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Construção psicopedagógica

Print version ISSN 1415-6954On-line version ISSN 2175-3474

Constr. psicopedag. vol.13 no.10 São Paulo  2005

 

DEBATE

 

25 anos de psicopedagogia no Instituto Sedes Sapientiae: onde estamos e para onde vamos?

 

Consuelo de Assis CarvalhoI,1; Maria Alice VassimonI,2; Maria Elizabeth Seidl Machado3; Mônica Hoehne Mendes4; Beatriz ScozII,5

IInstituto Sedes Sapientiae, SP

IIPrograma de Pós–Graduação Stricto Sensu (mestrado e doutorado) em Psicopedagogia da Universidade Santo Amaro (UNISA),Curso de pós–graduação lato sensu em Psicopedagogia das Faculdades Oswaldo Cruz

 


 

Realizado no auditório do Instituto Sedes Sapientiae, no dia 29 de setembro de 2004, data muito especial, de encontros de pessoas e idéias, em que foram comemorados os 25 anos do curso de Psicopedagogia e lançada a Revista Construção Psicopedagógica n. 9, Ano XII, 2004 – edição comemorativa com a temática “Psicopedagogia: onde estamos e para onde vamos?”.

Para celebrar e eternizar esse momento tão significativo e festivo, a revista publica um resumo dos discursos enviados gentilmente por algumas palestrantes, que certamente muito contribuíram — e contribuirão — para reflexões importantes na área da Psicopedagogia e em seus questionamentos.

Como representantes do departamento de Psicopedagogia do Instituto Sedes Sapientiae, Vera Márcia G. da Silva Pina e Anita Lilian Zuppo Abed, respectivamente, abriram o Debate.

O Instituto Sedes Sapientiae, por meio do departamento e do curso de Psicopedagogia, comemora os 25 anos do curso, bodas de prata, um quarto de século. Esse momento coroa todo um caminho de construção que vem sendo percorrido por tantos que, como nós, almejaram a construção de uma nova forma de pensar e de atuar no processo ensino–aprendizagem, que pudesse dar conta das lacunas que não eram contempladas pelas Ciências Humanas separadas em suas especialidades. A Psicopedagogia pode ser definida, hoje, como uma área de conhecimento transdisciplinar–que busca seus subsídios nas diversas ciências do humano, situando a sua especificidade justamente nesse espaço “entre”, nas fronteiras, nas articulações, na integração entre os diversos olhares. Isso faz de nós profissionais generalistas – ou, se preferirem, especialistas em atravessar fronteiras, em viajar pelos múltiplos aspectos do processo ensino–aprendizagem. São 25 anos de buscas no sentido de regulamentar a Psicopedagogia como profissão, de delimitar seu objeto de estudo e o seu campo de atuação.

Temos o prazer de contar com a presença de psicopedagogos formados neste Instituto, bem como de outros profissionais de relevante importância no cenário da Psicopedagogia no Brasil, que nos presentearão com o seu olhar para este momento, trazendo suas reflexões sobre o tema “Psicopedagogia: onde estamos e para onde vamos?”: Consuelo de Assis Carvalho, Maria Alice Vassimon, Maria Elizabeth Seidl Machado, Mônica Hoehne Mendes e Beatriz Scoz.

Sentimo–nos honrados por ter em nosso quadro docente quatro das professoras que fundaram este curso, há 25 anos. Quatro testemunhas de toda essa trajetória, quatro grandes mestras de todos nós, a quem queremos prestar nossas homenagens e agradecer publicamente pelos ensinamentos, pela dedicação à construção da Psicopedagogia, pela amizade e companheirismo.

Professores homenageados: Consuelo de Assis Carvalho, Vera Maria Rossetti Ferretti, Sônia Maria Madi Rezende, Eloisa Quadros Fagali.

