.
Cada equipe deveria tornar-se uma empresa com objetivo imediato de lançar um novo produto no mercado, denominado máscara. A proposta do trabalho buscava simular situações a que o gestor de uma empresa está sujeito, tais como, administrar uma organização recorrendo ao processo de planejar, organizar, dirigir e controlar pessoas e processos. Tudo isso requer trabalho em equipe, raciocínio lógico, comunicação, liderança, relacionamento interpessoal, criatividade na busca do cumprimento de um objetivo em comum.
A folha de tarefacontinha os seguintes procedimentos:
1. O grupo deve contar a história sobre o produto Máscara.
2. Cada equipe deve definir um presidente e três diretores, para as áreas administrativa, financeira e de marketing.
3. A distribuição das tarefas consiste em:
3.1 Definir a denominação e a missão da empresa;
3.2. Criar uma logomarca e um slogan para o produto;
3.3. Elaborar um texto de publicidade para jornais e revistas;
3.4. Detalhar a matéria prima a ser utilizada;
3.5, Definir e detalhar o público alvo;
3.6. Orçar o custo financeiro (gastos gerais) e estabelecer o preço de venda;
3.7. Especificar os critérios de qualidade a serem utilizados.
Os produtos criados foram: (1) proteção para computador, (2) cosmético para o rosto, (3) máscara sorriso para festas em geral, (4) máscara para festas infantis e (5) máscara comemorativa para preservativos.
O trabalho final foi apresentado em Power Point a uma banca simulada de empresários interessados em novos produtos e negócios, constituída pelos colegas e pela professora. Cada grupo recebeu uma avaliação individualizada pela banca.
Com o objetivo de analisar a capacidade de entendimento, argumentação e comunicação entre os componentes de cada grupo, não foram dados detalhes sobre o que seria a máscara, ou seja, o produto, ficando a escolha a critério dos estudantes. Este fato propiciou tanto o exercício da criatividade, o que pode ser constatado na descrição dos trabalhos, quanto a observação de sentimentos antagônicos de desconforto e descontração nos estudantes, ao mesmo tempo em que se divertiam com a situação inesperada, solicitando informações adicionais.
Entre os propósitos ligados à disciplina, fixar conceitos de administração de empresas, a atividade também buscou desenvolver a competência interpessoal, a habilidade para distribuição de tarefas, organização, criatividade, autonomia, comunicação e liderança, analisando-se a capacidade do grupo em definir as funções para cada um de seus elementos e a interação entre eles.
Para três grupos, as funções definidas no item 2Da folha de tarefas foram distribuídas de acordo com a preferência dos integrantes; o quarto grupo alternou as funções de presidente e diretores entre os integrantes; no quinto grupo, houve a predominância de postura autoritária do estudante que assumiu o cargo de presidente.
Observando-se o processo de trabalho das equipes, a maneira como se organizaram e a distribuição de tarefas, constatou-se no grupo Proteção para Computadores que o fator surpresa da atividade impactou os componentes do grupo, levando-os inicialmente à paralisação. Nos rostos dos alunos havia incredulidade enquanto expressavam verbalmente a dificuldade em construir a empresa.
Na visão dos estudantes, a oportunidade de cursar a disciplina Administração na Engenharia possibilitou a aquisição ou aprimoramento da competência empreendedora, desenvolvendo habilidades, até então nem sequer mencionadas no curso. A atividade levou-os a descobrir características inovadoras, liderança, criatividade e habilidades gerenciais nas áreas administração, marketing e finanças. O "susto inicial" da atividade propiciou a quebra do modelo "solucionador de problemas envolvendo matemática e física", valorizando os aspectos da área humana, como a relação interpessoal, ao ter que lidar com ideias diferentes e a defesa de suas próprias colocações. A situação hipotética aproximou o aluno do mundo do trabalho e da percepção da dificuldade enfrentada pelos profissionais de áreas como o marketing na criação e desenvolvimento de um produto e o plano de vendas.
