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Print version ISSN 2359-0769On-line version ISSN 2359-0777
Rev. Subj. vol.21 no.3 Fortaleza sept./Dec. 2021
https://doi.org/10.5020/23590777.rs.v21i3.e10830
ESTUDOS TEÓRICOS
Travessias artísticas de ai weiwei: um olhar psicanalítico sobre o sujeito, o tempo e o estrangeiro na obra lei da jornada
Ai Weiwei's Artistic Crossings: A Psychoanalytical Look at the Subject, Time and the Foreigner in Lei da Jornada
Travesías Artísticas de Ai Weiwei: Una Mirada Psicoanalítica sobre el Sujeto, el Tiempo y el Extranjero en la Obra Ley de la Jornada
Traversées Artistiques chez Ai Weiwei: Une Perspective Psychanalytique sur le Sujet, le Temps et l'Étranger dans l'Œuvre "Loi du Voyage"
Lucas de Oliveira AlvesI; Ana Lúcia Mandelli de MarsillacII
IPsicólogo, Psicanalista. Doutorando no PPG em Psicologia Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)
IIPsicóloga, Psicanalista, Pós-doutora pela Universidade Nova de Lisboa. Dra. Artes Visuais - História, teoria e crítica Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Professora Adjunta do Departamento de Psicologia da UFSC. Professora do PPG em Psicologia UFSC
RESUMO
Esse artigo analisa a obra Lei da jornada (Law of the journey) do artista contemporâneo Ai Weiwei. Para isso, utiliza-se o método psicanalítico da atenção flutuante de modo a investigar a obra como uma formação do inconsciente, sintoma de um tempo que interroga contextos e obras que extrapolam as intencionalidades do artista. Perscruta-se a densidade da imagem e do universo simbólico que constitui a obra, operando com os conceitos freud-lacanianos de sujeito, estrangeiro e uma concepção híbrida de tempo. A reflexão desdobra-se em discussões sobre o unheimliche (infamiliar), o trauma e a diferença, buscando, no enlace com a obra, problematizar questões subjetivas, políticas e históricas tocantes às jornadas dos refugiados.
Palavras-chave: psicanálise; arte; sujeito; tempo; estrangeiro.
ABSTRACT
This article analyzes the work Law of the journey by contemporary artist Ai Weiwei. For this, the psychoanalytic method of floating attention is used to investigate the work as a formation of the unconscious, a symptom of a time that interrogates contexts and works that extrapolate the artist's intentions. The density of the image and the symbolic universe that constitutes the work is examined, operating with the Freud-Lacanian concepts of the subject, foreigner, and a hybrid concept of time. The reflection unfolds into discussions about the unheimliche (unfamiliar), trauma, and difference, seeking, in the link with the work, to problematize subjective, political, and historical issues concerning the refugees' journeys.
Keywords: psychoanalysis; art; subject; time; foreign.
RESUMEN
Este trabajo analiza la obra Ley de la Jornada (Law of the journey) del artista contemporáneo Ai Weiwei. Para eso, se utilizó el método psicoanalítico de la atención flotante de modo a investigar la obra como una formación del inconsciente, síntoma de un tiempo que cuestiona contextos y obras que extrapolan las intencionalidades del artista. Se escudriña la densidad de la imagen y del universo simbólico que constituye la obra, operando con los conceptos freud-lacanianos de sujeto, extranjero y una concepción híbrida de tiempo. La reflexión se desarrolla en discusiones sobre el unheimliche (no familiar), el trauma y la diferencia, buscando, en el enlace con la obra, problematizar cuestiones subjetivas, políticas e históricas referentes a las jornadas de los refugiados.
Palabras clave: psicoanálisis; arte; sujeto; tempo; extranjero.
RÉSUMÉ
Cet article analyse l'œuvre Loi du voyage (Loi du voyage) de l'artiste contemporain Ai Weiwei. Pour cela, la méthode psychanalytique de l'attention flottante a été utilisée afin d'enquêter sur l'œuvre en tant que formation de l'inconscient, symptôme d'un temps qui interroge des contextes et des œuvres qui dépassent les intentions de l'artiste. La densité de l'image et l'univers symbolique qui constituent l'œuvre sont examinés, en opérant avec les concepts freud-lacan de sujet, d'étranger et d'un concept hybride de temps. La réflexion se déroule sur le "unheimliche" (l'inconnu), le traumatisme et la différence. Notre objectif, en faisant le lien avec l'œuvre, est de problématiser les questions subjectives, politiques et historiques, concernant les voyages des réfugiés.
Mots-clés: psychanalyse; art; matière; temps; étranger.
Este artigo analisa a obra Lei da jornada (Law of the journey) produzida pelo artista contemporâneo Ai Weiwei em 2016. O processo criativo de Lei da jornada permeia as experiências do artista com refugiados, articulando-se às obras e contextos de sua história. Desde 2015, Ai Weiwei aborda a atual crise dos refugiados em sua arte e ativismo - processos indissociáveis em sua trajetória. Em suas criações, Ai Weiwei evidencia questões marcantes da condição humana: diferença, intolerância, esperança e o desejo de um lar.
Viajando por diferentes campos de refugiados pelo mundo, sobretudo na Europa e no Oriente Médio, locais onde a crise apresenta um caráter mais agudo devido à chegada de sírios fugidos da guerra em seu país, Ai Weiwei busca promover uma costura entre experiência, criação e crítica. Suas visitas aos campos foram retratadas em seu documentário Human Flow, lançado em 2017 - material fílmico que se enlaça a obra em análise por alguns elementos, ajudando-nos a refletir sobre suas dimensões, proposições e críticas. O título Lei da jornada referencia as análises que Walter Benjamin1 fez do pensamento de Franz Kafka2, questão a ser desdobrada posteriormente na análise (Artpil. 2017).
O método de leitura da obra tem como aporte a psicanálise. A análise e a discussão ocorrem por meio de uma escuta flutuante articulada a alguns conceitos norteadores. Partindo de uma concepção freud-lacaniana, segundo a qual, a presunção de um inconsciente dilui as fronteiras entre o subjetivo e o político, tecemos uma análise que atravessa a relação espectador-obra, sujeito-estrangeiro. A obra de Ai Weiwei instiga-nos a refletir sobre a estrangeiridade e, assim, buscamos na teoria psicanalítica conceitos que nos permitam delinear melhor o que viria a ser a função do estrangeiro. Das Unheimliche, o infamiliar e o inconsciente freudiano; bem como os registros da experiência permitem-nos articular a leitura da obra às questões interpostas pela psicanálise.
