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Revista Polis e Psique

On-line version ISSN 2238-152X

Rev. Polis Psique vol.11 no.spe Porto Alegre  2021

 

ENTREVISTA

 

Para Deter Gargantua: uma exploração sobre a potência da crítica decolonial

 

Stopping Gargantua: an exploration of the strength of decolonial criticism

 

Para Detener Gargantua: un planteamento de la potencia de la crítica decolonial

 

 

Josemar de Campos Maciel

Universidade Católica Dom Bosco (UCDB), Campo Grosso, MS, Brasil

 

 


RESUMO

Neste texto propomos uma análise de alguns fatores que produziram o ideário do desenvolvimento. Apresentamo-lo como fruto de uma aceleração que produziu o esforço de esquecimento e silenciamento de forças históricas ancestrais. No momento que esse movimento entrou em crise, é necessário redescobrir e lançar mão criativamente dessas forças, para integrar uma visão sustentável e integrada da vida humana, mas sobretudo do que seja "crítica". A metodologia do trabalho combina o ensaio histórico e a filosofia. O resultado esperado é a divulgação de um pensamento crítico sobre o desenvolvimento que toma distância do eurocentrismo, favorecendo uma visão localizada, a partir do Grande Sul e da Grande América.

Palavras-chave: Crítica do desenvolvimento; Silenciamento; Resistência; Hospitalidade.


ABSTRACT

In this text we propose an analysis of some factors that produced the ideal of development. We present it as the result of an acceleration that produced the effort of forgetting and silencing ancestral historical dynamisms. At the present crisis of this movement, it is necessary to rediscover and use these forces, to integrate a sustainable and integrated vision of human life, focusing upon the idea of "criticism". The methodology of the work combines historical essay and philosophical reflection. The expected result is the dissemination of critical thinking on development that takes distance from Eurocentrism, favoring a localized view, from the Great South and the Great America.

Key words: Criticism of development; Silencing; Resistance; Hospitality.


RESÚMEN

En este texto, proponemos un análisis de algunos factores que producieron la narrativa maestra del desarrollo. Lo presentamos como resultado de una aceleración que produce un esfuerzo por crear y silenciar fuerzas históricas ancestrales. En plena crisis de este movimiento, es necesario redescubrir y relanzar estas fuerzas, para integrar una nueva visión sustentable e integrada de la vida humana, haciendo hincapié en la idea de "critica". La metodología de trabajo combina una prueba histórica y la filosofía. El resultado esperado es la difusión del pensamiento crítico del desarrollo que se aleja del eurocentrismo, privilegiando una mirada localizada, del Gran Sur y la Gran América.

Palabras clave: Crítica al desarrollo; Silenciamiento; Resistencia; Hospitalidad.


 

 

Introdução

Neste texto oferecemos uma reflexão a meio caminho entre uma genealogia da situação atual de confinamento, e uma tentativa de superá-la, a partir da construção de pontes para uma perspectiva histórico-filosófica. O confinamento que hoje associamos à pandemia causada pelo vírus da Covid-19, possui raízes em outro confinamento, em esquemas mentais artificiais que recobrem a realidade da alteridade e da ancestralidade com um manto de silêncio e de violência. Começamos nos referindo a uma figura renascentista, para ficar na Europa e sair dela.

O crítico Erich Auerbach comenta um texto de Rabelais, em que várias coisas entram pela boca do gigante Pantagruel. Até um exército inteiro, para atacá-lo. Sobreviveram apenas três soldados à inundação - era um copo d'água -, refugiando-se numa cárie. Na época em que se descobria o chamado Novo mundo, observa ele (Auerbach, 2003, p. 262-284), a alegoria da boca que tudo devora é oportuna e problemática. Auerbach antecipava situações como a atual, em que uma pandemia nos obriga a tentar entender os contornos dessa "boca" para detê-la.

Uma importante narrativa crítica acerca do Desenvolvimento é a do esquecimento da alteridade, após o sequestro privado do bem comum e o seu alinhamento pragmático (Shiva, 2016; Bercher & Costello, 1998). Tal sequestro subverte e intensifica a potência, acelerando a redução da biodiversidade, dando azo a novas crises climáticas e doenças de toda sorte. Essa narrativa recrudesce até o surgimento do "Sapiens" que, bem antes da indústria ou das locomotivas, produziu o impacto que está elevando as temperaturas no Planeta (Brooke, 2014). A aceleração existe. Mas ela se deve ao "Sapiens", antes do "homo economicus" - que a agrava (Harari, 2015; Hamilton, Bonneuil & Gemenne, 2015; Bonneuil, 2016).

Neste texto pretendemos apresentar algumas linhas de uma matriz crítica que se reserva o direito de não repetir o eurocentrismo. É um exercício de hospitalidade diante da insurgência do pensamento decolonial e da emergência de diversas fontes ancestrais, cedo demais excluídas na marcha do desenvolvimento. De saída, entendemos esta ancestralidade a partir da ideia de espaços, experiências e pensamentos anteriores ou paralelos, não-alinhados com a técnica e com o desenvolvimento, nem separados do seu ambiente nutriz. Modos de pensar a vida, a humanidade, a saúde e o desenvolvimento que pode ser considerados como uma saída para a atual crise da boca de Gargantua.

