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Ciências & Cognição

On-line version ISSN 1806-5821

Ciênc. cogn. vol.16 no.3 Rio de Janeiro Dec. 2011

 

Artigo Científico

 

Cognição e Diabetes Mellitus tipo 2 em idosos

 

Cognition and type 2 diabetes in the elderly

 

 

Regina Maria Fernandes Lopes, Roberta Fernandes Lopes do Nascimento, Cristiane Silva Esteves, Felipe Oliveira Iatchac e Irani I. de Lima Argimon

Grupo de Pesquisa Avaliação e Intervenção Psicológica no Ciclo Vital. Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil

 

 


Resumo

Estudos sobre o status cognitivo em idosos tem tido maior destaque nas pesquisas atuais, identificando prejuízos, principalmente quando uma doença crônica encontra-se presente. A hiperglicemia pode ser um fator significativo para incidência de Alzheimer e uma causa secundária de demência. A Diabetes Mellitus Tipo 2 (DM2) está associada a déficits cognitivos e funcionais, e um dos instrumentos que pode ser utilizado para avaliar funções executivas é o WCST. O objetivo foi avaliar os prejuízos cognitivos em idosos com DM2. Participaram do estudo 254 idosos de ambos os sexos, com idade igual ou superior a 60 anos, sendo 44 idosos com diagnóstico de DM2 e 210 idosos do grupo controle da população geral. O delineamento foi de um estudo quantitativo e transversal. Os instrumentos utilizados foram: Ficha de Dados Sociodemográficos,WCST, MEEM, BDI, BAI e GDS. Os subtestes Vocabulário, Códigos, Dígitos e Cubos da WAIS-III. Os resultados mostraram que houve diferença significativa no desempenho de idosos com DM2, quando comparados com os idosos do grupo controle em quatro descritores do WCST, indicando prejuízos. © Cien. Cogn. 2011; Vol. 16 (3): 095-108.

Palavras-chave: diabetes tipo 2; idosos; teste Wisconsin de classificação de cartas (WCST); flexibilidade cognitiva; prejuízos cognitivos; funções executivas.


Abstract

Studies about the cognitive status in elderly people have been greater emphasis on current research, identifying damages especially when a chronic illness is present. The hyperglycemia can be a significant factor for the incidence of Alzheimer, which could be a secondary cause for dementia. Type 2 Diabetes Mellitus (DM2) is associated to cognitive and functional deficits and, one of the tools, which can be used to assess executive functions, is the WCST. The objective was to measure the cognitive prejudice in older people with DM2 through the WCST. The participants of the study were two hundred and fifty four (254) old people of both genders, with 60 years of age or older, divided into 44 persons with a DM2 diagnosis and 210 old people of the control group from the general public. The design was from a quantitative and transversal study. The instruments used were: socio-demographic filing cards, WCST, MMSE, BDI, BAI, GDS. The Vocabulary, Coding, Digit Span, Block Design and WAIS - III sub-tests. The results showed a significant difference in the performance of old people with DM2, when compared to old people of the control group in four describers of the WCST, cognitive prejudice. © Cien. Cogn. 2011; Vol. 16 (3): 095-108.

Keywords: type 2 diabetes; old people; Wisconsin card sorting test (WCST); cognitive flexibility; cognitive prejudice; executive functions.


 

 

Introdução

O envelhecimento é um processo cada vez mais estudado por um grande número de pesquisadores, principalmente pelas mudanças demográficas e pelas possibilidades de um grande impacto nos próximos anos (Esteves & Slongo, 2009).

Observa-se que, com os anos, as pessoas passam por um processo natural de envelhecimento, gerando modificações funcionais no organismo, diminuindo a vitalidade e favorecendo o aparecimento de doenças físicas relacionadas a esse período de vida (Nascimento, 2007). Melhores condições de saúde frente ao avanço da ciência nos últimos anos fazem com que, consequentemente, haja um significativo aumento da expectativa de vida. A proporção de pessoas que alcançavam 60 anos de idade era de 25%, passando em 1990, para 78% de mulheres e 65% de homens. Presume-se que crescerá em torno de 8.95% e 18.8% o percentual de brasileiros com mais de 60 anos até o ano de 2025. Com a demanda do crescimento da população de idosos, é imprescindível o crescimento de serviços direcionados para esta população. Os idosos também apresentam mais problemas de saúde física, como Diabetes, hipertensão arterial, problemas visuais, entre outros (Andrade, Santos & Bueno, 2004).

Fauber (2006) identificou a existência de uma conexão entre Diabetes Mellitus (DM) e demência. Aponta que o índice elevado de açúcar no sangue pode ser um fator significativo para incidência de Alzheimer, bem como uma causa secundária de demência. Nos Estados Unidos, aproximadamente 18 milhões de pessoas têm Diabetes Mellitus Tipo 2 (DM2) e 41 milhões têm a condição conhecida como pré-diabetes. Este mesmo autor revela que pessoas com baixo controle da DM têm de 22% a 78% mais risco de desenvolver demência, e também, que outras pessoas portadoras de Alzheimer e sem DM mostraram uma velocidade menor de desenvolver um declínio cognitivo importante.