Para preservar a identidade dos estudantes que participaram do projeto, eles são identificados pelo número do grupo (1A 4) e por uma letra maiúscula (A a D). As funções de cada elemento dentro do grupo estão discriminadas na Tabela 1.
Cada estudante foi submetido a dois tipos de avaliação psicológica, aplicando-se o Index de Felder e o teste da figura humana de Machover, e os resultados correspondentes estão sintetizados na Tabela 2.
Função/ Grupo | Computador (1) | Cosmética (2) | Sorriso (3) | Festas Infantes (4) | Preservativo (5) |
Presidente | 1D | 2D | 3D | 4A | 5D |
Diretor Administrativo | 1B | 2B | 3B | 4B | 5B |
Diretor Financeiro | 1A | 2C | 3A | 4C | 5A |
Diretor de Marketing | 1C | 2A | 3C | 5C |
Tabela 1 - Distribuição das funções em cada grupo.
Computador
No início, este grupo ficou inerte, provavelmente em virtude do perfil de engenheiro, que deseja modelos para trabalhar. A atividade retirou os estudantes da zona de conforto. 1ª demonstrou-se arredio, ao ser chamado a participar. Fez sua parte pouco comprometido, atuando no grupo como o elemento que concorda mantendo a postura acomodada. 1B "travou", apavorada com o inusitado da atividade. Ela é tímida, temerosa em virtude da relação que faz entre a idade (perto dos 30 anos) e sua inserção no mundo do trabalho. O fato de ser a única aluna na sala não a impediu de se manifestar. 1B e 1C estagiaram na área de Informática influenciando a escolha do produto, como afirmaram os componentes do grupo. 1C é jovem, alternando entre um perfil solto e travado, mas contribuiu para dar uma direção ao grupo, partindo dele a ideia central da máscara para computador. 1D, embora com um perfil desconfiado e, de certa forma, despojado, tendo à época uma parceria com o irmão em uma empresa de camisetas para jovens, trouxe para o grupo alguma segurança, apontando um caminho. Compreende-se que ele, vendo os colegas perplexos e paralisados, recorreu ao modelo de gestor fruto da parceria com o irmão, e direcionou o grupo.
Característica central do grupo: inovação.
Cosmética
2A demonstra opinião, criticidade e conhecimento técnico. 2B e 2C são comedidos, apresentando o tradicional perfil técnico e tímido, sobretudo 2C; 2B é mais divertido denotando certa imaturidade. 2D é um rapaz que demonstra aspectos humanistas mais fortes em relação ao restante da sala. Foi reprovado em processos seletivos a emprego levando-o a sentimentos de desapontamento, decepção e descrença com respeito aos métodos utilizados pelas agências de emprego. A direção do grupo foi assumida por ele, uma vez que o grupo estava sem iniciativa, tenso, e não conseguia relaxar e deixar fluir a criatividade. 2D sugeriu o produto máscara como um cosmético, inspirado na atividade profissional da mãe, uma vendedora em domicílio. Ele direcionou o grupo, assumindo, tanto a presidência quanto a diretoria administrativa. 2D faltou, porém, a uma aula, por problemas de saúde. Nesse encontro, os componentes se reuniram, mas não tinham uma cópia do trabalho em sala e 2A assumiu a responsabilidade pela diretoria de marketing. Tal situação sugere que a direção do grupo assumida por 2D deve-se ao inusitado da proposta educativa. 2D, por conhecer o trabalho da mãe, recorreu ao modelo que conhecia de representante de cosméticos, aplicando-o à tarefa. Esse fato evidencia uma das características dos empreendedores, e do empreendedorismo, ou seja, o indivíduo recorre a modelos conhecidos, a mestres para empreender, corroborando o entendimento de que o empreendedorismo seja uma atividade que se aprende, não um dom inato. 2A ao assumir a função de diretor de marketing compreendeu, como expressou em sala, a dificuldade de criar um produto e colocá-lo no mercado, verificando em si o despertar das características empreendedoras, que até ali ele mesmo desconhecia. 2B contribuiu para o desenvolvimento das ideias de 2A, oferecendo sugestões na campanha de marketing, enquanto 2C observava e pouco interagia (comportamento recorrente nas aulas). 2C sentava-se um pouco mais distante do centro do grupo, indicando pela leitura corporal que a atividade o retirava do ambiente costumeiro. Todavia, o resultado proposto foi alcançado. Eles apresentaram um produto com características tradicionais dos catálogos, mas cumpriram as etapas de forma relevante.
