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Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva

Print version ISSN 1517-5545

Rev. bras. ter. comport. cogn. vol.1 no.1 São Paulo June 1999

 

ARTIGOS

 

Cognição: contato com contingências e regras1

 

Cognition: rules and contact with contingencies

 

 

Lorismário Ernesto Simonassi

Universidade Católica de Goiás
Departamento de Psicologia – Apoio CNPq 301.881-88-0

 

 


RESUMO

São descritas e comparadas concepções diversas sobre a consciência enquanto um evento cognitivo. Discute-se na literatura se a descrição de uma contingência deve vir antes ou depois da ocorrência de uma discriminação. São discutidos dados empíricos da literatura que procuram fundamentar os seguintes pontos: 1) possibilidade de sujeitos que solucionam problemas, sem que os descrevam; 2) se é necessário que a descrição de contingências ocorra antes da solução do problema; 3) se o aumento da freqüência do comportamento ocorre antes ou depois da descrição. Descrevem-se experimentos que concluem ser possível a solução de problemas sem prévia descrição das contingências em vigor.

Palavras-chave: Cognição, Consciência, Contingência, Regra e Resolução de problema.


ABSTRACT

Cognition: rules and contact with contingencies (study article followed by questions). Different conceptions about consciousness as a cognitive event are described and compared. The literature about possible relationships between stimulus discrimination and description of the contingency involved is reviewed. Data concerning: 1. the possibility of human subjects solving problems without being able to describe them; 2. the description of a contingency as a pre-requisite for the occurrance of problem solving; 3. whether an increase in problem solving behavior rates occurs before or after the description of a contingency are presented. Experimental data that indicate the possibility of solving problems without previous description of the contingencies involved are presented.

Keywords: Cognition, Consciouness, Contingency, Rule e Problem solving behavior.


 

 

Introdução

Conceitos sobre os assuntos chamados de psicológicos são importantes, pois sem que tais eventos sejam conceituados não é possível especificar as operações que possibilitarão a observação direta, quando possível, ou inferências sobre as relações entre tais eventos (Harzem e Miles, 1978; Skinner, 1945).

O termo cognição é utilizado em uma categorização que implicou uma variedade de eventos, entre eles, os comportamentos conscientes que podem ser analisados como comportamentos verbais (regras) que fazem parte de uma série de relações funcionais não lineares das contingências particulares, às quais as pessoas são expostas. Devemos nos lembrar, que ao operacionalizar alguns comportamentos chamados de conscientes não tornamos o fenômeno "consciência" passível de análise ao longo de toda a sua conceituadõo possível (Harzem e Miles, 1978).

Apontadas as questões da conceituação e operacionalização, vamos observar como asserções sobre o evento cognitivo consciência ou como a definição de consciência é feita por alguns autores de livros-textos:

1. "Um certo número de teorias diferentes foi sugerido no que se refere ao papel funcional das atividades simbólicas, que geralmente é incluído no termo geral "consciência" no processo de modificação do comportamento." (Bandura, 1979, p. 333)
"Os processos de modificação do comportamento são afetados pela consciência que a pessoa tem dos estímulos que a atingem, das respostas que exibem, das conseqüências dos seus comportamentos e das contingências que existem entre estes últimos eventos." (Bandura, 1979, p. 333)
2. "O termo consciência tem significado múltiplo. Utilizamos a palavra para nos referir ao total estado de consciência de uma pessoa (1) e /ou o seu estado normal de vigília (2).° (Davidoff, 1983, p.256)
3. "Apesar da reemergência da consciência na psicologia, ainda não existe um consenso sobre uma definição do termo... Resumindo, a consciência envolve (a) monitoramento de nós mesmos e de nosso ambiente, de modo que impressões perceptivas, recordações e pensamentos sejam representados na mente cônscia; e (b) controle de nós mesmos e de nosso ambiente, para que sejamos capazes de iniciar e terminar as atividades comportamentais e cognitivas." (Atkinson, C.; Atkinson, Smith e Bem, 1995, p. 168-169)
4. “Estamos conscientes do que estamos fazendo, quando descrevemos a topografia de nosso comportamento. Estamos conscientes de porque o fazemos, quando descrevemos variáveis relevantes, tais como aspectos importantes da ocoasião ou o reforço.” (Skinner, 1980, p. 354).
"Então, como a auto-observação também é um produto de contingências discriminativas, e se uma discriminação não pode ser reforçada pela comunidade, pode não aparecer nunca. Por mais estranho que seja, é a comunidade que ensina o indivíduo a `se conhecer'." (Skinner, 1967, p. 150)
"Não precisamos descrever as contingências de reforço a fim de sermos afetados por elas." (Skinner, 1988, p. 111)
5. "O comportamento verbal nunca teria evoluído se tivesse feito contato somente com outro comportamento verbal. Em algum ponto, ele deve fazer contato com os eventos ambientais. Chamamos esse contato de tato; um tato é uma resposta verbal ocasionada por um estímulo discriminativo (cf. Skinner, 1957)." (Catania, 1999, p.259-260)
“O comportamento verbal, como qualquer outro evento pode ser tateado. Nenhum novo tipo de relação está envolvido, mas as complexidades geradas quando o comportamento verbal é construído a partir de outro comportamento verbal exige um comentário especial. O comportamento verbal que depende de outro comportamento verbal e que modifica os efeitos de outro comportamento verbal é chamado de autoclítico." (Catania, 1999, p. 267)
"Os autoclíticos descritivos dependem de discriminações do nosso próprio comportamento verbal, e sabemos apenas um pouco acerca de como eles são aprendidos ou podem ser ensinados." (Catania,1999, p. 270)
6. "É notável que nós consideremos a percepção como uma atividade de processamento do qual o indivíduo tem noção consciente, e esta hipótese tem sido compartilhada pela maioria dos psicólogos interessados em percepção." (Eysenck e Keane, 1994, p. 72)
"Um dos principais fenômenos dentro do paradigma de dupla tarefa é a melhora dramática que o treino geralmente tem sobre o desempenho...
Várias definições de "automacidade" já foram propostas, mas existe a concordãncia generalizada sobre alguns dos principais critérios...
• processos automáticos são velozes
• processos automáticos não podem ser acessados pelo consciente. (Eysenck e Keane, 1994, p. 106)
"Estas três instâncias de comportamento do pensamento são úteis para que se ilustre vários aspectos gerais do pensamento. Primeiro, que todos os pedaços envolvem indivíduos que têm consciência de seus pensamentos. (Eysenck e Keane, 1994, p. 324)

As afirmativas (conceitos ou descrições) feitas sobre consciência nos itens 1, 2, 3, 4, 5 e 6 acima indicam a diversidade do uso do termo consciência feito por behavioristas e cognitivistas. Diante de tal diversidade de interpretação é muito difícil haver concordância sobre uma forma de proceder para se estudar o processo em questão. Porém, para efeitos de trabalho, vamos definir "consciência" como a descrição do próprio comportamento e das condições que produziram tal comportamento.

A definição acima, está mais próxima das sentenças agrupadas em 1 e 4, porém partilham de aspectos comuns também nas sentenças contidas em 3, 5 e 6.

Como definição de trabalho, a definição proposta pode ser bastante útil, pois se torna possível analisar, bem como realizar, estudos sobre exposição às contingências e formulação de regras. Quanto à formulação de regras, podemos falar de como as regras são aprendidas (aquisição) e ainda depois de aprendidas, como e porque elas controlam certos comportamentos (manutenção).

Quero deixar claro que, ao adotar esta definição para estudar um dos chamados processos cognitivos (consciência), tal empreendimento, de forma alguma, engloba todo o conceito, nem mesmo exclui outros tipos de procedimentos utilizados para estudo.

 

Nós discriminamos porque nós descrevemos ou descrevemos porque discriminamos?

Não é jogo de palavras. A questão poderia ser desdobrada para as seguintes formas:

1. Para que as pessoas discriminem, é necessário que, antes elas descrevam?
2. Para que as pessoas descrevam, é necessário que, antes elas discriminem?

Estas questões são fundamentais para que se adote uma posição mediacional ou não mediacional quanto à função DISCRIMINATIVA e DESCRITIVA e, conseqüentemente, adotar uma posição em que descrição é causa das discriminações ou que a descrição é efeito de causa(s) comum(s). Para relembrar, voltemos à definição de "consciência", como definição de trabalho:

"Consciência é a descrição do próprio comportamento e das condições que produziram tal comportamento ".

Esta definição permite uma resolução empírica. Portanto, vejamos. Quem descreve, descreve algum acontecer. O que é descrito é o próprio comportamento da pessoa que se comporta ao fazer algo. Quando se faz alguma coisa, se faz em relação à:

1. Estímulos antecedentes (presentes ou passados).
2. Estímulos conseqüentes que são apresentados ou retirados.

Também, é bom citar que 1 e 2 acima podem ser descritos. Ao se analisar relações entre nossos próprios comportamentos e os estímulos antecedentes e conseqüentes, estamos diante da possibilidade de se analisar a contingência de três termos e a resposta que descreve estas relações.