Quanto aos problemas de saúde física, a Diabetes Mellitus (DM) vem crescendo em consequência do aumento de pessoas idosas, da ociosidade e da obesidade (Freitas, Py, Cançado & Gorzoni, 2006). Corroborando com essa ideia, Hammerschmidt e Lenardt (2010) afirmam que o aumento da incidência DM é preocupante, tendo em vista que esta patologia é considerada fator de risco para cardiopatias e doenças cérebro-vasculares, ocorrendo, frequentemente, associada à Hipertensão Arterial Sistêmica, que, por sua vez, pode desencadear outros problemas crônicos. A DM refere-se a uma síndrome de distúrbio metabólico de carboidratos, que envolvem a hiperglicemia. As duas mais relevantes que têm origem genética são a Diabetes Mellitus Tipo 1 (DM1), e a Diabetes Mellitus Tipo 2 (DM2).

A DM1, ainda que possa se desenvolver em todas as idades, é o tipo diagnosticado, com frequência, na infância e na adolescência. O tratamento demanda em dose diária de insulina, e o diagnóstico anterior firma-se antes dos 30 anos, ainda que possa surgir em todas as idades (Freitas et al., 2006). A DM2 apresenta-se com diferentes graus de deficiência e resistência à atuação da insulina; caracteriza-se por mais elevada prevalência em idosos e constitui-se na forma mais comum da DM. Consiste numa doença crônica que afeta idosos, sem apresentar tendência à cetoacidose. Em idosos acima de 60 anos, a prevalência oscila entre 15% a 20%, com elevações nestes percentuais em idosos acima de 75 anos. Mais de 50% do total de pessoas com DM mostram estar acima dos 60 anos; é uma doença que está associada ao aumento de lesões macro e microvascular (Foss-Freitas & Foss, 2003). Este mesmo autor mostra que um estudo de prevalência de DM no Brasil em 1987 evidenciou uma taxa de 7,6 %, sendo o Rio Grande do Sul o estado com maior taxa, com 12,1%. A distribuição por idade foi: de 30 a 39 anos- com 2,7%; de 40 a 49 anos - 5,5%; de 50 a 59 anos -12,6% e se eleva na faixa etária de 60 a 69 anos, girando em torno de 17,4%.Somado a isso, dentre as doenças crônicas não transmissíveis, a DM é considerada uma importante causa de morbimortalidade, principalmente entre a população pertencente à terceira idade (Francisco et al, 2010). Com base nestas evidencias, a DM2, que acomete os idosos e também causa prejuízos relacionados ao declínio cognitivo, vem sendo uma das grandes preocupações de saúde. Nos diabéticos, mesmo sem um quadro claro de demência, certos domínios cognitivos podem ser prejudicados, como atenção, memória, funções executivas e lobo frontal (deficiência cognitiva e diabetes). Um estudo epidemiológico realizado por Kouta, Sakurai e Yokono (2006) salientou que a DM aumenta os riscos tanto para doença de Alzheimer como para demência vascular. A DM pode induzir uma variedade de declínio cognitivo e fazer sérios danos no cérebro por vários mecanismos. Existem evidências que indicam correlação biológica entre o metabolismo de glicose no cérebro e o declínio cognitivo. A maior parte dos problemas a serem resolvidos é identificar o mecanismo de deficiência cognitiva orgânica diabética que leva a demência. Diabéticos com idade avançada, com tratamento efetivo de diabete, dificilmente apresentam declínio cognitivo grave. Dessa forma, declínio cognitivo e a DM são considerados como importante comorbidade da diabete na idade avançada, e é exigido gerenciamento de hiperglicemia em longo prazo para sustentar uma função cerebral saudável.

Diante dos prejuízos cognitivos causados pela DM, relacionados com as funções executivas e lobo frontal, Lezak (2005) salientou que pacientes com área frontal afetada apresentavam problemas de iniciativa e motivação, mostravam-se incapazes de planejar metas e objetivos e não desenhavam planos de ação para o objetivo desejado. Assim o funcionamento executivo ou controle executivo fazem referência a uma série de mecanismos implicados na otimização de processo cognitivos para resolução de situações complexas (Tirapu-Ustrárroz & Muñoz-Céspedes, 2005).

Segundo Rocca e Lafer (2006), a flexibilidade mental consiste em uma função cujo uso aplicado à vida prática possibilita um monitoramento do comportamento para alternar o curso das ações de acordo com os resultados obtidos. A flexibilidade mental é a capacidade para formar conceitos, e perseverações são compreendidas como reflexo do envolvimento, ainda que funcional, do córtex pré-frontal, porque mostra falhas na memória de trabalho e na mudança de estratégias para solução de problemas. A flexibilidade cognitiva é uma das habilidades que integram as funções executivas, que são definidas como: "flexibilidade cognitiva implica capacidade de mudar (alternar) o curso das ações ou dos pensamentos de acordo com as exigências do ambiente"[itálicos nossos] (Malloy-Diniz, Sedo, Fuentes & Leite, 2006, p.198). Dessa forma, a capacidade de modificar estratégias, o curso do pensamento ou dos atos, de acordo com as exigências externas, envolve a flexibilidade cognitiva. O Teste Wisconsin de Classificação de Cartas (WCST) é um dos instrumentos mais usados para avaliação das funções executivas, e, quando ocorrem muitos erros, indica inflexibilidade cognitiva. O WCST é considerado uma significativa medida de flexibilidade cognitiva, atenção e impulsividade. Para avaliação de pessoas com disfunção frontal, esse instrumento é largamente utilizado, pela sua especificidade para lesões nesta região do cérebro, relacionadas com a flexibilidade mental, cognitiva ou do pensamento e funções executivas. Considerado um instrumento sensível para avaliar funções executivas, o WCST é citado frequentemente e foi originalmente desenvolvido para avaliar habilidade de abstração e mudar de uma linha de pensamento para outra. Pessoas com lesões no córtex pré-frontal lateral cometem frequentemente erros de perseveração, que são explicados por dificuldades e ações não relevantes que são automaticamente ativados tanto para inibir, quanto para escolher o elemento ou a ação relevante (Andrade et al., 2004).

