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Avaliação Psicológica

versão impressa ISSN 1677-0471versão On-line ISSN 2175-3431

Aval. psicol. vol.14 no.1 Itatiba abr. 2015

 

 

Forms of Bullying Scale: evidências de validade de construto da versão brasileira

 

Forms of Bullying Scale: Evidence of construct validity of the brazilian version

 

Forms of Bullying Scale: evidencia de validez de constructo de la versión brasileña

 

 

Layrtthon Carlos de Oliveira Santos1, I; Rildésia Silva Veloso GouveiaII; Ana Karla Silva SoaresI; Thiago Medeiros CavalcantiI; Valdiney Veloso GouveiaI

IUniversidade Federal da Paraíba
IICentro Universitário de João Pessoa

 

 


RESUMO

O presente estudo objetivou validar a Forms of Bullying Scale (FBS) ao contexto brasileiro, reunindo evidências de validade e precisão. Participaram 377 estudantes do ensino fundamental de duas escolas municipais de João Pessoa, Paraíba, cuja média de idade era de 12,8 anos (DP=1,44), sendo a maioria do sexo feminino (52,4%), que responderam a FBS e perguntas sociodemográficas. Uma análise fatorial confirmatória corroborou a estrutura de dois fatores da medida (χ2/gl=2,34, GFI=0,90, RMSEA=0,06), que se mostrou invariante em relação ao sexo dos participantes (ΔRMSEA<0,01). Observaram-se indicadores de confiabilidade adequados para os dois fatores: perpetração (α=0,80 e CC=0,81) e vitimização (α=0,83 e CC=0,83), que também mostraram evidências de validade convergente e discriminante a partir da variância média extraída (VME). Conclui-se que foram encontrados parâmetros psicométricos adequados dessa medida, justificando seu uso no contexto brasileiro.

Palavras-chave: bullying; escala; validação.


ABSTRACT

This study aimed to validate the Forms of Bullying Scale (FBS) to the Brazilian context, gathering evidence of validity and accuracy. Participants were 377 elementary students from two schools from João Pessoa-PB. Their average age was 12.8 years (SD=1.44), mostly female (52.4%), having answered the FBS and sociodemographic questions. A two-factor structure was corroborated by a confirmatory factor analysis (χ2/gl=2.34, GFI=0.90, RMSEA=0.06), which was invariant according to participants’ gender (ΔRMSEA<0.01). Adequate reliability coefficients were observed for the two factors: Perpetration (α=0.80 and CR=0.81) and victimization (α=0.83 and CR=0.83), which also showed evidence of convergent and discriminant validity. In conclusion, this scale gathering adequate psychometric parameters, justifying its use in the Brazilian context.

Keywords: bullying; scale; validation.


RESUMEN

El objetivo de este estúdio ha sido adaptar la Forms of Bullying Scale (FBS) al contexto brasileño, reuniendo evidencias de su validez y fiabilidad. Participaron 377 estudiantes de primaria de dos escuelas en João Pessoa-PB. Éstos tenían edad promedia de 12,8 años (DE=1.44), siendo la mayoría mujeres (52,4%), respondiendo a la FBS y preguntas sociodemográficas. Un análisis factorial confirmatorio apoyó la estructura teorizada de dos factores (c2/gl = 2,34, GFI=0,90, RMSEA=0,06), que se demostró invariable con respecto al género de los participantes (ΔRMSEA<0,01). Se observarón indicadores de fiabilidad adecuados para ambos factores: perpetración (α=0,80 y CC=0,81) y victimización (α=0,83 e CC=0,83), que también mostraron evidencias de validez convergente y discriminante. Se concluyó que esta medida reunió propiedades psicométricas adecuadas, justificando su uso en este país.

Palabras-clave: bullying; escala; validación.


 

 

As escolas são instituições de importante papel na socialização e formação de crianças e adolescentes, além de corresponderem a fontes de apoio social e afetivo (Fonsêca, 2008; Gouveia, 2009; Sisto et al., 2009). Desse modo, elas preparam as crianças e os jovens para o mundo adulto, exercendo influência na relação desse grupo com a sociedade (Pérez, 2007; Sousa, 2013). Portanto, dada sua importância social, tornam-se viáveis estudos a seu respeito, considerando, por exemplo, a violência no contexto escolar, fenômeno que comumente quebra a rotina da instituição (Malta et al., 2010).