 

O real é maior que o racional

Nosso ponto de partida é a tese historiográfica subjacente ao trabalho de pensadores de talhe de/poscolonial, como Enrique Dussel (1994), Arturo Escobar (1994), Samir Amin (2004, 2009, 2011, 2011b) ou Rajani Kanth (2005, 2017). Esses autores constroem sua análise da modernidade a partir do sul global, centrando o foco na crítica ao ideário do desenvolvimento. Nessa escola, o discurso do desenvolvimento aparece como a construção de uma narrativa que oculta personagens estratégicas que poderiam perturbá-la, por sua posição de desafio em relação às agendas impostas ao longo da consolidação dos estados nacionais dependentes de suas metrópoles, marcados com o traço da subalternidade, da escravidão e da espoliação de seus ambientes e diversidades. O discurso é articulado e proposto com o fito de legitimar impactos sociais, ambientais e políticos. Isso se pode documentar na América Latina, na reflexão filosófica subjacente à histórica e econômica. Para o filósofo e historiador Enrique Dussel (1994), a leitura clássica que se deve fazer do surgimento desta unidade geopolítica, mas não cultural, chamada "América(s)" traz o signo de um encobrimento, e não de uma descoberta. Os espanhóis teriam sido os primeiros a colocar em movimento a tentativa de impor uma visão de mundo, conhecimento e sistemas de vida, fazendo terra arrasada do que existia antes deles. Nisso foram seguidos por outros países europeus. O movimento apanhou todos os continentes. Do ponto de vista europeu, ele se chama modernidade, seguida à expansão ultramarina. Do ponto de vista dos que foram ficando, terá outros nomes. Se a modernidade é um movimento de aceleração, o combustível para esse movimento advém de países que são predados e forçosamente desacelerados. A metrópole construirá a indústria; os países satélites, com a industriosidade de seus braços e com os seus campos, fornecerão alimento, combustível e metais para sustentar esse movimento. Um pouco antes dos trabalhos de Dussel, a teoria da dependência nascida ao redor de Raúl Prebisch cravava essa leitura, não menos clássica (Prebisch, 1986).

No mundo afro-asiático e árabe, o caso de Samir Amin é fundamental. Normalmente, as escolas europeias associam a ideia de crítica aos mananciais kantiano ou marxista. Amin, egípcio, empreende uma revisão historiográfica das narrativas de progresso, vistas a partir dos países que não lideraram os surtos empreendedores. Em sua obra-prima original de 1989 (Amin, 2009), desenvolve a ideia de que a crítica forte do capitalismo, como estendendo-se na forma de um sistema mundializado, havia permanecido incompleta na obra de Marx, e precisa ser continuada, estendida ao sistema-mundo. Amin solapa a base da narrativa do desenvolvimento e do eurocentrismo, como sendo a euforização, ou seja, a tentativa sistemática de normalizar um sistema, uma forma de ser no mundo entre tantas, generalizando-a e impondo-a, desde uma dinâmica militar, comercial, ou mesmo sanitária, que cria uma padronização dos sistemas de vida (urbanização), produção e consumo (mídia e indústria monopolista) e conhecimento (Universidades e sistemas de competição). Algo que pensadores europeus como Michel Foucault e Giorgio Agamben chamarão de "biopolítica", para os que estão fora do centro e distantes de Paris, será a "necropolítica": a arte e o ofício de produzir a morte, impulsionadas por um sólido desejo de apartheid (Mbembe, 2019).

Desde a época das expansões ultramarinas que a história do Ocidente vem sendo contada como uma expansão da Europa para "arredondar" o mundo e diminuir distâncias e tempos. Outros povos e culturas foram sendo ressituados ou devorados por um canibalismo genocida, sofisticado e agressivo, posto que simbólico, a partir de um universo epistêmico que os reduziu à condição de periferia (Forbes, 2008). Entrementes, no seio desse processo, foi se impondo um movimento de aceleração do impacto das descobertas tecnológicas sobre a capacidade de absorção do planeta, em termos geológicos, vegetais, animais (não-humanos e humanos), energéticos, climáticos.

Noutros termos, os anos das expansões e tecnologias são o do início de uma aceleração forte. O aceleracionismo (Rosa, 2013; Dörre, Lessenich & Rosa, 2015) quebrou ou excluiu, total ou parcialmente povos, concepções e alternativas importantes que urge reouvir, reaver, retomar, respeitar, recompor, ou qualquer outra coisa que não seja produzir mais esquecimento.

Essa é a tese central deste trabalho. Para fundar um pensamento crítico de escala significativa, além do foco em Universidades de centros metropolitanos, é urgente desenvolver uma atitude de hospitalidade para recuperar perspectivas de pensamento que podem apontar saídas para o nosso mundo, que tornou-se técnico demais, por um lado, mas grotesco demais, por outro. O seu lado grotesco, pantagruélico, aparece em suas contradições, como as apontadas por Kanth (2005) e Amin (2009; 2011). O mundo dito civilizado é atravessado pelo conflito dos interesses que tenta silenciar. Manipulando o ambiente entendido como um repositório de recursos, e reduzindo a ideia de valor à mera representação quantitativa da acumulação, teóricos e praticantes da forja da civilização relacionam bem o desenvolvimento, a técnica e as ciências formais e naturais. Mas não têm ouvidos para as humanidades. Com isso, gera-se um efeito de rebote: Não se refletindo sobre as humanidades, elas estão fora de indicadores e cálculos. Ora, entre os campos das humanidades contam-se a história, a retórica, os estudos dos prazeres e dos desejos. Sem sua profundidade, o que restará será o consumo sem sentido e a sobrevivência como vida nua. Caímos no dilema de Kant: a razão sem a experiência é vazia; a experiência sem a razão é cega. Silveira (2002) explica que a concentração na pura "ratio", para o Mestre, é vazia. Ela pode ser útil, para esconder o que lhe subjaz, o puro planejamento por motivos ideológicos.