Assim, realizamos essas aproximações conceituais tomando a obra como um dispositivo promotor de estranhamentos e enlaçamentos. No esteio de uma leitura metapsicológica, analisamos a obra como uma formação do inconsciente, constituída por metáforas e metonímias (Lacan, 1999), amarrada entre os registros do imaginário, do simbólico e do Real3 (Lacan, 2007). Outrossim, guiando-nos por uma compreensão híbrida de tempo, delineada a partir de interlocuções e inflexões entre Freud e Benjamin, refletimos sobre as temporalidades históricas que os contextos de exposição da obra podem evocar, perpassando eventos traumáticos, de tempos e espaços distintos, que persistem sintomaticamente na cultura.
Os objetivos do artigo desenham-se da seguinte maneira: descrever questões do método psicanalítico no campo da arte; abordar o enlace entre psicanálise, arte e política no processo criativo da obra; e refletir sobre o sujeito, o tempo e a estrangeiridade a partir da obra Lei da jornada.
Aspectos Metodológicos da Jornada
O método de leitura das obras parte da premissa lacaniana (1995), de um inconsciente estruturado como uma linguagem. Inconsciente que nos habita à nossa revelia, constituindo-nos permanentemente como sujeitos do desejo. Como Lacan (1995) analisa:
O sujeito não é estruturado da mesma forma que o eu da experiência. O que se apresenta nele tem suas leis próprias. Suas formações não têm somente um estilo particular, mas uma estrutura particular. Essa estrutura, Freud aborda e demonstra no nível das neuroses, no nível dos sintomas, no nível dos sonhos, no nível dos atos falhos, no nível da tirada espirituosa [...]. (Lacan, 1995, p. 52)
Resgatando e articulando conceitos da metapsicologia freudiana, Lacan (1995) propõe pensar as quatro formações do inconsciente - sintomas, sonhos, atos falhos e chistes - como criações da linguagem estruturadas por metáforas e metonímias, termos da linguística equivalentes ao que Freud denominava condensação e deslocamento. Para os autores, essas manifestações são formadas por um compromisso entre inconsciente e consciente.
O sujeito na teoria lacaniana é fugaz, sem ontologia, permanentemente em constituição, como obra transitória e inacabada. Ele se apresenta conjugado às formações do inconsciente a partir de operações da linguagem, ou seja, entre um significante e outro, em encadeamentos metonímicos e metafóricos. O tesouro dos significantes é o Outro4, entidade simbólica manifesta de diferentes formas nas histórias individuais e na cultura, articulada às (im)possibilidades de gozo e ao enigma do desejo (Lacan, 1985).
"Com relação à cadeia significante inconsciente como constitutiva do sujeito que fala, o desejo se apresenta como tal numa posição que somente se pode conceber com base na metonímia determinada pela cadeia significante." (Lacan, 1992, p. 214). O desejo, enquanto algo permanentemente em formulação, pois articulado ao insolúvel enigma do desejo do Outro e à impossibilidade de um gozo pleno e satisfatório, permite a assunção do sujeito na cadeia significante. Desejo é propulsão a movimento na linguagem, e à linguagem, enquanto estrutura inconsciente que tece as relações intersubjetivas. Convoca à criação, institui a ficção de um eu da experiência que traça uma história por meio de imagens, palavras e sentidos.
Em diálogo com Didi-Huberman (2010, 2015) e com a Marsillac (2018), abordamos a obra de arte em analogia às formações do inconsciente. No sonho, assim como na obra, somos interpelados por desejos que se manifestam em imagens estruturadas por significantes. Palavras pictóricas que criam sentidos ambíguos e estranhezas. Por meio dos sintomas, em seu caráter repetitivo, somos propelidos a revisitar traumas e escutar não-ditos, palavras e imagens recalcadas que retornam em manifestações da cultura.
Didi-Huberman (2010, 2015) propõe a leitura da imagem da obra de arte de modo anacrônico, em um método que exclui a premissa da temporalidade linear, buscando investigar as visualidades e sentidos de outros períodos presentes na obra. Sua leitura, articulada a alguns preceitos psicanalíticos, sobretudo freudianos, propicia uma reflexão sobre a obra de arte como sintoma de um tempo, tendo em vista que a imagem demonstra, simultaneamente, elementos estéticos, poéticos e políticos do tempo do artista, assim como aquilo que resta de histórias e experiências que o antecedem (universo simbólico do Outro).
Benjamin (1940/1987b) aponta que esse tempo se descortina como um tempo "saturado de agoras", em permanente interlocução com os acontecimentos do passado. A obra, compromisso entre consciente e inconsciente, que como o sintoma, vela e revela o recalcado e o desejo, extrapola a intencionalidade do artista, visibilizando elementos obscuros em tempos heterogêneos. O sintoma do tempo presente na obra, assim como o sujeito do inconsciente que subjaz nela, demanda uma escuta que aproximamos à escuta flutuante, tendo em vista que ela não busca ordenar fatos, mas atentar ao que se destaca, àquilo que ressoa como enigma, como um fragmento de múltiplas temporalidades.
Freud (1912/1996a) advoga a favor de uma postura do analista que rompa com uma lógica factual e organizada linearmente. De modo complementar à associação livre, expressa ao paciente pelo icônico imperativo: "Fale o que lhe vier à cabeça!", Freud recomenda uma atenção parcialmente suspensa, visando ao estabelecimento de uma comunicação de "inconsciente para inconsciente". Ele fala em "cegar-se artificialmente para poder ver melhor", aproximando-nos do que comenta Agamben (2009, pp. 62-63), na linha de Benjamin, ao discorrer sobre o contemporâneo - posição necessária para enxergarmos os anacronismos: "[...] contemporâneo é aquele que mantém fixo o olhar no seu tempo, para nele perceber não as luzes, mas o escuro. Todos os tempos são, para quem deles experimenta contemporaneidade, obscuros".
A recomendação técnica de Freud dirige-se ao contexto da clínica, onde entre quatro paredes, um analisando fala de seus sonhos, sintomas e comete atos falhos. No entanto, tomá-la em uma perspectiva estritamente clínica (relação analista-analisando), escamotearia o trabalho de leitura da cultura empreendido pelo autor, dirigido, por exemplo, a fenômenos políticos, obras de arte e comportamentos grupais. A psicanálise nos indica uma relação inextrincável entre o humano e a cultura, pelas formações do inconsciente, rompendo barreiras artificiais entre o individual e o social, dentro e fora, operando por limiares e torções.
Nos ensinos lacanianos, a fita de Moebius, figura topológica caracterizada por uma torção que indefine dentro e fora, torna-se essencial para a psicanálise. A lógica espacial dessa fita permite olhar os aspectos inconscientes que atravessam os paradoxos do indivíduo-coletivo, bem como a interpenetração da psicanálise a campos outros, como o da arte e da política (Marsillac, 2018). Dentro dessa perspectiva, propomos analisar as obras de arte, formações do inconsciente que enlaçam o singular e o coletivo em temporalidades heterogêneas, por meio da atenção flutuante. Outrossim, ressaltamos que ante à obra, analisada como uma materialidade que nos permite escutar o sujeito do inconsciente, somos convocados também a entrar em associação livre. Na posição de psicanalistas pesquisadores no campo das criações artísticas, as funções de analista e analisando podem ser instauradas em uma mescla incomum aos parâmetros do setting (configuração, arranjo ou espaço) estritamente clínico. No contato com a obra de arte, interrogamos/escutamos e somos interrogados/escutados, interpelados em nossa posição singular de sujeitos.
