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Revista Brasileira de Orientação Profissional

On-line version ISSN 1984-7270

Rev. bras. orientac. prof vol.11 no.1 São Paulo June 2010

 

ARTIGOS ORIGINAIS

 

Evidências de precisão e validade do Teste de Fotos de Profissões (BBT-Br)1

 

Evidences of reliability and validity of the Berufsbilder-Test (BBT-Br)

 

Evidencias de precisión y validez de la prueba de Fotos de Profesiones (BBT-Br)

 

 

Erika Tiemi Kato Okino* 2; Sonia Regina Pasian**

Universidade de São Paulo - Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto - Departamento de Psicologia e Educação - Ribeirão Preto-SP, Brasil

 

 


RESUMO

Considerando a necessidade de aprimoramento dos instrumentos de avaliação psicológica apontada pela literatura internacional e nacional, este trabalho examinou indicadores de precisão e de validade do Teste de Fotos de Profissões (BBT-Br). Foram avaliados 497 voluntários, de 16 a 19 anos de idade, de ambos os sexos, estudantes do Ensino Médio público, por meio de aplicações coletivas do BBT-Br e do Self-Directed Search (SDS-CE). Neste trabalho, foram realizadas análises de precisão (consistência interna, pelo Alfa de Cronbach) e de validade do BBT-Br (análise fatorial e validação convergente com SDS). As evidências empíricas encontradas demonstraram bons índices psicométricos de precisão e de validade do BBT-Br, sobretudo a partir das associações significativas encontradas com o modelo RIASEC do SDS, fortalecendo as hipóteses interpretativas do BBT-Br no contexto brasileiro.

Palavras-chave: Interesse, Validade, Precisão, SDS, BBT-Br.


ABSTRACT

Considering the need for improvement of the instruments of psychological assessment, as highlighted by both international and national literatures, this paper examined the indicators of reliability and validity of the Berufsbilder-Test (BBT-Br). Four hundred ninety-seven volunteers with ages varying from 16 to 19 years old, of both sexes, doing their high school senior grade at a public school, were assessed collectively by the BBT-Br and the Self-Directed Search (SDS-CE). In this paper, reliability analysis (Cronbach’s alpha) and validity of the BBT-Br (factorial analysis and convergent validation with SDS) were done. The empirical evidences showed good psychometric levels of reliability and validity of the BBT-Br, chiefly relating to the significant associations with the RIASEC model, thus improving the interpretative hypothesis of the BBT-Br in the Brazilian context.

Keywords: Interests, Validity, Reliability, SDS, BBT-Br.


RESUMEN

Considerando la necesidad de perfeccionamiento de los instrumentos de evaluación psicológica apuntada por la bibliografía internacional y nacional, este trabajo examinó indicadores de precisión y de validez de la Prueba de Fotos de Profesiones (BBT-Br). Se evaluó a 497 voluntarios, de 16 a 19 años de edad, de ambos sexos, estudiantes de la Enseñanza Media pública, por medio de aplicaciones colectivas de la BBT-Br y de la Self Directed Search (SDS-CE). En este trabajo, se realizaron análisis de precisión (consistencia interna, por el Alfa de Cronbach) y de validez de la BBT-Br (análisis factorial y validación convergente con SDS). Las evidencias empíricas encontradas demostraron buenos índices psicométricos de precisión y de validez de la BBT-Br, sobre todo a partir de las asociaciones significativas encontradas con el modelo RIASEC del SDS, fortaleciendo las hipótesis interpretativas de la BBT-Br en el contexto brasileño.

Palabras clave: Intereses, Validez, Precisión, SDS, BBT-Br.


 

 

A avaliação psicológica, dentro do processo de Orientação Vocacional/Profissional (OVP), pode funcionar como processo facilitador da compreensão da dinâmica psicológica dos indivíduos, conquistando uma posição de relevante contribuição nesse contexto (Teixeira & Lassance, 2006). De acordo com Noronha, Freitas e Otatti (2003), a adequada identificação das necessidades individuais e o bom uso das técnicas de avaliação psicológica, pertinentes aos objetivos delineados, eleva a responsabilidade dos profissionais da área em sua prática cotidiana, reforçando assim, a importância da formação em orientação profissional e de carreira. Estes argumentos são reforçados por Lassance, Melo-Silva, Bardagi e Paradiso (2007). Também de acordo com Duarte (2008), a avaliação psicológica constituiria “instrumento de base para ajudar os indivíduos a realizarem suas escolhas” (p. 139), devendo ser compreendida como processo integrador de determinantes situacionais e características pessoais do indivíduo. Dentro desse processo, os modelos de intervenção implementados nos diversos serviços de OVP e a utilização das estratégias técnicas adequadas às demandas específicas dos indivíduos, incluindo avaliação psicológica, poderão favorecer uma escolha satisfatória da profissão, segundo Melo-Silva e Jacquemin (2001) e Melo-Silva, Lassance e Soares (2004).

No Brasil, como afirmam Draime e Jacquemin (1989), Noronha et al. (2002), Hutz (2002) e Bandeira, Trentini, Winck e Lieberknecht (2006), entre outros, pode-se identificar algumas imprecisões na utilização de instrumentos de avaliação psicológica em OVP, fato que colaborou para a criação de preconceitos por parte da população e também dos próprios psicólogos para com essas técnicas. Esse contexto exigiu (e exige) verificação específica da qualidade técnica dos instrumentos disponíveis para avaliação psicológica, no intuito de aprimorar a sua utilização. Nessa perspectiva, Otatti e Noronha (2003) examinaram os parâmetros psicométricos de inventários de interesse profissional comercializados no Brasil no início do século XXI. Verificaram reduzida qualidade técnica em quase todos os instrumentos psicológicos avaliados, sendo que a maioria dos problemas concentrava-se na ausência de estudos de validade, precisão e normas.

