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Ciências & Cognição

On-line version ISSN 1806-5821

Ciênc. cogn. vol.16 no.3 Rio de Janeiro Dec. 2011

 

Artigo Científico

 

Estudo empírico sobre a eficácia negocial de conflitos em ambiente escolar

 

Empirical study on the effectiveness of conflict negotiation in a school environment

 

 

Maria Olímpia Almeida de Paiva; Abílio Afonso Lourenço

Centro de Investigação em Psicologia e Educação (CIPE), Escola Secundária Alexandre Herculano, Porto, Portugal

 

 


Resumo

Nas sociedades contemporâneas, os processos de negociação têm vindo a assumir um relevo crucial na gestão dos mais diferentes conflitos que se desenvolvem nos distintos níveis da realidade social. Os sujeitos que integram o complexo processo negocial exprimem um conjunto único de características individuais que podem perturbar o modo e a efetividade da sua atuação. Este estudo tem como finalidade determinar se a Conscienciosidade, como fator da personalidade, bem como as variáveis sociodemográficas Sexo, Idade e Ano de escolaridade são relevantes na explicação da Eficácia Negocial. A amostra é constituída por 407 alunos do Ensino Secundário de uma escola do centro do Porto, Portugal. Foi utilizado o NEO-PI-R para avaliar a Concienciosidade e o QENCE para avaliar a Eficácia Negocial de Conflitos na Escola. Os resultados sugerem que a Conscienciosidade e as variáveis exógenas em estudo são essenciais para o entendimento da eficácia condutual dos negociadores. © Cien. Cogn. 2011; Vol. 16 (3): 151-166.

Palavras-chave: conscienciosidade; conflito; ambiente escolar; eficácia em negociação.


Abstract

In the contemporary societies, the negotiation processes have been coming to assume a crucial relief in the administration of the most different conflicts that are developed in the different levels of the social reality. Those individuals who take part in the complex negotiating process are prone to express a whole group of individual characteristics which can affect their way of behaving. This study aims at determining whether Conscientiousness, as personality factor, as well as socio-demographic variables Sex, Age and Grade level, are relevant in the attempt to explain negotiation effectiveness. The sample taken into account for that study is of 407 secondary school students of a school in Oporto, Portugal. We used the NEO-PI-R to assess Conscientiousness and the QENCE to evaluate the negotiation effectiveness in a school context. The results suggest that Conscientiousness and the exogenous variables studied are essential for the understanding of the behavioural effectiveness of those involved in the negotiating process. © Cien. Cogn. 2011; Vol. 16 (3): 151-166.

Keywords: conscientiousness; conflict; school environment; negotiation effectiveness.


 

 

Introdução

Os conflitos sempre existiram de diversas formas e sobre as mais variadas definições e conceitos interpretativos e constitutivos da realidade. Contudo, hoje, apresentam-se com características novas que, pela sua intensidade e força na sociedade, necessitam de ser investigadas e examinadas, bem como redefinidas para que se possam vislumbrar formas de enfrentá-las com competência a fim de superá-las (Ruotti, 2010). Constituindo-se como uma parte integrante da natureza humana, a realidade conflitual não pode ser relegada para segundo plano nem reprimida por muito tempo. Indissociavél aos vários sistemas sociais, não deve ser conotada de imediato de forma negativa (Cunha, 2001). O conflito pode assumir-se como um poderoso antídoto contra a estagnação, podendo estimular o interesse e a curiosidade e ser o meio mais credível para que os problemas possam ser esclarecidos, debatidos e discutidos. Desta forma, é possível encontrar soluções e considerar o conflito como a raiz das mudanças pessoais e sociais (Deutsch, 1990).

No plano da dinâmica social quotidiana, a temática do conflito na escola pode sofrer a classificação simplista das chamadas "patologias sociais" contemporâneas, ou ainda, numa apreciação neo-evolucionista, ser encarada no âmbito de problemas de inadequação às regras e normas sociais prevalecentes. Na perspectiva de Rodrigues (2007), os comportamentos indisciplinados podem ser considerados como uma forma de os alunos evidenciarem a sua não-existência nas vivências escolares, isto é, tudo fazem para revelar a sua fragilidade face aos seus pares e a sua debilidade como indivíduo.

Segundo Lourenço e Paiva (2004), atualmente as sociedades, sobretudo as urbanas, confrontam-se com a evidente problemática da aceitação de situações de conflito. As contínuas alterações sociais criam problemas que não podemos menosprezar. Porém é importante identificá-los e estudá-los, sem ideias pré-concebidas ou preconceitos, de forma a encontrar a origem dos mesmos. Há que pesquisar e tentar perceber o que lhes está subjacente. À implícita diversidade de fatores acresce, também, a dificuldade na sua resolução. A solução passa, assim, pela dedicação ativa dos diversos intervenientes sociais, pois ao não se resolverem os problemas atempadamente hoje, corre-se o risco de, amanhã, o seu feedback se manifestar com o dobro da intensidade.

Nesta sequência, e segundo Rahim (2002), a gestão de conflitos organizacionais envolve o diagnóstico e a intervenção no conflito. Um bom diagnóstico deve incluir as medidas da quantidade de conflitos, os estilos de lidar com conflitos interpessoais e as fontes de conflito. De forma idêntica, a escola deverá ser vista como um espaço organizacional onde existem conflitos de vários tipos e assim a crescente necessidade de se diagnosticar os conflitos que a envolvem e organizar programas de intervenção que os possam atenuar.