Wattari et al. (2006) objetivaram avaliar idosos com DM2, com e sem depressão, utilizando o WCST. Na amostra, foram comparados 20 idosos com DM2 e depressão, 20 idosos com DM2 sem depressão e 34 controles sem diabete ou depressão. A idade variou de 30 a 80 anos, mas os estudos enfatizaram os pacientes acima de 65 anos. Os resultados apontaram que os pacientes diabéticos mostraram mais comorbidades médicas em relação aos controles. Os pacientes com DM2 e depressão associada apresentaram déficit cognitivo maior do que os controles saudáveis. Controles com DM2 mostraram muitos déficits executivos. O padrão dos déficits cognitivos sustenta prejuízos subcorticais frontais.

Desta forma, os estudos relatados confirmaram a hipótese de que a DM2 está associada com comprometimento cognitivo, mais especificamente com a flexibilidade cognitiva nos idosos testados. Além disso, as dificuldades executivas, como iniciativa, planejamento e flexibilidade mental também apresentaram declínio.

Diante dessa realidade, o objetivo deste estudo foi avaliar a flexibilidade cognitiva de idosos com DM2 através do teste WCST.

 

Metodologia

O delineamento é de uma pesquisa descritiva do tipo quantitativo, transversal, de comparação de grupos e de amostra por conveniência. A amostra foi constituída por 254 idosos, do sexo feminino e masculino, com idade igual ou superior a 60 anos, sendo 44 idosos com diagnóstico de DM2 e 210 idosos de ambos os sexos do grupo controle da população geral, conforme cálculo amostral, considerando 95% de confiança. De acordo com estudos de Foos-Freitas e Foss (2003), a partir dos 60 anos a prevalência de DM2 é em torno de 17,4%. Estes participantes fazem parte de um projeto maior de normatização do teste Wisconsin de classificação de cartas (WCST) para a população de 60 anos ou mais.

Como critérios de inclusão, os participantes deveriam ter idade igual ou superior a 60 anos, apresentando diagnóstico de DM2 há mais de cinco anos, de acordo com estudos de Seyfaddini (2006). Foram excluídos do estudo idosos com um quadro demencial ou problemas visuais e/ou auditivos, sintomas depressivos moderados ou graves, que pudessem intervir na execução dos instrumentos. Os idosos que foram identificados por apresentarem sintomas depressivos, moderados e graves foram orientados a buscar ajuda especializada.

Foram utilizados os seguintes instrumentos para coleta de dados e triagem: ficha de dados sócio-demográficos e WCST. A ficha de dados sócio-demográficos consistiu de itens em que constam informações referentes à: idade, escolaridade, estado civil, ocupação, nível socioeconômico, atividades de lazer, doenças e utilização de medicação. Os seguintes instrumentos foram utilizados com a finalidade de triagem: inventário de depressão de Beck (BDI-II), inventário de ansiedade de Beck (BAI), escala de depressão geriátrica (GDS) e mini-exame do estado mental (MEEM). Além dos subtestes códigos, cubos, dígitos e vocabulário, da escala Wechsler de inteligência para adultos-III.

O BDI-II, normatizado para a população brasileira por Gorenstein, Pang, Argmion e Werlang (2011), foi desenvolvido por Beck e Steer (1993) e modificado em 1996. É um instrumento conhecido mundialmente que visa mensurar a intensidade dos sintomas de depressão e foi adaptado e validado para o Brasil por Cunha (2000). É uma escala de auto-relato de 21 itens, cada um com quatro alternativas, subentendendo graus crescentes de gravidade da depressão com escore de 0 a 3. Conforme as normas da versão em português, os pontos de corte, desenvolvidos em 1999 por Cunha (2000), estão subdivididos em: 0 a 11= mínimo, de 12 a 19 = leve, de 20 a 35 = moderado e de 36 a 63 = grave. Pesquisas realizadas com BDI demonstraram a necessidade de aprofundar os estudos, objetivando revisar e modernizá-los. Beck, Steer e Brown (1996), iniciaram um estudo piloto com o BDI-II, tendo como base os critérios de depressão do DSM-IV. Através das publicações dos últimos tempos referentes ao uso da escala, várias análises foram realizadas, dando início à revisão e modernização. Depois da revisão do BDI nos Estados Unidos, pesquisadores de diversos países começaram a fazer a tradução e adaptação para diferentes comunidades, entre elas: Porto Rico, Alemanha, paises árabes, Espanha, Argentina (Rodriguez-Gomez, Davila-Martinez & Collazo-Rodriguez, 2006; Kuhner, Burger, Keller & Hautzinger, 2006; Alansari, 2006).

O BAI tem por objetivo medir a gravidade dos sintomas de ansiedade através de uma escala de sintomas (Beck & Steer, 1993; Cunha, 2000). Composto de 21 itens, em que o sujeito deve pontuar conforme os sintomas presentes nele, numa escala de quatro pontos. Os resultados são obtidos por meio da soma dos escores de cada item. Para a população psiquiátrica, os pontos de corte, de acordo com as normas da versão em português, desenvolvidos em 1999 por Cunha (2000), estão subdivididos em 0 a 10 = mínimo, 11 a 19 = leve, de 20 a 30 = moderado, e de 31 a 63 = grave.

