Services on Demand
article
Indicators
Share
Revista Subjetividades
Print version ISSN 2359-0769On-line version ISSN 2359-0777
Rev. Subj. vol.20 no.1 Fortaleza Jan./Apr. 2020
https://doi.org/10.5020/23590777.rs.v20i1.e9713
RELATOS DE PESQUISA
Apreensão do sofrimento do adulto ofensor sexual em intervenção psicossocial: uma etnografia
The Apprehension of the Suffering of Adult Sexual Offenders in Psychosocial Intervention: An Ethnography
Aprehensión del Sufrimiento del Adulto Ofensor Sexual en Intervención Psicosocial: Una Etnografía
Appréhension de la Souffrance des Agresseurs Sexuels Adultes en Intervention Psychosociale: Une Ethnographie
Raiane Nunes NogueiraI; Liana Fortunato CostaII; Cássia de Freitas Teixeira PassarelaIII; Cássio Bravin SetúbalIV
IMestranda pelo Programa de Pós Graduação em Psicologia Clínica e Cultura da Universidade de Brasília
IIDoutora em Psicologia Clínica pela USP. Docente Permanente do Programa de Pós graduação em Psicologia Clínica e Cultura - UnB
IIIAssistente Social do Programa de Pesquisa, Assistência e Vigilância à Violência- PAVs Alecrim
IVPsicólogo do Programa de Pesquisa, Atenção e Vigilância à Violência - PAV Alecrim
RESUMO
Este estudo teve como objetivo apreender o sofrimento dos homens autores de violência sexual por meio de uma etnografia realizada em uma unidade de saúde durante uma intervenção psicossocial grupal. As intervenções com ofensores sexuais visam a restabelecer direitos humanos de atenção à saúde e complementar a responsabilização judicial. Entretanto, para desenvolver e aprimorar intervenções efetivas, é necessário o entendimento dos aspectos clínicos envolvidos no ato da ofensa sexual. O conhecimento desses aspectos é possível tanto por meio da literatura quanto por meio da experiência clínica com esses homens. Assim, realizou-se uma etnografia em uma unidade de saúde pública especializada no atendimento de homens ofensores sexuais. A etnografia se caracteriza pela tentativa de entendimento profundo dos sujeitos a partir de um denso diário de campo. Participaram das intervenções oito homens durante oito encontros, de três horas e meia, com temas pré-prédefinidos. A partir da análise do diário de campo, observou-se uma categoria que diz respeito ao sofrimento dos ofensores sexuais antes, durante e após o cumprimento da medida judicial. O sofrimento antes da denúncia está relacionado com violências físicas e sexuais sofridas enquanto crianças e adolescentes. O sofrimento durante o cumprimento da medida judicial está relacionado tanto ao ambiente inóspito das prisões brasileiras quanto aos estigmas associados a esse tipo de crime, que envolve discriminação e isolamento com relação a outros presos e agentes penitenciários. Por fim, o sofrimento após o cumprimento da medida também está relacionado com os estigmas de ser um ofensor sexual e os prejuízos são individuais, relacionais, comunitários e sociais. A partir das informações, aponta-se para o sofrimento como um aspecto clínico a ser considerado tanto no desenvolvimento de políticas públicas de enfrentamento dessa violência quanto por unidades de saúde especializadas no atendimento dessa população.
Palavras-chave: abuso da criança; intervenção psicossocial; violência sexual; abusador sexual.
ABSTRACT
This study aimed to apprehend the suffering of men who committed sexual violence through ethnography performed in a health unit during a group psychosocial intervention. Interventions with sexu offenders aim to restore human rights to health care and complement judicial accountability. However, to develop and improve effective interventions, it is necessary to understand the clinical aspects involved in the act of sexual offense. It is possible to know these aspects both through the literature and through clinical experience with these men. Thus, an ethnography was performed in a public health unit specialized in the care of men who are sex offenders. Ethnography is characterized by an attempt to understand the subjects in depth from a dense field diary. Eight men participated during eight meetings, lasting three and a half hours, with pre-defined themes. From the analysis of the diary, a category was observed, that concerns the suffering of sexual offenders before, during, and after the fulfillment of the injunction. Suffering before reporting is related to physical and sexual violence suffered while children and adolescents. The suffering during the fulfillment of the judicial measure is related both to the harsh environment of Brazilian prisons and to the stigmas associated with this type of crime, which involves discrimination and isolation from other prisoners and correctional officers. Finally, the suffering after complying with the injunction is also related to the stigmas of being a sex offender and the losses are individual, relational, community, and social. Based on the information, suffering is pointed out as a clinical aspect to be considered both in the development of public policies to face this violence and by health units specialized in serving this population.
Keywords: child abuse; psychosocial intervention; sexual violence; sex offender.
RESUMEN
El objetivo de este trabajo fue aprehender el sufrimiento de los hombres autores de violación sexual por medio de una etnografía realizada en una unidad de salud durante una intervención psicosocial de grupo. Las intervenciones con ofensores sexuales objetivan restablecer derechos humanos de atención a la salud y complementar la responsabilización judicial. Sin embargo, para desarrollar y perfeccionar intervenciones efectivas, es necesario el entendimiento de los aspectos clínicos involucrados en el acto de la ofensa sexual. El conocimiento de estos aspectos es posible tanto por medio de la literatura cuanto por medio de la experiencia clínica con estos hombres. Fue realizada una etnografía en una unidad de salud pública especializada en el atendimiento de hombres ofensores sexuales. La etnografía se caracteriza por el intento de comprensión profunda de los sujetos a partir de un denso diario de campo. Participaron de las intervenciones ocho hombres durante ocho encuentros, de tres horas y media, con temas predefinidos. A partir del análisis de campo, se observo una categoría que se refiere al sufrimiento de los ofensores sexuales antes, durante y después del cumplimiento de la medida judicial. El sufrimiento antes de la denuncia está relacionado con violencias físicas y sexuales sufridas mientras niños y adolescentes. El sufrimiento durante la medida judicial está relacionado tanto al ambiente inhóspito de las cárceles brasileñas cuanto al estigma asociado a este tipo de crimen, que envuelve discriminación y aislamiento con relación a otros presos y agentes de la cárcel. Por fin, el sufrimiento después del cumplimiento de la medida judicial también está relacionado con los estigmas de ser un ofensor sexual y los daños son individuales, relacionales, comunitarios y sociales. A partir de las informaciones, se indica para el sufrimiento como un aspecto clínico a ser considerado tanto en el desarrollo de políticas públicas de enfrentamiento de esta violencia cuanto por unidades de salud especializadas en la atención de esta población.
Palabras clave: abuso del niño; intervención psicosocial; violencia sexual; abusador sexual.
RÉSUMÉ
Cette étude a eu comme objectif à appréhender la souffrance des hommes auteurs des violences sexuelles à travers une ethnographie réalisée dans un service de santé lors d'une intervention psychosociale de groupe. Les interventions auprès des agresseurs sexuels visent à rétablir les droits de l'homme dans les soins de santé et à compléter la responsabilité judiciaire. Cependant, pour développer et améliorer des interventions efficaces, il est nécessaire de comprendre les aspects cliniques impliqués dans l'acte d'agression sexuelle. La connaissance de ces aspects est possible à la fois par la littérature et par l'expérience clinique avec ces hommes. Ainsi, une ethnographie a été réalisée dans une unité de santé publique spécialisée dans la prise en charge des hommes agresseurs sexuels. L'ethnographie se caractérise par une tentative de comprendre les sujets en profondeur à partir d'un dense journal de bord. Huit hommes ont participé à huit réunions, d'une durée de trois heures et demie, avec des thèmes prédéfinis. À partir de l'analyse du journal de bord, une catégorie a été observée qui concerne la souffrance des agresseurs sexuels avant, pendant et après l'exécution de la mesure judiciaire. La souffrance avant la plante criminelle est liée à la violence physique et sexuelle pendant leur enfance et adolescence. Les souffrances pendant l'exécution de la mesure judiciaire sont liées à l'environnement hostile des prisons brésiliennes et aussi aux stigmates associés à ce type de délits, qui impliquent discrimination et isolement des autres prisonniers et des agents correctionnels. Enfin, les souffrances liées après de la mesure judiciaire sont également liées aux stigmates d'être un agresseur sexuel. Les pertes sont individuelles, relationnelles, communautaires et sociales. À partir de ces informations, la souffrance est signalée comme un aspect clinique à prendre en compte dans l'élaboration des politiques publiques pour faire face à cette violence et aussi dans les formations sanitaires spécialisées au service de cette population.