Característica do grupo: atitude empreendedora
Sorriso
O grupo teve a direção de 3D, que assumiu de imediato a posição de presidente da empresa, revelando um perfil autoritário. Esse traço marcou o grupo que, embora se divertisse muito, seguia a direção de 3D que se mostrava resistente aos novos modelos de direção ao ser questionado pelos integrantes. Foi o único grupo que trouxe o contexto histórico do uso das máscaras na Roma antiga, quando, além do teatro, eram usadas em velórios. A possibilidade de confeccionar uma máscara mortuária gerou risos em sala, apesar do aspecto macabro do projeto: todos ficaram imaginando como seria usar uma máscara com o rosto do indivíduo morto. O grupo também trabalhou com as máscaras para festas infantis, que tem o rosto do aniversariante, e com máscaras para campanha eleitoral, com o rosto dos candidatos. O presidente centralizador restringiu a participação e autonomia dos componentes. Os responsáveis pelas funções administrativa, financeira e de marketing não foram definidas, sugerindo que essas atividades foram compartilhadas. A liderança de 3D deixou à mostra o aspecto do gerente tradicional, que manda e espera ser obedecido. Os demais componentes demonstravam a intenção e o desejo de maior participação nas atividades. De certa forma, porém, eram impedidos, o que gerava risos e estranhamento com esse aspecto de personalidade do presidente: ouvia-se muito a voz (grossa) de 2D, coordenando, definindo as ações empresariais.
Característica marcante do grupo: autocracia.
Festas infantis
Este é o grupo dos alunos que mais faltaram às aulas, provavelmente porque dois deles são muito jovens e tem também compromissos de iniciação científica; o terceiro é casado, pai e trabalha em uma grande empresa. Assim, os dois mais jovens apresentaram o trabalho em sala, enquanto o terceiro enviou o trabalho via internet, comentando sua parte na atividade. O grupo andou na direção tradicional de máscaras para festas infantis, com o tema escolhido pelo aniversariante nas festas. Este trabalho, de certa forma, tem conexão com o grupo Sorriso, que também apresentara máscara para festas infantis.
Muito embora este grupo não tenha definido explicitamente os cargos, fato que se atribui ao número reduzido de componentes e ausências às aulas, percebeu-se que foi dirigido por 4A. Esse estudante demonstrou características de liderança e criticidade. Indagados sobre os motivos da não divisão dos cargos, eles disseram que foram construindo a empresa em conjunto, passo a passo, sem atribuição dos cargos às pessoas. Dessa forma, 4A tomou para si alguns aspectos ligados ao cargo de presidente, uma vez que ele vinha até a professora para tirar dúvidas e, na apresentação, ocupou melhor o espaço físico expondo com domínio sobre o assunto. 4B possui um perfil técnico, gosta de cálculo, na apresentação concordava com os argumentos de 4A. Aparentemente, 4B adotou a posição um tanto cômoda de "ficar olhando o circo pegar fogo", não querendo correr o risco de se expor. 4C é comedido, desconfia dos conteúdos da área de administração. Todavia, ao fim do trabalho, demonstrou mudança no comportamento, manifestando que a disciplina havia contribuído para a sua formação como gestor.
Característica marcante do grupo: modelo tradicional.