A necessidade de aprimoramento dos instrumentos de avaliação psicológica utilizados no Brasil foi claramente apontada pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP), levando à elaboração da Resolução 002/2003 (CFP, 2003). Este documento define e regulamenta a elaboração e a comercialização de testes psicológicos no contexto brasileiro, oferecendo claras diretrizes para a adequada utilização e qualificação dos instrumentos de avaliação psicológica.

Dentre os testes psicológicos avaliados pelo CFP, de acordo com Mansão (2005), o Teste de Fotos de Profissões (BBT-Br) caracteriza-se como único teste projetivo utilizado em OVP com parecer favorável para uso e comercialização no contexto brasileiro. O BBT-Br é um instrumento projetivo de avaliação psicológica composto por 96 fotos de profissionais no exercício de sua profissão, apresentando-se nas versões masculina e feminina. Foi proposto originalmente por Achtnich (1988, 1991), com o objetivo de avaliar inclinações motivacionais, compreendidas como representantes dos interesses e das necessidades individuais ao longo da vida, passíveis de modificação em função de variáveis internas ou do contexto sociocultural, possuindo, portanto, uma natureza de permeabilidade e de desenvolvimento, ultrapassando uma concepção determinística única para o comportamento humano. Em sua proposta haveria estreita ligação entre a satisfação das necessidades do indivíduo e sua escolha profissional e pessoal de vida, resultantes da integração entre características de personalidade e interesses. A gratificação básica das inclinações motivacionais do indivíduo, em atividades laborais ou cotidianas, seria um elemento favorecedor de saúde mental, representando um aspecto de preservação da própria vida. Originalmente esta técnica denominava-se Berufsbilder-Test, marcando sua origem suíça, conhecido pela sigla BBT. Este teste foi introduzido no Brasil por André Jacquemin na década de 1980, passando por amplo processo de adaptação sociocultural a este contexto, resultando nas versões masculina e feminina do BBT-Br (Jacquemin, 2000; Jacquemin, Okino, Noce, Assoni, & Pasian, 2006; Okino et al., 2003).

Os estudos de adaptação e padronização da versão masculina do BBT foram publicados em Jacquemin (2000). Esse trabalho detalhou as etapas realizadas para adequar os estímulos (fotos de atividades profissionais) ao contexto brasileiro, bem como apresentou os padrões de desempenho nesta técnica projetiva obtidos com 472 estudantes de escolas públicas e particulares do Ensino Médio, 227 universitários e 31 profissionais. Estudos semelhantes foram realizados com a forma feminina do BBT (Jacquemin et al., 2006), apresentando resultados encontrados em 512 alunas do Ensino Médio de escolas públicas e particulares, além de 352 universitárias, apontando especificidades de inclinações motivacionais em função da origem escolar dos adolescentes. Os resultados destas investigações geraram as versões adaptadas do Teste de Fotos de Profissões (BBT) ao contexto brasileiro, denominadas de BBT-Br (masculino) e BBT-Br (feminino), abarcando a elaboração de novas fotos e padrões normativos para o instrumento. O BBT-Br, portanto, corresponde ao BBT original, com as mesmas bases teóricas e técnicas, propondo-se a avaliar as tendências motivacionais do indivíduo, informando sobre suas estruturas (primária e secundária) de interesses e de rejeições de atividades.

De acordo com os trabalhos publicados por Jacquemin e Pasian (1991) e Noce, Okino, Assoni e Pasian (2008), o BBT-Br pode ser aplicado com eficiência em processos de OVP em função da riqueza das informações e hipóteses interpretativas decorrentes de sua correta utilização. Estas evidências também foram apresentadas nos estudos de Pasian e Jardim-Maran (2008) e Melo-Silva, Pasian, Assoni e Bonfim (2008).

Pode-se afirmar que as possibilidades de uso do Teste de Fotos de Profissões em processos de intervenção em OVP no Brasil têm sido exploradas. Melo Silva e Jacquemin (2000) focalizaram o uso do BBT como instrumento auxiliar na avaliação de processos de intervenção grupal em OVP com estudantes do Ensino Médio. Seus resultados permitiram apontar o BBT como uma ferramenta importante na ampliação das possibilidades diagnósticas do indivíduo em OVP. Bernardes (2000), por sua vez, realizou estudo longitudinal com adolescentes do ensino médio, com intervalo de aproximadamente quatro anos entre as aplicações do BBT. Os resultados confirmaram a capacidade prognóstica do BBT, fortalecendo pressupostos teóricos e técnicos do instrumento. Sbardelini (1997), por sua vez, utilizou o BBT para tentar compreender a reopção da carreira durante os estudos de graduação, estabelecendo prognósticos sobre a adaptação à nova escolha profissional. Os resultados permitiram a identificação de necessidades específicas dos alunos estudados, atestando a contribuição do Teste de Fotos de Profissões (BBT) para esclarecer motivações intrínsecas implicadas nos processos de reopção profissional, evidenciando, assim, sua validade clínica no contexto universitário.

Em outro estudo, Melo-Silva, Noce e Andrade (2003) aplicaram o BBT-Br em 136 adolescentes com o objetivo de investigar os alcances terapêuticos de processos individuais e grupais em OVP. Apresentaram dados de produtividade e da estrutura de inclinação motivacional positiva e negativa de acordo com o sexo dos sujeitos, destacando semelhanças e diferenças em função desta variável. Conseguiram apontar evidências de utilidade no uso do BBT-Br na investigação das necessidades e dos interesses em adolescentes que procuram OVP, demonstrando sua validade clínica.