Mots clés: abus de l'enfant; intervention psychosociale; violence sexuelle; agresseur sexuel.
Este estudo teve como objetivo apreender o sofrimento dos homens acusados de cometer uma ofensa sexual, descrito a partir do método etnográfico realizado durante uma intervenção psicossocial. O sofrimento é um aspecto clínico presente nas intervenções com essa população. O entendimento dos aspectos clínicos envolvidos na ação de ofender sexualmente é importante para desenvolver intervenções efetivas tanto de cunho judicial quanto de saúde. As intervenções, por sua vez, são importantes para diminuir o índice de reincidência no cometimento de uma ofensa sexual (Christensen, 2017; Marshall, 2001), embora não seja esse um dos vetores do texto. A apreensão dos aspectos clínicos é possível não somente a partir da teoria, mas também da experiência clínica de intervenção com essa clientela (Marshall, 2018; Marshall, Marshall, Serran, & Fernandez, 2006). Assim, uma vez que a etnografia apresenta interfaces com a psicologia (Andrada, 2018), ela pode ser utilizada pela psicologia clínica como uma ferramenta de observação e registro do que se passa durante uma intervenção psicossocial.
A Ofensa Sexual de Crianças e/ou Adolescentes
O abuso ou ofensa sexual contra crianças e/ou adolescentes é definida pela World Health Organization (WHO, 2017) como o ato de envolver uma criança ou adolescente em qualquer atividade sexual, pois eles não compreendem e são incapazes de dar consentimento ou que viola as leis ou tabus sociais. As consequências psicológicas e desenvolvimentais para as vítimas são extensas, danosas e podem durar toda a vida (Rehan, Antfolk, Johansson, & Santtila, 2019). As consequências da ofensa sexual podem variar em gravidade segundo alguns fatores, como a relação da vítima com o agressor, a frequência e duração dos abusos, se teve ou não uso da força, e se houve penetração oral, vaginal ou anal (Marshall, 2001).
No Brasil, entre os anos de 2011 e 2017, o Boletim Epidemiológico (Secretaria de Vigilância em Saúde, 2018) apontou que foram notificados 184.524 casos de violência sexual, sendo que 58.037 (31,5%) foram contra crianças e 83.068 (45,0%) contra adolescentes. É importante destacar que esses números não representam a real prevalência dos abusos sexuais contra crianças e/ou adolescentes, pois os casos são subnotificados (Lussier & Cale, 2016). Ainda no Brasil, foram presas 6.072 pessoas por estupro de vulnerável entre os anos de 2015 e 2016, segundo o relatório do Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (InfoPen) (Ministério da Justiça e Segurança Pública, 2017). O estupro de vulnerável é tipificado como o ato de praticar qualquer ação de cunho sexual com menor de 14 anos (Decreto-Lei nº 2.848, 1940). Entretanto não constam no InfoPen informações mais específicas em relação às características dos ofensores sexuais, como a cor da pele, escolaridade, local de moradia, nem informações relacionadas ao contexto da ofensa sexual, como local da ofensa e idade da vítima. Essas informações podem ser inferidas dos dados sobre a população prisional total do Brasil. Assim, a maior parte desses homens está entre 18 e 24 anos (30%) e 25 e 29 anos (25%), são negros (64%), possuem ensino fundamental incompleto (51%), solteiro (60%), sem filhos (53%) e estão em atividade laboral (87%) (Ministério da Justiça e Segurança Pública, 2017). É importante destacar que esse perfil declara razões políticocriminais acerca da predileção do sistema punitivo brasileiro por um grupo de risco específico, sendo ele jovem, negro e periférico (Oliveira, Torres, & Torres, 2018). Porém não só brasileiro, pois Wacquant (2001) aponta bem essa realidade se reproduzindo em contexto americano e europeu, ainda que se trate de países considerados de primeiro mundo. A população carcerária, e seu aumento, é produto de "mais Estado" policial e penitenciário e "menos Estado" econômico e social (Wacquant, 2001, p.7).
A falta de indicadores oficiais sobre esse público de autores de violência sexual marca tanto a falta de conhecimento quanto a dificuldade de se estudar o fenômeno no Brasil (Fonseca, Setubal, & Costa, 2019; Meneses, Stroher, Setubal, Wolff, & Costa, 2016; Wolff, Oliveira, Marra, & Costa, 2016). Assim, observa-se que as informações sobre as características do autor de violência sexual ficam restritas ao contexto da área de saúde, devido ao esforço de pesquisadores e estudiosos do tema, concentradas principalmente nas regiões Centro-Oeste (Fonseca et al., 2019; Penso et al., 2016; Wolff et al., 2016), Sul e Sudeste (Baltieri & Boer, 2015; Valença, Meyer, Freire, Mendlowicz, & Nardi, 2015). O Boletim Epidemiológico da Secretaria de Vigilância em Saúde (2018) aponta que os ofensores sexuais de crianças e/ou adolescentes são majoritariamente homens e eles possuem vínculo familiar com a vítima, sendo pais, padrastos, avôs, entre outros, assim como apontam Penso et al. (2016) e Schaefer, Brunnet, Lobo, Carvalho, e Kristensen (2018).
Ainda dentro do contexto da saúde, um estudo realizado no Brasil demonstrou que os ofensores sexuais que ingressaram no sistema penitenciário reproduzem as características da população carcerária brasileira. Sendo assim, os ofensores sexuais de crianças e/ou adolescentes são homens de baixa escolaridade, atuantes em subempregos e pertencentes às classes sociais de menor poder aquisitivo (Penso et al., 2016). Os autores destacam que essas informações devem ser analisadas com cuidado, uma vez que os prontuários podem conter informações omitidas ou distorcidas, pois esses homens se recusam a admitir a violência cometida ou fornecer quaisquer informações que possam constituir uma prova que os levem de volta ao sistema prisional. Penso et al. (2016) ainda destacam que o sistema de justiça do Brasil tende a punir com maior frequência os indivíduos em situação de baixos recursos financeiros e sociais e pertencentes à raça negra (Oliveira et al., 2018). O perfil de pessoas presas, com base no Relatório InfoPen de 2014, é de, majoritariamente, jovens negros de baixa renda e baixa escolaridade (Penso et al., 2016).
Marshall (2001) indica que a maior parte desses homens passa despercebida pela sociedade, pois é um grupo heterogêneo, tanto em relação ao tipo e detalhes da ofensa sexual cometida quanto em relação à etiologia individual, à motivação para a ofensa, às comorbidades e o risco de reincidência (Carter & Mann, 2017; Ribeiro & Cordeiro, 2018). É importante destacar que a maioria dos casos de abuso sexual é cometida por pessoas sem qualquer patologia de ordem psicológica (Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, 2015; Ribeiro & Cordeiro, 2018). Assim, esse homem não é necessariamente um pedófilo (Seto, 2018). A pedofília é um transtorno parafílico e contém em si uma condição psicopatológica na qual o desejo sexual por crianças se dá de forma preferencial (American Psychiatric Association, 2013), enquanto que o ofensor sexual atua mediante oportunidade para a ação criminosa contra crianças e/ou adolescentes e mantém o interesse sexual preferencial por adultos (Christensen, 2017).
Intervenção Para o Ofensor Sexual
O Ministério da Saúde, por meio da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem (Ministério da Saúde, 2009), prevê o desenvolvimento de programas voltados à atenção integral à saúde do homem, sendo pessoa autora da violência sexual ou vítima. O atendimento em saúde ao ofensor sexual de crianças e/ou adolescentes também está previsto no Plano Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual Contra Crianças e Adolescentes (Secretaria de Direitos Humanos, 2013). Mas, para oferecer atendimento, é preciso mudar o paradigma social de punir e penalizar para identificar e oferecer atendimento no âmbito da saúde pública (Meneses et al., 2016). Essa mudança de paradigma é importante, porque as medidas punitivas sozinhas não alteram os índices de reincidência (Marshall, 2001). Destaca-se que as intervenções de cunho psicológico são eficazes para diminuir a reincidência e, consequentemente, o número de vítimas (Schmucker & Lösel, 2017).