Preservativo
Este foi sem dúvida o grupo mais divertido da sala. Os integrantes riam muito e não revelaram qualquer constrangimento quanto ao tema escolhido. Não houve uma escolha explícita para presidente. Eles trabalharam em conjunto, definindo as ações da empresa. Com exceção de 5B, comedido, o grupo apresentou um perfil típico de profissionais de marketing, com ideias criativas e desprovidos de uma crítica limitadora. Eles rapidamente se organizaram e se divertiram muito elaborando o trabalho. Observou-se que 5C assumiu a tarefa de diretor financeiro, compartilhando com 5A a diretoria de marketing. 5B e 5C assumiram a função de diretor administrativo. As atitudes de ambos demonstravam comedimento e direcionamento, oferecendo equilíbrio ao grupo.
Característica mais forte do grupo: marketing.
N | Computador (1) | Cosmética (2) | Sorriso (3) | Festas Infantes (4) | Preservativo (5) |
A | F: Ativo Moderado, Sensitivo Leve, Visual Moderado, Global Leve M: Extrovertido, Sensitivo | M: introvertido, sensitivo. | F: ativo leve, sensitivo leve, visual moderado, global leve. M: extrovertido. | F: reflexivo leve, sensitivo forte, verbal moderado, seqüencial leve. M: extrovertido, intuitivo. | F: ativo moderado, intuitivo leve, visual leve, seqüencial leve. M: introvertido. |
B | F: ativo leve, sensitivo leve, verbal leve, sequencial leve. M: Extrovertido, Sensitivo | F: ativo moderado, sensitivo leve, visual forte, global leve. M: extrovertido, sensitivo, pensativo. | F: ativo moderado, sensitivo leve, visual moderado, seqüencial leve. M: introvertido, sensitivo. | F: ativo moderado, intuitivo forte, visual moderado, seqüencial leve. M: extrovertido, sensitivo. | F: ativo leve, intuitivo leve, visual leve, seqüencial leve. M: introvertido. |
C | F: ativo Leve, intuitivo leve, visual moderado, sequencial leve. M: extrovertido | F: ativo moderado, intuitivo leve, visual leve, seqüencial leve. M: extrovertido, pensativo. | F: ativo moderado, sensitivo leve, visual leve, seqüencial moderado. M: introvertido. | F: reflexivo moderado, sensitivo moderado, verbal leve, seqüencial moderado. M:extrovertido, pensativo. | F: ativo forte, sensitivo leve, visual moderado, seqüencial moderado. M: introvertido. |
D | F: ativo moderado, sensitivo moderado, visual moderado, global leve. M: extrovertido, pensativo. | F: ativo leve, sensitivo moderado, visual moderado, seqüencial leve. M: introvertido, sensitivo. | F: reflexivo leve, sensitivo moderado, visual moderado, global leve. M: extrovertido, pensativo. | F: ativo moderado, sensitivo moderado, visual moderado, global leve. M: extrovertido, sensitivo. | |
Total | Ativos: 4 Reflexivos: 0 Sensitivo: 3 Intuitivo: 1 Visual: 3 Verbal: 1 Sequencial:2 Global: 2 Introvertidos: 0 Extrovertidos: 4 | Ativos: 4 Reflexivos: 0 Sensitivo: 3 Intuitivo: 1 Visual: 3 Verbal: 1 Sequencial:2 Global: 1 Introvertidos: 2 Extrovertidos: 2 | Ativos: 3 Reflexivos: 1 Sensitivo: 4 Intuitivo: 0 Visual: 4 Verbal: 0 Sequencial: 2 Global: 2 Introvertidos: 2 Extrovertido: 2 | Ativos: 1 Reflexivos: 2 Sensitivo: 2 Intuitivo: 1 Visual: 1 Verbal: 2 Sequencial: 3 Global: 0 Introvertidos: 0 Extrovertidos: 3 | Ativos: 4 Reflexivos: 0 Sensitivo: 2 Intuitivo: 2 Visual: 4 Verbal: 0 Sequencial: 3 Global: 1 Introvertidos: 3 Extrovertidos: 1 |
Tabela 2 - Estilo de aprendizagem dos estudantes por grupo.