Relevante investigação do BBT-Br foi desenvolvida por Campos (2003), pesquisando a congruência/incongruência entre o perfil vocacional (evidenciado pela técnica projetiva) e as características da profissão desempenhada por adultos. Os resultados evidenciaram associações significativas entre a estrutura de inclinações motivacionais do BBT-Br e o grau de satisfação nas atividades desempenhadas no trabalho, as quais se relacionaram claramente com as intercorrências de saúde por eles vivenciadas. Quando existia congruência entre as inclinações motivacionais evidenciadas pelo BBT-Br e as atividades profissionais efetivamente realizadas, identificou-se, no histórico de vida destes indivíduos avaliados, menor número de problemas de saúde geral e de afastamentos do trabalho por motivos de doença. Este estudo apresentou, desta forma, evidência empírica confirmadora do pressuposto de Achtnich (1991) de que o grau de satisfação em atividades ocupacionais favorece a preservação da saúde mental e geral.

Buscando a interface do BBT-Br com outras técnicas de avaliação psicológica, Jardim-Maran (2004) avaliou estudantes do terceiro ano do Ensino Médio público e particular de ensino, com idades entre 16 e 19 anos, por meio de entrevista, BBT-Br e Questionário Desiderativo. Os resultados evidenciaram sinais de interface qualitativa entre os fatores de inclinação motivacional mais escolhidos ou rejeitados no BBT-Br e os mecanismos de defesa e os conteúdos rejeitados no Questionário Desiderativo, evidenciando que o uso associado destes instrumentos de avaliação psicológica é enriquecedor na compreensão dos temores e ansiedades dos adolescentes.

Com o objetivo de verificar as possibilidades informativas do BBT-Br quanto a indicadores de maturidade para a escolha profissional e na perspectiva de fundamentar empiricamente algumas de suas hipóteses interpretativas, Noce (2008) avaliou individualmente alunos do terceiro ano do Ensino Médio público, de ambos os sexos. Os resultados demonstraram a existência de especificidades motivacionais na produção dos adolescentes diante do BBT-Br em função do nível de maturidade e do sexo, confirmando, empiricamente, evidências da influência sociocultural na determinação dos interesses profissionais.

Uma síntese histórica das pesquisas realizadas no Brasil com o Teste de Fotos de Profissões (BBT e sua versão brasileira BBT-Br) foi apresentada em Pasian, Okino e Melo-Silva (2007). A partir desses trabalhos, pode-se depreender adequadas condições técnicas no Teste de Fotos de Profissões (BBT-Br) para investigação dos interesses no contexto brasileiro. No entanto, ao verificar a própria construção desse instrumento projetivo de clarificação das inclinações motivacionais, nota-se a falta de investigações sobre a sustentação teórica da estrutura de fatores motivacionais pressuposta por Achtnich (1991).

O Teste de Fotos de Profissões de Achtnich (1991) foi estruturado com base em oito radicais de inclinação motivacional, postulados como elementos básicos para classificar as tendências, as aspirações fundamentais e as inclinações essenciais dos interesses. Esses oito radicais coexistem num mesmo indivíduo, combinados entre si de maneiras múltiplas e são expressivos de necessidades motivacionais específicas. Achtnich (1991) os nomeou da seguinte maneira: Fator W (associado à sensibilidade, prazer ao toque, delicadeza e subjetividade); Fator K (relacionado à força física e psíquica, agressividade); Fator S, apresentado em duas vertentes: Sh (representante da necessidade de ajudar o outro, do interesse por relações interpessoais) e Se (caracterizado pelo dinamismo, energia psíquica, busca por mudanças e soluções de desafios); Fator Z (necessidade de mostrar-se, de reconhecimento, de valorização pessoal, de apreço ao belo e apuro estético); Fator V (caracterizado pela racionalidade, objetividade, organização e precisão lógica); Fator G (abstração, imaginação criativa, intuição e elaboração de idéias, investigação); Fator M (necessidade de lidar com o concreto do ambiente, com limpeza; apego ao passado, conservador); Fator O, apresentado em duas vertentes: Or (necessidade de comunicação verbal) e On (necessidade e interesse por nutrição e aspectos da alimentação).

Não foi possível identificar, dentro de nosso conhecimento, trabalhos dirigidos à investigação da validade de construto das pressuposições interpretativas do Teste de Fotos de Profissões, mais especificamente sobre os chamados fatores Achtnich (W, K, S, Z, V, G, M, O), como adequados representantes das inclinações motivacionais humanas. Este desafio precisa ser enfrentado para o aprimoramento desta técnica projetiva, dadas as várias pesquisas apontadas anteriormente e que demonstraram sua adequada validade clínica, sobretudo em OVP.

Um ponto central das formulações de Achtnich (1991) é a noção de que a integração da personalidade e o equilíbrio psíquico do indivíduo são dependentes (embora não de maneira exclusiva) do nível de satisfação de suas necessidades no exercício ocupacional e profissional. Em termos de princípios teóricos, é possível notar que esses pressupostos básicos estabelecidos por Achtnich (1991), aproximam-se da reconhecida Teoria de Holland (1997) denominada como Personalidade Vocacional. Ambas postulam a preservação da saúde mental do indivíduo como fortemente determinada pela concretização e satisfação das necessidades motivacionais no trabalho e nas atividades ocupacionais em geral. Outro ponto comum entre as formulações destes referidos pesquisadores, está no fato de que ambos criaram instrumentos de avaliação psicológica específicos como estratégias embasadoras e norteadoras das práticas de intervenção em OVP. Entre outras técnicas de exame psicológico, Holland, Fritzsche e Powell (1994) elaboraram o Self-Directed Search – SDS – Career Explorer (CE), enquanto Achtnich (1991) criou o Berufsbilder-Test (BBT) ou Teste de Fotos de Profissões.