O objetivo das intervenções clínicas com homens ofensores sexuais é promover a melhora do funcionamento psicológico por meio do desenvolvimento de novas habilidades (Carter & Mann, 2017; Marshall, 2018). Desde 1960, várias foram as estratégias de intervenção propostas para os homens adultos ofensores sexuais. Os programas de tratamento se desenvolveram a partir do enfoque sobre o interesse sexual desviante, utilizando desde estratégias de condicionamento pavloviano (emparelhamento de estímulos) até o desenvolvimento de intervenções focadas sobre os fatores de risco de reincidir na ofensa sexual. Atualmente, as intervenções estão enfocando menos sobre os déficits ou os problemas desses homens, e mais sobre as suas potencialidades (Marshall, 2018).
Revisões sistemáticas de literatura atuais marcam uma grande heterogeneidade de intervenções propostas para homens adultos ofensores sexuais, incluindo as intervenções farmacológicas e castrações químicas (Carter & Mann, 2017). A maior parte delas é direcionada para homens que foram acusados de cometer uma ofensa sexual em comparação aos homens que procuram ajuda livremente (Seto, 2012). Dessas, a intervenção mais comum é a terapia cognitivo-comportamental, uma vez que se percebeu a influência de aspectos cognitivos para a motivação e manutenção da ofensa sexual. Ademais, as intervenções em grupo são mais comuns do que as de atendimento individual, apesar de programas de intervenção que mesclam atendimentos em grupo com atendimentos individuais possam ser os mais efetivos (Schmucker & Lösel, 2017).
Independente de qual seja o modelo, para o melhor entendimento sobre a ação sexual desviante ou para o desenvolvimento e aprimoramento de estratégias eficazes de intervenção, é necessário compreender os aspectos clínicos envolvidos na ação de ofender sexualmente crianças e/ou adolescentes (Christensen, 2017; Ribeiro & Cordeiro, 2018). Os aspectos clínicos são aqueles que devem ser considerados no planejamento da intervenção com o adulto ofensor sexual, como problemas de regulação emocional, problemas de funcionamento socioafetivo, distorções cognitivas relacionadas à ação sexual cometida, fantasias sexuais, interesses sexuais desviantes, grande dificuldade para construir e manter vínculos emocionais com adultos, baixa autoestima e sentimento de solidão (Marshall, 2001; Ward & Beech, 2016). Alguns autores organizam esses aspectos em fatores de risco para ofender sexualmente, os quais podem ser estáticos ou dinâmicos. Os estáticos são aqueles que não podem ser alterados por meio da intervenção clínica, como número de vítimas, história de vida, entre outros. Já os dinâmicos abrem a oportunidade para a intervenção, tais como interesse sexual desviante, problemas de intimidade com adultos, baixa regulação emocional, entre outros (Marshall, 2018).
Uma das formas de se apreender esses e outros aspectos clínicos, envolvidos na ofensa sexual de crianças e/ou adolescentes, é por meio da observação durante a prática clínica (Marshall, 2001; Marshall et al., 2006). A prática clínica envolve apreender a experiência dos sujeitos utilizando-se da fala e da escuta qualificada como ferramenta que resultará na compreensão da expressão do sofrimento dos sujeitos (Costa & Penso, 2010; Lima & Schneider, 2018). Costa e Penso (2010) destacam que a prática clínica, em uma perspectiva psicossocial, deve compreender o contexto econômico, social, político e cultural no qual o indivíduo vive. A clínica psicossocial se direciona a pessoas que possuem dificuldades provenientes do contexto social, como problemas no contexto jurídico. Assim, a prática clínica deve articular a subjetividade com as demandas sociais e jurídicas, pois o encaminhamento para o atendimento em saúde se origina desses contextos (Costa & Penso, 2010). As autoras destacam, ainda, que as intervenções psicossociais são curtas e objetivas. Dessa forma, entende-se que essa é uma prática clínica moldada em um contexto de atendimento público. Assim, ela deve transformar uma demanda que, originalmente, é externa ao sujeito, de origem judicial, em uma demanda pessoal (Meneses et al., 2016).
Método
Para apreender o sofrimento dos homens acusados de cometer uma ofensa sexual, realizou-se um estudo qualitativo, descritivo e exploratório de método etnográfico. Este estudo foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética do Instituto de Ciências Humanas da Universidade de Brasília, via Plataforma Brasil, por meio do Parecer n.º ٩٧٢.٢٤٦.
Etnografia Como Método de Pesquisa
Andrada (2018) considera que a etnografia é uma contribuição clássica das ciências sociais e que possui serventia para qualquer outra área que se proponha a entender atores sociais, entre elas, a psicologia. A etnografia é um método de estudos que busca descrever uma cultura, ou seja, um conjunto de conhecimentos adquiridos por uma sociedade (Geertz, 2008; Hammersley, 2018; Nunes, 1978; Spradley, 1980). Esse método de pesquisa tradicionalmente se voltava para o estudo de sociedades e culturas não ocidentais. Entretanto, ao longo do tempo, os sociólogos observaram que qualquer sociedade, inclusive a que o etnógrafo faz parte, abarca diferentes culturas e, assim, possui também as suas diferenças e complexidades, tornando-se palco para uma prática etnográfica (Spradley, 1980).
A essência desse método de pesquisa é o entendimento profundo do sujeito e do significado das suas ações a partir da documentação, do monitoramento e da observação direta (Geertz, 2008; Gobo & Marciniak, 2016; Howitt, 2016; Jerolmack & Khan, 2018; Spradley, 1980). Para tal, o etnógrafo deverá fazer uma descrição densa, completa, criteriosa e minuciosa do comportamento de um grupo de pessoas através da transcrição de comportamentos verbais e não verbais (Geertz, 2008). Mas além de descrever o que observa detalhadamente, o etnógrafo tentará apreender o significado do que observou (Spradley, 1980).
Faz-se necessária a diferenciação entre os conceitos de etnografia e observação. Enquanto a etnografia é uma estratégia de investigação, a observação é o procedimento de coleta das informações. Assim, o pesquisador utilizará a observação a serviço da etnografia, pois esta é baseada na observação direta, sua principal fonte de informações. Dessa forma, na prática etnográfica, a observação é uma das várias formas de se acessar a informação, mas também pode compreender análise documental, entrevistas e uma gama de outros métodos relacionados (Creswell, 2016; Gobo & Marciniak, 2016; Howitt, 2016; Jerolmack & Khan, 2018; Spradley, 1980). Outra diferença diz respeito à análise das informações. Na etnografia, o estudo vai além da descrição do comportamento. O mais importante é entender o significado dos comportamentos observados (Geertz, 2008; Spradley, 1980).
O uso da etnografia dentro desse contexto específico surgiu como uma opção para a aproximação com os sujeitos de pesquisa e a obtenção das informações. Isso porque, assim como apontado por estudos internacionais (Bowden, Glorney, & Daniels, 2017) e nacionais (Wolff et al., 2016), pesquisas na área de abuso sexual são caracterizadas por várias dificuldades de acesso a dados importantes. Uma dessas dificuldades é a aproximação do pesquisador ao grupo dos ofensores sexuais, uma vez que esses indivíduos acabaram de sair do contexto jurídico para ingressar no contexto de saúde. Com isso, geralmente não aceitam se identificar espontaneamente como ofensores sexuais, pois temem que essa atitude seja utilizada como denúncia e usada contra eles no contexto judicial ou como definição da sua identidade.
Contexto da Pesquisa
A aplicação do método etnográfico foi realizada no segundo semestre de 2018, em uma unidade de saúde pública especializada no atendimento psicossocial de homens adultos acusados de cometer ofensa sexual contra crianças e/ou adolescentes e já sentenciados. A equipe de atendimento é formada por um psicólogo, uma psicóloga, duas assistentes sociais e duas auxiliares de pesquisa (alunas da graduação e/ou pósgraduação em Psicologia). Desde o início da atividade de intervenção psicossocial grupal, ficou patente a necessidade de se ter observadores da ação durante as sessões do grupo. Essa necessidade mostrou-se em relação à descrição da dinâmica grupal, às interações entre os participantes, às verbalizações produzidas nas interações entre os membros do grupo e entre eles e os membros da equipe profissional. Desse modo, os participantes da ação interventiva possuem familiaridade com a presença de observadores presentes e que efetuam o registro.
Os autores de violência sexual chegam a essa unidade por meio do encaminhamento da Justiça. Nos anos de 2017 e 2018, foram encaminhados ao programa 44 homens, entretanto nem todos os encaminhados ao programa foram atendidos, pois alguns deles não preencheram os critérios do programa, que são: ser adulto (acima de 18 anos), ser do sexo masculino e ter cometido violência sexual intrafamiliar (Meneses et al., 2016).