Aproximar a obra de arte ao sintoma implica uma análise dos registros que por ela são sustentados na amarração borromeana: imaginário, simbólico e Real. Lacan (2007) comenta que a invenção é uma resposta sintomática ao que se impõe, indicando que o ato criativo sustenta os três registros. O Real, registro do impossível, do impensável e do sem sentido, ex-iste e con-siste aos outros dois registros, permitindo sua articulação. O simbólico, universo da linguagem, está ligado a alguma coisa que no Real faz furo, abrindo sentidos a partir do sem-sentido (ex-nihilo). O imaginário assegura a consistência e porta uma inquietante estranheza, características que podemos aproximar ao que Rivera (2018, p. 52) expressa pelos termos imagem-muro e imagem-furo: "A imagem é obstáculo, é véu sobre a trama, e podemos chamá-la, nessa vertente, de imagem-muro. Mas por entre sua trama, em suas lacunas, encontra-se, in-visível, um acontecimento terrível - em sua vertente, digamos, de imagem-furo.".
A imagem não fecha sentidos, mas seu enlace com o discurso. A linguagem, que é a estrutura, lhe provoca rasuras, abre sentidos, permitindo-nos acessar cenas para além de sua fronteira. Ela fracassa em portar uma significação plena e totalizante, pois é, paradoxalmente, familiar e estranha. De acordo com Didi-Huberman (2010) a imagem interpela, promove jogo de dubiedades e ressignificações permanentes.
Elencados os aspectos teóricos do método, ressaltamos que os dados coletados para análise estão presentes em materiais já produzidos sobre o artista e sua obra, como livros, reportagens, críticas, análises, além daquilo que o próprio autor comenta sobre sua criação - experiências e questões que a atravessam - em entrevistas, declarações e exposições.
Considerando que a análise desse artigo se estrutura pelo método psicanalítico, cuja premissa é de uma experiência singular, transferencial, pautada no inconsciente -transindividual e político, como ressalta Lacan (2008) - e sem vistas à neutralidade da relação sujeito-objeto, ressaltamos que previamente à escrita, um contato corporal com a obra em análise foi realizado no período em que a mesma encontrava-se exposta, em 2019, no Museu Oscar Niemeyer - Curitiba. Defendemos que esse encontro material e afetivo, no Real do corpo, sem o qual não há subjetividade e política (Safatle, 2018), enseja uma experiência mais complexa, promotora de aberturas e reflexões outras, que no diálogo com a teoria e com o material coletado, propicia uma análise mais próxima aos princípios da psicanálise.
Travessias Artísticas de Ai Weiwei
A jornada de Ai Weiwei é permeada por uma inextrincável relação entre arte e política. Seu pai era um poeta politicamente engajado, perseguido e enviado para campos de trabalhos forçados na era maoísta5. O artista recorda de uma cena que marcou esse período: os livros de poesia de seu pai sendo queimados para evitar que a família sofresse mais punições por parte do Exército Vermelho da Revolução Cultural. Esse acontecimento relaciona-se diretamente com uma obra produzida pelo artista entre 2008 e 2012: Reto (Straight), exposta em alguns museus pelo mundo. No ano de 2008, um terremoto em Sichuan (China) destruiu vários prédios, dentre eles uma escola onde várias crianças morreram soterradas. Chamou a atenção do artista que vários prédios na região sofreram poucos danos, levando-o a investigar as razões. O artista verificou que o material utilizado na construção da escola era de baixa qualidade e passou a denunciar o governo chinês em suas redes sociais por se eximir da responsabilidade. Concomitantemente, o artista contrata um coletivo para retirar as vigas de ferro retorcidas do local e colocá-las em sua forma original, ação que remete à sua infância, como se ele estivesse des-queimando os livros de seu pai (Dantas, 2018).
Após passar a infância e a adolescência exilado com sua família, Ai Weiwei se muda para Pequim, mora alguns anos nos Estados Unidos e nos anos 90 retorna ao seu país, agora mais aberto à diversidade artística. Contudo, mesmo em um contexto menos repressor, o tom político de suas criações, especialmente após a obra Reto e a intensificação de suas críticas nas redes sociais, o artista continua a enfrentar situações delicadas com as autoridades. Em 2011, acusado de evasão fiscal, o artista sofre prisão domiciliar por 81 dias e tem seu passaporte aprendido por quatro anos (Dantas, 2018).
Em 2015, após recuperar seu passaporte, o artista viaja para a ilha de Lesbos, na Grécia, porta de entrada para milhares de refugiados que chegam à Europa. Suas experiências no local mobilizaram o desejo de se dedicar à crise dos refugiados. Ele viajou para 40 campos de refugiados, em 23 países. Jornada que culminou no documentário Human Flow (2017). No período em que produziu o documentário, Ai Weiwei criou diversas obras relativas aos refugiados, dentre elas: Lei da jornada, um bote inflável com figuras também infláveis, sem rosto, todo o material na cor preta, realizado em três protótipos, o maior medindo 70 metros de extensão. A obra foi exposta primeiramente Galeria Nacional de Praga, em 2017, local que deportava judeus do leste europeu para campos de concentração nazistas durante a Segunda Guerra. A escultura, em sua camada imediata, representa a travessia dos refugiados da Turquia à Grécia, cena frequente que o artista pôde presenciar em sua primeira visita a um campo de refugiados (Artpil. 2017; GQ, 2017).
As alegorias e referências de Lei da jornada são variadas e ampliam-se a cada nova exposição, dialogando com elementos do espaço onde se insere. A exposição em Praga propicia interlocuções entre as duas maiores crises de refugiados da história - a provocada pela ascensão dos regimes totalitários nos anos 1930, Segunda Guerra e a da atualidade - fazendo alusão a jornadas e medidas biopolíticas que se repetem. O universo simbólico das obras de Ai Weiwei é atravessado pelo pensamento de Hannah Arendt6, Kafka e Benjamin, teóricos da modernidade que o artista cita em entrevistas e exposições. O título Lei da jornada referencia o texto de Benjamin: Franz Kafka. A propósito do décimo aniversário de sua morte (1934/1987a).
Ai Weiwei declara que sempre foi visto como um estrangeiro, mesmo em seu país, de modo que ser dissidente em um regime autoritário é ser o outro, o indesejado. Nos EUA e, agora, em Berlim, ele foi e permanece sendo legalmente um estrangeiro (Dantas, 2018; Velasco, 2017). A reflexão do artista revela o olhar de um Outro que nos posiciona no campo político, enfatizando que a crise dos refugiados, atravessada pelas marcas da estrangeiridade, é fundamentalmente uma crise humanitária.