Esta resposta de descrever, descreve os estímulos discriminativos (verbais ou não), a resposta-solução (seja tal resposta pública ou privada) e as conseqüências (sejam imediatas ou remotas). Portanto, a descrição dos termos da contingência seria um comportamento verbal a mais a ser analisado. De forma mais específica, tal descrição, se estiver em acordo com os estímulos antecedentes- indicadores de respostas que tenham suas probabilidades modificadas - dá-se o nome de REGRA. Estou me referindo à aquisição de REGRAS, que após terem sido formuladas passam a ser estímulos discriminativos para o ouvinte no episódio falante-ouvinte. Uma regra, após formulada pode facilitar o desempenho exigido em uma situação problema.

Será que existem respostas empíricas ao conjunto de afirmativas feitas acima? Tentaremos classificar alguns achados empíricos relativos aos seguintes pontos:

1. Possibilidade de sujeitos que solucionam problemas, sem que os descrevam.
2. É necessário que a descrição ocorra antes da solução do problema?
3. Ocorrência de aumento da freqüência antes ou depois da descrição?

 

Possibilidade de sujeitos que solucionem problemas, sem que os descrevam

Talvez, o primeiro estudo contundente relativo à solução de problemas e descrição, tenha sido feito por Hefferline, Keenan e Harford em 1959. Hefferline e col. (1959) fizeram um arranjo experimental em que sujeitos humanos terminavam ou pospunham estímulos aversivos sonoros com uma resposta de distender o músculo de um dos dedos da mão através de um eletromiógrafo. O mais interessante é que quando foi solicitado aos sujeitos que descrevessem os eventos que eles próprios modificavam, não foram capazes de relatá-los, isto é, não relataram nem os seus próprios comportamentos e nem os seus efeitos. Infelizmente, Hefferline e col. (1959) não citam como foram medidas as informações sobre a própria descrição.

Em outro estudo muito antigo, feito por Greenspoon (1955) reforçava aos sujeitos com um HUM! HUM! contingentemente à classe de palavras específicas e estas se tornaram mais freqüentes. Os sujeitos "não notaram a relação entre o seu comportamento verbal e as condições de reforçamento".

Apesar destes dois estudos antigos demonstrarem que é possível um aumento na freqüência do responder, independentemente das descrições das contingências, tais estudos não são citados. Por exemplo, Bandura (1979) citou resultados de experimentos em que a descrição é condição necessária para aumento da freqüência do comportamento, embora cite também experimentos em que a freqüência da resposta aumentou independentemente da descrição. Bandura (1979) aponta que problemas metodológicos podem ser os responsáveis por tais resultados discrepantes. Entre os problemas, dois deles merecem atenção:

1. "A consciência (descrição) geralmente é tratada como um fenômeno de tudo ou nada ~2, quando de fato ela pode variar desde uma determinação correta por hipóteses parcialmente correlacionadas a noções altamente errôneas da razão pela qual o sujeito está sendo reforçado." (p. 337)

2. "A consciência é inferida das respostas a uma série de questões de entrevista*2 progressivamente mais sugestivas. Portanto; o número de sujeitos julgados cônscios é determinado, em certa extensão, pelo número e natureza das pistas informativas veiculadas pela sondagem nas entrevistas.*2

Para tentar resolver estas questões de medidas e questões de outra natureza temos conduzido no Laboratório de Análise Experimental do Comportamento da Universidade Católica de Goiás, uma série de experimentos e estudos conceituais sobre comportamentos cônscios (Simonassi, de Oliveira e Sanabio, 1994; Simonassi, Froes e Sanábio, 1995; Simonassi, 1997; Simonassi, de Oliveira e Gosch, 1997; Simonassi, de Oliveira, Gosch e Carvalho, 1997; além do estudo feito por de Oliveira (1998).