Discussão
Dos 19 estudantes que participaram das pesquisas, 18 entregaram o Index. Desses, 15 são ativos (83%) e apenas 3 são reflexivos, que aparecem nos grupos 3 e 4. A concentração nesse estilo de aprendizagem provavelmente esteja ligada a uma seleção prévia dos próprios estudantes que se candidatam ao curso, baseada na expectativa habitual do que seja um engenheiro eletricista, isto é, alguém ativo, capaz de liderar equipes, projetar, construir e monitorar equipamentos. De qualquer forma, está um pouco acima do valor médio das amostragens envolvendo diversos países (63%), mas compatível com os resultados encontrados na Inglaterra (85%), por exemplo, (Felder & Spurlin, 2005).
A maior parte dos estudantes pertence à categoria sensitivo (72%), mas os intuitivos se distribuíram proporcionalmente entre os grupos, pois apenas o grupo 3 não apresentou nenhum sensitivo.
Quanto à dimensão visual/verbal, 83% dos estudantes são visuais, e os verbais estão nos grupos 1 e 4. Os grupos 3 e 5 não contêm nenhum verbal, enquanto o grupo 4Apresenta 2 verbais e um visual, ou seja, na proporção invertida em relação aos demais.
No que se refere à dimensão seqüencial/global, 67% dos estudantes são seqüenciais, ou seja, preferem aprender passo a passo. Mais uma vez, eles estão distribuídos entre os grupos.
Os estilos de aprendizagem relativos às dimensões sensitivos/intuitivos, seqüenciais/globais e visuais/verbais enquadram-se dentro das médias e respectivas dispersões obtidas por outros estudos (Felder & Spurlin, 2005).
Os resultados quanto à constituição espontânea dos grupos contrariam a hipótese de partida, segundo a qual haveria uma tendência de reunião dos indivíduos de estilos semelhantes. Em lugar disso, observou-se uma distribuição de estilos complementares entre os grupos.
Todos os estudantes entregaram o desenho da figura humana, teste de personalidade de Machover. Do total, 11 (58%) são extrovertidos e 7 (42%) são introvertidos, uma proporção próxima ao equilíbrio (50/50), com ligeira predominância dos extrovertidos. Esse resultado é coerente com os estudos de Jung (1991), para o qual a distribuição dos tipos de personalidade é aleatória, não importando a classe social ou o gênero dos indivíduos.
Comparando-se os testes de Felder e Machover, em relação aos estilos/tipos ativos/extroveridos, observa-se uma congruência entre ativos/extrovertidos de 58 % (10 estudantes em 18). Esse resultado está abaixo do estudo anterior (Senra, Lima & Silva, 2008), que apontou uma congruência de 71% entre essas categorias.
Quanto às funções dos indivíduos dentro dos grupos, a de presidente geralmente é a que mais se destaca, pois corresponde ao líder, o ponto de referência dos demais. A hipótese inicial era a de que essa posição fosse ocupada sempre por indivíduos ativos e extrovertidos, mas isso nem sempre ocorreu. No grupo 1, a função foi assumida por um indivíduo ativo-extrovertido; mas, no grupo 2, por um ativo-introvertido; nos grupos 3 e 4, reflexivos-extrovertidos; no grupo 5, a função foi ocupada alternadamente pelos integrantes, todos ativos, porém majoritariamente introvertidos. Isso significa que a conquista da liderança de um grupo exige a presença de outros atributos e nem sempre aquele que se destaca é o mais ativo, ou o mais prolixo, ou o mais extrovertido.
O senso comum sugere que os líderes mais eficientes sejam extrovertidos, mas uma pesquisa realizada em Harvard Business School em parceria com as universidades Wharton e Kenan-Flagler (Grant, Gino & Hoffmann, 2011) indica que os líderes introvertidos são mais eficientes quando a equipe é mais proativa. Tudo depende do grupo de trabalho e de sua relação com o líder. Quando o líder é mais introvertido, ele tende a aceitar melhor as idéias e sugestões da equipe, que, em conseqüência, torna-se mais motivada para o trabalho. Já os líderes extrovertidos são pouco propensos a ouvir o grupo, o que pode gerar atritos quando a equipe toma a iniciativa ou é mais proativa.