A intervenção é de carácter psicossocial (Meneses et al., 2016) e está dividida em três principais momentos: entrevista inicial, intervenção grupal e acompanhamento posterior, caso necessário, em sessões individuais. São cinco entrevistas iniciais semiestruturadas e elas têm o objetivo de coletar informações como identificação do homem encaminhado, dados da família, condições de moradia e de saúde, qualidade da rede de apoio, histórico da violência sexual encaminhada à Justiça, entrada no sistema judiciário, expectativas para a intervenção, aspectos da interação e organização do sistema familiar após a denúncia e aspectos psicopatológicos, como psicopatias e depressão (Meneses et al., 2016).
A intervenção grupal aconteceu entre os meses de agosto e novembro, com duração de oito encontros quinzenais, sendo que cada encontro teve duração de três horas e meia. Os temas das sessões são pré-definidos, sendo eles: promoção da integração grupal, estigmas, violências sofridas, gênero, sexualidade, fatores de risco/proteção, desejo por crianças/adolescentes e plano de futuro. As intervenções psicossociais desse grupo aconteceram a partir da criação de um ambiente lúdico, promovido por meio de recursos do psicodrama (Meneses et al., 2016).
Participantes
Foram convocados 10 homens para participar do grupo no segundo semestre de 2018 e, desses, oito compareceram. Todos eram heterossexuais e pardos. As idades variaram entre 28 e 59 anos e a renda pessoal de R$ 600,00 a R$ 2.000,00. Em relação à situação familiar, cinco deles estavam casados ou em união estável e três estavam solteiros. Apenas um deles fazia uso de álcool controlado, os outros relataram não fazer uso de substâncias químicas. Em relação à escolaridade, três deles possuíam ensino fundamental incompleto, dois possuíam médio incompleto, um possuía ensino médio completo, um era pós-graduado e o outro não informou.
Quanto à medida judicial, sete deles responderam em reclusão, ou seja, pena privativa de liberdade, sendo que o tempo na prisão variou de três anos e seis meses a 14 anos. Apenas um dos participantes obteve a transação penal, instituto jurídico pré-processual consagrado por um modelo de justiça criminal consensual que permite a substituição de uma pena mais grave por outra mais branda de modo a viabilizar o caráter ressocializador da pena. É aplicado quando o acusado assume a autoria do crime e é considerado de menor potencial ofensivo, ou seja, a pena máxima de reclusão seria de dois anos ou os crimes cometidos foram de contravenção penal. A transação penal implica no cumprimento de penas alternativas, tais como prestação de serviço à comunidade, pagamento de algum valor, entre outras (Decreto-Lei nº 9.099, 1995).
Em relação ao número de vítimas, seis deles cometeram ofensa sexual contra uma vítima e outros dois estavam sendo acusados por cometer uma ofensa sexual contra duas. Apenas uma das vítimas era do sexo masculino, as outras nove eram do sexo feminino. As idades das vítimas variaram de 5 a 16 anos. Em relação ao vínculo com o autor da violência, três vítimas eram filhas, três eram primas, duas eram enteadas, uma era vizinha e a outra, sobrinha.
Dos oito homens que compareceram ao grupo, apenas quatro permaneceram até o final da intervenção em grupo. Cada participante pode faltar apenas três dos oito encontros. Essas três faltas terão de ser repostas em atendimento individual. Caso o participante falte mais de três encontros, ele estará fora da intervenção grupal e terá que reiniciar o grupo no semestre seguinte.
Procedimento de Coleta das Informações
O ponto de partida da etnografia é o estranhamento do etnógrafo em relação ao contexto que ele se propõe a estudar, e esse estranhamento deve se manter durante toda a etnografia (Mata, 1978). A partir dessa postura do pesquisador, foi feita a observação direta das ações dos sujeitos de pesquisa, mas também das sensações provenientes do contexto observado. Segundo Geertz (2008) e Spradley (1980), as observações devem ter enfoque tanto nos aspectos descritivos e objetivos quanto nos subjetivos, ou seja, nas impressões do observador.
Como já foi dito, os participantes do grupo possuem familiaridade com a observação, ainda assim, foram consultados sobre a permissão da observação e do registro. Portanto, sabiam que estavam sendo observados e concordaram verbalmente com essa ação. As informações obtidas por meio das observações etnográficas foram registradas apenas com o auxílio do diário de campo (Mata, 1978). O registro foi feito de forma mais densa e minuciosa possível, como sugerem Geertz (2008) e Spradley (1980). Foi informado aos participantes que o diário de campo estava disponível para consulta caso quisessem. No entanto, nenhum deles solicitou conferir as anotações.
Procedimento de Análise das Informações
Para a análise das informações obtidas, valorizaram-se os relatos verbais e as impressões dos observadores/pesquisadores. A presença da subjetividade do pesquisador é imprescindível para a compreensão das informações obtidas (Geertz, 2008; Spradley, 1980). Uma das formas que Spradley (1980) propõe para se compreender as informações contidas no diário de campo é a análise temática, na qual o etnógrafo identifica padrões de significados e os organiza em categorias. Iniciou-se esse processo digitando todo o diário de campo em um arquivo no computador. Em seguida, realizou-se uma leitura fluida e extensiva de todo o material. Esse material foi lido e relido várias vezes até que se pudessem identificar sentidos comuns, buscando identificar padrões, ou seja, aspectos observados que se repetem. Esses sentidos comuns foram organizados em um primeiro conjunto de sentido. Em seguida, outro pesquisador, pertencente à equipe de pesquisa, identificou as nuances dessas categorias, apreendendo o significado das informações presentes em cada uma. Por fim, os dois avaliadores discutiram as categorias e seus conteúdos.
A análise do diário de campo resultou, portanto, em algumas categorias. A categoria mais marcante, ou seja, que mais concentrou conteúdos de fala, diz respeito ao sofrimento presente na história de vida dos homens ofensores sexuais de crianças e adolescentes, tanto antes do cumprimento da medida judicial quanto durante a permanência no contexto penal e depois da passagem por esse contexto. Assim, como recorte para esse texto, privilegiou-se a discussão acerca do sofrimento em detrimento das outras categorias que apareceram, apesar de todos os conteúdos observados serem considerados importantes. O outro motivo para essa escolha foi o ineditismo do tema, uma vez que não se observa na literatura o debate sobre o sofrimento desses homens durante sua trajetória de vida (Bailey, 2018) e esse enfoque é valorizado na literatura, pois considera a importância do olhar compreensivo sobre o homem ofensor sexual (Lussier & Cale, 2016).
Resultados e Discussão
A partir da análise do diário de campo percebeu-se, então, que a história de vida dos homens acusados de terem cometido uma ofensa sexual é marcada por sofrimento. Percebeu-se que esse sofrimento está presente em três momentos principais: antes do cumprimento da medida judicial, durante o cumprimento da medida judicial e após o cumprimento da medida judicial.
Sofrimento Antes do Cumprimento da Medida Judicial
Os homens que participaram do grupo de intervenção relataram violências de natureza sexual e física presentes em sua história de vida. Em relação à violência sexual, observou-se que está intimamente relacionada à como os participantes se desenvolveram e expressaram a sua sexualidade. Assim, eles relataram que tiveram contato com práticas sexuais desde tenra idade, período considerado inapropriado para a compreensão dessas práticas. Um dos participantes disse que teve "acesso a pornografia com uns oito anos, com revistinha". Observou-se, também, que a iniciação da experiência sexual foi marcada pela violência, o que fica explícito no relato "quando eu tinha nove anos, uma garota de 14 me pegou e ficou mostrando as coisas, e eu não estava pronto para isso". Outro relato muito comum durante as intervenções é em relação à prática de homens mais velhos que os levaram às casas de prostituição, como um ritual de passagem da fase da adolescência para a fase adulta. Um dos participantes disse que "com uns 14 anos, meu pai me levou num puteiro. Ele falou 'vai lá'". É importante destacar que esses homens não perceberam esses eventos como violência sexual, apesar de reconhecerem o desconforto nessas situações. Esses achados corroboram a literatura internacional sobre o tema, que aponta que grande parte dos homens ofensores sexuais foram vítimas de violência sexual ou outros tipos de maus-tratos (Blom, Högberg, Olofsson, & Danilesson, 2014; Marshall, 2001).
