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Psicologia para América Latina

On-line version ISSN 1870-350X

Psicol. Am. Lat.  no.21 México  2011

 

ARTÍCULOS DE INVESTIGACIÓN CIENTÍFICA Y TECNOLÓGICA

 

Auto-eficácia Docente: Um Estudo com Professores de Física

 

 

Fábio Ramos da SilvaI; Marcelo Alves BarrosII; Ione LisboaIII

IUniversidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá, Brasil
II
Universidade de São Paulo, São Carlos, Brasil
III
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, Brasil

 

 


RESUMO

Investigamos neste artigo a relação entre os níveis de auto-eficácia docente de professores de Física que atuavam no Ensino Médio com a formação acadêmica dos mesmos. Nossa amostra consistiu num grupo de 136 professores brasileiros que trabalhavam no noroeste do estado de São Paulo e no noroeste do estado do Paraná. A análise consistiu em testes de correlação e análise de variância. Como resultado destacamos a associação entre os maiores níveis de crenças de auto-eficácia docente com a formação específica em Física, o que indica a importância da oferta de formação adequada aos professores de Física de nosso país.

Palavras-chave: auto-eficácia docente, professores de Física, motivação de professores.


ABSTRACT

We investigated in this paper the relationship between levels of self-efficacy of physics teachers with the academic background. Our sample consisted of a 136 teachers who worked in the northwestern state of Sao Paulo and in the northwestern state of Parana. The analysis consisted of correlation tests and analysis of variance. As a result we highlight the association between higher levels of self-efficacy of teachers with academic background in physics, which indicates the importance of offering adequate training to physics teachers in our country.

Keywords: teacher self-efficacy, physics teachers, teacher motivation.


RESUMEN

Se investiga en este artículo la relación entre los niveles de autoeficacia de los profesores de la física de la escuela secundaria con la formación académica de ellos. Nuestra muestra está formada por 136 profesores que habían trabajado en el noroeste del estado de São Paulo y en el noroeste del estado do Paraná. El análisis consistió en pruebas de correlación y análisis de la varianza. Como resultado podemos destacar la asociación entre niveles más altos de las creencias de autoeficacia con la formación específica en física, lo que indica la importancia de ofrecer una formación adecuada en física en nuestro país.

Palabras clave: autoeficacia de profesores, profesores de física, motivación de los profesores.


 

 

INTRODUÇÃO

Apresentamos neste trabalho uma pesquisa acerca das crenças de auto-eficácia de professores de Física que atuavam no Ensino Médio. Alguns trabalhos em educação em ciências (Britner & Pajares, 2006; Barros, 2005; Katelhut, 2007) têm investigado a influência destas crenças nos aspectos motivacionais envolvidos no aprender e ensinar ciências.

Analisamos por meio de uma pesquisa correlacional as relações entre os níveis das crenças de auto-eficácia dos professores de Física com a formação acadêmica dos mesmos. Além das dificuldades compartilhadas pela educação básica brasileira em geral, sobretudo a pública, o ensino de Física caracteriza-se pela escassez de profissionais com formação específica (Gobara & Garcia, 2007).

É consensual que a formação acadêmica adequada dos docentes deve influenciar positivamente os aspectos tradicionalmente atribuídos à profissão, como as habilidades didáticas e os conhecimentos teóricos. Possivelmente, ela deve se associar também com alguns aspectos ligados à motivação docente, como as crenças de auto-eficácia.

 

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Segundo a definição de Bandura (1986) as crenças de auto-eficácia são componentes psicológicas que estão relacionadas com as percepções pessoais de competência para executar cursos de ação específicos.

As crenças de auto-eficácia (Bandura, 1977) são relacionadas com quatro fatores: as experiências positivas, as experiências vicárias, a persuasão verbal e os estados fisiológicos. As experiências positivas referem-se às situações nas quais o sujeito viu-se frente a uma situação difícil e conseguiu sucesso no seu enfrentamento, servindo para encorajá-lo a enfrentar outras situações semelhantes.