Num trabalho desenvolvido por Loureiro e Queiroz (2005), o diálogo foi destacado pelos inquiridos como um meio de solucionar os impasses ou lidar com algum tipo de violência. Este diálogo é visto como um encontro entre professor e aluno. O professor deve estar sempre disponível para conversar com o aluno, principalmente se este apresenta um comportamento violento. Quando esta situação não é possível temos de agir muitas vezes com autoritarismo por um certo tempo, até que um respeito mínimo seja construído. Dessa forma, subentende-se que ora o diálogo é utilizado, ora o autoritarismo. O importante é que o diálogo seja sempre procurado como a primeira opção na manutenção das relações escolares, sendo importante a participação dos alunos na elaboração das regras da sala de aula.

Se é uma realidade que a sociedade evolui e está, naturalmente, aberta às mudanças sociais que possam ocorrer, avalia-se não ser menos verdade que na Escola, parte intrínseca dessa sociedade, tenham-se desenvolvido enormes transformações no decurso do tempo. Sendo o conflito uma dessas transformações e este ser influenciado por algumas variáveis sociodemográficas (Cunha, 1996; Lourenço, 2009; Paiva, 2009). É sobre a forma como negociar esse conflito que se pretende desenvolver esta investigação.

Num estudo de Cunha (2000b), foi possível observar a existência de uma relação positiva e estatisticamente significativa entre a eficácia negocial e algumas variáveis sociodemográficas, nomeadamente a idade, a profissão, o tempo de experiência e o tipo de negociador. Por outro lado, os resultados demonstraram não existir propriamente diferenças significativas nas pontuações obtidas no CEN II (Cuestionario de Eficacia Negociadora II) com base no gênero (ainda que as mulheres apresentem uma pontuação média ligeiramente mais elevada), resultados estes que vão de encontro à não existência de evidência satisfatória acerca da relação entre sexo e a eficácia negocial, apesar dos homens possuírem uma percepção diferente das mulheres sobre a situação conflitual (Pinkley, 1990). O mesmo autor refere, ainda, que há uma relação positiva entre a eficácia negocial e a Extroversão e a Conscienciosidade.

Como refere Cunha (2000a), as investigações realizadas nas últimas cinco décadas chegaram a um modelo de cinco factores, onde pode ser encontrada a maioria dos traços da personalidade, cujas dimensões fundamentais são a Abertura à Experiência, a Amabilidade, a Conscienciosidade, a Extroversão e o Neuroticismo. No presente estudo será considerado, apenas, o factor Conscienciosidade, com base na pesquisa de Barry e Friedman (1998), no qual os autores salientam que este fator trata facetas da personalidade que influem nos mecanismos e nos resultados negociais. Costa e McCrae (1992) conceberam a Conscienciosidade como tendo aspectos proactivos e inibidores: o primeiro aspecto consiste na imprescindível realização e ligação ao trabalho, enquanto o lado inibidor se expressa nos escrúpulos morais e na precaução. Desta forma, esta faceta avalia o grau de organização, perseverança e motivação no comportamento orientado para um determinado objetivo. Compara indivíduos que são zelosos e de confiança com os que são ociosos e negligentes.

Assim, e com uma visão continuada no tempo, Mack e Snyder (1957) caracterizam o conflito como um tipo distinto de interação social entre partes que têm valores mutuamente restritos ou opostos. Pruitt e Rubin (1986: p. 4), numa significação mais delimitada, referem que o conflito representa " (...) uma percebida divergência de interesse, ou a crença de que as actuais aspirações das partes não podem ser alcançadas simultaneamente". Por seu lado, Serrano e Rodríguez (1993) estabelecem que o conflito será observável no instante em que duas ou mais partes se confrontam entre si, para atingir finalidades compreendidas como inconciliáveis.

De forma similar ao conceito anterior, existem várias interpretações sobre o que é negociar em contexto de conflito. Assim, a negociação tem como objetivo solver o conflito, de tal forma que a resolução se torne aceitável para ambas as partes envolvidas. Bercovitch, segundo Cunha (2001: p. 49), refere que "a negociação representa um tipo de mecanismo de gestão do conflito, possuindo um mecanismo de decisão e um mecanismo de termo que podem mover as partes conflituosas de um estado de conflito para uma de não conflito". Será importante mencionar que nem sempre é possível resolver um conflito por meio da negociação (Kennedy, Benson & McMillan, 1986), pois, como sublinha Rubin (1983), existem conflitos que não podem e não devem ser decididos através da negociação, defendendo este autor que a negociação continua a ser uma das melhores opções para resolver problemas.

Dos diversos estudiosos no âmbito da negociação, seguiremos, especialmente, a estruturação desenvolvida por Mastenbroek (1987, 1989), como linha orientadora da apresentação e interpretação das tácticas de negociação. Segundo Cunha (2001) a vantagem da aplicação deste modelo é que o mesmo é portador de uma articulação conceitual sólida e de grande evidência entre as orientações de comportamento mais global e estratégico (as quatro dimensões da negociação eficaz, a que acresce uma quinta dimensão respeitante à negociação intra-organizacional) e as respectivas ações de que os negociadores dispõem para as pôr em prática (táticas). O sentido das táticas de negociação será encaminhado para as resoluções negociais de: obtiver resultados substanciais; influir no equilíbrio do poder; desenvolver um clima positivo; conseguir uma flexibilidade negocial e estabelecer uma perspectiva racional de negociação.

No entender de Cunha (2000a), o modelo de Mastenbroek apresenta uma visão ampla sobre a eficácia em negociação, organizando-se, especialmente, em torno das atividades problemáticas que o negociador enfrenta, assim como acerca das dúvidas e receios que as mesmas lhe colocam. Esta visão está, claramente, em concordância com o plano de resolução de problemas e com o posicionamento estratégico de base, como fundamento essencial na firme flexibilidade, com vista à resolução do conflito. Deste modo, com o desenvolver da personalidade surgem os conflitos de várias ordens, primeiro num processo de interiorização no indivíduo, na procura de uma solução de dentro para fora, para, logo de imediato, na impossibilidade de resolução interna, passar para a dissolução do problema externamente, gerando, muitas vezes, novos conflitos. Da Rosa e Lapointe (2004) referem-se à personalidade como um agregado de diferentes características emocionais, intelectuais ou cognitivas e comportamentais de um indivíduo. Apesar da considerável variedade conceptual, reúne alguns pontos comuns, como a "consistência, essencialidade, estabilidade, continuidade, estrutura", entre outros (Monteiro & Santos, 2001: p. 298).