Já em relação à violência física, esteve presente no contexto familiar como estratégia parental de corrigir comportamentos inadequados. Isso pode ser percebido na seguinte fala de um dos participantes em relação aos seus pais: "às vezes, a gente acha que eles podem ser amorosos, mas com o filho são violentos achando que, assim, estão educando". Outro participante relata a violência física sofrida durante o período escolar: "lembro que aprender tabuada era um inferno. Minha mãe me dava reguada, palmatória". Em outro relato, observou-se a severidade da violência sofrida: "meu pai me batia e minha mãe lavava com água com sal pra curar". A violência física sofrida pelas crianças no Brasil é decorrente de uma construção histórico-cultural na qual os pais acreditam que o uso de castigo físico é apropriado para educar os filhos e que essa ação não causaria danos à saúde deles (Souza & Berlini, 2018).
Assim, observou-se que a história de vida dos homens acusados de terem cometido uma ofensa sexual é marcada por sofrimentos decorrentes de diversas violências presentes na infância e na adolescência, o que é corroborado pela literatura (Eloir, Ducro, & Nandrino, 2019). Os autores destacam que os ofensores sexuais sofreram mais violências físicas, sexuais e psicológicas do que pessoas que não apresentam esse tipo de comportamento violento. O mesmo ocorre com mulheres ofensoras sexuais, uma vez que elas apresentam uma história de diversas vitimizações ao longo da vida (DeCou, Cole, Rowland, Kaplan, & Lynch, 2015).
Já está bem estabelecido na literatura que ofensores sexuais de crianças e adolescentes foram vítimas de diversos sofrimentos, os quais podem, inclusive, ter um papel no desenvolvimento de um comportamento sexual desviante (Ward & Beech, 2016; Yoder, Dillard, & Leibowitz, 2018). Segundo Marshall (2001) e Yoder et al. (2018), as experiências de vida adversas durante a infância podem resultar em um padrão de vínculo inseguro, que se reflete em baixa autoestima, dificuldade de desenvolver intimidade com adultos e, consequentemente, a presença de sentimentos de solidão. Como já exposto, a baixa autoestima, a dificuldade de desenvolver intimidade e vínculo com adultos e o sentimento de solidão são aspectos clínicos alvos da intervenção com ofensores sexuais (Marshall, 2001; Marshall et al., 2006).
A discussão acerca do sofrimento presente na história de vida é importante de ser realizada durante uma intervenção grupal, pois desenvolve a empatia, outro aspecto que deve ser alvo da intervenção com essa clientela (Marshall et al., 2006). Para o autor, o desenvolvimento dessa habilidade ocorre a partir do relato e da escuta do sofrimento dos outros integrantes. A escuta acerca do sofrimento dos colegas de grupo propicia desenvolvimento da empatia por eles e também pela vítima.
Sofrimento e Violação de Direitos Durante o Cumprimento da Medida Judicial
Os ofensores sexuais continuam a experienciar sofrimentos durante suas trajetórias de vida, ou seja, não sofrem apenas na infância e adolescência, mas também na fase adulta, especificamente em decorrência da denúncia. Para um dos participantes, "a partir daí [da denúncia], é só dificuldade". Esse relato corrobora a perspectiva mais atual sobre os ofensores sexuais, que destaca a importância de se entender a história de vida desses sujeitos, compreendendo não só a adolescência, mas também a adultez (Lussier & Cale, 2016). Alguns autores destacam que a maior parte das pesquisas sobre a história de vida é relacionada ao adolescente ofensor sexual, entretanto é importante que se entenda as mudanças sociais e contextuais, incluindo a fase adulta, porque, segundo os autores, assim é possível não só entender os precursores do comportamento sexual desviante, mas também contextualizar os aspectos envolvidos na continuidade e descontinuidade do comportamento sexual violento.
Uma pesquisa desenvolvida por Aslan, Edelmann, Bray, e Worrell (2014), no que diz respeito à comparação entre abuso sexual concretamente efetuado com crianças/adolescentes e ações semelhantes perpetradas pela internet, aponta o intenso sofrimento experienciado por esses perpetradores durante sua vida. A pesquisa foi efetivada por meio de entrevistas. O interessante desse texto é que a pesquisa indica que a motivação em direção à busca por pornografia / violência sexual pela internet está estreitamente ligada a uma tentativa de diminuir o sofrimento e a ansiedade advinda da ameaça de ser pego por atos abusivos cometidos de forma concreta. Esse dado traz uma contribuição importante tanto para aprimorar o atendimento clínico e/ou aperfeiçoar a prevenção.
Os participantes do grupo relataram sofrimentos extremos advindos da experiência prisional. Segundo um dos participantes, "traumas é o que você mais tem depois de ser preso". O sistema penitenciário brasileiro é marcado por diversas transgressões aos direitos humanos, nas quais prevalecem a desumanidade com os encarcerados (Iribarrem, 2019). Uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), realizada em 2008, acerca das condições dos presídios brasileiros, constatou que eles não oferecem condições mínimas para que os presos possam viver adequadamente. Ademais, os presos vivem sob tensão, medo, repressão, torturas e violências. As prisões brasileiras podem causar danos psicológicos severos às pessoas que passam por lá (Câmara dos Deputados, 2008).
O sofrimento dos ofensores sexuais tem continuidade a partir do momento em que adentra o regime fechado, em função de medida adotada pela administração do presídio, a qual, sob a alegação de proteção da integridade física, coloca esses ofensores sexuais de crianças e adolescentes em local diferenciado. Por local diferenciado entenda-se local separado fisicamente dos autores de crimes comuns. Trata-se de uma medida que, mesmo que vise à proteção física, acaba por estigmatizar esses sujeitos, porque os participantes do grupo relatam que "se me perguntar, vou dizer que meu crime foi assassinato". Há uma cultura dentro das penitenciárias de que o abuso sexual contra crianças é considerado uma afronta pelos demais presos, razão pela qual os administradores do presídio podem tomar a iniciativa de colocá-los em espaço diferenciado. Essa questão não identifica o conteúdo judicial da estipulação da medida de segurança, que é uma decisão judicial para atendimento em saúde do criminoso (Marin & Baltieri, 2013). A colocação do ofensor sexual em espaço diferenciado é uma medida alternativa adotada como estratégia de proteção pelos administradores do presídio (L. M. C. Ströher, comunicação pessoal em 11 de novembro de 2019).
Por outro lado, os participantes do grupo também narraram que os demais presidiários identificam os ofensores sexuais como "Jack", remetendo a Jack, o Estripador, o pseudônimo de um assassino em série do Reino Unido. Esse pseudônimo constitui-se em um apelido que estigmatiza o ofensor sexual em regime fechado de modo explícito e vergonhoso (L. M. C. Ströher, comunicação pessoal em 11 de novembro de 2019) e, portanto, temem ser assim identificados
A prisão é um lugar onde homens responsabilizados pela justiça vão ampliar o leque de violências sofridas, adicionando a violência institucional à sua história de vida (Iribarrem, 2019). Os princípios da igualdade e da dignidade humana estão bem longe da realidade dos presídios. Pesquisa realizada por Souza e Ferreira (2016) com a população trans apenada revela que esses aspectos determinam as relações interpessoais e os estigmas presentes no ambiente. A população de ofensores sexuais se encontra bem próxima da circunstância da população trans.
Além de viverem todas as condições desumanas impostas a todos os presos, os ofensores sexuais são ainda mais vulneráveis a assédios e outras formas de abuso. Durante o encarceramento, esses homens já irão se deparar com os estigmas associados à ofensa sexual de crianças e adolescentes. Um deles testemunha que "fui agredido lá. Acho que todos que estão com um crime desses foram agredidos de alguma forma". O estigma é uma representação social direcionada a pessoas que é prejudicial (Tyler & Slater, 2018) e, nesse contexto, atuou como um catalisador para o sofrimento, porque, dentro da prisão, existe uma licença estabelecida para praticar violências físicas e sexuais contra esses homens. Nesse contexto, eles são entendidos como inferiores aos outros presos, como em um sistema de castas. Para sobreviver dentro da prisão, os ofensores sexuais tentam esconder o crime pelo qual estão sendo responsabilizados (Schwaebe, 2005). Essa situação foi observada durante a etnografia. Os participantes do grupo relataram que utilizam como estratégia de sobrevivência a esse espaço, a mentira sobre o crime praticado. Um dos ofensores relatou que "preferia responder por 10 homicídios do que por um crime desses".