Um breve resumo dos resultados dos experimentos citados é apresentado a seguir:

a. nenhum dos sujeitos em todos os experimentos formulou a regra (descreveu) antes de ser exposto às contingências. O conjunto de experimentos utilizou ao todo 167 sujeitos;
b. a freqüência média de acertos (medida pelo número de tentativas) aumentou para 15 de 19 sujeitos antes da formulação da regra. (Simonassi, de Oliveira e Sanábio,1995). Em outro experimento houve aumento da freqüência de acertos para 8 de 10 sujeitos que formularam a regra (Simonassi, Froes e Sanábio, 1995).
c. onze sujeitos mesmo não tendo formulado a regra, tiveram aumento na freqüência média de acertos. Apenas 2 sujeitos não tiveram aumento na freqüência média de acertos (Simonassi, de Oliveira e Sanábio, 1 995). Em outro experimento (Simo-assi, Froes e Sanábio, 1994) 3 dos 4 sujeitos que não formularam a regra e solucionaram o problema aumentaram a frequência de acertos;
d. sempre as regras foram formuladas por etapas (Simonassi, Froes e Sanábio, 1995; Simonassi, de Oliveira e Sanábio, 1994), independendo da complexidade das contingências (de Oliveira, 1998);
e. as formulações de regras foram influenciadas pelas contingências a que as pessoas foram expostas e pelas instruções que receberam (Simonassi, de Oliveira e Gosch,1994).
f. as propriedades dos estimulos discriminativos afetaram as descrições das contingências (Simonassi, de Oliveira e Gosch,1997).
g. nos experimentos de 1995 observou-se que a solução do problema proposto ocorreu para 3 dos 16 sujeitos utilizados, sem terem descrito as contingências (formulação de regras). No experimento de 1994, ocorreu o mesmo para 13 sujeitos, isto é, solucionaram o problema, porém sem descrever as contingências. Estes resultados têm sido sistematicamente encontrados em demonstrações experimentais feitas a alunos do curso de Psicologia da Universidade Católica de Goiás.

Como conclusão, os resultados mostram que é possível que humanos solucionem problemas, sem que os descrevam.

 

É necessário que a descrição ocorra antes da solução do problema?

Resultados empíricos permitem que afirmemos que não. Os livros-textos contém experimentos que relatam tais tipos de resultados (cf. Catania, 1999; Bandura, 1979; Millenson,1979). Ainda mais: o que dizer dos estudos com infra-humanos, que não apresentam comportamento verbal como definido por nós e que solucionam problemas? O que dizer do homosapiens, antes de colocar sua musculatura vocal sob controle operante? Será que solucionavam problemas?

É bom salientar que o termo solução de problemas é aplicado aos casos em que diante de um conjunto de estímulos, não existe no repertório do solucionador, resposta solução disponível.

Será que podemos especular um pouco? Você alguma vez já se envolveu com as brincadeiras chamadas de quebra-cabeças? Se já, deve ter observado que em alguns casos, você consegue resolver o problema, porém, quando vai ensinar a outra pessoa como fazê-lo, torna-se mais eficiente demonstrando (fazendo na presença do aprendiz) do que verbalizando. O exemplo dos dois pregos dobrados e superpostos é um caso muito bom de ser experimentado.

Outro ponto relevante é que empiricamente pode-se demonstrar que a resolução de um problema envolve uma resposta solução, que é final de um elo que pertence a uma cadeia de respostas, que depende de respostas precorrentes. Portanto, a solução de problemas não é um processo do tipo tudo ou nada. Desta forma, não é necessário que os comportamentos precorrentes sejam descritos para que a solução ocorra. (cf. Moroz, 1991; Silva Santos, 1998; Cavalcante, 1999).

 

Ocorrência de aumento da freqüência antes ou depois da descrição?

Esta pergunta poderia ser formulada de outra maneira, ou seja; "Seriam as regras (descrições das contingências - consciência) necessárias para que a freqüência das respostas aumentem?

Os resultados dos experimentos citados na subseção 2.1 indicam que para alguns sujeitos (a maioria deles) não foi necessário que verbalizações ocorressem antes de se iniciar o aumento da freqüência das respostas. Há no entanto, na literatura (cf. Bandura, 1979) relatos indicativos de que "as descrições das respostas exigidas para reforçamento, geralmente acusam um aumento substancial das respostas apropriadas."

A afirmativa precedente, está em acordo com uma das principais funções do comportamento verbal segundo Baum (1999), Catama (1999), que é a de modificar o comportamento do outro organismo. A questão primordial, creio que seja, não em saber se descrições facilitam a solução de problemas, mas sim se descrições de exposição ás contingências discriminadas facilitam a solução, uma vez que uma pessoa pode também descrever os estímulos antecedentes e respostas que não estão correlacionados com a solução, e portanto ao seguir suas próprias regras irá ser seguido de punição. Conseqüentemente, o seu comportamento de descrever não aumentará em freqüência. O que pode ocorrer é que uma regra (descrição) facilite a solução do problema ou o aumento da freqüência como citam Spielberger e De Nike (1966), no sentido de que a descrição faz com que o aumento seja abrupto como demonstraram Philbrick e Postman (citado em Bandura, 1979). No entanto, antes do salto abrupto as respostas já estavam aumentando sua freqüência.