De acordo com Stelko-Pereira e Williams (2010) é difícil um consenso entre diferentes áreas de estudo (psicologia, antropologia, sociologia e pedagogia) acerca da definição de violência escolar, uma vez que se trata de um fenômeno complexo e com múltiplas perspectivas. Não obstante, nos dias de hoje é comum indicar o bullying como o mais característico tipo de violência observado nas escolas (Mendes, 2011), sobretudo no ensino fundamental, entre estudantes de 11 a 13 anos (Lopes Neto, 2005). Porém, apesar de os estudos a respeito terem sido iniciados na década 1970, na Noruega (Soares, 2013), somente na década de 1990 as pesquisas sobre essa temática se expandiram para outros países (Olweus, 1993; Smith & Sharp, 1994; Rigby, 1998; Ross, 1996).

Bullying: do conceito às consequências

Do ponto de vista conceitual, o bullying é compreendido quase consensualmente como um comportamento agressivo, intencional e repetitivo que parte de um único indivíduo ou grupo e se dirige a outro estudante ou grupo (Lopes Neto, 2005; Pearce & Thompson, 1998), não constituindo apenas uma luta entre indivíduos de forças físicas e psicológicas equivalentes, mas uma disputa baseada em desequilíbrio de poder (Soares, 2013; Vanderbilt & Augustyn, 2010; Viscente, 2010). Nessa direção, Olweus (1993) caracteriza o bullying a partir de três critérios, definindo-o como um comportamento (1) agressivo e intencional; (2) repetido ao longo do tempo; e (3) dado numa relação de desequilíbrio de poder.

Esse fenômeno pode envolver diferentes atores, como os perpetradores (os bullies), geralmente estudantes que utilizam seu poder ou força física para amedrontar outros; as vítimas, os alvos do comportamento de bullying; as vítimas-agressores, que são intimidados e que também intimidam os demais colegas, buscando humilhá- los de modo a encobrir suas próprias limitações; e as testemunhas, que não se envolvem diretamente no comportamento de bullying, mas que presenciam o fenômeno e se calam, seja por não saberem como reagir ou mesmo por medo de serem as próximas vítimas (Lopes Neto, 2005; Olweus, 1993; Soares, 2013).

Olweus (1991) classifica o bullying em duas formas: direto e indireto. A direta ocorre quando a vítima é intimada pessoalmente pelo agressor, sendo dividida em bullying físico (empurrões, tapas, chutes) e verbal (gozações, calúnias, xingamentos) (Almeida, Silva, & Campos, 2008; Soares, 2013). A forma indireta, por sua vez, ocorre quando a vítima é excluída das atividades do grupo, ou quando boatos a seu respeito são espalhados com a intenção de lhe prejudicar (Soares, 2013), abarcando estratégias como a indiferença, o isolamento e a difamação da vítima (Lopes Neto, 2005). Finalmente, convém destacar uma nova forma de bullying, originada do advento de novas tecnologias e meios de comunicação, o cyberbullying, uma agressão realizada por meios eletrônicos para atingir de maneira repetida uma vítima (Smith et al., 2008).

É indiscutível que o bullying gera uma série de consequências que transpassam suas formas e atingem os diversos atores sociais envolvidos no fenômeno, física e emocionalmente, a curto ou longo prazo (Lopes Neto, 2005). Alguns estudos indicam efeitos como, por exemplo, situações de estresse (Konishi & Hymel, 2009), comportamentos autodestrutivos (Olafsen & Viemeroe, 2000) e sintomas pós-traumáticos (Balducci, Fraccaroli, & Schaufeli, 2011).

Albuquerque, Williams e D’Affonseca (2013) e Soares (2013) apontam que as vítimas do bullying, apresentam, especificamente, indicadores de depressão, ansiedade, baixa autoestima e ideações suicidas. Rolim (2008) verificou que crianças vítimas de bullying apresentam, com mais frequência, sintomas como insônia, dores de cabeça e abdominais e enurese noturna do que aquelas que não o são. Curiosamente, Wang, Iannotti, e Nansel (2009) apontam que vítimas do cyberbullying se mostraram mais depressivas do que as que cometem ou sofrem o bullying tradicional.

Não somente as vítimas, mas também os agressores sofrem os efeitos desse comportamento agressivo (Vanderbilt & Augustyn, 2010) tornando-se, a longo prazo, adultos com maior tendência a se envolver em comportamentos criminosos, apresentar dificuldades profissionais e afetivas, bem como apresentar personalidade antissocial, transtornos de ansiedade e abuso de substâncias psicoativas (Albuquerque, Williams, & D’Affonseca, 2013; Lopes Neto, 2005).