A nossa era é a da crise de interesses. E preconiza um desfile estranho: estudos sobre indústrias financiados por indústrias; sobre agricultura financiados por empresas agrícolas; sobre a Guerra financiados por indústrias de armamentos; sobre doenças financiados por laboratórios bioquímicos. Estudos sobre cidadania financiados por partidos ou seus "think tanks". E até mesmo um prêmio Nobel falso, criado para fortalecer uma opção de teoria econômica, como documentado por Avner Offer e Gabriel Söderberg (2016). Eles elaboram a equação entre economia, democracia e bem-estar social, e o redirecionamento neoliberal da década de 1970. Territorialidades subalternizadas, como a América Latina, absorveriam a nova agenda, a partir do "outro" onze de Setembro, em que Salvador Allende foi assassinado.

Contra a extinção da diversidade, resta apenas o cultivo do pluralismo. No mundo da atividade de pensamento, isso significa recuperar a potência da experiência humana básica da conversação - a troca de impressões e relações a partir de diversos pontos de vista, visando construções comuns. Daqui, projeta-se uma imagem comunitária de ciência, elaborando critérios próprios buscando bens coletivos. Quem sabe, temos a que ver com as discussões sobre consumo interiormente aos estudos econômicos - desde 1776, data da primeira publicação da Riqueza das Nações de Adam Smith (Mitchell, 2014). E somos interessados num bem específico, a participação para contribuir na construção da agenda e do ideal de bem estar, vida comum, ou de Desenvolvimento. Na verdade, o desenvolvimento é o campo de prova em que aparece de forma mais aguda a relação entre o conhecimento e o interesse na história do Ocidente (Habermas, 1972). Ele se baseia em ideias filosóficas, implementa-se a partir de retóricas e convencimento de participantes, acontece no espraiamento de técnicas avançadas de propaganda e, no entanto, "embasa-se" numa disforização, ou desqualificação sistemática do sujeito, concentrada na terceirização do eu investigativo que, paradoxalmente, narra uma história de salvação, como nos discursos fundadores de um "presente" (Gumbrecht, 2014). Não por acaso Gilbert Rist (2007, 2001, 2014) introduz a ideia de "Buzzword", ruído como o de caixas de abelhas, para referir-se ao desenvolvimento. A expressão refere-se tanto à ideia de moda, caracterizada pela euforia do uso a todo custo, mas também à ideia de desgaste, atravessada pela experiência do efêmero (Lipovetski, 1987), ou do líquido - quando tudo o que é sólido desmancha no ar (Berman, 1982). Esta liquidez talvez seja uma paródia das finanças, enquanto a moda, da modernidade.

Para mudar esse estado de coisas, foram necessários movimentos diversos, mas complementares. Por um lado, surgiram insurreições e ondas de ação e de discussão pós-colonial (Fanon, 1961; Amin, 2011), que deram início a diversos movimentos intelectuais esforçando-se por rediscutir a historicidade no seio das ontologias pretensamente generalizadas, como acenamos mais acima. Por outro lado, interessa ainda ressaltar a força do estancamento dos sistemas do mundo durante a pandemia da Covid 19. Todos os sistemas mostraram sua vulnerabilidade, mas sobretudo a máquina do crescimento teve que ser detida, para se revisar a possibilidade de continuar a existir a espécie humana sobre a terra. Ailton Krenak (2020, p. 4-5) observa que o confinamento dos povos indígenas do Brasil antecipou-se ao confinamento que hoje afeta praticamente todo o mundo, e isso traz uma séria questão ao primeiro plano: a dualidade sujeito-objeto não se sustenta. A predação do ambiente para o uso e abuso de seus recursos não se sustenta. A crise climática e, agora, global, que ameaça todos os sistemas de vida humana, força a introduzir a questão, as práticas e a teoria decolonial no centro da agenda. Nas palavras de Krenak, para salvar o ambiente seria necessário parar com a atividade humana, e reavaliar todo o sistema. Ele observa que os empreendedores que representavam uma grande companhia lhe disseram que isso não era possível, e que o mundo não poderia parar, o movimento do progresso não poderia parar. "mas parou", de fato (2020, p. 5). Como as revoluções e as convulsões sociais, desta vez um vírus obriga a uma retomada de raízes profundas - a grande categoria da ancestralidade - que agora voltam a aparecer, pelo movimento da dor e da perda.

 

Poesia e crítica

Se até agora aproximamos muito a ideia de crítica decolonial à ancestralidade, aproximamo-nos também da categoria da liminaridade. Ou seja, metodologicamente ancoramo-nos na poesia. Isso se deve a dois motivos. O primeiro é a recusa a entregar a engenharia da vida e o desenvolvimento a especialistas em monólogos de técnica. O desenvolvimento não pode ser pensado a partir de conhecimentos isolados de sistemas, pois isso perpetua o sequestro do assunto, desta vez na forma linguística (Chang & Grabel 2014). Existem grandes grupos em risco, com seus interesses, quando são implicadas alterações em diversos sistemas sociais, ambientais e culturais. Alterações não podem ser propostas de forma unilateral, sem que especialistas conheçam algo da vida de povos doentes, tradicionais e ligados a culturas orais. Mas isso implica numa escuta que nem sempre os especialistas, já pagos pelos empreendedores, estão dispostos a realizar. É sua obrigação, e a supomos, pelo menos aqui.

O segundo motivo de lançarmos mão da poesia advém de uma matriz interpretativa importante, que vê a linguagem como a casa do Ser e moldura da ação (Austin, 1962). O que se manifesta, manifesta-se na linguagem, e a predicação pode ser um ato de violência, se esta relação é ignorada, entre o falar e o fazer. As essências dos projetos não acontecem no plano objetivo, mas se dão a mentes, acontecem no dinamismo vulnerável das sinapses - aspectos neurofilosóficos aqui, para nos entendermos (Chalmers, 1996).