Quero ainda chamar a atenção que estudos sobre aquisição de regras (descrição) implicam em um procedimento de discriminação com respostas correlacionadas ao estímulo discriminativo que levam ao reforço e com respostas correlacionadas aos estímulos que não levam ao reforço. Um procedimento de discriminação simples, e que os sujeitos ao discriminarem, relatam os seus próprios comportamentos e as condições que os produziram (de Oliveira, 1998; Simonassi, de Oliveira e Sanabio, 1994), fazendo assim, com que discriminações complexas operem na situação (Cerutti, 1989). Este ponto será tratado no próximo tópico. Ainda mais, que os relatos dos termos das contingências às quais os participantes foram expostos são mais freqüentemente feitos aos estímulos discriminativos e respostas e em seguida aos reforçadores (LAEC, 1994-í999)*3.

Em relação ao título do tópico 2, os dados parecem indicar que a relação funcional significativa é de relatos às partes da contingência que estão relacionadas ao reforço, porém, que os relatos são sobre partes das contingências às quais os participantes foram expostos e suas respectivas discriminações. Não há casos de descrição sem exposição às contingências. Seria impossível.

 

Comportamento verbal de descrever contingências e comportamento verbal de seguir instruções. Possibilidade de integração de atividades cognitivas

Podemos afirmar, portanto, que uma pessoa exposta a uma contingência, emite comportamentos verbais discriminados, ou seja, ela pode falar sobre si mesma (seus comportamentos não-verbais) e as condições geradoras e mantenedoras (estímulos discriminativos e conseqüências) relacionadas entre si, ou seja, é possível relatar o ambiente e as respostas da contingência colateral (Cerutti, 1989). O nome contingência colateral é utilizado para designar os estímulos discriminativos, respostas e conseqüências a que os participantes são expostos em contraposição à contingência instrucional, que é composta da instrução (um estímulo discriminativo), uma resposta (a resposta de seguir a instrução) e a conseqüência social (aprovação ou desaprovação). Estas duas contingências podem ou não interagir, dependendo de quais variáveis irão ser manipuladas nos experimentos em que existe aquisição de regras. De importância é o terceiro termo da contingência instrucional (conseqüência social), pois introduz na interação das contingências, a comunidade verbal. Esta comunidade verbal é a responsável por manter as descrições (regras - comportamentos cônscios).

Assim, ao analisarmos as contingências colaterais e as contingências instrucionais estamos aptos a relatar eventos destas duas contingências, sempre baseados em eventos observáveis ou potencialmente observáveis em ocasiões futuras, dependendo das contingências sociais que produzirão a publicização de possíveis respostas precorrentes momentaneamente privadas (Simonassi, Tourinho, da Silva, Gosch, de Oliveira, S. Santos, Froes e Sanábio, 1997).

Os esquemas abaixo ilustram a forma como os eventos das contingências colaterais, instrucionais e derivadas (Parte a) podem ser analisados diretamente. Na contingência colateral os eventos (Sde Re Cc) podem ser diretamente observados e registrados, bem como os eventos (Sd RL Ccv) da contingência instrucional. Desta interação de contingências ocorrem novos eventos (estímulos, respostas e conseqüências).

 

 

Na parte a do esquema estão exemplificados como estímulos discriminativos letras e números, como resposta tocar uma tela de um monitor de computador e como conseqüência as palavras certo ou errado que aparecem na tela do computador. Tais eventos são parte de um conjunto de eventos estudados dos programas FORMRULES 1 e 2 disponíveis no LAEC-UCG. O exemplo é estendível a quaisquer outros procedimentos de discriminação que se possa realizar com participantes humanos.

De interesse especial é a Resposta de Descrever (-Regra - R D) que vai fazer parte de uma nova contingência, chamada de contingência derivada. Observando-se os eventos das duas primeiras contingências, verifica-se que a resposta de descrever da contingência derivada (a regra) surge da interação dos eventos que compõe as contingências colaterais e instrucionais. Esta é uma forma de análise em que todos os eventos de todas as contingências são diretamente observáveis em momentos diferentes, pelo menos nas situações de experimentação.