Forte influência nas obras de Ai Weiwei, o artista dadaísta Duchamp engendra a noção de coeficiente artístico, lógica dos processos de criação que apontam uma diferença entre intenção e realização. Entre esses dois tempos do ato, intenção e realização, inserem-se campos contingenciais, hiâncias em dinâmicas intersubjetivas que envolvem o artista, seus pares e o público (Marsillac, 2018). A obra de arte excede as intencionalidades do autor, é abarcada por um universo simbólico que o precede e constitui - campo do Outro que serve de anteparo para seu desejo e ato.
Ai Weiwei declara que suas obras são ready-mades7 (Dantas, 2018). Lei da jornada, por exemplo, foi fabricada com PVC reforçado, mesmo material utilizado em vários botes de refugiados que chegam à Europa (Dantas, 2018). Partindo da proposta de Duchamp, refletimos sobre como o siginificante made joga com uma ideia de temporalidade e inacabamento da obra. O made (feito) remete a algo que possui uma história concluída, mas que o gesto do artista, ao promover um deslocamento, lança em uma nova experiência de constituição, mostrando que os efeitos do objeto permanecem, reverberam após a intencionalidade do acabamento. Deslocamentos (metonímias) que se condensam (metaforizam) - pois são necessárias duas metonímias para produzir uma metáfora (Lacan, 1999). No gesto do artista, os primeiros deslocamentos. Nos enlaces entre obra e público, deslocamentos posteriores e condensações.
Partindo dessas discussões, refletimos sobre Lei da jornada como uma criação que evoca múltiplos períodos, visibilizando jornadas que se repetem na história. Aproximamos a obra - formação do inconsciente, sintoma de um tempo - das noções psicanalíticas de sujeito e estrangeiro, de modo a refletirmos sobre o enlace que ela faz com o público, assim como questões e agenciamentos políticos que ela engendra no tocante à crise dos refugiados.
O Sujeito, o Tempo e o Estrangeiro: Reflexões Preliminares sobre Lei da jornada
Como ponto de partida para a discussão, analisamos os significantes do título da obra, o qual, como já mencionado, referencia a análise que Benjamin faz das obras de Kafka. Nas obras do Kafka, somos confrontados com uma lei intransponível e paradoxal. Suas personagens precisam, recorrentemente, encarar burocracias e hierarquias de modo a descobrirem a razão de sua culpa. Na leitura de Benjamin (1934/1987a), as contradições e a falta de sentido das jornadas e leis kafkianas são próprias da modernidade, mas nelas o autor encontra um sentido, a saber, que o sentido da lei não antecede a jornada, mas se escreve nela mesma. As personagens kafkianas, desse modo, falham em sua busca pela verdade porque a tomam como estabelecida em uma escritura que as precede.
A(s) jornada(s) que Ai Weiwei alegoriza em sua obra são realizadas por personagens que, assim como os kafkianos, não podem ser culpados/criminalizados por sua condição. Do mesmo modo, eles não podem olhar para trás em busca de uma lei - uma lei que dê sentido, por exemplo, à guerra e à fome que os forçaram à jornada do refúgio. A Lei da jornada é aquela em que, de maneira análoga ao que preconiza a psicanálise, o sentido se constrói em um a posteriori - não de modo a obliterar o passado, mas para nele encontrar centelhas de esperança para o futuro (Benjamin, 1940/1987b), elementos para a reconstrução de uma narrativa, uma lei que seja a lei do desejo permanentemente escrita.
A referida lei do desejo é a lei que permite a assunção do sujeito na cadeia significante. Ela se funda a partir de um significante primordial, inscrito no e pelo Outro: o significante nome-do-pai. Esse significante, primeiro de uma cadeia sem limites, exerce a função de uma lei interditora, escrita a partir da indicação de que há um Outro do Outro e que, portanto, a possibilidade de satisfação não se fecha em uma relação simbiótica, mas se abre em uma dimensão simbólica (Lacan, 1999). O nome-do-pai instaura uma jornada, Lei da jornada, que se dá entre deslocamentos (metonímias) e condensações (metáforas), constituindo o sujeito. Lei que é, paradoxalmente, sempre, a priori, mas cujos sentidos se constituem no a posteriori.
A obra Lei da jornada aponta caminhos, promove enlaces com o público, abrindo possibilidades de escrituras e encadeamentos significantes onde o sujeito se apresenta. Como destaca Rivera (2018), a arte contemporânea produz o sujeito na relação que se estabelece entre artista e espectador em um arranjo simbólico. Nesse arranjo, que se dá entre corpos, ações, lugares e disposições, o sujeito é convocado. De modo a adensarmos a discussão acerca das relações tecidas entre público, obra e artista, refletimos sobre o efeito do unheimliche.
O unheimliche, termo utilizado por Freud (1919/2019) para destacar o que é da ordem paradoxal do estranho familiar, sublinha uma fragilidade nas fronteiras do eu, mostrando que ela possui rachaduras, brechas. A imagem porta uma inquietante estranheza, pois assim como o outro pode refletir a imagem daquele que o olha, a verdadeira imagem refletida pode revelar uma alteridade, como quando Freud, após um solavanco do trem, depara-se com sua imagem refletida no espelho e não se reconhece.
Lei da jornada, como um todo, faz corpo e seus contornos emulam e refletem corpos. A dimensão especular permite ao espectador se ver na imagem do(s) outro(s) ali representado: os refugiados. Do mesmo modo, ele é olhado pelo que vê (Didi-Huberman, 2010), deparando-se com a irrevogável condição de sua própria imagem: estranha, inconstante, estrangeira.
Freud é enfático ao articular o efeito do unheimliche ao recalcamento. Ele afirma que o familiar torna-se estranho e o estranho familiar, pois a constituição do sujeito e daquilo que se enuncia como eu, se dá, sobretudo a partir de imagens e palavras que foram banidas da consciência, vindo a compor a ficção da identidade. Como sustenta Lacan, em diversos seminários, o sujeito é fugaz, emerge na cadeia significante sem se cristalizar, já o eu, se sustenta por seus contornos fixos, aquilo que é para si e para o outro. Esse eu, primordialmente eu corporal, entra em vertigem diante da imagem outra que toca no seu recalcado (Freud, 1923/1996c, 1919/2019). Diante da imagem dos refugiados sem rosto no bote, estamos diante de conteúdos que foram recalcados: a responsabilidade pela crise, a indiferença, a segregação. Estamos, também, diante de rostos que nos interrogam pela opacidade, dando a ver que o eu não é cristalino e não possui uma definição a priori.