Professores do curso de Psicopedagogia: Anna Helena Altenfelder, Anita Lilian Zuppo Abed, Beatriz Helena Stucchi, Elisa Maria Pitombo, Geórgia Vassimon, Izilda Freitas Rolim, Linda Derviche Blaj, Maria Lydia de Mello Negreiros, Marilda Nogueira Costa de Almeida, Marlene Coelho Alexandroff, Regina Andrade Clara Rufino e Vera Márcia G. da Silva Pina.

Dando início aos trabalhos desse evento comemorativo, convidamos a professora Consuelo de Assis Carvalho para, em nome dos professores da casa, contar um pouco da história desses 25 anos do curso de Psicopedagogia do Instituto Sedes Sapientiae.

 

Consuelo de Assis Carvalho

Minhas senhoras e senhores:

Aos 25 anos de nossa existência, ao "abrir" esta comemoração, volto–me para a figura de Madre Cristina, que inspirou e apontou o sentido e o rumo a ser trilhado pela Reeducação Pedagógica, à altura das necessidades de formação dos educadores, no atendimento a crianças com dificuldades de aprendizado, no que se enfatizava sua realidade social. Era, em 1975, o impulso inspirado que dava para que Maria Alice Vassimon, como coordenadora de um grupo de professores, pudesse planejar e pôr em prática o primeiro projeto, que só se executou com o apoio que recebemos da Diretoria do Instituto Sedes Sapientiae. Vale lembrar que o objetivo era formar educadores especializados, capazes de lidar com a adaptação e reintegração dos alunos, nas defasagens de aprendizado. Integravam–se, assim, na prática, os mecanismos psicológicos e as construções do conhecimento, indo além da compreensão dos fundamentos pedagógicos, proporcionando a prática da interdisciplinaridade.

Madre Cristina e o grupo então nascente participavam de início de um mesmo espírito, em que o único medo era ser limitado pelo receio da superficialidade e da falta de extensão. Exigia–se coragem de empreender e de compreender. O curso pioneiro propôs uma rara interação de teoria e prática, o que propiciou uma constante transformação, sempre necessária, para acompanhar novas idéias, atualizando–se constantemente, diante de novos conceitos e publicações. Assim se fez a mudança essencial, e não só nominal, da reeducação para a Psicopedagogia. A idéia contida nessa transformação era a de divulgar uma forma de aprendizagem que se propague, se multiplique, até como um novo agente social. E é assim que já no primeiro grupo de alunos surge, como conseqüência, a iniciativa de criar a Associação Brasileira de Psicopedagogia, que, na sua expansão pré–estimulada, continuará a crescer, com filiais em todo o País.

Foi na ocorrência desse processo que pudemos manter cursos palpitantes e criativos em diferentes regiões, de que destaco como experiências felizes e renovadas as de Uberlândia, as de Salvador, as de São Luís, onde, além de ampliar a formação, como se supunha, conseguiu–se elaborar e operar as diferenças culturais deste nosso país–continente, o que, além de elaborar mais o interesse profissional, permitiu um crescimento grupal, mais objetivo. Nesse capítulo, posso testemunhar a enorme potencialidade da troca de experiências, que permitiu entrever a riqueza que se despertava na ação, quando cada nova turma de alunos engendrava mudanças sempre levadas em consideração, o que, com sugestões e propostas dos professores, enriqueceu e dinamizou os cursos.

Foi realizada, nesse caso, em termos de dinâmica, a integração de visões e leituras, em que se puderam exercitar críticas, o mais das vezes aceitas.

No âmago desse trabalho, de que tive a imensa alegria de participar, fomos descobrir, no esforço despendido, passados, anos de fidelidade à nossa Sociedade, no cerne de nossas experiências, um reencontro espantoso, com as possibilidades e com o crescimento do ser humano, que, além de se superar e acrescentar sempre, permanece como ideal, tão inefável quanto Madre Cristina transmitiu, há 25 anos, como preocupação central.