A universalmente reconhecida teoria da Personalidade Vocacional de Holland (1997) afirma que os indivíduos e os ambientes poderiam ser classificados em seis tipos psicológicos. Estes tipos ficaram estruturados no modelo RIASEC, podendo-se esquematicamente sistematizar suas principais características nos seguintes termos: Realista (R): estilo pessoal prático e concreto, resolutivo de problemas; Investigativo (I): marcado por estilo analítico, investigativo, reflexivo e intelectualizado; Artístico (A): estilo pessoal onde predomina a expressão criativa de idéias, emoções e sentimentos; Social (S): centrado na sociabilidade, em humanitarismo e interesse por relações interpessoais de ajuda ao outro, empatia; Empreendedor (E): caracterizado pela energia, dinamismo, habilidade verbal, capacidade persuasiva e de liderança nas relações; Convencional (C): estilo pessoal conformista, consciencioso, prudente e mantenedor de regras e rotinas ordenadas, e que valoriza o poder nas relações sociais. Na base destas formulações, reside a noção de que um tipo psicológico congrega o conjunto global das características pessoais do indivíduo, em termos hereditários, culturais e ambientais. A relevância da concepção teórica de Holland (1997) e de suas ricas possibilidades de compreensão e de intervenção com indivíduos que buscam OVP foram amplamente demonstradas em estudos internacionais, podendo, citar, por exemplo, os trabalhos de: Ackerman e Beier (2003), Gupta, Tracey e Gore (2008), Hedrih (2008), Rounds, Tracey e Hubert (1992), Rounds e Tracey (1996), Staggs, Larson e Borgen (2003), Sverko e Babarovic (2006). Evidências similares também puderam ser encontradas no Brasil, com resultados bastante positivos advindos dos estudos que utilizaram esta perspectiva teórica, sobretudo a partir da utilização dos instrumentos de avaliação psicológica elaborados com base nas concepções teóricas de Holland (Balbinotti, Magalhães, Callegari, & Fonini, 2004; Magalhães, 2005; Mansão, 2005; Mansão & Yoshida, 2006; Primi et al., 2002; Sparta, 2003; Primi, Mansão, Muniz, & Nunes, 2010).

Derivado da teoria da Personalidade Vocacional de Holland (1997) cabe destacar, especificamente, o seu instrumento de avaliação de interesses denominado SDS (CE). Pode-se afirmar que, além de robusta sustentação teórico-metodológica, constitui-se num instrumento de avaliação psicológica com seguros índices de precisão e de validade. Na realidade brasileira, o SDS (CE) foi extensamente estudado por Mansão (2005) e Primi et al. (2010), demonstrando adequados resultados psicométricos, subsidiando a aprovação de seu uso pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP, 2009). Este último trabalho (Primi et al., 2010) constitui, na verdade, o manual técnico da versão brasileira do SDS, onde estão apresentadas as investigações científicas realizadas com este instrumento, que passa a ser denominado SDS - Questionário de Busca Auto-Dirigida.

Com base nestas considerações, configurou-se como possibilidade profícua para o aprimoramento dos instrumentos de avaliação psicológica utilizados em OVP, verificar possíveis interseções entre os fundamentos teóricos propostos por Holland e por Achtnich, contrapondo evidências empíricas de suas técnicas de avaliação de interesses, respeitando-se suas especificidades teóricas. Apesar das especificidades do SDS (CE) e do BBT-Br, ambos se dispõem a examinar o mesmo construto (interesses profissionais) dentro de uma perspectiva estrutural (ou tipológica) e assumem como ponto de partida que características de personalidade, disposições afetivas e emocionais têm reflexo nas escolhas motivacionais (e profissionais) ao longo do desenvolvimento humano, favorecendo ou não a satisfação de necessidades pessoais e o equilíbrio interno. Diante dessas possibilidades, pretendeu-se neste estudo buscar evidências empíricas de validade convergente entre BBT-Br e SDS (CE), bem como examinar especificamente o BBT-Br em termos de precisão e de validade de construto (por análise fatorial) em adolescentes que estão vivenciando o momento da escolha profissional, na realidade brasileira contemporânea.

 

Método

Participantes

Com base nos objetivos no presente trabalho, delineou-se uma amostra com número significativo de participantes para viabilizar as análises estatísticas pretendidas com os instrumentos em questão. A amostra ficou, então, composta por 497 adolescentes de 16 a 19 anos de idade, estudantes do terceiro ano do Ensino Médio público, sendo 295 (59%) do sexo feminino e 202 (41%) do sexo masculino. O grupo feminino teve idade média de 16,9 anos (±0,6), sendo praticamente igual à idade média do grupo masculino, correspondente a 17,0 anos (±0,7). As escolas que colaboraram com o estudo e forneceram participantes localizam-se na região central de uma cidade do interior do estado de São Paulo (SP) e foram selecionadas, por conveniência, pelo fato de reunirem alunos de diversos bairros (representando diversidade de experiências socioculturais), além de possuírem infraestrutura operacional que permitiu a realização do estudo.

Materiais

Foram utilizados dois instrumentos de avaliação psicológica para a coleta de dados sobre interesses dos estudantes, como descrito a seguir.

Teste de Fotos de Profissões (BBT-Br). Elaborado originalmente por Achtnich (1991) e adaptado ao Brasil por Jacquemin (2000 – versão masculina) e por Jacquemin et al. (2006 – versão feminina).

O Teste de Fotos de Profissões – Berufsbilder Test (BBT) é um instrumento projetivo no qual o indivíduo é convidado a fazer escolhas (preferências, rejeições e áreas neutras) a partir 96 fotos que representam diferentes profissionais em situação de trabalho. A partir da freqüência de distribuição de escolhas (positivas e negativas) dos fatores (representados em cada foto do teste) é possível elaborar as estruturas de inclinação motivacional (primária e secundária, positiva e negativa) do indivíduo.

Dentre as pesquisas realizadas com o BBT e BBT-Br, no âmbito de suas evidências psicométricas, identificam-se trabalhos voltados ao estudo de sua validade interna (Jacquemin, 2000; Jacquemin et al., 2006), validade preditiva (Bernardes, 2000) e validade de critério (Noce, 2008). Relativamente à precisão, Sbardelini (1997) examinou a estabilidade das estruturas motivacionais identificadas pelo Teste de Fotos de Profissões, encontrando bons resultados nesta direção. Com relação aos parâmetros normativos do BBT-Br no Brasil têm-se os estudos desenvolvidos por Jacquemin (2000) e Jacquemin et al. (2006).