A obra, desse modo, é imagem furada, convocando o sujeito em arranjos significantes. A imagem-furo (Rivera, 2018) é furo no espectador, na obra e no artista, assim como no tempo e no espaço que os aproximam. Como ressalta Didi-Huberman que (2015, p. 9): "diante da imagem, estamos sempre diante do tempo".
Temporalidades e Traumas em Lei da jornada: O que Resta?
Conjugação de palavras, corpos e tempos, Lei da jornada, em sua primeira exposição, ecoa críticas pujantes à modernidade - tempo que Kafka retratou e Benjamin descreveu como paradoxalmente arcaico e moderno, tempo da coexistência do mito e da ciência. A obra foi exposta na Galeria Nacional de Praga (República Tcheca), país que não possui políticas de facilitação para a entrada de refugiados na Europa. Além do flagrante contexto da atualidade, o local eleito nos transporta ao período da Segunda Guerra. O prédio, entre 1939 e 1941, era utilizado como local de deportação de judeus do país para campos de concentração de Terezín, na República Tcheca, local onde muitos foram mortos ou reencaminhados para campos de extermínio como Auschwitz, na Polônia (Artpil. 2017; GQ, 2017). O olhar contemporâneo do artista cria pontes entre as duas grandes crises de refugiados do último século, mostrando aquilo que se repete na história.
No sentido dessa discussão, Agamben (2008), em O que resta de Auschwitz comenta que o campo de concentração é o paradigma do estado de exceção como regra. Aqueles que seguiam as regras enunciadas, rapidamente adoeciam, transformavam-se no que Primo Levi, escritor e célebre sobrevivente de Auschwitz, denominava de mulçumano - ser em uma zona indefinida entre a vida e a morte, o humano e o inumano. O cotidiano do campo era marcado pela arbitrariedade da lei, portanto, buscar sua lógica, seu princípio, era tarefa que, como aquela empreendida no universo literário de Kafka, fracassava, na medida em que a busca era ausente de sentido como a própria lei.
O autor comenta que aquilo que o campo levou ao extremo: o estado de exceção como regra não cessou de ocorrer. Assim, nos espaços organizados para refugiados na Europa, o filósofo encontra a repetição desse paradigma (Agamben, 2008; Arroyo (2018). Bauman (1998) se aproxima dessa discussão, argumentando que a razão não anula o pensamento mítico, trazendo exemplos históricos como: a caça às bruxas no início da Idade Moderna, ou métodos científicos racistas como a frenologia e o darwinismo social coexistindo com ideias iluministas no século XIX. O Holocausto mescla um grande avanço tecnológico, atrelado a hierarquias e burocracias (temas kafkianos) bem definidas, a serviço de ideologias racistas e higienistas, alicerçadas no mito da superioridade e na aniquilação da diferença.
O que resta de Auschwitz toma formas outras nos campos de refugiados, agora controlados por antigas e novas tecnologias (muros, cercas, câmeras, armas, dispositivos móveis) e imperativos: não se trata primordialmente de expulsar, mas de não deixar entrar. Os campos de concentração restam nos campos de refugiados, calcificados em dicotomias: dentro e fora, cidadão e estrangeiro.
Bauman (1998, p. 151) comenta que: "A estrada para Auschwitz foi construída pelo ódio, mas pavimentada pela indiferença". O ódio é da diferença, pequena diferença como Freud (1921/1996b) sustenta em sua teoria do narcisismo das pequenas diferenças. A indiferença é a negação que desimplica. Ambas lançam para fora a estrangeiridade em fórmulas como: o outro é o problema ou o outro existe, mas eu finjo que não existe.
O que resta e persiste de Auschwitz, ponto culminante das contradições da Modernidade, localiza-se no registro do Real, ou seja, nos elementos não simbolizáveis do acontecimento. Agamben (2008) encontra no mulçumano a figura que se aproxima desse resto não simbolizável. Como ele relata: Um cinegrafista filmava um campo de concentração após a sua libertação. Ele passa horas filmando corpos empilhados, mas ao captar o mulçumano em sua câmera, ele a desvia, nos dando apenas um rápido vislumbre do Real desse corpo (morto) vivo.
O paradoxo do testemunho de Auschwitz é que não há palavras que abarquem a dimensão de sua experiência. O mulçumano, corpo que é testemunha do acontecimento, está tão próximo da morte, do Real, que não permite que o olhar do outro o apreenda em uma dimensão simbólica. Algo nessa figura não permite o retorno do olhar, pois nela, não há significante que faça furo no Real. Diante do mulçumano, figura que condensa o inominável de Auschwitz, o indizível impera.
Lacan (1999, p. 35) comenta que o simbólico vem dar: "sentido de profundidade àquilo que, no Real, não passa de pura opacidade". O Real do mulçumano não permite o olhar direto, pois a literalidade do horror que ele põe em cena obnubila a visão. Contudo, retroativamente, por meio de camadas simbólicas de tempos e materialidades outras, podemos nos aproximar dele. Os corpos no bote de Lei da jornada são opacos como o Real, núcleo traumático que promove repetições sintomáticas na história. O que resta de Auschwitz se inscreve novamente em corpos que não têm face, orifícios, pulsão, desejo. São apenas números e configuram estatísticas. Os refugiados e suas representações, imagens que tocam o Real, trazem elementos do mulçumano, mas não coincidem com eles (repetição na diferença), possibilitando-nos, dessa forma, revisitar a barbárie do Holocausto, abrindo a história pela linguagem.
A exposição em um antigo local de deportação é potente, pois insere o corpo do espectador no local da experiência. Safatle (2018) argumenta que não há política sem corpo. É necessário haver contato entre corpos, circulação de afetos e palavras para que experiências políticas ocorram. Lei da jornada na Galeria Nacional de Praga é, portanto, política, não só por denunciar a crise de refugiados na atualidade, mas por aproximar corpos em espaços e tempos imbricados, incitando o público a fazer circular na cultura palavras, imagens e afetos que permitam escutar e mobilizar as ruínas e fantasmas da paradoxal Modernidade, que de modo análogo aos traumas e fantasmas individuais, restam pulsando no tecido social, clamando por escuta e vias para elaboração. Conforme Rivera (2018) assinala acerca da temporalidade regida pelo inconsciente: "[...] sob o seu domínio o passado não ficou para trás, mas continua pulsando no presente, traçando narrativas futuras [...]. O passado lateja e demanda (re)construção, ele não cessa de retomar sentidos, retroativamente, e de apontar sua seta para o futuro" (p. 303).
Quem já visitou um campo de concentração ou espaços interligados a ele, sabe que se deixar afetar pelo que resta desse passado no agora, no Real da carne, ultrapassa certo limiar do enquadramento estético. O documentário Shoah (1985) de Claude Lanzmann, por exemplo, busca abrir mão de reencenações, trilha sonora e análises de especialistas, para tentar, apenas por meio de relatos e filmagens atuais dos campos de concentração, aproximar o espectador do indizível que subjaz à experiência, bem como da tentativa, impossível, mas absolutamente necessária, de dar um testemunho.