Alguns dos homens ofensores sexuais, entretanto, acabaram sendo descobertos pelos outros presos que, então, cometeram violências físicas contra eles, mesmo que agentes penitenciários tenham tentado isolá-los para garantir sua vida e integridade física. Nesse caso, os agentes penitenciários protegeram, mas também praticaram violência física contra eles. Durante o encontro cujo tema foi estigmas de ser um ofensor sexual, um dos participantes relatou: "o que eu levei de tapa na cabeça de agente penitenciário…", demonstrando que sofreu diversas vezes violência física e institucional perpetrada por esses agentes em decorrência desse estigma.
Assim, observa-se que, na história de vida dos homens acusados de cometer uma ofensa sexual, o sofrimento também está presente na adultez, durante o período prisional. Nessa categoria, o sofrimento está, principalmente, relacionado com a experiência prisional, evento que proporciona sofrimentos decorrentes de violências físicas e institucionais que são impostas a todos os presos brasileiros.
Sofrimentos Após o Cumprimento da Medida Judicial
O sofrimento na adultez continua ao sair da prisão: os homens ofensores sexuais carregarão dois estigmas. O primeiro, por serem expresidiários e, o segundo, por serem ofensores sexuais de crianças / adolescentes. Os ofensores sexuais são os que sofrem uma estigmatização mais severa em comparação com pessoas que responderam por outros crimes (Cubellis, Evans, & Fera, 2019). Os participantes sabem que, ao sair da cadeia, o estigma de ser um ofensor sexual permanecerá e entendem que "a gente sempre vai ser julgado".
A literatura internacional aponta que esse estigma está entranhado na identidade do homem acusado de cometer uma ofensa sexual e, como consequência, esse homem terá vergonha e medo (Bowden et al., 2017). De fato, vergonha e medo foram os sentimentos mais presentes durante as intervenções psicossociais, mas, além delas, apareceram também, durante os encontros do grupo, raiva, tristeza e culpa decorrentes desse estigma. O medo está relacionado com a volta ao sistema penitenciário e está dirigido tanto a mulheres quanto a crianças, como fica explícito nas falas: "tô com o maior medo do mundo de crianças" e "tô com medo de mulher". Já a vergonha apareceu paralelamente à culpa, como pode ser observado nas falas: "é doloroso, é constrangedor" e "se livrar da culpa não é fácil". O medo e a vergonha prejudicam a autoestima e podem se tornar barreiras para o engajamento em programas de tratamento voltados para eles, O trabalho clínico com esses sentimentos pode promover comportamentos e emoções mais adaptadas à atualidade (Bowden et al., 2017).
O estigma terá impacto não só sobre a subjetividade desses homens, mas também no seu convívio social. Cubellis et al. (2019) apontam que o sentimento da sociedade em relação a eles é de medo e raiva tão intensos que se expressam em desejo de atacar e, até mesmo, matá-los. Livramento & Rosa (2016, p. 413) falam em processo de "mortificação do eu", que são os efeitos nocivos sobre as relações afetivas em decorrência do período dentro do sistema penal, tanto nas relações intraprisão como extraprisão. Esses estigmas dificultam que os homens acusados de cometer uma ofensa sexual consigam voltar ao mercado de trabalho (Cubellis, Walfield, & Harris, 2018). Segundo os participantes de grupo, "o emprego é a principal [dificuldade]".
A família e as outras relações afetivas também são prejudicadas em decorrência do estigma de ser um ofensor sexual. Nesse sentido, um dos participantes disse que "as pessoas querem ficar longe, se afastar de você". Compreende-se que o sofrimento na adultez em face das experiências vividas, diante das relações familiares, trazem muita vergonha e isolamento: "a família é o pior de tudo". Embora reconheçam que "a maior ajuda é a família" e que "minha família é minha luz", ou seja, a família é uma fonte de apoio, os participantes sentem "vergonha da família", em especial da companheira, pois ofender sexualmente uma criança ou adolescente "vai causar sofrimento na família". Eles demonstraram sofrimento e sentimento de perda em relação ao afeto familiar, o que fica evidente no relato: "fico triste né? Família é muito importante e a gente só dá valor depois que perde". Esse é um ponto sensível, uma vez que o sentimento de pertencimento a um grupo está relacionado com a reflexão sobre o cometimento da ofensa sexual (Farmer, Beech, & Ward, 2011). Entende-se que a vergonha sentida pode inverter os papéis familiares, pois coloca o ofensor sexual em situação de submissão em relação aos outros membros dentro da hierarquia familiar.
O contexto familiar, em relação ao social, tende a ser o que dá mais suporte a esses homens depois que saem da prisão. Apesar de necessitarem de suporte emocional e material, o suporte disponível é basicamente material, ou seja, local de moradia, comida, contatos de possíveis trabalhos, entre outros. Em outros casos, nem isso está disponível, ou seja, a família pode também isolar e afastar o homem denunciado (Kras, 2018). Assim, destaca-se que a família dos homens acusados de cometer uma ofensa sexual desempenha um papel ambíguo, uma vez que é apoio, mas também cobrança e motivo de vergonha.
Pesquisa com mulheres em um sistema prisional fechado brasileiro (Patricio & Cascaes, 2018) evidenciou que o suporte da família é fundamental para a estabilidade afetiva da apenada, bem como para a manutenção de empatia e de sentimentos positivos para com outras pessoas. A retomada de vida após a prisão do ofensor sexual caminha nesse sentido, visto que seu sofrimento está ligado a sentimentos de desamparo e solidão: "escolhi a máscara de monstro, porque as pessoas querem se afastar de mim".
O suporte familiar, entretanto, não é suficiente para que esse homem supere as dores do estigma social, necessitando também de suporte da rede de amigos (Kras, 2018). Mas a rede de amigos desses homens também é afetada pelo estigma, resultando em várias perdas, rompimentos, afastamentos e abandono. Um dos relatos dos participantes ilustra esse sofrimento: "eu tinha um amigo que era como um irmão. Quando eu saí da cadeia, ele ficou estranho comigo". Assim, o sofrimento ao sair do sistema penitenciário está muito relacionado aos estigmas que esse homem carrega, sendo que saem do sistema de justiça, mas permanecem vinculados ao sistema. Esses estigmas causam dificuldades na reinserção social, tanto em relação ao convívio na comunidade quanto em relação ao emprego. O maior dano do estigma será sobre as relações afetivas, causando perdas ou enfraquecimento dessas relações, pois implica em prejuízos na sua rede de apoio formada por amigos e familiares. A falta de rede de apoio e o isolamento social estão associados à reincidência na ofensa sexual e, portanto, esses aspectos clínicos também devem ser considerados alvos das intervenções (Marshall, 2001; Ward & Beech, 2016).
Considerações Finais
Este artigo teve como objetivo apontar para o sofrimento presente na história de vida do homem ofensor sexual apreendido por meio de uma etnografia. O artigo retomou a discussão acerca das violências sofridas enquanto crianças e adolescentes, já bem discutida na literatura (Eloir et al., 2019), e avançou na discussão para as violências e sofrimentos vivenciados na fase adulta, especificamente após a denúncia do ato sexual criminoso. Eloir et al. (2019) destacam que o entendimento da trajetória de vida do homem ofensor sexual e o estudo sobre o sofrimento pode aperfeiçoar as intervenções, ampliando a percepção dos profissionais sobre esses indivíduos.
O uso da etnografia como método de pesquisa no contexto da violência sexual surgiu como uma saída metodológica de investigação clínica, uma vez que o acesso a essa população é muito restrito. Apesar de ser um método clássico das ciências sociais, a etnografia se mostrou uma boa aliada para o estudo em psicologia, pois a etnografia também enfoca sobre o entendimento profundo do ser humano (Andrada, 2018; Geertz, 2008; Spradley, 1980). Além disso, mostrou-se adequada para o contexto deste estudo e proporcionou uma maior apreensão dos conteúdos observados.
Em relação aos estigmas de ser um ofensor sexual, considera-se importante ampliar esse debate para os profissionais envolvidos na promoção de saúde pública para esse homem. Nesse sentido, Call (2018) aponta para a importância de estudos sobre a percepção dos profissionais de saúde que trabalham com ofensores sexuais, bem como de profissionais envolvidos na criação, aplicação e gestão de políticas públicas para ofensores sexuais. A etnografia realizada destaca que o sofrimento é um aspecto clínico importante para as políticas públicas de enfrentamento à violência sexual contra crianças e adolescentes e de promoção da saúde do homem autor de violência dentro da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem (Ministério da Saúde, 2009).