A GDS, desenvolvida por Yesavage et al. (1983), tem como objetivo identificar e quantificar sintomas depressivos na população idosa. O instrumento consiste em um questionário de 15 questões, com duas opções de respostas: sim e não. Os escores inferiores a 5 são considerados normais; de 5 a 10 indicam depressão leve à moderada; e acima de 10 indicam depressão grave.

O MEEM, na versão utilizada em projetos de pesquisa pela Escola Paulista de Medicina (Bottino, Cid & Camargo, 1997), foi aplicado em todos os participantes desta pesquisa. Avalia orientação temporal e espacial, registro (memória imediata), cálculo, memória recente e linguagem (agnosia, afasia, apraxia e habilidade construtiva). O MEEM foi desenvolvido por Folstein, Folstein e McHugh (1975) e adaptado para o Brasil por Bertolucci, Brucki, Campacci e Juliano (1994). É composto por questões agrupadas em sete categorias planejadas para avaliar funções cognitivas específicas. O escore do MEEM pode variar de um mínimo de zero até um total máximo de 30 pontos, com ponto de corte de 24.

A WAIS-III (Cunha, 2000, Wechsler, 2004) tem sido administrada como um dos instrumentos mais conhecidos para avaliação do QI, embora, mundialmente, seja usada também para outros propósitos. Esta escala é composta por 11 subtestes, divididos em duas áreas: área verbal e área de execução. Desta escala de inteligência, foram utilizados os seguintes subtestes: códigos, cubos, dígitos e vocabulário. O subteste códigos avalia capacidade de aprendizagem, memória visual, coordenação visomotora, velocidade psicomotora, capacidade em tarefas imitativas e flexibilidade mental. O subteste cubos mensura a coordenação visomotora, capacidade de análise, síntese, estratégias de solução de problemas, organização e velocidade viso-motor-espacial. O subteste dígitos avalia a extensão da atenção, retenção da memória imediata (dígitos ordem direta), memória e capacidade de reversibilidade (dígitos na ordem inversa) e concentração. O subteste vocabulário foi utilizado pela sua alta correlação com a soma da escala verbal, o que o torna uma medida adequada de inteligência, pouco vulnerável a transtornos, considerado como possível estimativa da inteligência pré-mórbida (Cunha, 2000, Primi, 2002).

O WCST foi utilizado como instrumento principal deste estudo. O material do WCST (Huber et al., 1992) consta de quatro cartas-chave, utilizadas como estímulo e de dois baralhos de cartas-resposta, com 64 cartas cada um. Consiste em um teste de avaliação cognitiva que mensura a flexibilidade do pensamento e para gerar estratégias de solução de problemas, com base no feedback do examinador. Avalia a capacidade para estabelecer, manter e modificar categorias mentais (Heaton, Chelune, Talley, Kay & Curtis, 1993; Cunha, et al., 2005). É um instrumento de avaliação que tem demonstrado sensibilidade para identificar disfunções neuropsicológicas implicadas com a área pré-frontal dorsolateral, como a inibição de resposta nos comportamentos inflexíveis.

O trabalho aqui descrito faz parte de um projeto maior, desenvolvido pelo Grupo de Pesquisa "Avaliação e Intervenção no Ciclo Vital", com o título WCST: normatização para pessoas com mais de 60 anos, coordenado pela Professora Drª Irani I. de Lima Argimon, com aprovação da Comissão Cientifica da Faculdade de Psicologia número 071/2007, e do Comitê de Ética da PUCRS, sob número 00/820.

Inicialmente, foi feito contato com os responsáveis por algumas clínicas de Porto Alegre que atendessem pacientes com DM2, para explicar os objetivos da pesquisa. Após a liberação do desenvolvimento da pesquisa pelo serviço, foi combinado o local e a data de aplicação dos instrumentos. Para o grupo controle, foi realizado contato com os responsáveis das instituições mantenedoras de grupos de convivência de terceira idade. Foi feita a visita aos locais que realizavam atividades em grupo semanais. Em outros locais, os idosos receberam orientações individualmente. Aqueles que concordaram em participar da pesquisa assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Os instrumentos foram aplicados, individualmente, em salas da instituição. A coleta de dados foi realizada pela pesquisadora, colegas do grupo de pesquisa e alunos de graduação, que foram treinados previamente.

A análise estatística foi realizada através de estatística descritiva: frequências, percentis, médias e desvio padrão sobre as variáveis demográficas e psicopatológicas. Foi utilizado o Teste t de Student para comparação das médias dos escores gerais e específicos do WCST no grupo composto por idosos com DM2 e do grupo da população geral. Para as análises destes resultados, foram utilizados procedimentos estatísticos a partir do programa SPSS 17.0 (Statistical Package for Social Science).

 

Resultados e discussão

Para a análise dos resultados, fizeram parte da amostra 210 idosos do grupo controle e 44 idosos com DM2. A idade variou de 60 a 88 anos, tendo como média 69, 34 anos (DP = 6,13). Prevaleceram idosos do sexo feminino (77,6%). Quanto ao estado civil, 46,1% eram casados e 30,3% viúvos. A média geral de escolaridade foi de 8,9 anos. Na tabela 1, encontram-se as frequências relacionadas às amostras dos dois grupos.

Dos 210 idosos que constituíram a amostra do grupo controle, a maioria tinha 9, 57 anos de estudo; 54,1% dos idosos cursaram o Ensino Fundamental completo e incompleto. Com relação à fonte de renda, a maioria eram aposentados e cuidavam de sua saúde, fazendo exames de rotina. Quanto à percepção da própria saúde, 66,5 % classificaram-na como boa. Da amostra, 50,2% moravam com familiar e 75,9% não tinham deixado de realizar atividades físicas por motivo de saúde. Quase toda a amostra, 86,1% relataram não ter nenhuma doença e 85% não tiveram hospitalização prévia.