Nesse sentido, Sousa (2013, p. 391) enfatiza: "Há uma literalidade do trauma que pode nos deixar reduzidos à mínima significação ou até mesmo à ausência de significação" e, adiante, complementa: "Há, contudo, outro literal que é como uma espécie de retorno possível à cena traumática, lembrando o que Claude Lanzmann no seu filme Shoah nomeia como certa obscenidade do entendimento que aniquila a complexidade do fenômeno". Assim como a psicanálise, a arte, em seus diferentes arranjos, busca transmitir o incomunicável, semear palavras no deserto do indizível. Em imagens e palavras, a obra nos aproxima do traumático, daquilo que talvez o olhar não possa suportar em sua literalidade, pois, ainda, como Sousa (2013, p. 390) ressalta: "A literalidade do acontecimento pode ser luminosa, mas também pode cegar".
Arendt (1943/2013), em sua condição de judia refugiada nos EUA no período da Segunda Guerra, logo uma sobrevivente do Shoah, escreve uma carta/texto intitulada Nós, os refugiados. Nela, a autora discorre sobre problemáticas como a estrangeiridade que marca a história dos judeus, as perdas implicadas no refúgio e suas reverberações na linguagem. Arendt (1943/2013), p. 8) assevera: "Perdemos a nossa língua, o que significa a naturalidade das reações, a simplicidade dos gestos, a expressão impassível dos sentimentos". Esse trecho aborda a dimensão do trauma, do que inviabiliza a naturalidade de palavras e gestos. Se nas figuras opacas em Lei da jornada não se entrevê uma boca, estamos então na direção da resistência da linguagem salientada por Arendt. Trata-se da falta de palavras, do silêncio, sendo o espectador aquele a emprestar palavras ou oferecer um novo lar à obra, imersa em sua enigmática opacidade. Como salienta Rivera (2018, p. 365): "o espectador, diante da obra, 'cria o espaço' de existência de tais objetos encarregados de passar algo incomunicável".
No Brasil, Lei da jornada marcou presença em quatro cidades nas exposições intituladas Ai Weiwei Raiz. Em nosso país, a obra tem o potencial de evocar imagens que constituem a história brasileira de travessias transatlânticas, da comunhão entre cultura e barbárie que reatualizam nossos traumas e sustentam nossos sintomas sociais como o genocídio dos povos originários, a escravidão, as ditaduras e a persistente e obscena desigualdade social. As cores escuras dos bonecos infláveis nos provocam a refletir sobre os africanos trazidos do além-mar na condição de escravos. Pessoas que em suas travessias marítimas forçadas, assim como os refugiados na atualidade, encontraram sofrimentos, traumas e morte.
Segregação, silenciamento e invisibilidades marcam a trajetória de negros e negras no Brasil. A imagem de Anastácia (uma suposta descendente da realeza africana escravizada) com a máscara do silenciamento - pedaço de metal colocado na boca dos escravizados com o intuito de impedi-los de comer os alimentos que plantavam e colhiam para seus senhores, nas plantações de cana de açúcar e café - é simbólica ao retratar a violência à qual pessoas negras foram e continuam sendo submetidas, mesmo após mais de cem anos da abolição da escravidão (Kilomba, 2019). A máscara, dispositivo silenciador, marca indelével de um trauma histórico, resta produzindo efeitos de dominação e desigualdade; efeitos que encontram ancoragem no discurso racista, naturalizado durante séculos na história da colonização brasileira e ainda fortemente arraigado em nossa cultura (Alves, Bloss, & Marsillac, 2020).
Em seu livro sobre o estatuto político e psicanalítico do estrangeiro, Koltai, (2000) aponta o racismo como sintoma, desdobramento discursivo de uma posição defensiva diante do enigma do outro/Outro. Esse outro, estrangeiro de outro país, sexo, religião, é aquele que goza de uma maneira diferente, interrogando nosso próprio gozo.
A dificuldade de responder às questões que o gozo coloca ao humano na Modernidade intensifica os processos de segregação. A homogeneidade proposta pelo discurso liberal e igualitário de que "somos todos iguais", paradoxalmente culmina em uma intolerância extrema a todo aquele que porta uma suposta diferença, levando a processos de dominação e extermínio. Não por acaso, o século 20, século do suposto amadurecimento dos ideais iluministas, foi também o responsável pelos maiores genocídios da história da humanidade (Bauman, 1998; Koltai, 2000).
Žižek (2008) comenta, no esteio de Benjamin, que as maiores realizações da cultura ocidental escondem práticas de racismo e genocídio. O outro, esse estrangeiro que incomoda e precisa ser subjugado, controlado, escravizado ou, na radicalidade absoluta, eliminado "[...] parece manter uma relação privilegiada com o objeto - o outro possui o objeto-tesouro que furtou de nós (e é por isso que não o temos) ou representa uma ameaça à nossa posse do objeto" (Žižek, 2008, p. 396). De maneira similar ao que sustenta Koltai (2000), o autor aponta que o que verdadeiramente incomoda (na lógica do funcionamento inconsciente) na presença do estrangeiro não são as perturbações sociais e econômicas que ela provoca (por exemplo: o refugiado vai roubar empregos ou trazer violência), mas a dinâmica sustentada na crença de que o outro goza com o objeto, e que se ele goza, meu gozo se torna insuficiente ou inviável.
Refugiados na atualidade, Shoah, colonialismo escravagista. O que esses tempos têm em comum? Apontamos como resposta possível uma específica relação com a diferença, calcada imaginariamente na constância de um eu (branco, ariano, cidadão etc.), com anteparo no simbólico (os discursos que buscam dar sustentação ao imaginário) e como resposta ao Real (o impossível e o imponderável interpostos pelo gozo). Essas temporalidades intercruzadas, com seus traumas e sintomas, permitem escutar os ditos e os não-ditos que se repetem sob novas roupagens, possibilitando-nos furar os muros totalizantes que emudecem e invisibilizam determinados grupos.
Constelação de Obras
Aproximando os conceitos benjamininos de aura e imagem dialética, Didi-Huberman (2010) propõe secularizar a aura, defendendo que ela não é um conceito ambíguo, mas dialético, ou seja, a aura como distância desdobrada, conjugação do perto e do distante. O objeto aurático é aquele que contém algo para além de sua visibilidade, abrindo uma constelação de imagens.
Refletindo sobre a constelação de imagens que Lei da jornada abre, podemos nos aproximar de obras que, do mesmo modo, interrogam-nos e nos alertam para a urgência da atual crise dos refugiados. Nessa constelação, destacamos o documentário alemão Human Flow (2017) dirigido por Ai Weiwei e as obras Lampedusa (2015) e Balsa de Lampedusa (2016), respectivamente de Vik Muniz e de Jason de Caires Taylor.