As experiências vicárias relacionam-se às situações nas quais a observação da execução de uma tarefa semelhante influencia o desempenho do indivíduo. Quando vemos um dos nossos pares obtendo êxito na execução de uma atividade, nos motivamos a fazer o mesmo. Esse fator é particularmente interessante no ambiente escolar, onde as atividades são compartilhadas por diversas pessoas. Assim, por exemplo, a observação da atuação dos pares mais experientes pelos novatos mostra-se de grande importância.

A persuasão verbal refere-se às situações em que a comunicação entre os pares influencia a auto-eficácia dos indivíduos. Esse é um fator importante na situação escolar, na qual o corpo docente de uma instituição pode compartilhar um determinado discurso, que tanto pode incrementar a motivação como diminuí-la.

Os fatores fisiológicos se referem às reações do organismo do indivíduo quando do enfrentamento de situações ameaçadoras. Sintomas como estresse, suor, dores abdominais, tonturas são comuns nessas situações. A forma como o sujeito conhece e se relaciona com o funcionamento do seu organismo é vital para o nível da auto-eficácia.

O nível de auto-eficácia de uma determinada pessoa, nessa perspectiva, é vista como resultante da interação de três fatores principais: os pessoais, os ambientais e os comportamentais. Para Bandura (1986) essa interação caracteriza-se de uma forma triádica, pela qual os fatores pessoais (as crenças do indivíduo, suas atitudes e seu conhecimento) interagem com o meio ambiente (os recursos sociais e materiais) e com o comportamento que reflete as ações dos sujeitos.

O relacionamento entre essas instâncias (pessoal, ambiental e comportamental) é entendido como um processo dinâmico e interdependente. A constituição do nível de auto-eficácia é bastante sensível às mudanças na configuração desses fatores.

A pesquisa das crenças de auto-eficácia de professores revelou a existência de outras crenças relacionadas. Vale destacar a Crença de Eficácia Geral no Ensino como particularmente interessante, pois, representa uma crença no ensino de uma determinada disciplina, não pressupondo implicação pessoal nesse julgamento (Bzuneck, 2001).

Neste artigo, analisamos as Crenças de Eficácia Pessoal (ou auto-eficácia docente) e de Eficácia Geral no Ensino, de professores de Física que atuavam no nível médio. Esta opção deu-se pela tradição de pesquisas nacionais que investigam a relação entre essas crenças e a motivação no ensino (Bzuneck & Guimarães, 2003; Goya, Bzuneck & Guimarães, 2008; Bzuneck, 2001).

 

MÉTODO

A metodologia de coleta e análise de dados desta investigação é quantitativa, com um delineamento correlacional (Dancey & Reidy, 2006; Hair et al., 2009). A coleta de dados foi realizada mediante um questionário do tipo Likert, os dados foram analisados através de testes de correlação (Spearman) e análise de variância (Kruskal-Wallis), todos fornecidos pelo pacote estatístico SPSS® for Windows versão 13.

Amostra

Os dados foram coletados junto a 136 professores de Física que atuavam em escolas (públicas e privadas) de nível Ensino Médio, nas cidades de Ourinhos (SP), Presidente Prudente (SP), Assis (SP), Marília (SP) e Maringá (PR) durante os anos de 2006 e 2007.

O instrumento de coleta de dados

Segundo Riggs e Enochs (1990) a atividade de pesquisa que objetive o estudo das crenças dos professores deve dar-se com uma delimitação precisa, retratando a especificidade do ensino. Assim, para a elaboração do instrumento relativo ao ensino de Física, partimos da adaptação de dois instrumentos existentes, a versão brasileira (Bzuneck & Guimarães, 2003) do instrumento elaborado por Woolfolk e Roy (1990) e a versão original do STEBI-A (Science Teaching Efficacy Belief Instrument), desenvolvido por Riggs e Enochs (1990).

Como o nosso interesse é a pesquisa das crenças de auto-eficácia dos professores de Física, a adaptação desses dois instrumentos foi necessária, pois ambos apresentam questões bastante gerais, no primeiro caso, referem-se ao ensino de uma forma geral, e no segundo ao ensino de Ciências. Assim, alguns itens foram adaptados e elaboramos outros que possuíssem correspondência com aspectos do ensino de Física, como questões referentes à experimentação e a sua estrutura teórica.