Segundo Lopes Neto (2005), outras consequências do bullying podem ser prejuízos financeiros e sociais que atingem a família, a escola e a sociedade como um todo, uma vez que a criança que pratica ou sofre esse tipo de violência pode necessitar de serviços especiais, como os de saúde mental, justiça da infância e adolescência, educação especial e programas sociais específicos. Desse modo, parece evidente a necessidade de monitorar sua presença nas escolas, permitindo pensar em estratégias para minorá-lo, sendo indispensáveis medidas que avaliem o comportamento de bullying.

Medidas de bullying

De acordo com Shaw, Dooley, Cross, Zubrick, e Waters (2013), embora haja um consenso sobre a definição e formas do bullying, a mensuração desse fenômeno ainda é foco de debates que têm resultado no desenvolvimento de uma série de instrumentos, a maioria desenvolvida para medir a vitimização e a perpetração. Apesar da imensa variedade de medidas, nenhuma é reconhecida por sua excelência e considerada universalmente como a melhor opção a ser adotada (Furlong, Sharkey, Felix, Tanigawa, & Greif-Green, 2010; Hamburger, Basile, & Vivolo, 2011). Embora a literatura destaque o instrumento desenvolvido por Olweus (1996), nem mesmo ele é isento de críticas (apresenta uma definição extensa de bullying no início das instruções, o que dificulta a compreensão por parte das crianças) (Lee & Cornell, 2010; Soares, 2013).

A escolha de um instrumento em detrimento de outro depende dos objetivos de cada estudo (Felix, Sharkey, Green, Furlong, & Tanigawa, 2011; Furlong et al., 2010; Greif & Furlong, 2006). Se o objetivo for comparar a prevalência da vitimização e da perpetração de modo geral, instrumentos com questões globais são indicados para categorizar estudantes que intimidam ou são intimidados no contexto escolar (Solberg & Olweus, 2003). No entanto, se um estudo objetivar verificar a prevalência de determinada forma de bullying (físico, verbal, indireto, cyberbullying), indica-se a utilização de instrumentos compostos por diferentes itens que avaliem cada uma dessas formas separadamente (Shaw et al., 2013).

Shaw et al. (2013) identificaram alguns instrumentos para avaliar o bullying em adolescentes, porém não foram suficientes para os propósitos de seu estudo, uma vez que ou mediam apenas a vitimização ou a vitimização e a perpetração com itens não equivalentes. Os autores argumentaram ainda que algumas dessas medidas têm uma quantidade grande de itens, tornando sua administração difícil, enquanto outras apresentam relativamente poucos itens, limitando a representação do construto bullying em suas diferentes formas. Considerando as limitações observadas nas medidas reunidas, os autores propuseram a The Forms of Bullying Scale.

Forms of Bullying Scale (FBS)

As limitações anteriormente mencionadas dos instrumentos de autorrelato para medir sucintamente as diferentes formas de bullying em adolescentes levaram Shaw et al. (2013) a desenvolverem a Forms of Bullying Scale (FBS), partindo de dois instrumentos amplamente referenciados: o Olweus Bully/Victim Questionnaire (OBVQ) (Olweus, 1996) e o Peer Relations Questionnaire (PRQ) (Rigby, 1998). A FBS é constituída por vinte itens igualmente distribuídos para avaliar a vitimização (FBS-V; alfa de Cronbach=0,87) e a Perpetração (FBS-P; alfa de Cronbach=0,85), tendo como diferencial a equivalência dos itens dos dois tipos ("I was teased in nasty ways" [FBS-V] e "I teased someone in nasty ways" [FBS-P]).

Os comportamentos de bullying são medidos na FBS em um sentido geral, com a possibilidade de ocorrerem tanto no meio virtual (cyberbullying) quanto pessoalmente (bullying tradicional). Além disso, seus itens são respondidos em escala de cinco pontos variando de 1 – Nunca a 5 – Várias vezes por semana, e definem semanticamente cinco formas de bullying: (1) verbal (xingamentos, apelidos desagradáveis); (2) físico (destruição ou roubo de pertences, agressões físicas); (3) ameaçador (amedrontar, intimidar); (4) relacional (quebra de amizades, exclusão de atividades); e (5) social (mentiras, boatos espalhados para causar danos sociais).