Human Flow começa com um plano no mar aberto. Na sequência, um bote com refugiados é enquadrado do alto, evidenciando sua fragilidade e pequeneza no vasto oceano. Após essa tomada, a câmera foca em um pequeno farol, cuja luz pisca em intervalos ritmados. Todas essas sequências ocorrem durante o dia.
Adiante, em outra cena, há um farol que pisca na escuridão da noite. A narrativa informa que estamos na ilha de Lesbos, na Grécia, porta de entrada para milhares de refugiados que atravessam o mar Mediterrâneo saindo da Turquia (travessia que Ai Weiwei acompanhou em sua primeira visita a um campo e inspirou Lei da jornada). A escuridão deixa o bote, e os corpos que abarca, negros como a noite. O mar, o bote e as pessoas parecem ser feitos do mesmo material, em uma amálgama semelhante à Lei da jornada. A luz do farol, lentamente, passa a dar contornos, feições e movimentos para os corpos que chegam à praia. O farol parteja a imagem dos corpos, bem como suas subjetividades e desejos plurais.
O mar é quase uma personagem no documentário. Sua presença imponente porta paradoxos, pois para aqueles que fogem de seus países e precisam atravessá-lo, ele pode ser tanto uma passagem de esperança, quanto um túmulo. Para os que ficam, ele é mítico, pois como aqueles que se despedem do personagem Ulisses em A Odisseia, de Homero, (séc. VIII a. C./2017), o tempo não mais permite distinções entre morte real e morte simbólica. Não obstante os milhares que se afogam, há sempre algo que morre e nasce em cada jornada.
Na narrativa, a luz do farol é esperança e se aproxima da metáfora de Didi-Huberman (2011) em Sobrevivência dos Vaga-Lumes, o qual vê nos pontos luminosos emitidos pelos vaga-lumes, possibilidades de criação e resistência aos tempos obscuros de autoritarismo e exclusão da diferença. O autor (2011, p. 30) assinala: "Quando a noite é mais profunda, somos capazes de captar o mínimo clarão, e é a própria expiração da luz que nos é ainda mais visível em seu rastro, ainda que tênue". Mas a luz que sinaliza um ponto de ancoragem e sobrevivência, também pode ser a luz de lanternas e veículos do controle de imigração, dificultando ou impedindo a continuidade da jornada. "Os vaga-lumes desaparecem na claridade dos 'ferozes' projetores." (Didi-Huberman, 2011, p. 30).
Para além das luzes dos faróis captadas pela câmera, Ai Weiwei busca, em sua escuta e olhar, captar gestos e relatos. Na longa, assistimos refugiados de várias nacionalidades relatando fragmentos de suas histórias e projetos: razões que os levaram a buscar refúgio, dificuldades na exaustiva travessia e sonhos da reconstrução de um lar. As palavras e gestos em cena ampliam os contornos simbólicos, densificam a imagem, enlaçam o espectador por uma narrativa, que ao modo de Benjamin (1940/1987b) não distingue os pequenos e os grandes acontecimentos da história.
O artista brasileiro Vik Muniz, que na 56ª Bienal de Veneza, no ano de 2015, mesmo ano que Ai Weiwei passa a se dedicar às causas dos refugiados, cria a obra Lampedusa, barco de madeira, medindo 14 metros, revestido com notícias do naufrágio de uma embarcação com refugiados na ilha italiana de Lampedusa, ocorrido em 2013. Sua obra, então, constituiu-se do lançamento do barco nos principais canais da cidade (Rubin, 2015).
Referenciando o mesmo evento, o artista britânico Jason de Caires Taylor expõe a obra Balsa de Lampedusa (2017), em um museu submerso localizado em Lanzarote, nas ilhas Canárias, a 14 metros de profundidade. A obra é composta por esculturas representando 13 refugiados à deriva sobre um bote (Oliani, 2017). Essas e outras obras, em diálogo, criticam, ampliam sentidos e transmitem o senso de urgência da crise humanitária que vivemos. Ai Weiwei insere-se nessa constelação a partir de suas memórias, trazendo marcas muito particulares da China, articuladas a elementos de territórios outros que marcaram seu percurso em um permanente movimento de assunção de sua estrangeiridade.
Entre Furos, Vertigens e (Ir)Reversões
Lei da jornada materializa os efeitos de um discurso de controle e apagamento do sujeito. Ela coloca em questão as estatísticas que tratam os refugiados como números, bem como os mecanismos de poder que as enunciam. Contudo, na contramão desse discurso, ao provocar críticas sem vistas à formulação de sentidos unívocos, apostamos que artista e obra promovem um enlaçamento a partir de furos, sublinhando o caráter não-todo dos ideais totalizantes que buscam marginalizar e/ou apagar a diferença. A obra porta o enigma do sintoma (do artista e do seu tempo), o indizível do Real que nos interroga, mobilizando o desejo, a criação e o encontro com a diferença.
Kaya Barry (2019) no artigo em que analisa Lei da jornada e Human Flow, relata sua experiência estética e teórica ao encontrar o protótipo do bote de 60 metros de comprimento na Bienal de Sydney. Ela comenta que o tamanho colossal da obra, feita com os mesmos materiais utilizados na confecção dos botes reais utilizados por refugiados em suas travessias, consegue remeter o público aos enormes desafios que as pessoas enfrentam em seus percursos de refúgio, bem como nos aproximar da vertigem que Ai Weiwei sentiu ao visitar pela primeira vez um campo de refugiados em Lesbos. Na abertura da Bienal ele fala sobre sua sensação: "I lost my balance... my relationship to the world... how can we talk about the global human condition?" (Barry, 2019, p. 210). Essa possibilidade de vertigem, ou perda de balanço, diante da obra, lança-nos ao encontro da diferença, diferença que não está apenas no refugiado figurado em Lei da jornada, mas que nos constitui enquanto sujeitos cindidos, atravessados pelo inconsciente - estranho, estrangeiro, outro - realçando a inelutável estrangeiridade de quem olha e é olhado, dialeticamente.
Além de estrangeiros em relação a nós mesmo e ao outro, algo que o artista tem o poder de formalizar em sua obra, somos todos estrangeiros em relação ao Real. Lacan (2016) comenta que a vida é errância, viagem que se dá a partir do enodamento dos três registros (simbólico, Real, imaginário) e da experiência que ocorre em três dimensões. O simbólico e o imaginário buscam dar o contorno bidimensional, lógico, calculável, mas o Real instaura uma terceira dimensão. Partindo dessa tese lacaniana, é possível analisar (Marsillac, 2019) que a função do estrangeiro, a saber: a posição diante daquilo que escapa - o oculto, o desconhecido - aponta algo para além de duas dimensões. O Real, com o qual a estrangeiridade nos confronta, instaura a dimensão do tempo, do acontecimento imprevisível e irreversível.