Lembramos que os dois instrumentos citados (Bzuneck & Guimarães, 2003 e Enochs & Riggs, 1990) possuem similaridades e incongruências. Em comum, além da formatação das perguntas, ambos quantificam por meio de alguns itens a variável 'Eficácia Pessoal do Professor' ou 'auto-eficácia docente'. Porém o questionário brasileiro quantifica também a variável 'Eficácia Geral do Ensino' enquanto que o estadunidense se dedica a pesquisa da 'Expectativa de Resultados'.

Segundo Bzuneck (2001) esses dois últimos conceitos representam uma questão controversa na pesquisa educacional guiada pelos pressupostos teóricos de Teoria Social Cognitiva. A Expectativa de Resultados depende da execução de um comportamento condizente com elas (Bandura, 1977), porém, no caso da Crença de Eficácia Geral no Ensino, isto não se faz necessário, uma vez que a responsabilidade da execução do comportamento pode ser atribuída a outros atores (Bzuneck, 2001).

Optamos, então, seguindo a tradição de pesquisa em crenças de auto-eficácia docente no Brasil, em redigir itens que se correspondessem com o conceito de Crença de Eficácia Geral no Ensino, sem a implicação causal, característica do conceito de Expectativa de Resultados. A seguir, rediscutimos essa questão, que mostrou não se encerrar na linguagem das questões.

O instrumento caracterizou-se por um questionário de 34 itens do tipo Likert, ou seja, afirmações com as quais os professores expressavam o seu grau de concordância ou discordância em uma escala de 5 pontos, variando de discordo totalmente até concordo plenamente.

De todos os itens, 17 referiam-se a Crença de Eficácia Pessoal e 17 a Crença de Eficácia Geral no ensino de Física. A validade desse questionário (Silva et al., 2007) foi analisada segundo o procedimento sugerido por Silveira (1993). Apresentamos abaixo, na tabela 1, os itens que foram considerados, juntamente com as cargas fatoriais relativas aos conceitos de Crença de Eficácia Pessoal e Crença de Eficácia Geral no Ensino.

 

 

ANÁLISE DOS DADOS

Buscamos, por meio do teste de correlação de Spearman, as relações de associação entre as variáveis: formação acadêmica, nível de Eficácia Pessoal e nível de Eficácia no Ensino. O nível de Eficácia Pessoal e no Ensino de cada professor fora obtido pela soma das respostas dadas para os itens correspondentes.

Consideramos para a formação acadêmica a seguinte classificação: professores formados em Física (escore 3), professores com formação em Ciências Exatas (escore 2) e professores com formação em Ciências Biológicas (escore 1). A tabela 2 apresenta os resultados do teste.

 

 

O nível de Eficácia Pessoal demonstra uma associação significativa com a variável formação acadêmica. Indica, que professores com formação específica possuem maiores níveis de Eficácia Pessoal. Mais adiante, por meio de uma análise de variância, analisaremos mais detalhadamente este resultado.

Os níveis de Eficácia Pessoal e de Eficácia Geral no Ensino estão correlacionados de forma positiva, resultado que sugere uma associação. Assim, não é possível afirmar que a Eficácia no Ensino seja independente da Crença de Eficácia Pessoal, como defendido por Bzuneck e Guimarães (2003).

Porém, reconhecemos que há diferenças metodológicas entre a pesquisa dos autores citados acima e a nossa. Eles correlacionam as médias dos escores das duas crenças, enquanto que nesta investigação trabalhamos com os escores brutos. Encontramos valores de correlação semelhantes em Enochs e Riggs (1990) e Riggs e Enochs (1990), que usam esta mesma metodologia (escores brutos), apesar de utilizarem o conceito de expectativa de resultados.