Nada, absolutamente nada do que se conseguiu, porém, teria tido o denso resultado a que se chegou não fosse a intensidade do esforço e da dedicação do corpo de professores, a quem, portanto, se tributa nosso sucesso. E é claro que se conseguimos como de fato conseguimos, produzir e firmar, na amplidão do País, os resultados de que já falei, tudo se deve ao diuturno esforço, também coroado de êxito, da clínica, mantida, desenvolvida e renovada, modelo do que se fez e padrão de atendimento decente, voltado para a superação da injustiça social, o que é em si um marco fundamental destes 25 anos de muito empenho no marcar o caminho com os traços dos passos que demos juntos. A clínica, ouso destacar, foi o laboratório e o motor de todos os nossos resultados.

Resultados ora documentados devidamente, eis que o registro de nossas reflexões e experiências permite anunciar mais um produto desse movimento de um quarto de século, que culmina com a publicação da revista Construção Psicopedagógica, que, pela qualidade das contribuições que traz, mais adensará o peso da empreitada comum.

Somos, tenho o prazer de dizê–lo, um poderoso resultado da ação, tal como foi pensada pelos filósofos cristãos, ou seja, exatos no pensar e fortes no fazer. No que acabo de lhes dizer repousa um dos maiores e exclusivos prazeres de quem trabalha com o incomensurável, que é o ser humano, em todas as suas condições, condições de caráter social, que não permitiriam a profundidade desejada se não tivéssemos lutado para abrandá–la, em benefício do resultado humano. Muito obrigada.

 

Maria Alice Vassimon

Queremos compartilhar com vocês algumas idéias que têm norteado a nossa reflexão pessoal no presente momento e alimentado o nosso trabalho como educadora e terapeuta.

Trabalhamos com a expressão humana, ela é fundamental, é preciso que se tenha vez e voz.

E na expressão humana convidaria a todos que focassem o movimento do vivo.

Por mais marcas que tivemos ao longo do nosso desenvolvimento e que estão gravadas em nosso corpo, o vivo pulsa em cada um de nós.

Enxergar o vivo é convidá–lo a acontecer.

O vivo brilha em nossos olhos, tem cor que tinge nossa pele, o vivo é leve, tem movimento.

É esperança: leva–nos para o eterno vir a ser.

Enxergar o vivo é também contactá–lo em nós, mesmo que seja preciso desconstruir aqui, transformar ali.

A sistemática repetição de gestos mecânicos não presentifica o que corre vivo em nós.

Para que a expressão genuína de cada um de nós aconteça ela precisa ser acolhida, num campo saudável. Aquele que tem a qualidade de incluir incondicionalmente, cada um em sua singularidade. Um campo que não é moralista, que está aberto para o novo e para o velho, para a dor e a alegria. Simplesmente aberto.

Um campo que acolhe e sustenta as expressões e a busca do vivo em cada uma delas.

Esse campo existe concreto na relação de educação e terapia.

Esse campo é também espaço interno, dos que sabem que o vivo é o movimento humano, movimento da natureza, movimento do universo.

Esse campo de saúde possibilita o encontro.

A riqueza da troca. O reconhecimento de mim mesmo solidário no outro, somos todos únicos e muito, muito semelhantes.

Esse campo de saúde ultrapassa os muros das salas de aula, dos consultórios e estimula a criação de redes humanas, com o homem em situação de risco nas ruas e minha tia que faz tricô, com os profissionais de Psicodrama público no Centro Cultural Vergueiro e as donas de casa que passam por ali.

O vivo nos irmana

e nos ajuda a recriar nossas casas,

nossa cidade, nosso país.

 

Maria Elizabeth Seidl Machado

Queria agradecer o convite de estar aqui entre pessoas tão queridas e que participaram da minha história. É realmente um motivo de muito orgulho, satisfação e emoção.