Self-Directed Search - Career Explorer (SDS - forma CE). Elaborada originalmente por Holland, Fritzche & Powell (1994) e adaptado ao Brasil por Primi et al. (2010), denominando-se SDS - Questionário de Busca Auto-Dirigida. Este material foi gentilmente cedido por Ricardo Primi para uso neste estudo, dado ser o interlocutor brasileiro inicialmente responsável pelos contatos com a Psychological Assessment Resources (PAR) para investigações com o SDS (CE).

Trata-se de um inventário de interesses profissionais, auto-aplicável, com itens organizados em quatro seções distintas (11 em Atividades, 11 em Competências, 12 em Carreiras e 12 em Habilidades). Cada item avalia a preferência relativa à tipologia RIASEC, sendo que o indivíduo deve assinalar “sim” para os itens que lhe interessam e “não” para aqueles que não lhe interessam. Ao final da avaliação, elabora-se o Código Holland, composto pelos dois tipos psicológicos que atingiram maior escore no SDS como um todo, possibilitando ao orientador conhecer interesses e o tipo psicológico do indivíduo, segundo as concepções da Personalidade Vocacional de Holland (1997).

Quanto aos parâmetros psicométricos do SDS (CE) no contexto brasileiro, Mansão (2005) e Primi et al. (2010), apontaram, em termos de precisão, coeficientes superiores a 0,80. O estudo de Mansão (2005) detalhou os índices de consistência interna (Alfa de Cronbach variando de 0,87 a 0,90) e de precisão teste-reteste (variando de 0,82 a 0,91) em amostras de adolescentes brasileiros. Por sua vez, o manual elaborado por Primi et al. (2010), traz as informações relativas dos vários estudos desenvolvidos com o SDS no Brasil, apresentando inclusive referenciais normativos.

Procedimentos

A pesquisa foi inicialmente avaliada e aprovada por um Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos. Foram tomados os devidos cuidados relativos ao uso de instrumentos de avaliação psicológica com adolescentes em contexto escolar, firmando, por escrito, o Consentimento Livre e Esclarecido dos participantes e de seus pais ou responsáveis.

A partir do interesse manifesto em colaborar com o estudo, foram agendadas as aplicações coletivas dos instrumentos em horário regular de aula. Em função das duas formas do BBT-Br (masculina e feminina), foi necessário separar os participantes para o processo de aplicação dos instrumentos, contando-se com a colaboração de dois psicólogos para a aplicação dos testes em sessões simultâneas em diferentes salas de aula. O primeiro instrumento aplicado foi o BBT-Br, na forma de slides, e após a sua finalização, aplicou-se o SDS (CE).

Os dados do BBT-Br e do SDS foram analisados de acordo com recomendações constantes em seus respectivos referenciais técnicos (Achtnich, 1991; Holland et al., 1994; Holland, 1997). Neste trabalho serão focalizados, conforme objetivos delineados, os resultados referentes ao BBT-Br.

A consistência interna do BBT-Br foi calculada em função de sua versão masculina e feminina, por meio da estimativa da homogeneidade dos itens representativos dos construtos, neste caso, de cada fator de Achtnich. Para isso, utilizou-se o coeficiente Alfa de Cronbach (α), adotando-se nível de significância igual ou menor a 0,05.

Para o estudo da validade do BBT-Br foram adotadas duas estratégias técnicas, aplicadas à versão feminina e masculina: a) análise fatorial exploratória (análise dos componentes principais); b) análise da convergência entre resultados do SDS (CE) e do BBT-Br. Como procedimento anterior à análise fatorial, foram examinados o coeficiente de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO) e o Teste de Esfericidade de Bartlett para verificar a condição de utilização do método de Análise dos Componentes Principais (ACP). Esta foi realizada com rotação Varimax, com o objetivo de identificar fatores latentes e simplificadores da distribuição dos resultados em cada versão do BBT-Br. Optou-se, nestas ACP, pelo agrupamento dos 96 itens (fotos) em oito fatores, seguindo-se a idéia original do instrumento, postulado como estruturado em oito radicais de inclinação motivacional (Achtnich, 1991).

A seguir foi realizada análise correlacional entre os resultados das duas técnicas de avaliação psicológica aqui utilizadas, procurando-se validar a convergência entre BBT-Br e SDS (CE), tomando-se como critério-padrão as evidências relativas ao instrumento de Holland. Foram calculados os coeficientes de correlação de Pearson (p ≤ 0,05) entre a frequência de escolhas positivas nos oito fatores de cada versão específica do BBT-Br (W, K, S, Z, G, V, M, O) e os resultados das preferências pelos tipos psicológicos (RIASEC) do SDS (CE).

 

Resultados

A análise da precisão das duas versões do BBT-Br foi avaliada pelo índice de consistência interna de cada radical de inclinação, calculando-se o Alfa de Cronbach. Os coeficientes gerais estimados para cada fator do BBT-Br estão apresentados na Tabela 1.

Tabela 1
Coeficientes Alfa de Cronbach dos fatores do BBT-Br, de acordo com o sexo dos participantes

 

 

Os coeficientes gerais encontrados para o conjunto da amostra apresentaram uma variação entre 0,57 a 0,80, valores classificados por Sisto (2007) como indicadores de níveis medianos de precisão do instrumento. Examinando estes resultados em função do sexo, notou-se variação entre 0,57 e 0,80 para o grupo feminino e, para o grupo masculino, valores entre 0,64 e 0,80. Esses valores constituem-se em índices razoáveis da fidedignidade do BBT-Br, corroborando sua adequada consistência interna, tanto em sua versão masculina quanto a feminina.