A poesia, que extrapola as objetividades, e mostra em transcendências de várias qualidades, aparece como uma interlocutora importante para se ver a realidade aliada à imaginação. Para Derrida a poesia aparece como espaço no qual se manifesta a capacidade libertadora da imaginação, que torna o ser humano capaz de transpor para um produto, o papel, de forma mais ou menos material, diversos cenários de possibilidade que vão na sua mente (Derrida, 1981). Appiah (2017) aponta a imaginação como o grande negado da história das civilizações e das ciências. Tudo aconteceu, na terminologia de Veihinger, que ele analisa, "como se". A partir de projeções da mente, que precede cálculos e projetos de fato. À diferença do fazer tecnocientífico, porém, o fazer filosófico que defendemos não esquece, nem nega, nem tergiversa sobre o seu lado imaginativo. Esse cenário, de fato, transformou-se em paisagem apropriada ao longo da história do Ocidente e de suas viagens de construção das sucessivas "mímeseis" (Auerbach, 2003). Ocorre que o Desenvolvimento, como uma das mais recentes vocalizações da mudança, ou da história da técnica, produto refinado da espécie humana, tem sido um empreendimento desequilibrado, injusto e predatório, prejudicial ao planeta e autodestrutivo para a espécie humana. Ao mesmo tempo que os empreendimentos e a tecnologia constituem boa parte da real história da espécie, e possuem força para resolver problemas estruturais da própria matéria a partir da qual decolam. Aqui se manifesta um paradoxo. O desenvolvimento é, ao mesmo tempo, magnífico e monstruoso. Dependendo do ponto de vista, ou dos indexadores dos sistemas de valor, o público avaliador do Desenvolvimento fica mais sensível a alguns aspectos, e menos a outros. Daí que a partir do mercantilismo, por exemplo, a acumulação de bens e o assim denominado crescimento econômico, serão vistos como positivos (Douthwaite, 1992, 2015) e os lugares de ostentação, como conformes a um ideal, a civilização. Outras áreas, nuas ou menos ornadas, serão consideradas desconformes.

Do outro lado, depois de uma forte crítica à ideia de base do crescimento entendido como desenvolvimento, que é a linearidade e cumulatividade dos progressos na história, formas de ser e de fazer aparecem sem medo de afirmar que outros modos de pensar o desenvolvimento são possíveis, mesmo - talvez sobretudo - redesenhando a ideia de mercado, de indústria, consumo, de vida e mesmo de humanidade (Garcia, Martinez-Iglesias & Kirby, 2017). De toda forma, permanece o paradoxo. A espécie humana vê uma divisão importante entre intérpretes da sua marcha sobre o planeta. Uma parte quer acelerar a máquina do crescimento, calculando a minimização dos impactos (Rosa, 2013; Mackay & Avanessian, 2014). Outra parte quer desacelerar para reavaliar pontos que não estão muito claros - entre eles, as ideias de base, o conceito e os atores do Desenvolvimento (Latouche, 2004, 2007; Latouche & Petrella, 2015). Ou seja, praticamente tudo.

Neste trabalho assumimos a posição dos segundos, mas sem intenção polêmica. De fato, se é possível uma crítica ao conceito hegemônico de desenvolvimento, não é por não sentir sua importância, mas para conter a voracidade das mãos que o sequestraram, e que podem quebrar suas joias: o ambiente, como um todo, e a própria espécie humana. Se o paradoxo enunciado é difícil, sua ilustração é atravessada pelo engasgo. Oferecemos uma tradução poética, num poema de Edmond Jabès, falando por duas personagens, um guardião da casa e um tal Yukel:

- Onde se encontra este livro?

- No livro.

- Quem és?

- O guardião da casa.

- De onde vens?

- Tenho errado.

- Yukel é teu amigo?

- Assemelho-me a Yukel.

- Qual o teu destino?

- Abrir o livro.

- Estás no livro?

- Meu lugar é na soleira.

- Que tentaste aprender?

- Detenho-me às vezes sobre o caminho das fontes e interrogo os signos, o universo dos meus ancestrais.

- Escrutas as palavras reencontradas.

- As noites e as manhãs, as sílabas que me pertencem, é.

- Andas esgotado.

- É. Caminho há dois mil anos (Jabès, 2015, p. 13. Tradução nossa).

Esse lugar intelectual origina e alimenta a pergunta pela imaginação de outros mundos e outros desenvolvimentos possíveis. Nasce da intuição de base de uma teoria crítica do Desenvolvimento que o caracteriza como tendo sido e permanecer sendo uma ultrapassagem de portas que não estavam bem prontas, ultrapassagem esta que fez irromper fissuras, gerando feridas históricas. Mas o panorama que se descortinara, após a invasão, era lindo demais para esquecer. Então, jogou-se sobre as fissuras abertas um manto de invisibilidade, e continuou-se o caminho. Abrindo fissuras ulteriores e aumentando as primeiras, que se aprofundam. Alguns dos viajantes, pioneiros, desbravadores, percebem que o chão está sumindo dos pés, mas guardam silêncio enquanto ainda há financiamentos para as viagens. Mas está claro que as viagens "pioneiras" são movimentos de prospecção para invasões, guerras e, às vezes, comércio (Hansen & Curtis, 2010).