As diversas definições de personalidade detêm uma característica essencial, é uma construção pessoal que se verifica ao longo da vida. Tem o seu funcionamento no temperamento, no meio social em que estamos incluídos, sendo, também, resultado de um trabalho da nossa história de vida, isto é, da maneira como apreciamos, representamos e incluímos as nossas experiências. Entende-se, assim, por que motivo se atesta que a personalidade é um sistema dinâmico, uma elaboração contínua, que ocorre no decurso da vida das pessoas. Este factor mede o nível de organização, perseverança e motivação pela atitude orientada para uma meta específica.

Da revisão da literatura, constata-se que são escassos os estudos sobre a negociação de conflitos em contexto escolar, contudo existem vários sobre os processos de resolução de conflitos em contexto organizacional (Jaffe & Scott, 1998; Melamed & Reiman, 2000) que descrevem os diferentes caminhos que as organizacoes utilizam para a resolucao dos conflitos. Um estudo de Marques e Cunha (2004) nos revela uma primeira aplicacao do ROCI-II ao contexto organizacional especifico da escola, nomeadamente a docentes. A amostra era constituida por um total de 232 professores de duas escolas secundarias da zona centro de Portugal. O objetivo principal dessa investigacao foi verificar de que forma os cinco estilos de gestao de conflito propostos no Modelo Bidimensional de Rahim e Bonoma (1979) eram adotados pelos professores dessas escolas no seu contexto profissional, designadamente no relacionamento que estabeleciam com o direcao, colegas e alunos, tendo sido obtido um alpha de Cronbach de .92. No entanto, não existem estudos que relacionem os construtos conscienciosidade e a eficácia negocial de conflitos em contexto escolar.

Assim, este estudo tem como finalidade determinar se a Conscienciosidade, como fator da personalidade, bem como as variáveis sociodemográficas Sexo, Idade e Ano de escolaridade são relevantes na explicação da Eficácia Negocial.

 

Método

Participantes

A amostra é constituída por 407 alunos do Ensino Secundário, de uma escola do centro do Porto - Portugal. Destes, 156 (38,3%) pertencem ao sexo masculino e 251 (61,7%) ao feminino, sendo 75 (18,4%) do 10º ano, 169 (41,5%) do 11º ano e 163 (40,1%) do 12º ano. Apresentam, ainda, idades compreendidas entre os 17 e os 22 anos (M = 17,78; DP = 0.99). Os indivíduos do sexo masculino exibem uma média de idades de 17,83 anos e os do sexo feminino uma média de 17,74.

Instrumentos

Da revisão de literatura, é possível verificar que a eficácia negocial de conflitos pode ser avaliada por vários instrumentos já existentes, nomeadamente no contexto laboral. Sendo o objetivo principal desta investigação o contexto escolar, tomou-se a decisão de construir um questionário ajustado ao contexto português (QENCE - Questionário de Eficácia Negocial de Conflitos na Escola) (Paiva, Cunha & Lourenço, 2011) e que abarcasse o último nível do Ensino Básico e o Ensino Secundário, a partir de alguns modelos conceituais de negociação de conflitos. Este instrumento tem por origem conceitual o modelo de negociação aconselhado por Mastenbroek (1987, 1989), tendo-se, também, tido em consideração as abordagens de outros autores, principalmente as de Bazerman e Neale (1993), Pruitt e Carnevale (1993), o Modelo Bidimensional de Rahim e Bonoma (1979), o questionário ROCI-II (Rahim Organizational Conflict Inventory; Rahim, 1983a, 1983b, 1983c, 2001) e o CRQ (Conflict Resolution Questionnaire) proposto por McClellan (1997). O questionário final apresenta 21 itens distribuídos por cinco dimensões: Influência Negocial - IN (e.g., Habitualmente, quando o opositor não aceita uma proposta minha, ameaço quebrar a negociação); Clima Negocial - CN (e.g., É importante criar segurança na outra parte quando se pretende obter um acordo satisfatório e duradouro); Soluções Construtivas - SC (e.g., Numa negociação é fundamental trabalhar em conjunto para encontrar os interesses comuns às duas partes); Firmeza-Flexibilidade Comportamental - FFC (e.g., Procuro ser uma pessoa flexível, não esquecendo, contudo, os meus objectivos principais da negociação); e Racionalidade Negocial - RN (e.g., Consigo aceitar as críticas do meu oponente). Os sujeitos respondem indicando em que medida a referida afirmação é válida para si próprio.