Entende-se que o oferecimento de saúde pública e tratamento não podem ser prejudicados por conflitos de interesse por parte dos profissionais envolvidos (Birgden & Ward, 2016). Destaca-se que o oferecimento de saúde para o homem ofensor sexual é, antes de tudo, questão de garantia de Direitos Humanos, uma vez que os atendimentos em contexto de saúde pública devem cumprir totalmente o princípio da universalidade (Ministério da Saúde, 2009). Ward (2010) entende que esse tipo de atendimento deve ser segundo a lógica da saúde e, portanto, os códigos da ética profissional devem ser observados. Nesse sentido, a partir do sofrimento apresentado tanto para a comunidade científica quanto para o contexto de saúde, este estudo pode contribuir para o desenvolvimento da humanização durante o atendimento clínico dos homens ofensores sexuais.
Naturalmente, existem limitações neste estudo. Uma é essencialmente o contexto de realização da pesquisa. O grupo da intervenção apresenta um clima de suspensão de informações. Sabe-se que os participantes escondem informações e evitam falar sobre qualquer aspecto que eles entendam que possa ser usado contra eles, fazendo-os voltar ao sistema de justiça. Considera-se que os participantes buscam dar informações que possam reafirmar sua inocência, desde o início até o fim dos contatos. De qualquer maneira, entende-se que, apesar dessa limitação, foi possível alcançar informações valiosas para a ampliação do conhecimento sobre o homem ofensor sexual e para o desenvolvimento e aperfeiçoamento de estratégias de intervenção.
Referências
American Psychiatric Association. (2013). Diagnostic and statistical manual of mental disorders (5th ed.). Arlington, VA: Associação Americana de Psiquiatria [ Links ]
Andrada, C. F. (2018). O método no centro: Relatos de campo de uma pesquisa psicossocial de perspectiva etnográfica. Psicologia USP, 29(2), 236-245. Link [ Links ]
Aslan, D., Edelmann, R., Bray, D., & Worrell, M. (2014). Entering the world of sex offenders: an exploration of offending behavior patterns of those with both internet and contact sex offences against Children. Journal of Forensic Practice, 16(2), 110-126. DOI: [ Links ]
Bailey, D. J. (2018). A life of grief: An exploration of disenfranchised grief in sex offender significant others. American Journal of Criminal Justice, 43(3), 641-667. DOI: 10.1007/s12103-017-9416-4 [ Links ]
Baltieri, D. A., & Boer, D. P. (2015). Two clusters of child molesters based on impulsiveness. Revista brasileira de psiquiatria, 37(2), 139-145. DOI: 10.1590/1516-4446-2014-1568 [ Links ]
Birgden, A., & Ward, T. (2016). Ethical sex offender treatment. In D. P. Boer (Ed), The Wiley Handbook on the Theories, Assessment and Treatment of Sexual Offending (pp.1523-1539). Canadá: Wiley. [ Links ]
Blom, H., Högberg, V., Olofsson, N., & Danilesson, I. (2014). Strong association between earlier abuse and revictimization in youth. BMC Public Health, 14, 715. DOI: 10.1186/1471-2458-14-715 [ Links ]
Bowden, L., Glorney, E., & Daniels, M. (2017). Individuals' experiences of sexual offending therapy in a forensic psychiatric setting. Journal of Sexual Aggression, 23(3), 278-290. DOI: 10.1080/13552600.2017.1343398 [ Links ]
Brasil. Câmara dos Deputados. (2008). Relatório Final da CPI do Sistema Carcerário julho de 2008. Link [ Links ]
Brasil. Ministério da Justiça e Segurança Pública. (2017). Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias. Link [ Links ]
Brasil. Ministério da Saúde. (2009). Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem: Princípios e diretrizes. Brasília: Ministério da Saúde. Link [ Links ]
Brasil. Ministério Público do Distrito Federal e Territórios. (2015). Violência sexual contra crianças e adolescentes: Identificação e enfrentamento. Link [ Links ]
Brasil. Secretaria de Direitos Humanos. (2013). Plano Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual Contra Crianças e Adolescentes. Link [ Links ]
Brasil. Secretaria de Vigilância em Saúde. (2018). Análise epidemiológica da violência sexual contra crianças e adolescentes no Brasil nos anos de 2011 a 2017. Boletim Epidemológico, 49(27). Link [ Links ]
Call, C. (2018). The collateral consequences of sex offender management policies: Views from professionals. International Journal of Offender Therapy and Comparative Criminology, 62(3), 676-696. DOI: 10.1177/0306624X16653978 [ Links ]
Carter, A. J., & Mann, R. E. (2017). The strengths of treatment for sexual offending. In D. R. Laws & W. O'Donohue (Eds.), Treatment of sex offenders: Strengths and weaknesses in assessment and intervention (pp. 157-174). Nova Iorque: Springer. [ Links ]
Christensen, L. (2017). Child sexual offenders: The psychology of offending. Em L Christensen, The Psychology of Criminal and Antisocial Behavior (pp. 439-458). Austrália: Academic Press. [ Links ]
Costa, L. F., & Penso, M. A. (2010). A dimensão clínica das intervenções psicossociais com adolescentes e famílias. Em M. M. Marra & L. F. Costa (Eds.), Temas da clínica do adolescente e da família (pp. 201-214). São Paulo: Ágora. [ Links ]
Creswell, J. W. (2016). Projeto de pesquisa: Métodos qualitativo, quantitativo e misto. Porto Alegre: Artmed. [ Links ]
Cubellis, M. A., Evans, D. N., & Fera, A. G. (2019). Sex offender stigma: An exploration of vigilantism against sex offenders. Deviant Behavior, 40(2), 225-239. DOI: 10.1080/01639625.2017.1420459 [ Links ]
Cubellis, M. A., Walfield, S. M., & Harris, A. J. (2018). Collateral consequences and effectiveness of sex offender registration and notification: Law enforcement perspectives. International Journal of Offender Therapy and Comparative Criminology, 62(4), 1080-1106. DOI: 10.1177/0306624X16667574 [ Links ]
DeCou, C. R., Cole, T. T., Rowland, S. E., Kaplan, S. P., & Lynch, S. M. (2015). An ecological process model of female sex offending: The role of victimization, psychological distress, and life stressors. Sexual Abuse, 27(3), 302-323. DOI: 10.1177/1079063214556359 [ Links ]
Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal Brasileiro. Link [ Links ]
Decreto-Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995. Juizados Especiais Cíveis e Criminais. Link [ Links ]
Eloir, J., Ducro, C., & Nandrino, J. L. (2019). Determining sexual offender profiles from life trajectories. Sexual Abuse, (0)0. DOI: 10.1177/1079063219828782 [ Links ]
Farmer, M., Beech, A. R., & Ward, T. (2011). Assessing desistance in child molesters: A qualitative analysis. Journal of Interpersonal Violence, 25, 930-950. DOI: 10.1177/0886260511423255 [ Links ]
Fonseca, M. C. F., Setubal, C. B., & Costa, L. F. (2019). Adulto autor de violência sexual: Um estudo exploratório de avaliação de risco de reincidência. Gerais: Revista Interinstitucional de Psicologia, 12(2), 389-409. [ Links ]
Geertz, C. A. (2008). A interpretação das culturas. Rio de janeiro: Livros Técnicos e Científicos Editora. [ Links ]
Gobo, G., & Marciniak, L. (2016). What is ethnography? In D. Silverman (Ed.), Qualitative Research (4a ed., pp 100 -151). Newcastle: SAGE. [ Links ]
Hammersley, M. (2018). What is ethnography? Can it survive? Should it? Ethnography and Education, 13(1), 1-17. DOI: 10.1080/17457823.2017.1298458 [ Links ]
Howitt, D. (2016). Qualitative research methods in psychology. Londres: Pearson Education. [ Links ]