Neste ponto propomos a posição da soleira, como na poesia de Jabès. Nem dentro, comprando sem questionar os produtos gerados pela irrupção porta adentro; nem fora, negando a visão da própria porta e suas possibilidades. A soleira é a posição que nos permite deitar o olhar para dentro da casa e ouvir seus movimentos, guardando-nos em parte fora dela. É posição prudente e vulnerável de hóspedes em diáspora, posição que hoje quase todas as minorias reivindicam para si, de alguma forma. Prova disso é a brilhante assimilação da categoria do estrangeiro para descrever a vida intelectual no clássico de Said (1979), a caracterização ontologico-social do pensador como alguém que habita um entrelugar, no clássico de Bhabha (1994). Ainda, como os resistentes ao anjo Abadon, que incomoda mas traz a mensagem do novo tempo da África (Ngoenha, 2017). Na soleira da vida, do comportamento, do pensamento e do estilo. O lugar aqui é o da liminaridade, da margem das especializações, a partir do qual se reflete sobre os fenômenos, curtindo-os antes de catalogá-los e explorando suas virtualidades. Não por que não apreciemos catálogos, mas porque os catálogos são a parte mais pesada da casa já ameaçada demais por fissuras.

 

Pensamento crítico

Há estudiosos que tentam superar os reducionismos do desenvolvimento a partir de diversos aspectos e direções. A área do desenvolvimento, em geral, é tributária de uma aproximação entre a economia e as finanças, que gerou diversas críticas, nas quais aparece a liminaridade e o espírito de recuperação de matrizes, a que nos referíamos acima. Como é o caso de Nicolau Georgescu-Roegen, Karl Polanyi, Raúl Prebisch e outros. Num breve sobrevôo pela economia, no mesmo primeiro quartel do século XX, encontramos carreiras fortes que não aceitam a ideia de valor como a que foi imposta, na forma da aglutinação da experiência na sua indexação financeira, e também em sentido diverso da economia, transformando-a em uma luta pela gestão da ganância. Assim, temos Georgescu-Roegen, com sua demolição do axioma do crescimento infinito (1995); Bataille, com a proposição da importância do desperdício e do seu paradoxo, para entendermos qualquer noção de economia (2013); Mauss, que está na posição de fundador de alguma coisa entre a sociologia e a antropologia, e que retoma com Malinowski a função da reciprocidade e do dom para a estruturação de relações de troca e de construção de significados (Mauss, 2002; Masclef, 2018). É preciso mais que uma vida para refazer a economia a partir de pressupostos não ortodoxos, mesmo deixando de lado, por falta de tempo, as vertentes mais aguerridas do marxismo. E notemos ainda que a simples voz "ortodoxia" já pinta de arte e religião o que queria ser comprado como se fosse apenas cálculo.

Uma referência fundamental para estudar a crítica ao reducionismo no Ocidente é o problema da abstração, na gênese da última Modernidade, no embate entre desenvolvimento e mercado, posto a lume por Karl Polanyi (2001) na obra "A Grande Transformação". Nesse texto, Polanyi enuncia uma crítica importante ao modelo que pouco depois da publicação original do livro (1944) seria consolidado como um estilo de vida, a partir do discurso de posse de Harry Truman, com a imposição do Plano Marshall a todo o Ocidente. O que seria um sonho para um país, seria um pesadelo para os outros (Vogelgesang, 1980; Buruma & Margalit, 2005), uma paródia do bem viver.

Segundo Polanyi, a alma das revoluções tecnológicas que tomaram o mundo de assalto desde as grandes navegações, consolidada com as revoluções do transporte, da indústria e da urbanização, nos primeiros anos do século XX, é a criação de uma nova ortodoxia. O "Mercado", não será mais um espaço de troca, mas a forma histórica mais importante através da qual a sociedade e o mundo representacional humano gravitariam - um espaço de essencial abstração, preficicação.

Polanyi segue uma tendência importante na história do surgimento da sociologia econômica, que tenta entender a economia a partir das mudanças nos sistemas de vida, criando cidades imensas e alterando de modo substancial os tempos e espaços de famílias, trabalhadores, relações raciais e assim por diante. Ele aproxima-se de autores que entendem o mercado como novo articulador dos sistemas de vida social ou coletiva, avaliando-o de modo crítico. Neste caso, aproxima-se de Tönnies (2001), que aproxima o mercado da noção de burocracia, a "Geselschaft", a sociedade dos pactos, carimbos e contratos. Daí a ideia da Grande Transformação: para Polanyi, a partir do momento em que a automatização chegou ao coração da fábrica, tendo sido estabelecida como um sistema viável, ela foi capaz, de transformar o mundo circunstante à sua imagem. Imagens de blocos de modelos produtivos indexados a partir de uma centralidade de relação de troca entre trabalho, capital e um horizonte expansivo de precificação. A transformação de tudo em mercado é a mudança quantitativa do horizonte da experiência humana (Polanyi, 2001, p. 40 - 45). Ali começou, de fato, o confinamento. Aparentemente, Polanyi sintetiza aqui a ideia de alienação e a de fetiche. Outros pensadores de orientações diferentes retomarão este motivo. Por exemplo, Pieper (2009), Hamilton e Deniss (2005). No final das contas, estamos diante da antecipação, décadas antes do ano do grande confinamento, da percepção da redução do horizonte da experiência humana a uma experiência de claustrofobia, a quantidade. E de fato, a quantidade não é suficiente para mobilizar a responsabilidade dos agentes públicos. Nem a prática de cuidado para as populações. A atualidade do texto é posta a lume pelo estudo de Ayse Bugra e Kaan Agartan (Bugra & Agartan, 2007), em uma coleção de ensaios. A ideia central ali é um inchaço na forma de se postular as questões ligadas à gestão de grande escala (que vimos como uma imposição de modelos) e ao desenvolvimento. Esta forma de "mercado" é uma criação do século XIX, para Polanyi. Ao menos em sua forma atual, lidando com a vida humana e parahumana a partir de uma precificação, sendo trabalhada fundamentalmente como objeto de troca (Cf. também Mendell & Salee, 1991). Neste ponto, observa Polanyi, nenhum economista sai ileso. Nem Marx, com suas tentativas de criticar e sobrepujar o sistema, conseguiu ver que a mercantilização, gentrificação, commodificação e a precificação (variantes da mesma ideia em posições diferentes de mercado) criaria o monstro que criou, e que devora a chance de outros interlocutores do desenvolvimento se manifestarem. O monstro precisa deles bem cordiais e bem domados, silentes, para se poder alimentar. Não se veem outras formas de existir que não sejam com uma etiqueta apensa, referida como sendo um valor. Uma forma de valor que interessa aos agentes que o põem em circulação, entendamo-nos.