No estudo de desenvolvimento da FBS, Shaw et al. (2013) encontraram evidências de validade convergente e discriminante entre os dois fatores dessa medida e instrumentos de depressão e ansiedade, problemas de conduta, comportamentos prossociais e apoio dos colegas. Especificamente, o fator vitimização correlacionou- se positivamente com os fatores depressão (r=0,41; p<0,001) e ansiedade (r= 0,37; p<0,001) da Depression Anxiety Stress Scale (DASS; Lovibond, & Lovibond, 1995), e negativamente com a medida de apoio dos colegas (Perceptions of Peer Social Support Scale; Ladd, Kochenderfer, & Coleman, 1996) (r=-0,23; p<0,001). O fator perpetração, por sua vez, correlacionou-se positivamente com problemas de conduta (r=0,34; p<0,001), e negativamente com comportamentos prossociais (r=-0,21; p<0,001) da Strengths and Difficulties Questionnaire (SDQ; Goodman, 1997).

Além disso, Shaw et al. (2013) também encontraram resultados de uma análise fatorial confirmatória que evidenciaram a validade de construto a partir do modelo de dois fatores da FBS (χ2/gl=2,82; CFI=0,97; RMSEA=0,048 (0,043-0,053), bem como que essa estrutura é invariante entre os sexos dos participantes (ΔCFI=0,019>0,002; Δχ2=1215; p<0,001). Nesse sentido, parece pertinente empregar essa medida na avaliação do bullying, justificando a realização do presente estudo, cujo propósito principal é validá-la para o contexto brasileiro, reunindo evidência de sua validade de construto e precisão, em linha com os achados originais de Shaw et al. (2013).

 

Método

Participantes

Participaram desta pesquisa 377 estudantes do ensino fundamental de duas instituições públicas de ensino de João Pessoa, Paraíba, de idades variando entre 10 e 17 anos (M=12,8; DP=1,44), sendo a maioria do sexo feminino (52,4%). Tratou-se de uma amostra de conveniência (não probabilística), com a participação de sujeitos presentes nas turmas disponíveis das escolas selecionadas que concordaram em participar voluntariamente.

Instrumentos

Os participantes responderam um livreto contendo questões de caráter demográfico (perguntas sobre idade, sexo e série escolar), presentes no final do questionário e com finalidade de caracterizar a amostra, assim como a versão da FBS traduzida para o português, composta pelos mesmos 20 itens listados por Shaw et al. (2013), e igualmente distribuídos nos fatores perpetração e vitimização, sendo semanticamente equivalentes, com escala de resposta de cinco pontos, a saber: 1 – Nunca; 2 – Uma ou duas vezes; 3 – Algumas vezes; 4 – Uma vez por semana; e 5 – Várias vezes por semana.

A FBS foi inicialmente traduzida para o português por dois psicólogos fluentes tanto em inglês quanto em português, sendo as versões traduzidas por eles posteriormente consideradas por um terceiro psicólogo bilíngue que as comparou, chegando a uma versão preliminar que foi submetida a estudo de validação semântica realizado com vinte estudantes do 7º ano de uma escola pública. Procurou-se checar a compreensão dos participantes do conteúdo dos itens da escala de resposta adotada e das instruções sobre como os responder. Não sendo constatados quaisquer problemas a respeito, definiu-se a versão final utilizada neste estudo

Procedimento

Primeiramente, buscou-se contatar os responsáveis pelas instituições de ensino a fim de obter autorização para a realização da pesquisa. Todos foram informados sobre os objetivos e o procedimento, e, após assinatura do termo de responsabilidade, agendou-se o melhor momento para realização da coleta de dados. Foram cedidas turmas do 6º ao 9º ano, às quais se dirigiram os colaboradores devidamente treinados para dirimir quaisquer dúvidas dos participantes, informando também acerca do caráter voluntário e anônimo da participação e ressaltando que não assinassem ou colocassem seus nomes no questionário. No caso, seguiram- se as recomendações éticas de pesquisa com seres humanos, como estabelece a Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde. A coleta de dados ocorreu em contexto coletivo de sala de aula, porém cada participante respondeu individualmente um livreto, demandando-se um tempo médio de 10 minutos.