A eficácia negocial de conflitos em contexto escolar pode, assim, ser avaliada através da soma das pontuações nas respectivas subescalas. Por conseguinte, a dimensão IN, constituída por cinco itens, descreve a procura de influência quanto ao equilíbrio de poder, isto é, salienta ser fundamental uma determinada estabilidade de domínio entre as partes, com uma ajustada e superior capacidade e espaço de manobra para que o negociador obtenha o acordo eficaz. A dimensão CN, formada por cinco itens, tem como objetivo desenvolver um clima construtivo, ou seja, baseia-se no desenvolvimento de um clima mais favorável ao ato da negociação. Nesta dimensão os negociadores diligenciam apontar alternativas que permitam a flexibilidade e a exploração nas propostas a partir da comunicação, considerando os objetivos e interesses da outra parte, prevenindo, deste modo, comportamentos adversos e intimidatórios face ao adversário. A dimensão SC, constituída por três itens, traduz a obtenção de resultados substanciais e identifica-se como sendo o grande objetivo da negociação, isto é, a principal finalidade é alcançar bons resultados, o que vai orientar todas as demais acções. A dimensão FFC, com quatro itens, refere-se principalmente a uma flexibilidade comportamental, com o objectivo de eleger uma dinâmica flexível entre os negociadores. Embora o negociador apresente uma postura de interesses convenientemente fundamentada, a ideia passa, especialmente, pelo esforço de se conseguir um acordo através de cedências e permutas mútuas, nunca esquecendo os interesses e finalidades de ambas as partes. Por último, a dimensão RN, formada por quatro itens, tem como objectivo estabelecer uma perspectiva racional de negociação. Deve ser observada uma racionalidade superior por parte do negociador, com vista a evitar decisões assentes em propensões enviesadas face ao opositor, o que dificultaria a realização de acordos de maior eficácia. No que se refere à classificação das respostas, usou-se uma escala de formato Likert de cinco pontos, desde discordo fortemente (1) até concordo fortemente (5). Os índices de fiabilidade (alpha de Cronbach) são de 0,86; 0,88; 0,90; 0,87 e 0,90, respectivamente para as dimensões IN, RN, FFC, CN e SC.

Previamente à contrastação do modelo, realizaram-se análises fatoriais confirmatórias (CFA) com o fim de obter evidência empírica da validez do construto QENCE. Ajustou-se um modelo em que se postulava que uma estrutura de cinco dimensões que explicam a variabilidade dos 21 itens. Deste modo, assumiu-se que o modelo de medida está assente nos seguintes pressupostos: (i) As respostas dos alunos podem ser explicadas por cinco dimensões; (ii) A carga fatorial exibida por cada um dos itens está associada apenas à dimensão que é suposto medir (carga fatorial alvo) e carga fatorial zero nas outras dimensões; (iii) Não há correlação entre os erros de estimativa associados a cada um dos itens; e (iv) De acordo com o racional teórico no qual está baseado o questionário, as cinco dimensões estão correlacionadas. O modelo (n = 505) apresenta os seguintes índices de ajustamento: χ2 (179) = 313,867; p < 0,001; χ2/gl = 1,753; GFI = 0,946; AGFI = 0,930; CFI = 0,976; TLI = 0,972; RMSEA = 0,039 (0,031 - 0,046). Os valores obtidos nos índices de bondade sugerem que o ajustamento global do modelo é robusto.

Para avaliar a Conscienciosidade, como fator da personalidade, foi utilizada a versão portuguesa do NEO-PI-R (Neuroticism, Extroversion, Openess-Personality Inventory - Revised), aferida por Lima (1997), originalmente desenvolvida por Costa e McCrae (1991) e McCrae e Costa (1992) que operacionalizaram o modelo dos cinco fatores. Este modelo apoia-se numa organização dos traços da personalidade, à volta de cinco dimensões gerais, estando apoiado em escalas de avaliação do comportamento, resultados de questionários de personalidade e na analogia com outros sistemas de personalidade. As escalas do NEO-PI-R medem traços cujas cotações se avizinham do modelo da distribuição normal - a maioria dos indivíduos terá pontuações em torno da média, com uma reduzida percentagem de sujeitos nos extremos. O modelo em causa possibilita alcançar, a partir da delineação do posicionamento do indivíduo nos cinco factores (Extroversão, Neuroticismo, Amabilidade, Conscienciosidade e Abertura à Experiência), um esquema compreensivo que reúne características individuais que são afectivas, experienciais, interpessoais, atitudinais e motivacionais. Neste instrumento, o indivíduo tem a função de avaliar os itens que lhe são enunciados numa escala de cinco pontos de formato Likert, graduada desde discordo fortemente (0) a concordo fortemente (4). Cada uma das cinco dimensões está dividida em seis facetas diferentes e cada uma delas é constituída por oito itens.

A dimensão Conscienciosidade, selecionada para esta investigação empírica, foi uma das usadas por Barry e Friedman (1998). As facetas selecionadas para o presente estudo foram: Competência e Esforço de Realização, num total de 16 itens. A Competência, segundo Costa e MacCrae (1992: p. 18), é "o sentimento de que se é capaz, sensível, prudente e eficaz". e o Esforço de Realização caracteriza-se por níveis de realização elevados e forte motivação para os atingir, diligência, objectivos e sentido de vida.

Neste trabalho foi opção incluir as facetas mais apropriadas, com base no marco teórico desenvolvido e nos objectivos que nos propusemos em termos de pesquisa. De referir que a aplicação do NEO-PI-R se alarga por toda a idade adulta (a partir dos 17 anos) e a todos os graus de escolaridade e níveis de proveniências, bem como em contextos muito distintos.

Para avaliar o sexo, idade e ano de escolaridade, utilizou-se uma ficha de dados pessoais e escolares (FDPE). Esta ficha, apresentada aos alunos juntamente com o QENCE e o NEO-PI-R, foi construída para conhecer os aspectos referentes à identificação dos sujeitos e descrição da amostra, mas permitiu também avaliar outras variáveis em estudo.

Procedimentos e técnicas de análise de dados

Procedimentos

Com a finalidade de adquirir autorização superior para a aplicação do questionário foram contatos os diretores das escolas, onde foi explicado o objetivo do estudo. Através de impresso próprio foi pedido consentimento aos pais/encarregados de educação dos alunos para participarem nesta investigação. Todos os discentes foram autorizados, os quais foram bastante receptivos, tendo sido voluntária e confidencial a sua participação. Os instrumentos foram administrados em contexto de sala de aula, em Novembro de 2010. O tratamento estatístico dos dados foi realizado com base no programa informático PASW Statistics/AMOS.18 (Arbuckle, 2009; Byrne, 2001; Lowe, Winzar & Ward, 2007).