Para entendermos onde estamos é preciso falarmos de onde viemos. Eu vim daqui, desta casa, do Instituto Sedes Sapientiae. Entrei como aluna, em 1980. Era uma época em que não se sabia muito bem como nomear a área da psicopedagogia. Naquela época, o curso era apresentado como Reeducação Psicopedagógica, trazendo uma abordagem especificamente clínica. Eu vinha de uma experiência institucional e buscava uma melhor compreensão a respeito do processo de aprendizagem de crianças e adolescentes.

A primeira turma no Sedes contava com 6 alunas apenas; a minha, que era a segunda turma, tinha 12 alunas, e a terceira já contava com 20. Nos unimos, alunas e professoras, batalhamos juntas. E, com um grande esforço, fundamos a Associação de Psicopedagogia de São Paulo, em 1980, com a sigla AEP-SP. Foi um projeto que deu certo. Deu certo porque frutificou, cresceu, transformando–se em Associação Brasileira de Psicopedagogia – ABPP e que continua dando uma contribuição substantiva para todos nós. Permaneci alguns anos em cargos executivos nessa Associação.

Depois de formada, permaneci no Sedes Sapientiae, como docente no curso de formação, até o ano de 1993. Afastei–me do curso, com muito pesar e por motivos pessoais. Nesses anos em que lecionei aqui, continuei aprendendo e me formando, junto com as alunas e a equipe da psicopedagogia. Ao mesmo tempo, começava a agregar no meu percurso profissional a experiência clínica, trabalhando com crianças e adolescentes com dificuldades de aprendizagem. Esses dois olhares, o clínico e o institucional, foram muito importantes, porque me permitiram conceber o processo de aprendizagem com uma visão mais ampla e complementar.

Nesses dois contextos, instituição e espaço terapêutico, relacionava–me com as famílias dos alunos e filhos. Com muitas dúvidas e reflexões, fui encontrando algumas respostas e abrindo novas perguntas. Trabalhar com a aprendizagem implica inserir a família no processo de aprendizagem. O primeiro ambiente de aprendizagem é a família. Fui, então, complementar a minha formação, e hoje, além de psicopedagoga, sou também terapeuta familiar sistêmica, trabalhando com crianças, adolescentes, casais e famílias.

Essa é a minha história profissional.

Onde estamos e para onde vamos?

Estamos mais sabidos, e a Psicopedagogia, com certeza, ampliou os horizontes, tendo uma atuação mais abrangente e socializante. Lembro–me do primeiro caderno da Associação, de 1982, em que o tema principal era “A Psicopedagogia em Questão”. Os sub–temas versavam sobre: Psicopedagogia preventiva ou remediativa? Qual o perfil dos profissionais da área? Qual o papel do psicopedagogo na nossa realidade? Escola pública ou privada? Devemos criar nosso próprio modelo ou importar? Esse perfil foi sendo delineado. Congressos e encontros marcaram essa etapa.

A Psicopedagogia, que outrora se encontrava no lugar individual, dos déficits, das faltas, das patologias, hoje se encontra num lugar multiverso, de caráter multidisciplinar. Saiu da técnica para a investigação das questões ligadas à aprendizagem nesse mundo tão complexo que é o do aprender. O aprender ligado tanto aos aspectos individuais — orgânico, cognitivo, afetivo, psicomotor — como também aos contextos de aprendizagem — família, escola, comunidade, sociedade. Por isso falamos hoje em comunidades de aprendizagem acontecendo nas interações, sendo, portanto, relacional. Buscamos hoje os recursos e não as faltas e déficits buscamos as positividades e possibilidades, acreditando num mundo dos possíveis, na inclusão social e no atendimento à diversidade.