Dos 44 idosos que constituíram a amostra dos idosos com DM2, quanto às características sociodemográficas, a idade variou de 61 a 84 anos, tendo como média 68,77 anos (DP = 5,62). A maioria era do sexo feminino (75,0%). A média de escolaridade foi de 8,23 anos, sendo o ensino fundamental completo e incompleto mais representativo, caracterizando-se em 61,3% da amostra de idosos com DM2. Com relação à fonte de renda, a maior parte encontrava-se aposentada (61,4%).

No que se refere à percepção da própria saúde dos idosos com DM2, 29,5 % classificaram como boa; 61,4%, como regular e 9,1 %, como ruim. Dos idosos com DM2, 50,0% moravam com familiar e 36,8% sozinhos. Além disso, 61,4% não haviam deixado de realizar atividades físicas por motivo de saúde. Quanto ao número de doenças, 79,5% referiram não ter nenhuma doença, porém 25% relataram que já foram hospitalizados.

Variáveis

Idosos com DM2 (n=44)

%

Idosos Controles (n= 210)

%

p

Sexo

Masculino

Feminino

11

33

25

75

46

164

21,9

78,1

0,80

Estado Civil

Casado/companheiro

Solteiro

Viúvo

Separado

Outro

ND

17

4

14

05

04

38,6

9,1

31,8

11,4

9,1

100

20

63

8

18

1

47,6

9,5

30,0

3,8

8,6

0,5

0,42

Escolaridade

Fundamental comp. e incomp.

Médio compl. e incompleto

Superior compl. e incompleto

Pós-graduação

27

10

3

4

61,4

22,7

6,8

9,1

113

43

23

30

54,1

20,6

11,0

14,4

0,48

Ajuda econômica

Sim

Não

6

38

13,6

86,4

19

190

9,1

90,9

0,52

Faz Exames de Rotina

Sim

Não

39

5

88,6

11,4

191

18

91,4

8,6

0,77

Como está a saúde

Boa

Regular

Ruim

13

27

4

29,5

61,4

9,1

139

65

05

66,5

31,1

2,4

*0,001

Mora com alguém

Sozinho

Com familiar

Outro

18

22

4

36,8

50,0

9,1

75

105

29

35,9

50,2

13,9

0,64

Tem deixado de realizar atividades por motivo de saúde

Sim

Não

17

27

38,6

61,4

45

164

21,5

78,5

*0,02

Doenças: Quantas

Nenhuma

Até 3

Mais de 3

35

8

1

79,5

18,2

2,0

183

22

4

87,6

10,5

1,9

0,35

Hospitalização Prévia

Sim

Não

11

33

25,0

75

29

180

13,9

86,1

0,10

Tabela 1 - Dados sociodemográficos dos idosos com DM2 (n=44) e idosos do grupo controle (n=210). * P< 0,05.

Resultados dos testes MEEM, cubos, vocabulário, dígitos, códigos, GDS, BDI e BAI foram comparados entre o grupo controle e o grupo de idosos com DM2, através do teste t de Student. Observa-se, na tabela 2, que há diferença estatisticamente significativa entre os grupos nos resultados apresentados nos instrumentos: GDS, BDI e BAI. O que indica que os idosos com DM2 mostraram maiores escores na GDS, na BDI e no BAI. Nos demais instrumentos, na comparação do desempenho entre grupos, não houve diferença estatisticamente significativa (tabela 2).

Os resultados apresentados no WCST pelos idosos com DM2 (n=44) mostram que, na média, eles precisam utilizar quase todas as cartas do baralho na tentativa de completar as categorias solicitadas, e, assim mesmo, o número médio de respostas corretas é de 57,25% (tabela 3).

Instrumentos utilizados para triagem

Idosos com DM 2 n=44: Média e DP

Idosos Controles

n=210: Média e DP

t

p

Vocabulário

10,23.± 2,16

10,42.± 2,30

0,499

0,618

Dígitos

11,26.± 2,89

11,97.± 3,17

1,239

0,217

Código

10,79.± 3,05

11,52.± 2,63

1,432

0,154

Cubos

10,37.± 2,54

11,34.± 2,70

1,964

0,051

MMSE

27,37.± 2,37

27,26.± 2,64

-0,229

0,819

BAI

12,43.± 9,08

7,21.± 7,39

-3,668

0,000(*)

GDS

1,54.± 0,61

1,15.± 0,37

-5,082

0,000(*)

BDI

14,25.± 9,76

8,43.± 5,57

-5,400

0,000(*)

Tabela 2 - Médias, desvios-padrão e comparação do desempenho nos instrumentos utilizados para triagem - mini-exame do estado mental (MMSE) cubos, vocabulário, dígitos, códigos, inventário de depressão de Beck (BDI-II), e inventário de ansiedade de Beck (BAI) de idosos com DM2 (n=44) e grupo controle (n=210). * p<0,05 t Student

Indicadores Avaliativos do WCST

Idosos com DM2 (n=44)

Idosos Controles(n=210)