Iribarrem, A. S. O. (2019). Justiça restaurativa e prisões: Sobre uma política pública de prevenção e de enfrentamento da violência institucional. RELACult-Revista Latino-Americana de Estudos em Cultura e Sociedade, 5(4),11-12. DOI: 10.23899/relacult.v5i4.1257 [ Links ]
Jerolmack, C., & Khan, S. (2018). Approaches to ethnography: Analysis and representation in participant observation. Oxford: Oxford University Press. [ Links ]
Kras, K. R. (2018). Can social support overcome the individual and structural challenges of being a sex offender? Assessing the social support-recidivism link. International Journal of Offender Therapy and Comparative Criminology, 63(1), 1-23. DOI: 10.1177/0306624x18784191 [ Links ]
Lima, F. C., & Schneider, D. R. (2018). Características da atuação do psicólogo na proteção social especial em Santa Catarina. Psicologia: Ciência e Profissão, 38(2), 347-362. Link [ Links ]
Livramento, A. M., & Rosa, E. M. (2016). Homens no cárcere: Estratégias de vida na prisão. Pesquisas e Práticas Psicossociais, 11(2), 412-420. Link [ Links ]
Lussier, P., & Cale, J., (2016). Understanding the origins and the development of rape and sexual aggression against women: Four generations of research and theorizing. Aggression and Violent Behavior 31, 66-81. DOI: 10.1016/j.avb.2016.07.008 [ Links ]
Marin, M. C. D., & Baltieri, D. A. (2013). Crimes sexuais e suas particularidades na avaliação de risco e no cumprimento da medida de segurança. In Q. Cordeiro & M. G. A. de Lima (Eds.), Medida de segurança: Uma questão de saúde e ética (pp. 157-178). São Paulo: CREMESP. [ Links ]
Marshall, W. L. (2001). Agresores sexuales. Barcelona: Ariel. [ Links ]
Marshall, W. L. (2018). A brief history of psychological theory, research, and treatment with adult male sex offenders. Current Psychiatry Reports, 20(8), 1-8. DOI: 10.1007/s11920-018-0920-0 [ Links ]
Marshall, W. L., Marshall, L. E., Serran, G. A., & Fernandez, Y. M. (2006). Treating sexual offenders: An integrated approach. New York: Routledge. [ Links ]
Mata, R. (1978). O ofício do etnólogo, ou como ter 'anthropological blues'. In O. E. Nunes (Ed.), A aventura sociológica: Objetividade, paixão, improviso e método na pesquisa social (pp. 23-35). Rio de Janeiro: Zahar. [ Links ]
Meneses, F. F. F., Stroher, L. M. C., Setubal, C. B., Wolff, L. S., & Costa, L. F. (2016). Intervenção psicossocial com o adulto autor de violência sexual intrafamiliar contra crianças e adolescentes. Contextos Clínicos, 91(1), 98-108. DOI: 10.4013/ctc.2016.91.08 [ Links ]
Nunes, E. O. (1978). A aventura sociológica: Objetividade, paixão, improviso e método na pesquisa social. Rio de Janeiro: Zahar. [ Links ]
Oliveira, C. B. F., Torres, E. N. S., & Torres, O. (2018). Vidas negras: Um panorama sobre os dados de encarceramento e homicídios de jovens negros no Brasil. Revista Trama Interdisciplinar, 9(1), 86-106. DOI: 10.5935/2177-5672/trama.v9n1p86-106 [ Links ]
Patricio, B. P., & Cascaes, N. (2018). O significado das visitas familiares para as detentas do presídio feminino de Tubarão SC. Trabalho de Conclusão de Curso, Bacharelado em Psicologia, Universidade do Sul de Santa Catarina, Floriamópolis, Brasil. Link [ Links ]
Penso, M. A., Conceição, M. I. G, Costa, L. F., Meneses, F. F. F., Stroher, L. M. C., Setubal, C. B., & Wolff, L. S. (2016). Perfil de ofensor sexual intrafamiliar adulto atendido em uma instituição de saúde. In L. F. Habigzang, L. C. A. Williams & P. I. C. Gomide (Eds), A outra face da violência: O agressor em múltiplos contextos (pp. 63-76). Curitiba: Juruá [ Links ].
Rehan, W., Antfolk, J., Johansson, A., & Santtila, P. (2019). Do single experiences of childhood abuse increase psychopathology symptoms in adulthood? Journal of Interpersonal Violence, 34(5), 1021-1038. DOI: 10.1177/0886260516647004 [ Links ]
Ribeiro, R. B., & Cordeiro, Q. (2018). Sex offenders: risk assessment, risk factors and treatment. Arquivos Médicos dos Hospitais e da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, 57(2), 74-80. Link [ Links ]
Schaefer, L. S., Brunnet, A. E., Lobo, B. D. O. M., Carvalho, J. C. N., & Kristensen, C. H. (2018). Indicadores psicológicos e comportamentais na perícia do abuso sexual infantil. Temas em Psicologia, 26(3), 1467-1482. DOI: 10.9788/TP2018.3-12Pt [ Links ]
Schmucker, M., & Lösel, F. (٢٠١٧). Sexual offender treatment for reducing recidivism among convicted sex. Campbell Systematic Reviews, 13(1), 1-75. DOI: 10.4073/csr.2017.8 [ Links ]
Schwaebe, C. (2005). Learning to pass: Sex offenders' strategies for establishing a viable dentity in the prison general population. International Journal of Offender Therapy and Comparative Criminology, 49, 614-625. DOI: 10.1177/0306624X05275829 [ Links ]
Seto, M. C. (2012). Is pedophilia a sexual orientation? Archives of sexual behavior, 41(1), 231-236. DOI: 10.1007/s10508-011-9882-6 [ Links ]
Seto, M. C. (2018). Pedophilia and sexual offending against children (2nd edition). Washington, DC: Associação Americana de Psicologia [ Links ]
Souza, B. C., & Ferreira, G. G. (2016). Execução penal e população de travestis e mulheres transexuais: O caso do presidio de Porto Alegre. Cadernos de Gênero e Diversidade, 2(1), 26-35. Link [ Links ]
Souza, I. A., & Berlini, L. F. (2018). Autoridade parental e Lei da Palmada. Revista Brasileira de Direito Civil - RBDCivil, 17, 65-81. Link [ Links ]
Spradley, J. P. (1980). Participant observation. Nova Iorque: Holt, Rinehart and Winston Editora. [ Links ]
Tyler, I., & Slater, T. (2018). Rethinking the sociology of stigma. The Sociological Review, 66(4), 721-743. DOI: 10.1177/0038026118777425 [ Links ]
Valença, A. M., Meyer, L. F., Freire, R., Mendlowicz, M. V., & Nardi, A. E. (2015). A forensic-psychiatric study of sexual offenders in Rio de Janeiro, Brazil. Journal of forensic and legal medicine, 31, 23-28. DOI: 10.1016/j.jflm.2015.01.003 [ Links ]
Wacquant, L. (2001). As Prisões da Miséria. Rio de Janeiro: Zahar. [ Links ]
Ward, T. (2010). Punishment or therapy? The ethics of sexual offending treatment. Journal of Sexual Aggression, ١٦(3), 286-295. DOI: 10.1080/13552600.2010.483822 [ Links ]
Ward, T., & Beech, A. R. (2016). The integrated theory of sexual offending - Revised. In D. P. Boer (Ed.), The Wiley Handbook on the Theories, Assessment and Treatment of Sexual Offending (pp. 123-137). Hoboken: John Wiley & Sons. [ Links ]
Wolff, L. D. S., Oliveira, E. S. D., Marra, M. M., & Costa, L. F. (2016). O recurso psicodramático na intervenção com o adulto autor de ofensa sexual. Revista Brasileira de Psicodrama, 24(2), 58-68. DOI: 10.15329/2318-0498.20160020 [ Links ]
World Health Organization. (2017). Responding to children and adolescents who have been sexually abused: WHO clinical guidelines. Link [ Links ]
Yoder, J., Dillard, R., & Leibowitz, G. S. (2018). Family experiences and sexual victimization histories: a comparative analysis between youth sexual and nonsexual offenders. International journal of offender therapy and comparative criminology, 62(10), 2917-2936. DOI: 10.1177/0306624X17738063 [ Links ]
Endereço para correspondência:
Raiane Nunes Nogueira
E-mail: rai.nnogueira@gmail.com
Liana Fortunato Costa
E-mail: lianaf@terra.com.br
Cássia de Freitas Teixeira Passarela
E-mail: cassia.passarela@yahoo.com.br
Cássio Bravin Setúbal
E-mail: cassiosetubal@yahoo.com.br
Recebido em: 11/07/2019
Revisado em: 06/11/2019
Aceito em: 13/12/2019
Publicado online: 12/03/2020