Se na década de 90 observamos o fortalecimento de crianças e adolescentes com a conquista do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), numa perspectiva da garantia de direitos, hoje torna–se necessário também o fortalecimento de suas famílias, entendidas de forma mais democrática, flexível e humana, sejam elas quais forem. Olhar essas famílias pós–modernas e buscar novos significados é um de nossos desafios. A família mudará à medida que a sociedade muda, e a sociedade desenvolverá novas estruturas familiares para se adaptar às novas realidades sociais.

Por outro lado, as instituições escolares também passaram por uma revisão e evoluíram. Não cabe mais nos dias de hoje a pergunta “escola pública ou privada”? Mas a pergunta que deve ser feita é “como fazer parcerias e alianças em que possamos trocar os nossos saberes? Como trabalhar a inclusão e o complementar nesses espaços?”.

Estamos indo para uma Psicopedagogia sistêmica na qual todos os atores sociais implicados nas aprendizagens devem fazer parte e se responsabilizar pelo seu papel. O aluno, o professor, a equipe técnica, os familiares e a comunidade formando uma rede de atendimento. O grande elo que formei foi a possibilidade de articulação no fazer, no fazer–pensar e sentir, entre pessoas, espaços e sistemas. Entre a escola, a família e o espaço terapêutico, por exemplo. Várias redes podem e devem ser formadas. Quanto mais articulados forem esses espaços educativos disponíveis numa comunidade, maiores serão as chances de potencializar o desenvolvimento de crianças e adolescentes, de modo a torná–los autores e protagonistas de suas histórias.

Na sociedade, verificamos que 1o, 2o e 3o setores começam a aprender a desenvolver projetos em conjunto. Poder público e sociedade civil aprendendo a trabalhar em parceria. Descobrimos que sozinhos podemos muito pouco. Nenhuma instituição, espaço educativo, escola ou família pode ou consegue, hoje, responder isoladamente por toda a formação da criança e do adolescente. E a Psicopedagogia não pode ficar à margem desse processo. Por isso acredito estarmos indo para uma Psicopedagogia sistêmica. Uma Psicopedagogia que se articula nessa rede social, participando desse jogo de interações e dando sua contribuição. Portanto, hoje é mais útil pensarmos numa aprendizagem compartilhada. A aprendizagem não acontece só num determinado espaço, ela se constrói no cotidiano, com a escola, com a família, com os meios de comunicação, com a convivência social, com a cultura local. A complexidade da sociedade atual exige que se experimentem novas possibilidades e redes inovadoras, construindo múltiplos sentidos para o aprender.

Falta muito ainda, mas os primeiros passos já aconteceram. Na educação os processos são lentos, e isso não deve nos causar desânimo. O desafio dos novos tempos é o da construção de novas malhas para a formação integral de nossos educandos. Hoje, falamos de educação formal, não formal e informal. Todas elas significativas e importantes. Falamos de alunos e educadores como sujeitos de aprendizagem. Hoje falamos de aprendizagem permanente em todas as áreas e sentidos. Daí uma Psicopedagogia que pense sistemicamente e inclua na sua atuação os demais atores sociais.

Gostaria de finalizar com uma palavra de Paulo Freire:

“Ninguém ensina ninguém

Tampouco ninguém aprende sozinho

Os homens aprendem em comunhão

Mediatizados pelo mundo”.

 

Mônica Hoehne Mendes

A contribuição do Instituto Sedes Sapientiae para a Identidade da Psicopedagogia no Brasil.

É com grande satisfação que aceitei o convite para este evento em que se comemora o aniversário do “Curso de Psicopedagogia do Sedes Sapientiae”. Evidentemente esse curso faz parte da história da Psicopedagogia no Brasil, como pioneiro, acrescido do fato de ter sido o responsável pela formação das pessoas que fundaram a Associação Estadual de Psicopedagogos em 1980; são duas histórias que se entrelaçam. Dessa forma, o Instituto Sedes Sapientiae contribui duplamente para a construção da identidade da Psicopedagogia em nosso país.