Mínimo

Máximo

Média

DP

Mínimo

Máximo

Média

DP

1. Número de Ensaios Administrativos

82

128

124,32

11,82

70

128

121,82

14,86

2. Número Total Corretos

31

95

57,25

17,46

5

93

63,0

16,16

3. Número Total de Erros

15

97

67,07

23,14

6

100

58,39

23,51

4. Percentual de Erros

18,20

76

53,17

17,04

8,22

78,00

46,55

16,79

5. Respostas Perseverativas

6

126

56,18

37,27

3

126

39,39

27,15

6. Percentual de Respostas Perseverativas

7,30

98,43

44,15

28,77

0,89

98,44

29,84

19,33

7. Erros Perseverativos

6

94

45

26,88

3

94

33,45

20,11

8. Percentual de Erros Perseverativos

7,30

73,40

35,40

20,66

4,10

73,40

26,43

14,97

9. Erros Não-Perseverativos

2

65

22,07

14,53

2

77

24,94

15,73

10. Percentual de Erros Não-perseverativos

1,50

86

19,31

15,11

1,14

65,60

20,27

12,63

11. Respostas de Nível Conceitual

6

89

42,43

22,45

0

99

47,54

20,54

12. Percentual de Respostas de Nível Conceitual

4,70

79,30

32

21,26

0,0

90,40

39,42

21,90

13. Número de Categorias Completadas

0

6

2,20

1,86

0

6

2,80

1,93

14.Ensaios para Completar a Primeira Categoria

10

128

48,77

49,66

0

128

37,68

40,25

15. Fracasso em Manter o Contexto

0

7

1,02

1,56

0

128

1,83

8,92

16. Aprendendo a Aprender

- 39

4

- 7,10

11,15

- 37

37

-5,92

10,56

Tabela 3 - Resultados descritivos dos idosos com DM2 e dos idosos do grupo controle (n=210) nos indicadores avaliados do teste Wisconsin de classificação de cartas (WCST).

A média de número total de erros apurada foi de erros perseverativos (45 %) indicador 7. Esses erros perseverativos podem refletir inflexibilidade e resistência à mudança na tarefa realizada. Os erros não-perseverativos (indicador 9) foram de 22,07%. Esses dados refletem uma baixa proporção de acertos no WCST em idosos com DM2 (57,25%), que esteve associada a uma elevada proporção de perseveração (35,40%) da produção. O desempenho do número médio de ensaios para completar a primeira categoria está indicando, neste grupo, elevado número de ensaios para conseguir completar a primeira categoria do teste a partir do critério Cor. Assim, pode-se perceber que muitas das tentativas foram mal sucedidas para completar a primeira categoria. Quanto ao critério de fracasso em manter o contexto, houve, para cada idoso, aproximadamente, uma falha em manter-se atento na tarefa do teste. Conforme o indicador 16, aprendendo a aprender, a média foi de - 7,10 com valor negativo, sugerindo a dificuldade de aprendizagem durante realização do teste pelos idosos. No indicador percentual de respostas de nível conceitual (indicador 12), retratando apenas os acertos intencionais e desprezando os acertos aleatórios, a média foi de 32 % (DP= 21,26), o que revela a dificuldade dos idosos com DM2 nesta tarefa.

Nos idosos do grupo controle, o número médio de respostas corretas dos resultados obtidos mostra que (indicador 2) nos idosos da população geral, foi de 63,0, menos da metade das 128 cartas classificadas. Quanto ao número de categorias completadas (indicador 13), a média foi de 2,80, com desvio padrão de 1,93. No que se refere às respostas erradas, nos idosos do grupo controle, observou-se que o número total de erros (indicador 3) atingiu uma média de 58,39 (DP= 23,51). A maioria deste total de erros foram erros perseverativos (33,45%) indicador 7. O percentual de erros não-perseverativos (indicador 9) foi de 24,94%.

O grupo controle mostra que o número médio de ensaios para completar a primeira categoria teve valor médio de 37,68. O fracasso em manter o contexto (indicador 15) variou de zero a 128, com média de 1,83; houve para cada idoso, aproximadamente, uma falha em se manter atento na tarefa do teste. Conforme o indicador 16, aprendendo a aprender, observou-se que suas notas variam de - 39 e 37. A média foi de - 5,92 com valor negativo. Quanto ao indicador percentual de respostas de nível conceitual (indicador 12), retratando apenas os acertos intencionais e desprezando os acertos aleatórios, a média foi de 39,42% e o desvio padrão 21,90%.

A análise comparativa entre as médias de desempenho nos indicadores do WCST foi realizada por meio do teste t de Student para os indicadores com distribuição normal. A tabela 3 mostra os resultados da comparação, em função dos indicadores do WCST, expondo seus respectivos valores "t" e o nível de significância (p) resultante da análise estatística (tabela 4).

Observa-se, a partir da tabela 4, comparando o desempenho dos dois grupos nos indicadores acima descritos, que há diferença, estatisticamente significativa (p<0,005), em quatro indicadores do WCST: 2, 3, 5, e 6. Assim, os idosos com DM2 demonstram fazer menos categorias, apresentam percentual de erros maiores e cometem mais erros perseverativos, mostrando dificuldades quanto à flexibilidade cognitiva nestes itens. Os demais indicadores do WCST não mostraram diferença estatisticamente significativa.

Os idosos com DM2, previamente diagnosticados, foram comparados com idosos do grupo controle da população geral. Os resultados da análise comparativa dos dois grupos avaliados, idosos com DM2 e Grupo Controle, identificaram que os idosos com DM2 evidenciaram um pior desempenho e mostraram diferenças significativas em respostas perseverativas, que se relacionam com inflexibilidade cognitiva. O desempenho rebaixado nos idosos com DM2 demonstra falhas no processo inibitório do comportamento, que parece estar relacionado ao declínio cognitivo ocasionado pela DM2. Esses aspectos foram evidenciados nos estudos realizados por Zhao e Liu (2000), com 30 sujeitos com DM2 e 30 controles, de 40 a 60 anos de idade, utilizando o WCST e SPECT. Na análise, foram estudadas as funções cognitivas: memória, atenção, flexibilidade do pensamento, habilidade generalizar, inibição do funcionamento cerebral causada por hipofunção de fluxo sanguíneo cerebral, sujeitos com DM2, que mostraram redução.