Com o tempo, o mercado, que primeiro devorou o mundo do trabalho, devorou os corpos, a política, e as formas de vida - vegetais, minerais e animais não humanos, precificados, passam a ser considerados como recursos. Certo, a vida humana e as diversas formas de vida do planeta já possuíam um preço, um indexador objetivo, desde a crise do feudalismo, como bem mostra o Michel Foucault de "As Palavras e as coisas" (1966), mencionando a indexação como marca que atravessa a gênese da ciência moderna. Mas, principalmente com as novas economias do pós-guerra de 1914-1918, os interesses comerciais e geopolíticos ganharão a máscara cada vez mais forte da objetividade. E o mais interessante de toda objetividade é que existe um sujeito que a cria, mensura e manipula (Bugra & Agartan, 2007). Resumamos este esquema em suas partes essenciais.

No primeiro movimento, cria-se um acordo acerca da hierarquia de trocas. O mercado nasce ao redor de conceitos econômicos como acumulação e valor financeiro. No segundo movimento, os objetos da experiência recebem valores que lhes são atribuídos pelos agentes do mercado. Esse movimento não cessa, a menos que haja resistência dos atores, para que os valores de acima sejam postos em questão. Por exemplo: não é possível haver outros valores, além da acumulação? Há sistemas de economia cujo valor não é a acumulação, mas o dispêndio, aliado à circulação não de liquidez financeira, mas de prestígio. Aqui poder-se-ia encontrar um ponto de variação importante da perspectiva. São sistemas que dispõem de estudos consolidados (Bataille, 2013; Sahlins, 1974).

Além de Polanyi, Nicholas Georgescu-Roegen materializa outro esforço teórico importante (1995). Roegen elaborou uma série de observações críticas que lhe permitiram acusar o movimento do desenvolvimento de anacronismo, por igualar os objetos da experiência a partir da geração de produto bruto. Basicamente, acusa o pensamento econômico ocidental, que foi abandonando aos poucos a história desde James, de não levar em conta a revolução promovida ao redor da biologia do século XIX, com a descoberta da evolução e, consequentemente, da lei da entropia (Carpintero, 2006). Ele afirma que os sistemas que evoluem, não o fazem de forma indefinida e eterna, mas são limitados pela sua inserção ecológica. É possível partir deste ponto para recuperar a intuição de Roegen para a discussão ambiental e para a superação de um antropocentrismo consumista. Para ele, a modelização mecanicista do mundo não é realista, não dá conta da interação entre os sistemas ecológicos nem de suas tensões e limitações recíprocas - nem, muito menos, da sua morte. O desenvolvimento como tarefa mecanicista - mesmo na fantasia jamais demonstrada da autorregulação - não consegue imaginar qualquer solução para além do crescimento, que indefectivelmente produz a exaustão do sistema como um todo (Georgescu-Roegen, 1995). Não se trata, segundo ele, apenas de pensar um crescimento mitigado ou racionalizado. É importante a proposição de algo além, do decrescimento, ou seja, da busca de uma outra abundância e florescimento, através de uma revisão de valores que inspiram os esforços e iniciativas ligadas ao progresso e ao desenvolvimento. No coração do valor deve estar não a quantidade de troca, mas o conforto. Antecipamo-nos aqui à ideia de bem viver. Mas Roegen não foi muito influente na economia. Seu impacto foi mais importante entre pensadores ligados a questões ecológicas e ambientais, na sua disciplina. Mesmo assim, até hoje sua ideia central rege: o econômico e os sistemas de vida são indissociáveis. É preciso um trabalho de reconstrução de base de todo o universo metafórico que sustenta o modelo do que signifique o "econômico". Não um complexo mecanismo em marcha eterna, como queriam os primeiros economistas, fascinados com as máquinas a vapor. Muito mais, a metáfora reguladora deve referir-se ao sistema vivo composto por sistemas de interatividades vulneráveis uns aos outros e sensíveis a estímulos e sugestões de toda sorte (Cecchin & Veiga, 2010).

Aqui chegamos ao nó da noção de consumo, em oposição à de fruição. Bem diferente de uma máquina em aceleração, a economia pode ser repensada como um sistema de criação e adaptação de confortos - ou abundâncias frugais (Latouche, 2007; Latouche, 2004). Há uma importante sucessão de camadas de narrativas, que escondem os problemas das marchas civilizadoras às quais o Ocidente veio denominando como desenvolvimento, recoberto com adjetivos normalizadores, por grandes atores macroterritoriais a quem interessa a exploração do ambiente como "natureza" e do tempo e suas representações como mão de obra. Esse recorte entre a filosofia e a economia pode contribuir também para se elaborar novas bases de pensamento (D'Alisa, Demaria & Kallis, 2015).