Estudos sobre identidade levam em conta o processo histórico e os vários personagens que compõem este cenário. A leitura de nossa história (psicopedagógica) nos permite avaliar as várias transformações do cenário e da identidade dos personagens que dela fazem parte.

A identidade é compreendida como movimento, que procura articulação entre a subjetividade (dos personagens) e a objetividade. Sendo o psicopedagogo um profissional oriundo de diferentes graduações, ele busca, por meio de sua conscientização, uma transformação de suas concepções e de seu fazer.

A Psicopedagogia tem hoje uma identidade menos nebulosa, graças ao movimento associativo que há 25 anos cresce em nosso meio, assim como pela contribuição que os cursos com a seriedade do Instituto Sedes Sapientiae vêm dando a ela.

Os profissionais formados por este curso estão disseminando seu fazer, com competência e responsabilidade, o que posso constatar por aqueles que me procuram para supervisão de seu trabalho. Esta instituição, atravessada pela sua competência e seriedade, além de contribuir para a definição de nossa identidade, colabora para a institucionalização da Psicopedagogia.

Parabenizar o Instituto Sedes Sapientiae significa parabenizar os competentes profissionais que contribuíram para que, no transcurso destes anos, vários profissionais psicopedagogos aumentassem o índice daqueles que estudam e intervêm no processo de aprendizagem. Nossas escolas atravessam um momento de crise, e ninguém melhor do que os psicopedagogos para contribuir no enfrentamento dessas dificuldades.

Agora que estou à frente da Associação Brasileira de Psicopedagogia – Seção São Paulo, tenho tido a oportunidade de conhecer a realidade de várias cidades do interior de São Paulo, e percebo o quanto temos a fazer.

Finalizando minha fala, cumprimento a coordenação do Curso de Psicopedagogia, bem como a direção desta digníssima instituição, pelo seu brilhante trabalho, com os votos de que continuem a colaborar para o crescimento consciente de nossos profissionais.

 

Beatriz Scoz

A construção da subjetividade e da identidade de psicopedagogos e educadores: os sentidos do aprender e do ensinar

O objetivo desta palestra/artigo é promover uma reflexão sobre o passado, o presente e o futuro da Psicopedagogia apresentando as contribuições do Instituto Sedes Sapientiae. Nesse percurso, este artigo enfatiza a compreensão da subjetividade e da identidade de psicopedagogos e educadores em uma perspectiva dinâmica e processual, que considere uma confluência de sentidos que eles vão produzindo em suas trajetórias de vida.

O Instituto Sedes Sapientiae integra o ontem, o hoje e o amanhã da Psicopedagogia. Essa integração se expressa em minha própria trajetória, inicialmente como aluna e, posteriormente, como profissional da Psicopedagogia.

O meu primeiro contato com a Psicopedagogia aconteceu em 1981 no Curso de Reeducação Psicopedagógica promovido pelo Instituto Sedes Sapientiae. As vivências corporais nas aulas de Vera Maria Rossetti Ferretti, a construção psicopedagógica da leitura e da escrita nas aulas de Sônia Maria Maddi Rezende, as teorias psicodinâmicas nas aulas de Eloísa Quadros Fagali e as vivências corporais nas aulas de Consuelo de Assis Carvalho e de Maria Alice Vassimon contribuíram, inicialmente, para a minha atuação como psicopedagoga na clínica, no diagnóstico e no atendimento psicopedagógico, e, posteriormente, para a minha atuação como psicopedagoga nas instituições, na implantação e na docência de cursos de pós-graduação lato sensu em Psicopedagogia (Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Universidade Católica de Pernambuco, Faculdade Pio Décimo de Aracaju e Faculdades Cesmac de Maceió).

Nas universidades o curso do Sedes ofereceu–me valiosas contribuições, principalmente na disciplina Modalidades de Aprendizagem, na qual, a partir de cenas dramáticas, os alunos vivenciam seus próprios processos de aprender e de ensinar.