Para examinar a viabilidade de realização de uma análise dos componentes principais (ACP) do BBT-Br, inicialmente estimou-se o coeficiente de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO), verificando-se KMO = 0,75 e p < 0,000 no grupo masculino e, no grupo feminino, KMO = 0,79 e p < 0,000. Esses valores, bem como os resultados do Teste de Esfericidade de Bartlet (p < 0,000) indicam que as correlações entre os itens (escolhas das fotos positivas) mostraram-se suficientes e adequadas para proceder a uma análise fatorial exploratória dos dados de cada versão do BBT-Br. A ACP foi realizada com rotação Varimax, sendo que os respectivos autovalores, porcentagem da variância explicada e respectiva porcentagem da variância explicada acumulada, para versão do BBT-Br (masculina e feminina) estão apresentados na Tabela 2.

 

Tabela 2
Resultados da análise fatorial (rotação varimax) das duas versões do BBT-Br

 

 

*Masc=versão masculina/Fem=versão feminina

 

 

Pode-se notar que a ACP com solução de oito fatores, na versão feminina do BBT-Br, explicou 38,36% da variância dos resultados, enquanto abarcou 39,75% dos dados em sua versão masculina. Estes resultados sugerem evidências de confirmação da estrutura interna das duas versões do BBT-Br, configurando-se como evidência de validade dos postulados de Achtnich (1991), associados a oito radicais de inclinação motivacional.

Na continuidade das análises relativas à validade do BBT-Br, apresentam-se os coeficientes de correlação de Pearson entre a frequência de escolhas positivas nos oito fatores do BBT-Br e os resultados das preferências pelos tipos psicológicos do SDS (CE). Inicialmente serão apresentados os dados obtidos na amostra masculina (n = 202), constantes na Tabela 3.

A análise interpretativa dos dados da Tabela 3 focalizou as associações estatisticamente significativas com valor igual ou superior a | 0,30 |. Foi possível observar que, entre os participantes do sexo masculino, o fator W apresentou correlação significativa moderada (Sisto, 2007) com o tipo Social (r = 0,417). Tendo em conta os significados atribuídos por Holland (1997) ao tipo Social, pode-se depreender, dessa correlação, que o fator W do BBT-Br pode sinalizar interesses em atividades de interação com o outro e motivação para relacionamentos de ajuda, com caráter humanista. Esta associação, portanto, pode ser compreendida como confirmação dos aspectos postulados por Achtnich (1991) para este componente(fator W) de sua técnica.

Tabela 3
Índices de correlação (Pearson) entre SDS(CE) e BBT-Br (versão masculina)

 

 

* Correlação significativa (p<0,05) ** Correlação significativa (p<0,01)

Da mesma forma, os dados indicaram moderada correlação significativa entre o fator K e o tipo Realista(r = 0,536), caracterizado pelo pensamento prático, concreto, pragmático. Esta associação entre as técnicas permite, portanto, fortalecer a hipótese de Achtnich (1991) relativa à interpretação do fator K, correspondendo a uma atitude de determinação e de força (física e psíquica).

O fator S do BBT-Br mostrou associação significativa e moderada com o tipo Social (r = 0,416), caracterizado por Holland (1997) como associado a empatia, sociabilidade, relações humanitárias de ajuda ao outro. Este dado pode ser compreendido como fortalecimento das possibilidades interpretativas da vertente Sh do fator S do BBT-Br. Este fator apresentou também moderada correlação significativa com o tipo Realista (r = 0,367), marcado pelo pragmatismo e interesses nos aspectos concretos da realidade, dando margem para reforçar as interpretações da vertente Se do fator S de Achtnich (1991), vinculadas à boa disposição e energia vital.

Já para o fator Z, identificaram-se moderadas correlações significativas com o tipo Artístico (r = 0,559), característico pela expressão criativa de idéias e emoções, e o tipo Social (r = 0,396), caracterizado pela empatia e sociabilidade. Reiteram-se, deste modo, as possibilidades interpretativas do fator Z do BBT-Br como significativamente associadas a características de apuro estético e de apreciação do belo, acompanhadas de elementos de criatividade, intuição e emotividade, no geral também implicando em contatos interpessoais, onde há possibilidade de reconhecimento social.

O fator G apresentou moderadas correlações significativas com os tipos Investigativo (r = 0,435), Social(r = 0,423) e Artístico (r = 0,421). Estes dados podem ser compreendidos como evidências de fortalecimento da interpretação do fator G do BBT-Br como referentes ao pensamento abstrato, criatividade, originalidade e interesse em atividades de investigação e de pesquisa, já consolidadas como hipóteses plausíveis para o tipo Investigativo de Holland, aqui adotado como critério de sustentação teórica para as correlações encontradas.

O fator V do BBT-Br apresentou moderadas correlações significativas com quatro dos tipos RIASEC, a saber: o tipo Convencional (r = 0,418), marcado pelo aspecto consciencioso e organizado nas atividades; o tipo Realista (r = 0,406), caracterizado pelo rigor lógico e pragmatismo; o tipo Empreendedor (r = 0,372), caracterizado pelo dinamismo, pela habilidade verbal, persuasiva; e o tipo Investigativo (r = 0,367), caracterizado pela criatividade em sua expressão ideativa. Essa aproximação retrata representações de interesse em atividades que envolvam relacionamentos interpessoais, habilidade verbal, motivados pelo dinamismo, entusiasmo e extroversão, porém permeados pela lógica, precisão e organização do pensamento, como teoricamente proposto por Achtnich (1991) para o fator V. Desta forma, estes dados pareceram favorecer a hipótese interpretativa deste fator como sinal de organização, raciocínio lógico, presentes em várias atividades e contextos, além de rigidez, conservadorismo e apreço por bens materiais, típicos das características atribuídas ao tipo Convencional de Holland (1997).