A parte b do esquema, ilustra como a regra (Resposta de Descrever) entra como evento verbal observável no episódio verbal falante-ouvinte (cf. Skinner, 1978).

 

 

Sempre é bom lembrar que estamos falando de participantes que estão adquirindo repertório verbal na presença das contingências colaterais e instrucionais. Ao se observar a parte b do esquema, a partir do momento que a resposta de descrever (regra) ocorrer, existe a possibilidade de que tal resposta adquira propriedades funcionais discriminativas para os outros membros da comunidade e para o próprio falante. Não se deve esquecer que o falante pode, sob certas condições, tornar-se seu próprio ouvinte, já que ambos pertencem à mesma comunidade verbal (cf. Skinner, 1978; 1989; Hayes e Hayes, 1989; Baum, 1979; Zettle e Hayes, 1982).

Podemos pensar nos termos (estímulos, respostas e conseqüências) dos três tipos de contingências (colaterais, instrucionais e derivadas), principalmente nos estímulos discriminativos e respostas, como eventos que, em muitos casos são acessíveis apenas à própria pessoa (cf. Matos, 1997; Tourinho,1997). O fato de eventos serem acessíveis à própria pessoa, não os torna "mentais", mas sim que: 1. podem ter sido públicos no passado (dependendo dos arranjos disponíveis dos termos das contingências sociais), 2. estão momentaneamente inacessíveis a outras pessoas (como ouvintes dc uma mesma comunidade verbal), 3. poderão permanecer inacessíveis para sempre - e neste caso não entrarão em relação funcional com partes do ambiente, a não ser do ambiente privado - ou se tornarem públicos. Vamos exemplificar o que foi afirmado acima com base em uma suposição. Imagine que uma pessoa tenha assaltado um banco e fugido, sem que jamais tivesse sido identificada. Neste caso, a descrição de como foi o assalto poderia ser feita pelo assaltante a todo momento em voz alta ou para si mesmo. Se o relato for feito em voz alta, começam aparecer possíveis conseqüências sociais (prisão, julgamento etc.). No entanto, se forem feitos só para si mesmo, não ocorrerão tais sanções sociais, e o assaltante poderá morrer sem ser descoberto (obviamente, tratase aqui de um assalto perfeito). Relatar para si mesmo não é um exemplo de evento mental, mas sim de comportamento verbal, tipicamente operante, portanto sensível às conseqüências. (cf. Staats, 1973; Sl(inner,1976; Baum,1999; Burns e Staats, 1991; Spradlin,1985).

 

Algumas especulações e suposições teóricas

Caso falar para si, seja um operante e que tenha a possibilidade de que também partilhe de contingências tipicamente reflexas (Burns e Staats, 1991; Staats e Staats, 1993) é possível que falar para si (no caso de uma regra) possa gerar respostas tipicamente emocionais, ou que o falar para si possa ser conseqüenciado e que a freqüência deste comportamento possa ser modificada. Pode ocorrer também que ao ser conseqüenciado, gere os subprodutos dos estímulos reforçadores, como por exemplo a alegria, ou dos estímulos aversivos, como por exemplo a ansiedade, conforme foi sugerido por Skinner (1967, 1971). É possível ainda que o falar para si, elicie comportamentos emocionais, isto é, palavras eliciem respostas emotivas, como já foi demonstrado em experimentos com procedimentos que possibilitem o estudo das interações de processos operantes-reflexos. (Veja em Rescorla,1977; Peterson,1975, procedimentos eficazes para o estudo de interações operantes-reflexas, tanto em infra-humanos como cm humanos. Também podem ser encontradas referências a medidas reflexas, relativas à exposição a estímulos verbais em Wolpe, 1976, especialmente nos capítulos 6 c 7).

As afirmativas acima, esperam por procedimentos específicos que as suportem, uma vez que são poucos os experimentos sobre comportamento verbal que o abordam da forma integrada operante-reflexa.

 

Referências

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Questões de estudo

1. O que o autor denomina de regra?
2. A descrição dos termos da contingência é condição necessária para aumento da freqüência do comportamento? Justifique.
3. Descreva o que existe em comum nos resultados dos experimentos conduzidos por Simonassi e colaboradores.
4. Quando as regras são necessárias? 5. O que o autor especifica como contingências colaterais, instrucionais e derivadas?

 

 

1 Artigo didático, acompanhado de 5 questões de estudo.