Atualmente, atuo como docente nos cursos de pós–graduação stricto sensu — mestrado e doutorado — no Instituto de Psicopedagogia da UNISA (Universidade Santo Amaro), que configura um importante campo de pesquisa acadêmica que aponta para o amanhã da Psicopedagogia. Além dos Seminários de Pesquisa voltados para meus orientandos, ministro uma outra disciplina denominada A Intervenção Psicopedagógica em Instituições, em que são realizados estudos sobre a construção da subjetividade e da identidade de psicopedagogos, educadores, especialmente de professores.

A construção da subjetividade e da identidade é um tema que vem sendo discutido com muita ênfase nas últimas décadas, quando se percebeu que diversas situações humanas vividas pela sociedade contemporânea podem ser melhor compreendidas quando analisadas a partir da subjetividade e da identidade. Elas permeiam o modo de estar no mundo e o trabalho dos homens em geral, e, assim, dos psicopedagogos e educadores afetando suas formas de atuação profissional.

Nos estudos que desenvolvo a subjetividade e a identidade são compreendidas em suas formas processuais e dinâmicas, como a confluência de uma série de sentidos que se articulam na história do sujeito e nas condições concretas dentro das quais esse mesmo sujeito atua no momento. Minha proposição ao realizar este estudo foi a de tomar a categoria sentido tal qual foi explicitada por Fernando González Rey, em seu livro Sujeito e Subjetividade (2003). Para ele (p. ix) "o sentido exprime as diferentes formas da realidade em complexas unidades simbólico–emocionais, nas quais a história do sujeito e dos contextos sociais produtores de sentido é um momento essencial de sua constituição".

Ainda de acordo com González Rey, as criações humanas são produtoras de sentido que expressam de forma singular complexos processos da realidade. Esses processos são criações humanas que integram diferentes aspectos do mundo em que o sujeito vive, aparecendo em cada sujeito ou espaço social de forma única, organizados em seu caráter subjetivo pela história de seus protagonistas.

Segundo González Rey (2003, p. 273), essa maneira de conceber o estudo da subjetividade "concretiza no campo da Psicologia a visão de complexidade defendida por Edgar Morin", ou seja, trata–se de considerar as ligações, as articulações, ou, trata–se de expressar aquilo que é tecido em conjunto. Essa concepção assume importância cada vez maior nos tempos atuais, pois representa uma tentativa de superar o que foi artificialmente cindido na história do pensamento — por exemplo, a cisão homem–sociedade apresentando na Psicologia uma visão diferente, capaz de romper com toda reificação essencialista do fenômeno psicológico. Trata–se de uma visão que enfatiza ao mesmo tempo a complexidade da organização simultânea e contraditória dos espaços individuais e sociais.

Para o estudo da subjetividade e da identidade dos psicopedagogos e educadores, foram considerados os sentidos que eles produzem em seus processos de aprender e de ensinar em suas famílias, comunidades de convivência, escolas, processos formativos, bem como as possíveis relações entre esses sentidos. Nessa perspectiva, pode–se compreender esses profissionais em um de seus princípios epistemológicos: "o observador/criador deve se incluir na observação e na concepção. O conhecimento necessita do autoconhecimento".

Como sentidos passados, presentes e futuros não se dissociam, o Sedes também tem um papel importante em minha vida pessoal. Minha filha Adriana está concluindo o curso de Psicopedagogia aqui no Sedes, assim como Maria Christina de Magalhães Silvestre, filha de minha mais próxima e saudosa colega de curso Nilza de Magalhães.

É importante lembrar que o sentido é essencial para o ser humano, pois, como lembra Capra (2002, p. 96), "temos a contínua necessidade de captar o sentido dos nossos mundos interior e exterior, de encontrar o significado, e de agir de acordo com eles".