As matrizes de crítica de Karl Polanyi e Nicolas Georgescu-Roegen servem para ilustrar a presença, na crítica ao desenvolvimento, de um trabalho a fazer no campo dos pressupostos. Ambas as críticas direcionam a perspectiva de renovação das discussões para uma revisão de um ritmo que parece inexorável, mas não é. Ou ainda, que parece o resultado de puro cálculo quando é uma seletiva criação do espírito humano. Mendell e Salee (1991) apontavam, por exemplo, para a importância de se usar as reflexões de Polanyi como uma espécie de prevenção contra o fundamentalismo de mercado e o perigo de sequestro da democracia por interesses individuais potenciados pelos recursos - o que acaba acontecendo de fato. Mayumi (2001), por sua vez, aponta para um espectro de possibilidades pós-humanistas que se erguem a partir de trabalhos seminais, como os acima reportados. Duas perspectivas que florescem, e possuem boas intersecções com autores descoloniais, são o decrescimento, que favoreceria o privilégio aos motivos que levam o ser humano a buscar o movimento na sua experiência da temporalidade, e a bioeconomia, que prefere retomar o esforço de comunhão com as bases biológicas da existência humana.

 

Crítica, alteridade, ancestralidade

As críticas radicais ao desenvolvimento examinadas até agora provêm de vários lados, mas manifestam um traço comum. São tentativas de reposicionar os termos da discussão, e mesmo os discursos. Mas é possível elaborar um pensamento crítico, em relação ao mundo contemporâneo, indo mais abaixo ou além de fontes europeias. De fato, mesmo Polanyi, Georgescu-Roegen, Jabès, Bataille e Mauss, brevemente visitados, são todos periféricos, e possuem uma parte de sua inspiração na liminaridade a que nos referimos. Mas convém ainda oferecer algumas noções do desmonte do mito da aceleração. O mundo atual, confinado, é apresentado pela retórica oficial como mundo 5g, das ultraconexões. Sassen e Drainville (2003) e Sassen (2014) enunciam que as exclusões são a norma nos esforços de desenvolvimento capitaneados por esse modelo globalizado e superabstrato, e que se vende como ultraconectado. Quanto mais complexas as conexões, maior a centralização de iniciativa, paradoxalmente, pois maximiza o movimento de lucro. A crítica de Sassen ao processo de desenvolvimento o vê como a construção de fronteiras rigorosas, armadas e excludentes. A contribuição de Hartmut Rosa também vai ao ponto: ele afirma que a aceleração é o ganho de escala mais notável do centro comum que inicia a marcha moderna do desenvolvimento, a saber, a alienação, ou ao menos a temática da alienação, enunciada pelo jovem Marx (Dörre, Lessenich & Rosa, 2015).

De fato, existe mesmo uma caracterização do "aceleracionismo" como se fosse uma corrente de pensamento, com autoridades e dogmas, que podem ser desmascaradas (Mackay & Avanessian, 2014). O último passo da aceleração seria o capitalismo de plataforma (Google, Microsoft, Apple e Facebook), em que o mundo acabaria governado por abstrações, ou veria um enfrentamento sincero da situação de monopólio, como quer Nick Srnicek (2016). O ponto central de toda a crítica dessa escola, formulado por Rosa (2013), é a junção entre a imposição de uma gama de pressupostos e práticas de centralização de ações, num planeta ultraconectado, dotado de muitas chances de aplicar o que é decidido nos grandes centros de comando. No centro há uma máquina de criação da opinião, com o uso dos meios de comunicação pela máquina de aceleração do crescimento. Daí que surgem robôs - algoritmos replicadores de opiniões - para pautar o exercício da política, reduzindo o voto democrático à legitimação de decisões já tomadas (Haddad, 2013; Amin, 2009).

Mas essa forma abstrata de pautar a vida já foi enunciada por outro intelectual que se construiu à margem da Europa. Gilbert Rist, em um clássico que vem sendo reeditado há vinte anos, conceitua assim o desenvolvimento:

Nosso ponto de partida será a seguinte definição: o 'Desenvolvimento' consiste numa série de práticas, algumas vezes aparentemente em conflito entre si, que exigem, para a reprodução da sociedade, a transformação geral e destruição do ambiente natural e das relações sociais. Seu objetivo é aumentar a produção de 'commodities' (bens e serviços) direcionados, por meio da troca, à demanda efetiva (Rist, 2014, p. 13, tradução nossa).

Na realidade, para Rist, desenvolver é facilitar a mudança social acelerada por via da aliança entre a técnica e a produção de bens, intensificada pela industrialização. Isso implica num movimento programático de destruição do ambiente para a construção de um outro modo de ser e de ver, uma virtualização. Não se trata de apenas modificar o meio ambiente para aumentar o conforto dos humanos. O programa é de substituição de um meio visto e sentido como sendo "dado", gratuito, por um outro ambiente, uma projeção da imagem do que vai no interior da "ratio" humana. O desejo de ir além do que já existe, criou a nova religião da crença na aceleração sem limites e sem amarras (Perrot, Rist & Sabelli, 1992; Rist, 2014, p. 21-24). Um de seus dogmas é o de que "mais" é necessariamente equiparado a "melhor" nas dinâmicas históricas. Isso é um dogma porque não pode ser provado. Como não pode ser provada nenhuma previsão, em ciência. Entretanto, as explicações e análises visam sempre ao delineamento de cenários para o futuro. Em todo caso, é deste miolo histórico que saiu a noção de ideologia (Perrot, Rist & Sabelli, 1992).