O fator M apresentou moderada correlação significativa com os tipos Realista (r = 0,371), marcado por um estilo pragmático e concreto, e com o tipo Social (r = 0,325), com sua característica de empatia e sociabilidade. Cabe ainda apontar, diante dos dados da tabela 3, que o fator O apresentou moderada correlação significativa com o tipo Empreendedor (r = 0,420), caracterizado pela energia e dinamismo nas relações interpessoais e com o tipo Social (r = 0,396), marcado pela sociabilidade e humanitarismo nas relações interpessoais. Diante do conjunto destes resultados e ao recorrer à sólida Teoria da Personalidade Vocacional como base interpretativa, as moderadas e significativas associações aqui encontradas configuram-se como evidências empíricas suficientes para interpretar os construtos do BBT-Br como sustentados por aspectos teóricos do RIASEC de Holland.

A seguir foram realizadas as análises dos resultados da correlação entre SDS (CE) e o BBT-Br obtidos no grupo feminino de estudantes (n = 295). Estes dados compõem a Tabela 4.

Tabela 4
Índices de correlação (Pearson) entre SDS (CE) e BBT-Br (versão feminina)

 

 

* Correlação significativa (p<0,05) ** Correlação significativa (p<0,01)

Novamente foram destacadas as correlações com valor igual ou superior a | 0,30 | para análise interpretativa. Diante da versão feminina do BBT-Br, observou-se que o fator W não apresentou índices de correlação importantes, embora significativos, com a tipologia de Holland (1997). Quanto ao fator K, observou-se moderada correlação (r = 0,523) com o tipo Realista, marcado pelo pragmatismo e objetividade. Esta associação fortalece a base interpretativa do fator K do BBT-Br como representante do interesse por atividades racionais, implicando em força física e psíquica e em forte vínculo com o ambiente de vida do indivíduo.

O fator S mostrou moderada correlação significativa com o tipo Social (r = 0,514), caracterizado pela empatia, sociabilidade e interesse pelas relações interpessoais de ajuda ao outro. Esta evidência pode ser compreendida como subsídio empírico para as hipóteses interpretativas atribuídas por Achtnich (1991) ao fator S, principalmente em sua vertente Sh, no sentido de expressarem interesse por atividades que englobam relações interpessoais de ajuda, focadas no cuidado com o outro e na sensibilidade.

O fator Z mostrou-se correlacionado, de modo significativo e importante, com três tipos de Holland, a saber: Artístico (r = 0,395), Realista (r = 0,347) e Empreendedor (r = 0,321). Essas associações fortalecem as características atribuídas ao fator Z do BBT-Br relacionadas aos interesses estéticos, criatividade sem perda do vínculo com a lógica e a racionalidade, necessidade de reconhecimento de si ou de seu trabalho.

Identificou-se novamente moderada correlação significativa entre o fator G com os tipos Investigativo(r = 0,474), Realista (r = 0,312), Social (r = 0,362) e Artístico(r = 0,313) de Holland (1997). Nota-se, portanto, que este fator do BBT-Br apresentou quatro associações importantes com os tipos RIASEC, sugerindo tratar-se de uma característica que permeia os interesses do grupo feminino de estudantes. Pelas associações encontradas, pode-se inferir que esses dados confirmam as possibilidades de interpretação do fator G referentes à riqueza imaginativa e à capacidade de pensar de modo abstrato, aspectos relacionados à organização do pensamento, mostrando-se úteis no exercício das relações interpessoais e de ajuda ao outro, advindas da interpretação atribuída aos tipos de Holland com os quais houve relevante correlação.

O fator V também apresentou quatro índices de correlação significativa e moderada com os tipos da Personalidade Motivacional, a saber: Convencional (r = 0,496), Realista (r = 0,399), Investigativo (r = 0,330) e Empreendedor(r = 0,348). Procurando-se compreender estas associações encontradas entre as variáveis do BBT-Br e do SDS (CE), pode-se depreender que o fator V reúne interesses lógicos e formais, permeados de disposição e de análises racionais sobre os estímulos, oferecendo suporte empírico às interpretações de Achtnich (1991) relativas a esse fator.

Por sua vez, o fator M mostrou índices significativos de correlação, de força moderada, com os tipos Realista (r = 0,365) e Investigativo (r = 0,300). Essa associação reforça características atribuídas ao fator M do BBT-Br, relacionadas ao apego a coisas materiais, a ligação com a concretude dos fatos, aliados ao rigor lógico.

Por fim resta apontar que, quanto ao fator O, observou-se moderada correlação significativa com o tipo Empreendedor (r = 0,339), caracterizado pela energia, dinamismo, habilidade verbal e capacidade persuasiva nas relações humanas. Depreende-se, portanto, evidências empíricas sinalizadoras de integração entre motivações empreendedoras com as possibilidades de comunicação oral e contatos interpessoais, fortalecendo as interpretações de Achtnich (1991) relativas ao fator O.

 

Discussão

 

Inicialmente cabe apontar que os objetivos delineados para o presente trabalho foram plenamente alcançados. Foram obtidas evidências positivas sobre a fidedignidade e a validade das duas versões brasileiras do Teste de Fotos de Profissões, mais conhecido como BBT-Br.

Dado o caráter projetivo do BBT-Br, o qual possibilita vivências individualizadas dos estímulos, pode-se assumir que os atuais índices de consistência interna demonstram sua precisão, embora em valores classificados por Sisto (2007) como medianos. Além disso, é preciso destacar que esta precisão foi demonstrada para as duas versões do BBT-Br e pelo método da análise da consistência interna, constituindo-se numa diretriz ainda inédita no Brasil até o momento, atribuindo às atuais evidências um caráter de sistematização psicométrica para esta técnica projetiva. O estudo de Sbardelini (1997), por exemplo, permitiu verificar, entre outros objetivos, a estabilidade temporal das estruturas de inclinação motivacional (teste-reteste), por meio de delineamento longitudinal, em amostra de menor tamanho, cujos dados foram interpretados, sobremaneira, numa perspectiva clínica. Portanto, as atuais evidências empíricas de precisão do BBT-Br aqui apresentadas fortalecem as possibilidades de reconhecimento da qualidade deste instrumento projetivo de avaliação de interesses no contexto brasileiro.

