Services on Demand
article
Indicators
Share
Psicologia em Pesquisa
On-line version ISSN 1982-1247
Psicol. pesq. vol.3 no.2 Juiz de Fora 2009
RESENHA
"THE END OF STIGMA? Changes in the Social Experience of Long-Term Illness"
Pollyanna Santos da SilveiraI; Rhaisa Gontijo SoaresI
IUniversidade Federal de Juiz de Fora (UFJF)
O processo de estigmatização tem como características fundamentais o reconhecimento da diferença com base em alguma característica distinguível ou "marca" e uma conseqüente desvalorização do seu portador (Dovidio, Major, & Crocker, 2003). Além de enfrentarem doenças que causam sintomas negativos e incapacidades sociais que impedem que essas pessoas desempenhem muitos dos papéis sociais e alcancem objetivos de vida, os portadores dessas condições ainda precisam enfrentar as reações sociais às formas severas de algumas doenças as quais podem ser igualmente devastadoras.
Gill Green é professor de sociologia médica em University of Essex, no Reino Unido, sua principal área de interesse são as conseqüências sociais das doenças de longo prazo. Em 1999, recebeu o diagnóstico de esclerose múltipla e viveu com essa doença por cerca de 10 anos sem apresentar qualquer sintoma, entretanto, por medo da estigmatização resolveu manter a doença em segredo. O livro "THE END OF STIGMA? Changes in the Social Experience of Long-Term Illness" investiga a raiz da experiência de estigma, na sociedade contemporânea, examinando uma variedade de doenças de longo prazo tais como HIV/AIDS, dependência de substâncias e transtornos mentais.
No capítulo 1 o autor discute a fragmentação com a quebra das relações sociais e o aparecimento da identidade multifacetada, o que poderia trazer uma redução no estigma associado às condições de longo prazo. Segundo o autor, como a marca do mundo pós-moderno é a variedade infinita e ilimitada de liberdade cultural, nós deveríamos estar testemunhando o fim do estigma Este livro pergunta se essas mudanças estão realmente acontecendo e examina os desafios contemporâneos do estigma associado às condições de longo prazo seja na perspectiva organizacional, pessoal ou tecnológica, bem como a mudança nas relações entre doenças de longo prazo e estigma.
No capítulo 2 o autor começa a delinear o conceito de estigma. O autor utiliza a definição de Link e Phelan (2001) na qual a estigmatização é dependente do acesso social, econômico e político de poder, principalmente na identificação de diferenças, de construção de estereótipos, da separação de rótulos das pessoas, na distinção de categorias e assim ter a expressão da desaprovação, rejeição, exclusão e discriminação Além disso, o autor discorre sobre o conceito de auto-estigma em que pessoas incorporam e internalizam com freqüência o rigoroso padrão cultural na busca da perfeição na sociedade a qual fazem parte. Essa internalização pode produzir auto-ódio, vergonha, baixa auto-estima, evitação social e isolamento.
O foco do capítulo 3 incide sobre os desafios do estigma relacionado às doenças, e vem ilustrar como os fatores que contribuem para a produção do estigma estão mudando na sociedade contemporânea. O autor divide este capítulo em três partes. A primeira parte examina a natureza cada vez mais flexível do corpo à luz de uma cultura consumista e dos avanços tecnológicos. Retrata o processo de construção de uma identidade pós-moderna associada a uma "celebração da diferença", e analisa os avanços tecnológicos que permitem um molde, uma mudança do corpo em algo que reflete e projeta uma auto-identidade. Na segunda parte o autor aborda o desafio pessoal do estigma e registra a mudança de "perda do eu" e vitimização tradicionalmente associada às doenças de longo prazo, para uma construção pós-moderna de identidades empoderadas. A última parte deste capítulo analisa o impacto desses desafios e argumenta que eles transformaram a experiência de viver com uma doença de longo prazo, dando àqueles que estão doentes uma voz e maiores oportunidades para se envolverem com, e na, sociedade contemporânea.
No capítulo 4 o autor aborda o desafio tecnológico e sua relação com o HIV, especialmente os avanços das terapias farmacológicas que mudou o modo de se viver com HIV. Este capítulo aborda ainda o impacto da terapia antiretroviral que surgiu em 1996, para auxiliar o tratamento de pessoas soropositivas que viviam em países ricos. O autor discute em que medida o avanço do tratamento para pessoas com HIV diminui o estigma associado a essa condição, baseando-se em duas pesquisas realizadas, pelo autor, com populações com HIV.
O estigma do uso de drogas está relacionado à construção social do "dependente de drogas" como um indivíduo perigoso, descritos, geralmente como uma ameaça a ordem social. No capítulo 5, o autor descreve como o estereótipo do dependente de drogas possui uma conotação fortemente estigmatizante em função do uso de substâncias estar associado a incontáveis comportamentos desviantes e a grupo potencialmente estigmatizados.
O autor começa o capítulo 6 citando a obra de Hinshaw (2007) "The Mark of Shame", demonstrando como a doença mental é uma condição estigmatizada na sociedade contemporânea. Neste capítulo o autor examina atitudes em relação aos usuários dos serviços de saúde mental e a natureza do estigma associado à doença mental. Além disso, descrevem-se os desafios organizacionais, nos níveis locais, nacionais e internacionais, envolvendo tanto os usuários dos serviços de saúde mental como os provedores destes serviços. Sendo assim, o foco deste capítulo incide no impacto dos desafios organizacionais sobre o estigma associado à doença mental, examinando os a legislação, campanhas anti-estigma, protesto, educação e o contato têm sobre as atitudes em relação a doença mental e a experiência dos usuários dos serviços.
No último capítulo, a partir da discussão lançada nos capítulos anteriores, o autor busca compreender a validade teórica do conceito de estigma para doenças de longo prazo e ainda busca enumerar os três desafios relacionados ao fim do estigma - tecnológico, pessoal e organizacional. Para isso, o conceito do estigma será discutido bem como as críticas envolvendo sua formulação, serão mostrados os resultados de pesquisa sobre Esclerose Múltipla. Por fim, é apresentada uma conclusão sobre a pergunta que confere nome ao livro.
A literatura aponta a necessidade de operacionalização dos conceitos, considerando o estigma como um processo complexo. Os estudos sobre estigma encontram dificuldade de mensuração de atitudes e preconceitos implícitos, devido à tendência a dar respostas socialmente aceitáveis e, além disso, existe uma desconexão entre estudos de atitudes e os de indicadores de comportamento. Considerando que o tema em questão é indispensável para o planejamento das políticas públicas e estratégias de redução de estigma, torna-se de grande importância o trabalho de Green, o qual contribui para a ampliação da discussão sobre o processo de estigmatização e suas implicações nos indivíduos estigmatizados, entretanto ainda é necessário maior investimento nas pesquisas para a produção do conhecimento na área.
Referências
Green, G. (2009). The end of stigma? Changes in the Social Experience of Long-Term Illness. New York. Taylor & Francis e-Library. [ Links ]
Dovidio, J. F., Major, B., & Crocker, J. (2003). Stigma: Introduction and Overview. In T. F. Heatherton, R. E. Kleck, M. R. Hebl & J. G. Hull (Eds.), The Social Psychology of Stigma (pp. 1-28). New York: The Guilford Press. [ Links ]
Hinshaw, S. P. (2007). What is Mental Disorder and What is Stigma? In S. P. Hinshaw (Ed.), The Mark of shame (pp. 3-27). New York: Oxford University Press. [ Links ]
Link, B. G., & Phelan, J. C. (2001). Conceptualizing Stigma. Annual Rev. Sociol, 27, 363 - 385. [ Links ]