Rajani Kanth (2005; 2017) desdobra, na mesma linha, a produção do silêncio. Em uma descrição pungente da produção da razão iluminista, Kanth (2005, p. 95-152) observa que a concepção androcêntrica, ou seja, o antropocentrismo modificado que usa o ativismo judeu-cristão para chancelar a conquista do ambiente fazendo-o tornar-se uma "natureza, ou seja, um lugar que deve ser dominado" (Kanth, 2005, p. 95), produz uma série de dicotomias, valorizando e, logicamente, atribuindo maior poder, às ideias ligadas à racionalidade. Ideias artificialmente ligadas às emoções, seriam desmerecidas e, portanto, objeto de domesticação (animais e mulheres) educação (crianças) ou conversão em produtos (ambiente em geral: vegetais, água, e assim por diante). Ocorre que para funcionar desse modo, é preciso deter uma forma de conhecimento e relações sociais que espelha a forma dominante no país de onde saíram as primeiras caravelas. Assim, a Inglaterra terá uma razão anglicana, a França republicana, e assim por diante. O que aconteceu com essa centralização dos esforços de construir uma racionalidade foi a produção de um manto de silêncio ou desqualificação de interlocutores que não cabiam no esquema. Desde o iluminismo até a revolução industrial e, por consequência, à ascensão mais abstrata do domínio norte-americano, foi o desdobramento e aplicação de um contexto de racionalidade já fortemente formulada em suas bases.

Nesse sentido merece menção o trabalho de Vandana Shiva. Em uma obra denominada "Sequestro" (Shiva, 2016) ela denuncia e enucleia a dinâmica de apropriação particular de algo comum. Noutras palavras: desde a invenção das ciências modernas que o Estado-Nação possui um aparato intelectual (jurídico) e prático (militar) para apropriar-se de saberes, costumes e heranças, patrimônios inteiros que pertencem a realidades anteriores e mais complexas que eles, direcionando esses caminhos num sentido restritivo: a posse de tudo o que pode ser precificado, e a tentativa de impor essa visão de mundo como sendo "natural". A transformação do conhecimento numa narrativa histórica supostamente progressista, que classifica os conhecimentos numa sucessão de "mito-teologia-filosofia-ciência", por exemplo, teve suas resistências, mas se impôs. Agora a conversa atingiu as sementes e a água do planeta. E vozes críticas como a de Shiva, seguem combinando ancestralidade e crítica atual.

No Brasil, entre muitos, um manifesto fundamental é o de Davi Kopenawa (2019). Foi publicado primeiro em francês, depois em inglês. Então, e somente então, em português. Porque no Brasil a hostilidade contra os ambientalistas e indígenas é famosa. No entanto, os indígenas brasileiros entendem, há muito tempo, que é preciso rediscutir os "comuns" (Collier, 2014). Como espécie, é preciso repropor a discussão do que pertence a todos sem pertencer às categorias racionais já elaboradas, porque é mais sofisticado que elas. Toda a historiografia de movimentos sociais e tentativas de insurreição popular no Brasil poderia servir a ilustrar este ponto. Mas fique marcada a importância da postura repressiva do Estado brasileiro em relação às comunidades indígenas (Cunha, 1992). É possível pensar a irrupção, chegada, insurgência ou invasão da alteridade como hospitalidade, e isso pode contribuir para reconfigurar o conceito que fazemos de Desenvolvimento.

 

Conclusão

Neste texto, sumarizamos duas grandes classes de críticas ao sistema de vida atual, considerado como um sistema que busca a todo custo o desenvolvimento. Mostramos um movimento europeu, marginal, por um lado, que aponta para a grande capa retórica que o Ocidente construiu para esconder uma realidade de problemas graves. Trata-se de concepções como a inexorabilidade do progresso e como a condição naturalizada dos desejos humanos, considerados a partir do centro, ou seja, da Europa e, mais recentemente, dos Estados Unidos da América do Norte.

Por outro lado, pensadores e pensadoras que partem da perspectiva do chamado Sul Global, apresentam a importância de se recuperar os repertórios próprios desse mesmo Sul, para equacionar as formas de se organizar a totalidade da vida no planeta.

De certa forma, a proposição central do trabalho fica sendo a acolhida da diversidade de pensar, saber e fazer, como sendo um manancial de possibilidades para a construção de um modo de pensar mais plural, e mais sensível.

Esse novo pensamento crítico, aberto ao recorte da ancestralidade, presente no retorno às sementes (Shiva); às outras histórias e a diversos modos de saber e de organizar esse saber (Kanth, Dussel, Amin e outros), é um equilibrador em relação à sanha de imposição de uma visão de mundo restritiva, mesmo que seja aparentemente fascinante, como mostra a empolgação de muitos fundadores da ciência social atual com o aceleracionismo e com o universalismo (prussiano) de Kant. Se seguirmos as intuições dos autores que pensam a partir do Sul Global, devemos começar a considerar o universalismo realmente possível como sendo um coro enorme, formado por vozes diferentes, que falam cada uma a seu tempo e cada uma a seu modo. Mas que se encontram e entendem por serem hospitaleiras umas às outras, e por resistirem à tentação de devorar as alteridades.

A nossa perspectiva, brevemente esboçada, não é uma fuga, mas um mergulho nas próprias fontes. Esse mergulho tornou-se, a partir de Março do ano de 2020, compulsório, porque a situação de pandemia, compartilhada em todo o mundo, instaurou uma situação de confinamento prudencial em que as comunidades sensatas estão se colocando, para deter a propagação do vírus. Na verdade, o vírus da Covid 19 é uma das voltas da espiral que começou com outro vírus, o da produção dos silenciamentos e da redução aguda da biodiversidade. Esses dois podem ser superados apenas se formos capazes de manter com rigor um mergulho que respeitará diferentes ritmos e espaços. Só assim podemos pensar na possibilidade de deter a voracidade de Gargantua, ou o canibalismo dos descendentes de Colombo.

 

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Submissão: 30/09/2020
Aceite: 27/11/2020

 

 

Josemar de Campos Maciel faz parte do Programa de Pós-Graduação Lato Sensu: Mestrado e Doutorado em Desenvolvimento Local.
E-mail: maciel50334@yahoo.com.br
ORCID: http://orcid.org/0000-0001-8277-9422

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