O Real da obra, nesse sentido, abarca tempos passados e futuros que escapam a enquadramentos. A ideia de movimento, inelutavelmente, nos remete a um tempo que transcorre. Lei da jornada imobiliza uma imagem de movimento - a jornada de refugiados em um bote - justamente para destacar que há algo mais, questões ocultas que nos levam a perscrutar tempos que antecedem e sucedem a obra. Lei da jornada é errância, lei do desejo, permanente marca da estrangeiridade.
A obra de arte contorna o Real e, se no Real nada falta, em seus contornos simbólicos algo sempre falta, desacomoda, provoca. Na obra Reto, Ai Weiwei reverte (desentorta) em sua arte, aquilo que se tornou irreversível - no caso, a morte dos estudantes - pela dimensão do tempo. O artista, portanto, joga com as temporalidades nas obras, de modo a apontar o impossível e o possível. Materializa a irreversibilidade do acontecimento, "retificando" vigas de ferro, apontando travessias e possibilidades de novos enraizamentos.
Considerações Finais
A arte, de modo análogo às formações do inconsciente, visibiliza sintomas, condensa e interpela tempos. A história das imagens e, da arte de modo geral, nos mostra como artistas conseguiram exprimir o indizível de seus períodos históricos - período saturado de agoras Benjamin (1940/1987b), permeado por histórias não contadas pela História -, colocar em cena passado, presente e esboços do porvir, confirmando aquilo que Agamben (2009) aborda em sua análise sobre o contemporâneo. Lei da jornada nos remete a histórias não contadas, a corpos marginalizados, e nos permite formular questões: qual lei orienta aqueles que estão na ilegalidade jurídica e na errância forçada? Como fazer ecoar a voz e abrir caminhos para o desejo de sujeitos radicalmente lançados à condição de estrangeiros?
Nas trilhas que percorremos entremeando os registros simbólicos da obra, examinando os contextos de suas exposições, intencionalidades do artista e reverberações sobre o espectador (posição na qual nos encontramos), significantes foram realçados em encadeamentos que nos permitiram refletir sobre essas questões, adensando aspectos históricos, subjetivos e políticos evocados por Lei da jornada como: interdição - errância - lei do desejo; sujeito-estrangeiro - Das Unheimliche - diferença-trauma; refugiados - República Tcheca - campos - Terezín - Auschwitz - Shoah; refugiados - Brasil - colonialismo - racismo; - bote - Lampedusa - balsa de Lampedusa. Estas latitudes da obra, escutadas e analisadas através da atenção flutuante, mas também ensejadas por uma livre associação, descortinam seu potencial crítico e transformador, seu caráter aberto e condensador de temporalidades heterogêneas.
Lei da jornada, em interlocução com outras obras, alegoriza jornadas que não cessam. A obra-jornada persiste aquém e além dela, em hiâncias que constituem o sujeito do desejo, (i)mobilidades, fronteiras e passagens. Ela se dirige ao passado e ao futuro, mas não o "futuro" que a ideia do progresso busca construir, mas às ruínas do passado, fragmentos da história que se repetem, antecipando eventos (Benjamin, 1940/1987b). Lei da jornada abarca a estrangeiridade do artista, dos refugiados, do espectador e, de maneira dialética, da humanidade.
Além de tudo que foi mencionado, é importante frisar que o tempo da escrita desse artigo coincide com o tempo de uma pandemia causada por um vírus, que assim como o artista, veio da China e se tornou global. O denominado Coronavírus sublinha a inelutável estrangeiridade da humanidade, seja na dimensão biológica (estrangeiros em relação ao vírus) ou na dimensão política (xenofobia em relação ao "vírus chinês", práticas biopolíticas que decidem quem vive e quem morre em um contexto onde aqueles que já estavam vulnerabilizados no laço social, como os refugiados, estão ainda mais). Ai Weiwei, como artista que busca responder pela via estético-política às crises de seu tempo, dirigiu o documentário Coronation (2020), retratando o surgimento da pandemia em Wuhan e denunciando a omissão e ineficácia do governo chinês em sua contenção.
Assim, Lei da jornada ao colocar em questão a estrangeiridade que, paradoxalmente, não cessa de se escrever e de não se escrever, pois é da ordem do Real (Lacan, 2007), convoca a uma ação política ante o outro que chega marcado pelas palavras naufragadas, pelo heimweh, termo utilizado por Levi (2013) para falar da dor do lar ou, lembrança dolorosa do lar abandonado. Dor que ele não conseguiu encontrar em sua própria língua, o italiano, mas encontrou em uma língua estrangeira. Sentidos se perdem no trauma da jornada e no encontro (muitas vezes, igualmente traumático) com uma nova língua. Nesse encontro corporal, afetivo e político, faz-se premente uma escuta para que um dizer se ancore, um refúgio para a palavra que, doravante, possa se tornar um lar.
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Endereço para correspondência:
Lucas de Oliveira Alves
E-mail: lukass.oliveira@hotmail.com
Ana Lúcia Mandelli de Marsillac
E-mail: 2206ana@gmail.com
Recebido em: 24/04/2020
Revisado em: 17/05/2021
Aceito em: 24/05/2021
Publicado online: 10/01/2022
1 Filósofo, ensaísta e crítico literário judeu-alemão vinculado à Escola de Frankfurt e à Teoria Crítica. Nasceu em 1892 em Berlim e se suicidou em 1940 na Espanha, fugindo da perseguição nazista.
2 Escritor judeu de língua alemã, nascido em 1883 no território da atual República Tcheca. Faleceu em 1924 na Áustria.
3 Optamos por grafar o Real com a primeira letra maiúscula para diferenciar o conceito de Lacan do real comumente associado à realidade.
4 O Outro com maiúscula será, doravante, assim grafado, sempre que se referir ao conceito lacaniano de Outro (outro do simbólico, representante da cultura, da linguagem e da possibilidade de inserção do sujeito no social).
5 Período em que Mao Tsé-Tung, líder comunista e revolucionário chinês, governou como presidente a República Popular da China (1954-1959) e, também, como Presidente do Comitê Central do Partido Comunista da China (1945-1976). Promoveu a Revolução Cultural Chinesa (1966-1976), responsável por perseguir artistas e intelectuais considerados de direita (Dantas, 2018).
6 Filósofa judia-alemã erradicada nos EUA. Influenciada pelo pensamento de Benjamin e outros teóricos como Heidegger, Kant e Aristóteles, teorizou sobre o totalitarismo, o antissemitismo e a condição do imigrante e do refugiado.
7 No dadaísmo e na arte contemporânea, o ready-made é um objeto industrializado retirado de seu contexto e apresentado como obra de arte.