Técnicas de análise de dados

Recorrendo a modelos de equações estruturais (SEM) (Ullman & Bentler, 2004), pesquisamos a validade preditiva, analisando as relações dos construtos avaliados com variáveis que os investigadores têm frequentemente referido como teoricamente associadas. Esta técnica de modelação de equações estruturais possibilita avaliar as relações causais entre variáveis inferidas (não diretamente observadas) através de um conjunto de variáveis observadas que servem de marcadores de cada variável inferida ou latente (Byrne, 1994). Este modelo está representado pictograficamente por um diagrama causal (cf. figura 1), especificando as variáveis e a direção das influências causais.

O cálculo dos parâmetros estimados foi efetuado com o AMOS 18 que nos apresenta os modelos usados a partir de matrizes de efeitos e de covariância. A avaliação do modelo é executada através dos indicadores estatísticos que possibilitam concluir a adequabilidade do enunciado estabelecido anteriormente.

Na avaliação dos modelos causais, tentamos determinar se o modelo hipotetizado explica as relações existentes na matriz dos dados empíricos. A análise do ajustamento global do modelo seguirá duas fases: a análise do ajustamento do modelo e a leitura dos dados relativos à comparação do modelo (MacCallum, Wegener, Uchino & Fabrigar, 1993). O ajustamento global do modelo representa o grau em que o modelo estabelecido se ajusta à matriz de covariância dos dados. Serão descritos, seguidamente, os índices que permitem esta tomada de decisão, nomeadamente: χ2/gl; GFI; AGFI; CFI; TLI; e RMSEA (Byrne, 2001; Schreiber, Nora, Stage, Barlow & King, 2006), sendo os mais recomendados pela revisão de literatura sobre as aplicações SEM.

Utiliza-se, frequentemente, o valor obtido a partir da divisão do χ2 (qui-quadrado) do modelo pelo número de graus de liberdade (χ2/gl), considerando um ajustamento aceitável do modelo quando este valor é inferior a 5 (Giles, 2002), embora este critério não seja pacífico entre os investigadores. Marsh e Hocevar (1985) sugeriram que um valor entre 2 e 5 indicaria um ajustamento aceitável, enquanto Byrne (1989) afirmou que valores superiores a 2 não deveriam ser aceites.

O índice GFI (Goodness-of-Fit Index), introduzido por Jöreskog e Sörbom (1993), compara a matriz de covariância da amostra utilizada com uma matriz de covariância estimada para a população, isto é, que parâmetros poderíamos esperar de replicações do estudo em diferentes amostras. O seu valor está compreendido entre 0 e 1, sendo a proximidade de 1 uma medida de um bom ajuste. O AGFI (Adjusted Goodness-of-Fit Index) expressa, tal como o anterior, a quantidade de variância e covariância explicada, ajustada aos graus de liberdade do modelo. Valores iguais ou superiores a .90 nestes índices são normalmente considerados indicadores de ajustamento do modelo. Estes dois índices podem ser classificados como de ajustamento absoluto por não compararem o modelo hipotetizado com qualquer outro (Hu & Bentler, 1999).

O CFI (Comparative Fit Índex) coloca o modelo estimado algures num continuum de valores que oscilam entre 0 e 1, indicando o zero um mau ajuste e o 1 o ajuste perfeito. Este índice, desenvolvido por Bentler (1990), compara o modelo estimado com um modelo completamente independente, no qual não existe nenhuma relação entre variáveis, com base no procedimento de máxima verosimilhança. Este índice é importante pelo seu poder de ajuste em modelos estimados em amostras com um número reduzido de indivíduos. Valores iguais ou superiores a .95 são considerados indicadores de um bom ajuste (Hardy & Bryman, 2004; Hu & Bentler, 1999).

O TLI possibilita comparar o modelo estimado com um modelo teórico nulo, ou seja, visa determinar se todos os indicadores são associados a um único factor latente (Hair, Anderson, Tatham & Black, 2005). Valores iguais ou superiores a 0,95 indicam um ajuste robusto.

O RMSEA (Root Mean Square Error of Approximation) é um índice que dá a ideia da diferença existente entre a matriz de variância e covariância da amostra e a matriz do modelo obtido, partindo do pressuposto que o modelo é adequado. Os valores compreendidos entre 0,08 e 0,05 indicam um ajuste razoável e quando são inferiores a 0,05 revelam um bom ajuste (Hu & Bentler, 1999).

Hipóteses de investigação

Este modelo, centrado na eficácia negocial de conflitos dos alunos em contexto escolar, descreve determinadas relações causais entre as variáveis. Sendo o objetivo a comprovação da viabilidade do modelo proposto é formulada a seguinte hipótese: H - o modelo proposto representa as relações entre as variáveis existentes na matriz empírica.

Relativamente às relações existentes no modelo hipotetizado para os alunos do Ensino Secundário, estabeleceu-se que cada uma das variáveis latentes influi unicamente nas suas respectivas dimensões (Byrne, 2001) e que as relações entre variáveis observadas e inferidas são representadas por um alfa (α) e entre as inferidas por um beta (β). Deste modo, foram definidas as sub-hipóteses que norteiam as especificações delineadas:

H1 -O sexo dos alunos tem influência na conscienciosidade dos mesmos;

H2 -O grau de conscienciosidade pode variar com a idade dos alunos;

H3 - O ano de escolaridade em que o aluno se encontra tem impacto na sua conscienciosidade;

H4 -A eficácia de negociação de conflitos dos alunos é influenciada pela sua conscienciosidade.