Ainda no sentido de aprofundamento dos estudos psicométricos do BBT-Br, o modelo teórico associado ao instrumento foi testado e sua estrutura interna verificada, por meio da Análise dos Componentes Principais (ACP) dos resultados. A ACP com solução de oito fatores explicou 39,8% da variância dos resultados na amostra masculina e 38,4% na amostra feminina. Esta análise possibilitou o detalhamento das características estruturais do instrumento, verificando sua complexidade e a multiplicidade de fatores que compõem as profissões, conforme Achtnich (1991) já ponderava em suas considerações teóricas e clínicas. Desta forma, a presente análise apontou que as fotos do BBT-Br, em suas duas versões, abordam os elementos teoricamente previstos, no entanto, numa distribuição onde estes oito radicais de inclinação motivacional não explicam suficientemente a distribuição dos interesses verificada nos adolescentes, o que exigirá novos estudos, ultrapassando as atuais possibilidades.

A análise da possível associação dos resultados provenientes do SDS (CE) e do BBT-Br mostrou-se também bastante promissora em termos de validade para esta técnica projetiva. Pode-se identificar grande número de correlações significativas e moderadas entre os referidos instrumentos de avaliação psicológica, confirmando-se a convergência entre seus resultados. Devido à multifatoriedade das profissões e também ao fato do SDS ter em sua tipologia seis fatores e o BBT-Br oito radicais de inclinação motivacional, pode-se observar convergência de mais de um fator de Achtnich para um mesmo tipo de Holland. No entanto, houve alguns valores de correlação mais elevados entre a tipologia RIASEC e os fatores do BBT-Br, cujos índices foram esmiuçados e destacados na interpretação dos dados das tabelas 3 e 4. Considerando-se que o SDS (CE) constitui-se num instrumento de avaliação de interesses já consagrado na literatura científica internacional, as informações resultantes dessa análise convergente são muito favoráveis e positivas no sentido de confirmar a validade de construto do BBT-Br, certificando-o como um instrumento projetivo que avalia interesses profissionais.

De acordo com as ponderações de Holland (1996, 1999), os inventários de interesses também se constituiriam como inventários de personalidade. Essa afirmação acompanha as reflexões teóricas e empíricas de Achtnich (1988, 1991), no sentido de afirmar que a escolha profissional estaria diretamente relacionada às características de personalidade do indivíduo, sendo que uma boa escolha seria favorecedora de saúde mental e de bem estar.

A concepção integradora dos conceitos de cognição, personalidade e interesses tem se mostrado uma tendência atual na literatura da área de Orientação Profissional em interface com a avaliação psicológica. Vários trabalhos confirmaram a hipótese de comunalidade dos construtos citados e reforçam a sua importância no processo de escolha profissional (Ackerman & Beier, 2003; Bueno, Lemos, & Tomé, 2004; Gasser, Larson, & Borgen, 2004; Primi et al., 2002; Roberti, Fox, & Tunick, 2003). Esse ponto de vista teórico, a priori, assume que as características de personalidade e as disposições afetivas e emocionais de um indivíduo se refletem diretamente em suas escolhas motivacionais ao longo de seu desenvolvimento, podendo favorecer (ou não) a satisfação das necessidades pessoais.

Poder-se-ia aqui argumentar que, dentro dessa visão abrangente de integração destes citados construtos, a teoria de Holland (1997) apresentou-se como um modelo estrutural interativo ou tipológico interativo. Por sua vez, o modelo de Achtnich (1991) assumiu que as motivações profissionais também poderiam ser classificadas em fatores interativos. Isso decorre do fato de serem constituídos por variáveis que se inter-relacionam constantemente e, por isso, no caso do BBT-Br, nenhuma atividade profissional poderia ser caracterizada somente por um fator. Portanto, identificam-se pontos de similaridade teórica entre os dois modelos, como inicialmente pressuposto nesta investigação. Esta hipótese foi aqui confirmada por meio da elevada convergência dos resultados provenientes do SDS e do BBT-Br.

Essas ponderações se harmonizam com as orientações de Messick (2000) a respeito da necessidade de várias evidências empíricas cruzadas para, em sua integração, conseguir-se demonstrar a validação de um construto ou hipótese. Este processo tornou-se profícuo e eficaz no presente trabalho, onde foi possível fortalecer os indicadores de validade das técnicas de avaliação psicológica utilizadas, nomeadamente as duas versões do BBT-Br.

 

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Recebido: 16/12/2009
1ª Revisão: 17/05/2010
Aceite final: 24/05/2010

 

 

1 Investigação realizada com o apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Cooperação Internacional Brasil/ Portugal: convênio CAPES/GRICES).
2 Este artigo descreve parte dos resultados da Tese de Doutorado da primeira autora, sob orientação da segunda, junto ao Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo (FFCLRP/USP). As autoras agradecem à Profa. Dra. Maria Odília Teixeira, da Faculdade de Psicologia da Universidade de Lisboa pelas relevantes contribuições.

 

 

Sobre os autores
* Erika Tiemi Kato Okino é psicóloga e Doutora em Psicologia. Atua como psicóloga no Departamento de Psicologia e Educação da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo.
** Sonia Regina Pasian é psicóloga, Mestre em Filosofia, Doutora em Saúde Mental, Docente do Departamento de Psicologia e Educação da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Coordenadora do Centro de Pesquisas em Psicodiagnóstico. Bolsista de produtividade em pesquisa do CNPq e assessora ad hoc da FAPESP e de periódicos científicos da área.

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