É importante que esse movimento seja captado e transformado em ações concretas que propiciem a abertura de espaços facilitadores de produção de sentidos para psicopedagogos, educadores, especialmente professores, para, talvez assim, superar as situações problemáticas relativas à qualificação da educação e do ensino.

Não se trata de uma tarefa fácil, pois, como já mencionado, a produção de sentidos implica uma dimensão de complexidade na qual está em jogo uma configuração de sentidos produzidos nas trajetórias de vida dos sujeitos. Entretanto, como diz Jung (apud Jaffé, p. 139):

O homem possui uma consciência que não apenas percebe, reage e experimenta, mas que é capaz também de voltar ao vivido e percebido, dar–se conta do que está experimentando. Ele tem a faculdade da reflexão (do latim reflectere – dobrar–se para trás). E compreensão e, através do mundo exterior e interior, de auto–ampliação, de auto–transformação.

 

Referências bibliográficas

CAPRA, Fritjof. As conexões ocultas: ciência para uma vida sustentável. São Paulo: Cultrix, 2002.        [ Links ]

JAFFÉ, Aniela. O mito do significado na obra de C. G. Jung. 10. ed. São Paulo: Cultrix, 1995.        [ Links ]

MORIN, Edgar. Meus demônios. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2000.        [ Links ]

GONZÁLEZ REY, Fernando. Sujeito e Subjetividade: uma aproximação histórico–cultural. São Paulo: Pioneira Thompson, 2003.         [ Links ]

SCOZ, Beatriz J. L. Identidade e subjetividade de professoras/es: sentidos do aprender e do ensinar. (Tese de doutorado) São Paulo: Pontifícia Universidade Católica, 2003        [ Links ]

 

 

Nota

1 Pedagoga, psicóloga com especialização em Psicologia Clínica pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Sedes Sapientiae, SP, psicodramatista pelo Grupo de Estudo de Psicodrama, Argentina, professora do curso de Psicopedagogia e Atendimento Familiar no Instituto Sedes Sapientiae, SP, atendimento clínico e de orientação familiar no consultório particular
e–mail seraphico@terra.com.br

2Educadora e psicoterapeuta com formação em Psicodrama, Sociodrama, Vegetoterapia Caractero Analítica, fundadora do GETEP — Grupo de Estudos e Trabalhos Psicodramatico, SP, fundadora e coordenadora do Curso de Psicopedagogia do Instituto Sedes Sapientiae, SP, especialista em terapia de adultos e de casais, supervisora de profissionais nas áreas de Educação e Psicoterapia.
e–mail getep@terra.com.br

3Pedagoga pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, formada em Letras pela Faculdade de Letras da Universidade Federal do Rio de Janeiro, psicopedagoga pelo Instituto Sedes Sapientiae, SP, terapeuta familiar sistêmica pelo Familiae – Instituto de Formação e Pesquisa em Terapia Sistêmica, SP.
e- mail bethsmachado@terra.com.br

4Pedagoga pela Universidade São Marcos, SP, psicopedagoga pela EPSIBA, Buenos Aires, A., mestre em Psicologia pela Universidade São Marcos, SP, presidente da ABPp Nacional no biênio 91/92, presidente fundadora da ABPp Seção São Paulo.
e–mail monicamendes@ig.com.br

5Psicopedagoga pelo Instituto Sedes Sapientiae, SP, mestre e doutora em Psicologia da Educação pela Pontifícia Universidade Católica, SP, professora doutora do Programa de Pós–Graduação Stricto Sensu (mestrado e doutorado) em Psicopedagogia da Universidade Santo Amaro (UNISA), SP, professora do curso de pós–graduação lato sensu em Psicopedagogia das Faculdades Oswaldo Cruz, fundadora e professora dos cursos de Psicopedagogia da Universidade Católica de Pernambuco, da Faculdade Pio Décimo de Aracaju, SE, e da Faculdade CESMAC em Maceió, AL.
e–mail beatrizscoz@uol.com.br

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