 

Resultados

As relações causais que foram hipotetizadas neste modelo derivam direta ou indiretamente da literatura existente (cf. figura 1). É expectável que os alunos com valores de conscienciosidade mais elevados revelem maior eficácia na negociação de conflitos em contexto escolar. Foi hipotetizado, de igual forma, que algumas variáveis observadas (sexo, idade e ano de escolaridade) têm também influência na conscienciosidade.

Figura 1

Legenda: FFC - Firmeza-Flexibilidade Comportamental; CN - Clima Negocial; IN - Influência Negocial; SC - Soluções Construtivas; RN - Racionalidade Negocial.

Figura 1 - Especificação pictórica do modelo de equações estruturais da eficácia negocial e da consciensiosidade.

Na figura 1, observa-se a especificação do modelo hipotetizado para a amostra. As relações causais apresentadas são as existentes no modelo, considerando as hipóteses delineadas anteriormente. Teve-se em conta dois critérios para a avaliação dos resultados da contrastação do modelo de equações estruturais: o nível global de ajustamento do modelo e a significância dos coeficientes de regressão calculados. Os índices de ajustamento global (índices de bondade) do modelo proposto são bastante robustos [χ2(gl) = 57,147 (31); p < 0,01; χ2/gl = 1,843; GFI = 0,972; AGFI = 0,951; CFI = 0,966; TLI = 0,950; RMSEA = 0,046 (0,026 - 0,064)], atestando a hipótese de que o modelo hipotetizado representa as relações entre as variáveis existentes na nossa matriz empírica. Da tabela 1 e da figura 1 poder-se-á constatar que as sub-hipóteses que nortearam esta investigação foram todas confirmadas:

H1 -As raparigas têm mais conscienciosidade do que os rapazes (α = 0,13; p < 0,05);

H2 -Os alunos com mais idade apresentam uma conscienciosidade superior (α = 0;14; p < 0,05);

H3 -Os alunos do 12.º ano revelam maior conscienciosidade que os restantes colegas do Ensino Secundário (α = 0,15; p < 0,01); e

H4 -Os alunos que apresentam pontuações superiores na conscienciosidade manifestam maior eficácia de negociação de conflitos na escola (β = 0,28; p < 0,001).

Observa-se na tabela 1 que todos os valores de regressão de uma variável relativamente a outra se apresentam como significativos, excluindo os da relação da variável exógena sexo com as variáveis exógenas idade e ano de escolaridade.

Coeficientes

SE1

CR2

p<3

Sexo -> Conscienciosidade

0,13

0,469

2,439

0,015

Idade -> Conscienciosidade

0,14

0,238

2,504

0,012

Ano de escolaridade -> Conscienciosidade

0,15

0,322

2,766

0,006

Conscienciosidade -> Eficácia Negocial

0,28

0,020

4,117

0,000

Sexo <-> Idade

-0,05

0,024

-0,913

0,361

Sexo <-> Ano de escolaridade

0,05

0,018

0,933

0,351

Idade <-> Ano de escolaridade

0,25

0,037

4,937

0,000

1Erro padrão; 2Razão crítica; 3Probabilidade.

Tabela 1 - Resultados da contrastação do modelo.

Quanto à variância explicada das variáveis em estudo, as correlações múltiplas quadradas indicam valores de 7% para a conscienciosidade e 8% para a eficácia negocial, sendo esta a mais explicada no modelo em estudo. Na tabela 2, são apresentados os dados descritivos (média, desvio-padrão, assimetria e curtose) relativos às variáveis incluídas no modelo de equações estruturais, podendo-se constatar que as assimetrias e as curtoses apresentam valores ajustados. Os dados alcançados indicam médias na pontuação item a item próximos do valor intermédio da respectiva distribuição.

No que diz respeito à variável sexo, existe uma relação fraca e estatisticamente significativa (r = 0,118; p < 0, 05) com a conscienciosidade e com a eficácia negocial (r = 0,147; p < 0,01). De realçar que existe uma relação muito forte entre a conscienciosidade e as suas dimensões: esforço de realização (r = 0,927; p < 0,001) e competência (r = 0,921; p < 0,001). Relativamente à eficácia negocial, as dimensões que melhor definem este construto são o clima negocial (r = 0,705; p < 0,001), as soluções construtivas (r = 0,716; p < 0,001) e a firmeza-flexibilidade comportamental (r = 0,700; p < 0,001). Embora os fatores influência negocial (r = 0,643; p < 0,001) e racionalidade negocial ( r= 0,699; p < 0,001) apresentem valores inferiores, representam igualmente relações fortes. Verifica-se que a maioria das relações entre as facetas e fatores são estatisticamente significativas.

1

2

3

4

5

6

7

8

Esforço de realização

-

Competência

0,707**

-

3. FFC

0,206**

0,235**

-

4. CN

0,056

0,149**

0,387**

-

5. IN

0,88

0,125*

0,208**

0,212**

-

6. SC

0,158**

0,158**

0,512**

0,440**

0,292**

-

7. RN

0,067

0,124*

0,382**

0,408**

0,296**

0,426**

-

8. Idade

0,141*

0,149

-0,004

0,002

0,044**

0,025*

0,015

-0,045

Média

19,82

20,07

15,58

18,49

18,77

11,78

16,00

17,78

DP

Assimetria

Curtose

5,17

0,052

0,551

4,98

0,098

0,843

2,45

-0,857

1,795

2,60

-0,156

0,066

3,13

-0,379

0,419

1,71

-0,975

2,405

2,13

-0,544

0,974

0,99

1,300

1,270

Legenda: FFC - Firmeza-Flexibilidade Comportamental; CN - Clima Negocial; IN - Influência Negocial; SC - Soluções Construtivas; RN - Racionalidade Negocial.