Observa-se também que o presidente nem sempre é aquele do qual partiu a idéia vencedora. No grupo 2, a idéia partiu do presidente (2D), recorrendo à expderiência de sua mãe, uma vendedora de cosméticos. Entretanto, no grupo 1 partiu de outro elemento (1C), que ocupou alternadamente a diretoria financeira e a de marketing.
No grupo 3, a ideia também partiu do presidente (3D), mas a direção desse grupo foi exercida de forma autoritária e, conseqüentemente, todas as decisões importantes partiram do presidente, enquanto os demais limitavam-se a um papel coadjuvante. Se por um lado esse tipo de administração parece evitar discussões que poderiam ser interpretadas como perda de tempo, por outro lado não permite que o grupo funcione como equipe, uma vez que os integrantes ficam impedidos de revelar a complementaridade de suas competências.
O grupo 4 demonstrou menor compromisso com a atividade, dada as ausências às aulas. Tal fato dificultou a identificação do autor da proposta. Aparentemente, os estudantes iniciaram a atividade seguindo as etapas passo a passo, sem visão de conjunto do trabalho. Coincidência ou não, este é o único grupo que não contava com nenhum estudante de estilo de aprendizagem global, pois todos eram sequenciais.
Quanto ao comportamento dos grupos, é curioso notar que algumas características do conjunto parece não terem relação com os estilos individuais de seus integrantes. Por exemplo, o grupo 5 foi o único em que o número de indivíduos introvertidos superou o número de extrovertidos. No entanto, foi o grupo que mais se divertiu com a atividade, deixando a marca de sua irreverência e descontração desde a escolha do tema (preservativo). Isso demonstra o quanto os trabalhos em equipe, marcados pela interdependência (Wagner III & Hollenbeck, 1999) e identidade entre seus elementos (Vergara, 1999), distinguem-se dos trabalhos individuais. A escola tradicional prepara os estudantes para trabalhar individualmente, desconsiderando o contexto atual das organizações em que os profissionais serão chamados a participar de equipes cujo comportamento e resultados é mais do que a soma dos valores individuais. Por outro lado, o aspecto individual deve ser contemplado, pois a divisão de tarefas exige competências individuais, como demonstrado nesta pesquisa, bem como o rodízio de tarefas e troca de funções e de responsabilidades.
No grupo 5, observa-se ainda que o aluno extrovertido destacou-se como líder, já que foi o presidente. O restante da equipe, constituída por introvertidos, aceitou bem as idéias e orientações do presidente, ou seja, foi um grupo que se harmonizou na formação da equipe. Todos os quatro, porém, eram ativos, o que facilitou o trabalho em grupo e a experimentação prática da teoria, compatível com a característica da tarefa proposta, resultando na facilidade por eles encontrada ao executá-la.
Conclusão
Este trabalho investigou uma aplicação da metodologia de projetos ao ensino da disciplina de Administração na Engenharia, com enfoque na formação de engenheiros gestores. Foi particularmente analisada a relação entre a dinâmica interna das equipes que desenvolveram os projetos e os estilos de aprendizagem de seus integrantes.
De modo geral, os estudantes demonstraram grande interesse pela disciplina e trabalharam intensamente na execução dos projetos.
Os grupos de trabalho foram constituídos espontaneamente pelos estudantes. Contrariamente à hipótese inicial, os estudantes não se agruparam buscando constituir equipes com estilos de aprendizagem semelhantes, ou seja, grupos homogêneos, mas em todos eles havia uma distribuição dos diversos estilos de aprendizagem.
No que se refere à organização interna dos grupos, nem sempre a posição de liderança foi ocupada por indivíduos extrovertidos, pois a liderança de dois grupos em cinco foi assumida por indivíduos introvertidos.
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Notas
F.W. O. da Silva
E-mail para correspondência: fabiow@des.cefetmg.br.