Indicadores Avaliativos do WCST

N=44

Média DP

N=210

Média DP

t

p

1. Número de Ensaios Administrados

124,32

11,82

121,82

14,84

-1,213

0,229

2. Número Total Corretos

57,25

17,46

62,59

16,36

2,114

0,035(*)

3. Número Total de Erros

67,07

23,14

60,09

23,09

-2,232

0,027(*)

5. Respostas Perseverativas

56,18

37,27

39,39

27,15

-3,477

0,001(*)

6. Erros Perseverativos

45,00

26,88

33,45

20,11

-3,253

0,001(*)

9. Erros Não-Perseverativos

22,07

14,53

24,94

15,73

1,116

0,266

11. Respostas de Nível Conceitual

42,43

22,45

47,54

20,54

1,475

0,142

13. Número de Categorias Completadas

2,20

1,86

2,80

1,93

1,880

0,061

14. Ensaios para Completar a 1ª Categoria

48,77

49,66

37,68

4025

-1,593

0,113

15. Fracasso em Manter o Contexto

1,02

1,56

1,83

8,92

0,600

0,549

16. Aprendendo a aprender

-7,10

11,15

-5,92

10,56

0,667

0,506

Tabela 4 - Comparação do desempenho médio no teste Wisconsin de classificação de cartas (WCST) de idosos com DM2 (n=44) e idosos do grupo controle (n=210). * p<0,05 t Student.

Os idosos do grupo controle avaliados evidenciaram uma performance melhor nos seguintes indicadores: número total corretos, número total de erros, respostas perseverativas e erros perseverativos do WCST, se comparados aos idosos com DM2. Os achados revelaram que cometeram menos erros, completaram maior número de categorias e cometeram menos erros perseverativos. Esses resultados, nos indicadores do WCST do grupo controle, sugerem melhor funcionamento das funções executivas, relacionadas com a flexibilidade cognitiva, memória de trabalho e planejamento na execução de tarefas. Neste estudo comparativo, o WCST mostrou ser um instrumento sensível em quatro indicadores, com capacidade de revelar a intensidade dos prejuízos cognitivos associados à DM2, assim como identificar precocemente doenças que causam prejuízos nas funções cognitivas de idosos, principalmente as degenerativas, como a Doença de Alzheimer.

Não foram encontradas alterações importantes nos resultados dos subtestes do WAIS-III: Vocabulário (p > 0, 05 = 0,618), Dígitos (p > 0, 05 = 0,217) e Código (p > 0, 05 = 0, 154). Houve uma tendência de significância nos resultados do subteste Cubos (p > 0, 05 = 0,051), que examina a presença de prejuízos quanto à coordenação visomotora, percepção, capacidade de análise, síntese, raciocínio lógico, estratégias de solução de problemas, organização e velocidade viso-motor-espacial.

No desempenho do MEEM dos idosos com DM2, não houve diferenças significativas (p > 0, 05 = 0,819). O MEEM tem sido utilizado em protocolos de pesquisa e em situação clínica para rastear indivíduos com alterações cognitivas (Powlishta et al., 2002). Os instrumentos auxiliaram para efeitos de triagem.

No BAI (p < 0,001), na GDS (p < 0, 001), BDI (p < 0, 001), os achados apresentaram diferença significativa, indicando que os idosos com DM2 apresentaram sintomas de ansiedade e sintomas depressivos mais intensos do que os do grupo controle.

No WCST, os idosos com DM2 mostraram um número total maior de erros cometidos ao realizar a tarefa e cometeram mais perseverações. Um estudo empírico realizado evidenciou que o WCST pode ser considerado um instrumento sensível, analisado através de seus indicadores avaliativos, possibilitando a identificação dos aspectos que integram as funções executivas. Dessa forma, pode identificar funções mentais preservadas e funções que apresentam prejuízos que são decisivas nas avaliações neuropsicológicas e diagnósticos diferenciais. Na avaliação clínica, pode servir de subsídios para planejamento de estratégias de intervenção e reabilitação cognitiva dos pacientes longevos (Greve, Brooks, Crouch,Willians & Rice, 1997).

Os resultados do presente estudo apontaram que os idosos com DM2 mostraram diferenças significativas no BAI, BDI e GDS, demonstrando que os idosos com DM2 apresentaram mais sintomas de ansiedade e depressão. Entretanto, novas pesquisas e estudos são indispensáveis, principalmente os relacionados ao lobo frontal e ao controle executivo, flexibilidade cognitiva e do pensamento, por ser um indicador fundamental para identificar envelhecimento cognitivo normal e o patológico.