* p<.05; ** p<.01

Tabela 2 - Matriz das correlações correspondentes às variáveis incluídas no modelo estrutural e dados descritivos (média, desvio padrão, assimetria e curtose).

No que concerne à variável exógena idade existe uma relação fraca mas estatisticamente significativa (r = 0,157; p < 0,01) com a variável conscienciosidade. De igual forma, o ano de escolaridade estabelece uma relação fraca com as variáveis endógenas conscienciosidade (r = 0,180; p < 0,001) e eficácia negocial (r = 0,049; p = n.s.), sendo esta última estatisticamente não significativa.

 

Discussão

Como referem Greenhalgh, Neslin e Gilkey (1985), admite-se que as personalidades dos negociadores têm grande impacto sobre as negociações. São as predisposições de personalidade mais amplas, e não os traços de personalidade isolados, que afectam a negociação na vida real. De destacar que, na interpretação das condições que abarcam os efeitos da personalidade na negociação, Barry e Friedman (1998) referem que esses efeitos nos processos e resultados negociais podem ser diminuídos pelas aspirações elevadas. Uma intensa motivação para o sucesso poderá conduzir a uma forma de atuar que seja incongruente com a personalidade daquele que negoceia e, na falta de uma tal motivação, o desempenho do negociador poderá ver-se mais afetado pelas suas características estáveis de personalidade. No presente estudo, infere-se que os alunos mais conscienciosos, ou seja, que apresentam maior esforço de realização e competência, são mais eficazes na negociação dos seus conflitos em contexto escolar. Desta forma, estes alunos apresentam um maior grau de organização, perseverança e motivação no seu comportamento orientado para um determinado objetivo.

No que diz respeito ao Sexo, as raparigas apresentam valores superiores nas médias da conscienciosidade relativamente aos rapazes. A faceta onde as raparigas revelam melhor média é na competência, assim poder-se-á dizer que se sentem capazes e bem preparadas para lidarem com a vida, bem como são mais sensíveis, prudentes e eficazes. Dos resultados constata-se também que as raparigas apresentam médias superiores na eficácia negocial, bem como em todos os seus fatores. Nesta sequência poder-se-á inferir que as raparigas costumam fazer uma procura criativa de soluções para os problemas, orientando todas as demais ações, utilizam um estilo de negociação baseado no bom senso e no argumento, de forma a se conseguir um acordo através de cedências e permutas mútuas. As alunas procuram desenvolver um clima construtivo mais favorável ao ato da negociação apontando alternativas de uma forma racional de forma a se obter um acordo eficaz. Relativamente à percepção da situação de conflito, os homens, geralmente, estão mais voltados para a maximização de resultados, enquanto as mulheres se preocupam mais com a manutenção da relação. Segundo Cunha (2001), relativamente à percepção sobre o opositor os homens tendem a percepcioná-lo como sendo fundamentalmente distinto de si próprio, enquanto que as mulheres tendem a ser mais empáticas e percepcioná-lo como semelhantes a si mesmas.

De uma maneira geral, os negociadores da amostra apostam, principalmente, na utilização de estratégias de menor dureza a fim de obterem um equilíbrio na sua relação com o oponente, isto é, as atitudes eleitas pelos negociadores sugerem serem aquelas que estão mais em consonância com a resolução de problemas, com a finalidade de se desenvolver uma determinada margem de manobra de negociação.

Quanto ao ano de escolaridade, verifica-se que são os alunos do 12.º ano que apresentam melhores médias na conscienciosidade relativamente aos restantes anos. É na faceta competência que os alunos apresentam uma média superior. De uma forma indireta, quando relacionamos o ano de escolaridade com a eficácia negocial, verifica-se que são os alunos do 11.º ano e do 12.º ano que apresentam médias superiores. Estes alunos acreditam que é muito importante estabelecer uma boa relação com o oponente, evidenciando-lhe que se aposta na credibilidade e na mútua dependência, preocupam-se em facultar a imagem de que são negociadores fiáveis e credíveis, assim como não ameaçam quebrar a negociação se a outra parte não aceita a proposta apresentada. De realçar que nos três níveis de ensino as facetas que obtêm uma média superior são a influência negocial e o clima negocial. De forma idêntica, a faceta que apresenta médias mais baixas é a soluções construtivas.

Do modelo apresentado na figura 1 e no que concerne à relação entre a conscienciosidade e a eficácia negocial, os alunos que revelam médias superiores na dimensão conscienciosidade são os que apresentam uma melhor eficácia negocial (β = 0,28; p < 0,001). Estes resultados estão em consonância com os obtidos por Cunha (2000b), os quais atestam que o fator conscienciosidade é de grande importância na questão da eficácia negocial. Estes dados vão ao encontro à hipótese inicialmente delineada onde se prognosticou que os indivíduos com pontuações mais elevadas na conscienciosidade, definidas pelo esforço de realização e competência, fossem igualmente os que tinham alcançado pontuações mais elevadas na Eficácia Negocial.

A conscienciosidade, como dimensão da personalidade, deverá ser encarada como muito importante, pois a negociação não é apenas uma simples troca interpessoal, exigindo a preparação e a análise prévia do encontro negocial, como forma de aumentar a probabilidade de êxito (Lewicki, Litterer, Minton & Saunders, 1994; Murnighan, 1992). Assim, se o negociador projetar as suas ações será, talvez, menos influenciável pela proposta inicial do oponente e, uma vez que os responsáveis são normalmente organizados, focados na tarefa e guiados para a realização (McCrae & John, 1992), então os negociadores que obtêm pontuações altas em conscienciosidade alcançarão acordos mais favoráveis para si próprios. Resumindo, poder-se-á dizer que os indivíduos conscienciosos são organizados, trabalhadores, pontuais, ambiciosos, perseverantes e dotados de força de vontade e de confiança. Acresce às anteriores capacidades a sua influência no estabelecimento de uma abordagem racional de negociação.