Embora, os itens que se referem à Eficácia Geral no Ensino estejam redigidos de forma não causal, podemos inferir, que o investigado não entende dessa maneira quando responde ao questionário. A percepção que se possui das capacidades pessoais em ensinar Física não estão desconectadas das percepções acerca do seu ensino de uma forma generalizada. Percebemos a necessidade de novas investigações ou de reanálises que procurem refinar esse conceito.

Apesar de os resultados das correlações serem fracos (Dancey & Reidy, 2006; Hair et al., 2009) entendemos ser relevante a investigação das mesmas no contexto das variações nos grupos de professores. A análise das associações entre os níveis de eficácia pessoal e no ensino dos professores de física com a formação acadêmica foi realizada por meio do teste de Kruskal-Wallis. Encontramos resultados estatisticamente significativos para os níveis de Crença de Eficácia Pessoal.

Tabela 3 – Teste Kruskal-Wallis discriminando a variável formação acadêmica

 

 

Estatísticas do teste (a,b)

 

 

a Teste De Kruskal-Wallis
b Variável de agrupamento: formação

Para a variável 'formação acadêmica', os professores com formação específica apresentaram os maiores valores de posto médio para a eficácia pessoal, seguido dos docentes com formação em Ciências Exatas, e, por fim, os professores com formação em Ciências Biológicas. Embora seja esperado que professores que optaram por se graduar em Física sejam mais confiantes e motivados no ensino desta disciplina, entendemos que esse resultado evidencia a importância da formação adequada dos docentes, no contexto da auto-eficácia docente.

 

DISCUSSÕES

Investigamos nesse trabalho a associação entre os níveis de Crenças de Eficácia Pessoal (ou auto-eficácia docente) e da Crença de Eficácia Geral no Ensino com a formação acadêmica de professores de Física. A análise de variância revelou resultados estatisticamente significativos apenas para a crença de Eficácia Pessoal dos professores de Física, fato que sugere algumas reflexões.

Quando atentamos para a formação acadêmica da amostra, e de sua relação com os níveis de Crença de Eficácia Pessoal, observamos que os professores graduados em Física possuem valores superiores (postos médios) dessas crenças (78,73), em comparação, com os docentes com formação em outros cursos da área das Ciências Exatas (55,40) e com aqueles formados em cursos de Ciências Biológicas (37,79).

Considerando os níveis de Eficácia Pessoal ou auto-eficácia docente como vitais para a motivação dos indivíduos, é possível, argumentar que a oferta de formação adequada em Física, além de colaborar para aspectos tradicionalmente atribuídos à profissão docente como o domínio conceitual e didático, favoreceria o aprendizado dos alunos, por meio de processos educativos mais envolventes.

Segundo Brooke e Soares (2008) as dinâmicas de sala de aula, os processos interpessoais entre os alunos, e entre os professores e discentes, são as variáveis mais influentes na análise do desempenho cognitivo dos alunos, quando se investiga o efeito da educação escolar.

Neste sentido, algumas investigações sociológicas (Reynolds & Teddlie, 2000; Sammons, 1999) analisaram a relação entre as expectativas que os professores possuem a respeito das capacidades de seus alunos e o desempenho acadêmico dos mesmos. Percebeu-se uma associação significativa entre a melhoria do aprendizado com altas expectativas docentes. Assim, essa seria uma variável relevante para a o entendimento dos processos da Eficácia Escolar (Brooke & Soares, 2008).

Desta forma, podemos estender a influência do nível de auto-eficácia docente para além da motivação no ensino, colaborando também na melhoria do desempenho acadêmico dos alunos. Claro, que essa análise não pode ser realizada no contexto deste trabalho, mas essas possíveis associações podem ser o objeto de outras investigações.

Por fim, lembramos que embora a auto-eficácia docente seja reconhecida como uma variável associada à motivação intrínseca, e que, a formação adequada de professores de Física seja um meio de fortalecer essas crenças, reconhecemos a necessidade de mudanças nas condições externas de nosso país, que são, de modo geral, desfavoráveis a motivação e a auto-eficácia docente, como a baixa remuneração, as longas jornadas de trabalho e as turmas numerosas.

 

Referências

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