Um estudo realizado por Wattari et al. (2006), avaliou idosos com DM2, com e sem depressão, utilizando o WCST. A amostra foi de 20 idosos com DM2 e depressão, 20 idosos com DM2 sem depressão e 34 controles sem diabete ou depressão; foram comparados, com ênfase acima dos 65anos. Os resultados mostraram que os pacientes diabéticos mostraram mais comorbidades médicas em relação aos controles. Os pacientes com DM2 e depressão associadas apresentaram déficit cognitivo maior do que os controles. O padrão dos déficits cognitivos sustenta prejuízos subcorticais frontais. Este estudo clarifica nossos achados, que mostraram que os idosos com DM2 apresentam mais sintomas depressivos com diferenças significativas em relação aos controles. Destaca-se tanto a importância de identificar em pacientes com DM2 sintomas depressivos, como a necessidade de tratá-los, já que foi aqui demonstrado que os idosos depressivos apresentam maior deficiência orgânica, comparados aos controles com DM2, mas sem Diabetes.

Um estudo realizado por Seyfaddini (2006), com uma população de 50 sujeitos com DM2 e 48 Controles não diabéticos, de 25 a 65 anos de idade, utilizou o WCST e MMSE. Os resultados sustentam a hipótese da existência de deficiência cognitiva associada à DM2. Os pacientes com DM2 mostraram oito vezes mais deterioração cognitiva, quando comparados ao grupo controle sem DM2. Todos os domínios cognitivos globais mostraram diferenças, caracterizando-se por diminuída velocidade e flexibilidade mental. Esses resultados confirmam os resultados do presente estudo: que os idosos com DM2 apresentaram diferenças significativas no desempenho de quatro discriminadores do WCST, indicando pior desempenho cognitivo que os grupo controle. No MEEM não foi encontrada diferença significativa entre os dois grupos.

Outra pesquisa envolvendo o WCST, realizado por Zhao e Liu (2000), em 30 pacientes com DM2 e 30 controles, de 40 a 60 anos, relata que os pacientes com DM2 mostraram diminuição na memória, atenção, habilidade de generalizar e flexibilidade do pensamento e, ainda, inibição causada por hipofunção de fluxo sanguíneo cerebral frontal e temporal. Dessa forma, mesmo com reduzido número de estudos encontrados similares a este, os achados apontaram que os idosos com DM2 mostraram pior desempenho no WCST, indicando prejuízos quanto às funções executivas, mais especificamente, à flexibilidade cognitiva.

 

Considerações finais

Considerando a população pesquisada, foi encontrado déficits no desempenho dos

idosos com DM2 quanto à flexibilidade cognitiva em quatro indicadores do WCST: número total corretos, número total de erros, respostas perseverativas e erros perseverativos, indicando prejuízos cognitivos. Assim sendo, a avaliação das funções cognitivas no idoso é considerada importante, porque pode trazer informações significativas para possibilitar diagnósticos diferenciais e de mais complexidade, identificando precocemente sinais de disfunção, assim como sua intensidade. Além disso, os achados podem auxiliar nas decisões da vida do idoso e, se for o caso, na orientação para um processo de reabilitação.

Pesquisas atuais relacionadas com esta temática são limitadas, ao mesmo tempo, o próprio delineamento do estudo, do tipo transversal, impede a visualização prospectiva dos déficits cognitivos aqui encontrados e se eles persistem ou não ao longo do tempo. Diante dessas evidências e das pesquisas sobre o WCST em idosos com DM2, ressalta-se a importância da realização de mais estudos nessa área, envolvendo amostras maiores. Sugere-se, também, um delineamento longitudinal para futuras pesquisas, no intuito de observar, de forma prospectiva, se os déficits cognitivos persistem ou não no decorrer do tratamento e com o tempo da doença.

Uma das limitações do estudo foi o número pequeno de idosos com DM2 avaliados. Também é importante salientar que outras áreas cerebrais, além da área frontal, estão envolvidas no desempenho das funções cognitivas. Entre os indicadores do WCST, somente quatro deles mostraram diferenças importantes, quando comparados com o grupo controle. Outros instrumentos foram mais sensíveis BAI, BDI e GDS. Pelo número de estudos encontrados e os instrumentos utilizados, pode-se pensar que, junto ao WCST, outros instrumentos poderiam ter sido utilizados para este grupo clínico. Outro aspecto importante é que, provavelmente, apesar dos prejuízos cognitivos identificados em idosos com DM2, conforme os trabalhos que compõem as tabelas e trabalhos no texto, a flexibilidade cognitiva seja mais resistente ao deterioro para estes pacientes.

Concluindo os objetivos estabelecidos para este estudo, os achados mostraram que os idosos com DM2 apresentaram uma diferença significativa em quatro indicadores do WCST: número total corretos, número total de erros, respostas perseverativas e erros perseverativos, quando comparados com os idosos do grupo controle. Salienta-se a importância e relevância dos estudos envolvendo o WCST como instrumento para avaliação da flexibilidade cognitiva, relacionada ao lobo frontal. Os idosos com DM2 mostraram intensidade de sintomas depressivos e de ansiedade estatisticamente maior em relação ao grupo de idosos controles. A disfunção cognitiva identificada em idosos com DM2 pode estar relacionada com os prejuízos localizados no lobo frontal. Assim como, nos instrumentos utilizados para triagem, os subtestes do WAIS, vocabulário, cubos, códigos e dígitos não mostraram diferenças significativas entre os grupos. Entende-se que, devido ao aumento crescente da população de idosos, podem ocorrer, consequentemente, doenças degenerativas associadas, como a DM2. Estudos, envolvendo aspectos neuropsicológicos e indicadores de déficits que possam contribuir para identificar precocemente a presença de declínio facilitarão instituições a instituir ações preventivas e de reabilitação.

 

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Notas

R.M.F. Lopes
Endereço para correspondência: Av. Assis Brasil, 3532, Conj. 516/513, Jardim Lindóia, Porto Alegre, RS 91.010-003, Brasil.
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