Como menciona Cunha (2000a), é de salientar que os resultados encontrados não são uma garantia de uma atuação conforme o que responderam, pois os sujeitos são questionados quanto aos comportamentos adotados perante um conflito e não se verificam in loco as atitudes no momento real da situação conflitual. Assim sendo, poderão ser detectadas algumas discrepâncias entre as cotações alcançadas pelos alunos na escala e a prática dos mesmos no processo de negociação de conflitos. Sobre esta dificuldade em analisar os resultados, Da Rosa e Lapointe (2004: p. 37) referem que "alguns desses limites provêm da dificuldade em quantificar dados, da utilização de questionários escritos e das contradições entre o comportamento e a percepção que os actores têm delas".

Em jeito de conclusão, a escola representa um espaço social rico do ponto de vista da intensidade de interações que nele se desenvolvem. Apesar de sabermos que não pode ser analisado, compreendido e equacionado sem se ter em conta as condições situacionais e estruturais que o encorpam e atravessam, sabemos, também, que as práticas de interação que nele se desenvolvem não são, por vezes, uma reprodução das regras socialmente estabelecidas para este contexto particular. Por conseguinte, mais importante do que controlar comportamentos, é considerar os aspectos de relação, interação/comunicação, empatia, disponibilidade e franca mediação na resolução do conflito, permitindo um clima de tolerância, liberdade e aceitação mútua.

Devido à importância concedida à negociação construtiva e eficaz dos conflitos, e considerando que é uma problemática relativamente pouco investigada em contexto de escola, foi opção avaliar uma pequena amostra de forma a inferir-se sobre os comportamentos mais frequentes, perante uma situação de conflito interpessoal em espaço escolar. Em termos globais, será oportuno evocar que, na perspectiva sobre a eficácia em negociação, teve-se em consideração que tal fenômeno poderia ser entendido à luz de dois tipos de questões essenciais: a conscienciosidade - um dos fatores da personalidade - e variáveis sociodemográficas (sexo, idade e ano escolaridade). Assim, relativamente à variável conscienciosidade, constatou-se que existe uma associação linear positiva com a eficácia negocial e que é estatisticamente significativa. Verificou-se que pertencer ao sexo masculino ou feminino influencia de uma forma significativa a conscienciosidade, constatando-se que as raparigas apresentam médias superiores, revelando uma certa facilidade de comunicação entre as partes e estabelecem relações interpessoais isentas de crispação. O indivíduo aprende a ponderar, a sentir e a falar no contexto que condiciona um desenvolvimento que está exposto a qualquer tipo de influência. Trata-se de uma adaptação ao grupo humano com o qual o indivíduo deve viver (Da Rosa & Lapointe, 2001).

Desta forma, a Escola é um lugar onde diariamente convivem pessoas com diferentes características, educações, vivências e personalidades. Entre tantas diferenças é natural que surjam divergências das mais diversas espécies. É imprescindível, então, a boa administração dos problemas que venham a surgir para que a harmonia e o respeito estejam presentes no ambiente escolar e possam interferir de uma forma positiva no processo de ensino-aprendizagem. Assim, é indispensável estar atento para as questões que pervertem os princípios e valores fulcrais dos alunos enquanto indivíduos isolados ou nas suas relações intergrupais no dia-a-dia escolar e familiar. A epistemologia subjacente ao estudo do conflito e da negociação revela-se, cada vez mais, de uma importância crucial, pois significa ir delineando os alicerces de outros aspectos determinantes - as soluções para uma educação mais consentânea para enfrentar os conflitos e as linhas orientadoras para a formação na prática da negociação.

Da revisão de literatura, sobre conflitos escolares e formas de gerir esses mesmos conflitos, fica a ideia de que existem diversos desafios que podem ser considerados para uma investigação futura, ultrapassando, assim as limitações encontradas neste estudo. Nesta sequência será importante: (i) realizar estudos que investiguem as relações afetivas pessoais, grupais e inter-grupais no sentido da aprendizagem e satisfação escolar; (ii) concretizar mais pesquisas de carácter quantitativo e qualitativo no sentido de identificar estilos de gestão para lidar com diferentes situações de conflito e avaliar a eficácia da sua aplicação; (iii) empreender estudos sobre a relação entre a personalidade e os estilos de lidar com conflitos interpessoais e inter-grupais; (iv) realizar estudos transculturais sobre as diferentes formas de gerir os conflitos e sua avaliação no desempenho escolar; (v) ter em conta as sugestões de triangulação de dados a partir de diferentes procedimentos de avaliação, através de itens de questionários que meçam o construto como uma atitude, mas também com indicadores de comportamentos avaliados como um evento; (vi) efetivar investigações que utilizem outras variáveis que permitam aumentar a variância explicada da eficácia negocial de conflitos em contexto escolar; e (vii) utilizar amostras mais alargadas numérica e geograficamente. Deste modo, as informações obtidas a partir desses estudos permitirão compreender melhor os construtos em análise, bem como gerir de uma forma mais eficiente e eficaz os conflitos nas escolas.

 

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Notas

M.O.A. de Paiva
Site: http://www.guia-psiedu.com/equipa/index.php.
Telefones para contato: 00351.220176714 (fixo) e 00351917135204 (celular).
E-mail para correspondência: cipe.esah.investigar@gmail.com;

A.A. Lourenço -
site: http://www.guia-psiedu.com/equipa/index.php.
Telefones para contato: 00351.220176714 (fixo) e 00351966800852 (celular).
E-mail para correspondência: cipe.esah.investigar@gmail.com.