Análise de Dados

Os dados foram tabulados e analisados com o uso da versão 18 dos programas estatísticos PASW e AMOS. O primeiro foi empregado no cálculo de estatísticas descritivas (medidas de tendência central e dispersão, cálculo de frequência) e consistência interna, enquanto o segundo o foi para comprovar a estrutura de dois fatores da medida adaptada.

Inicialmente, realizou-se uma análise fatorial confirmatória para testar a estrutura de dois fatores da FBS, considerando os seguintes indicadores de ajuste (Byrne, 2010):

χ2 (qui-quadrado): é utilizado para testar a hipótese nula de que as diferenças entre a matriz de variâncias e covariâncias e a matriz implicada pelo modelo se devem ao acaso. Valores altos representam um ajuste ruim. Esse indicador é influenciado pelo tamanho da amostra, sugerindo- se que se recorra à sua razão em relação aos graus de liberdade do modelo (χ2/gl), sendo resultados adequados aqueles entre 2 e 3, aceitando-se até 5.

Goodness-of-Fit Index (GFI) e Adjusted Goodness-of-Fit Index (AGFI): indicam a proporção da variância-covariância nos dados que o modelo teórico explica. Consideram-se adequados valores próximos a 0,90 ou superiores.

Comparative Fit Index (CFI): trata-se de um índice comparativo de ajuste do modelo, indicando um melhor ajuste os valores mais próximos a 1.

Root-Mean-Square Error of Approximation (RMSEA): com seu intervalo de confiança de 90% (IC90%), esse indicador avalia o quanto o modelo se ajusta aos dados, considerando os residuais. Um valor próximo a zero significa que o modelo é ajustado. Considera-se que o RMSEA especificamente deva situar-se entre 0,05 e 0,08, aceitando-se até 0,10.

Pretendeu-se também checar a invariância fatorial da medida em relação ao gênero dos participantes, conforme fez Shaw et al. (2013) no estudo de elaboração do instrumento. Diferentes indicadores têm sido utilizados para esse propósito, sendo um deles o ΔRMSEA, que pode ser considerado para avaliar se as restrições mantêm o modelo invariante, levando em conta os grupos de interesse, no caso, definidos a partir do sexo. Considera-se que o modelo é invariante se o ΔRMSEA for menor que 0,015 (Chen, 2007; Wu, Li, & Zumbo, 2007).

Conhecida a estrutura fatorial da FBS, procedeu-se ao cálculo de sua consistência interna (alfa de Cronbach); uma medida é considerada confiável se possui um a igual ou superior a 0,70 (Hair, Black, Babin, Anderson, & Tatham, 2009). Buscou-se ainda reunir evidências complementares de validade de construto da escala, calculando- se a variância média extraída (VME) e a confiabilidade composta (CC) (Gouveia & Gabriel, 2013) para os seus dois fatores, tomando em conta as saturações padronizadas dos itens como resultantes da análise fatorial confirmatória.

A VME é indicadora de validade convergente de cada fator (o quanto explica o conjunto de itens), sendo adequado um valor igual ou superior a 0,50. Sua raiz quadrada apresenta evidências de validade discriminante. A CC, por sua vez, dirime dúvida quanto ao alfa de Cronbach, uma vez que o índice é influenciado pelo número de itens e pressupõe a independência entre os erros da medida. Recomenda-se que a CC seja igual ou superior a 0,70 (Hair et al., 2009).

 

Resultados

Análise fatorial confirmatória

Em coerência com o modelo teórico descrito por Shaw et al. (2013) em seu estudo original, procurou-se verificar a adequação de um modelo de dois fatores, fixando a saturação dos itens nos respectivos fatores de perpetração e vitimização. É importante frisar que foi necessário correlacionar dois pares de erros, um em cada fator, uma vez que, com isso, o modelo apresentou-se mais ajustado, em razão da alta covariância desses erros. Com isso, observaram-se os seguintes indicadores de ajuste: χ2/gl=2,34, GFI=0,90, AGFI=0,87, CFI=0,88 e RMSEA=0,06 (IC90%=0,052-0,068). O resumo desse modelo é apresentado na Figura 1 a seguir.

 

 

Conforme é possível verificar na Figura 1, todas as saturações (λ, lambdas), com exceção da saturação do item 2 em perpetração (λ=0,39), foram superiores a |0,40|, apresentando valor médio de 0,55 (amplitude de 0,39 a 0,69). Entretanto, todas foram estatisticamente diferentes de zero (λ≠0; z>1,96, p<0,05).

Além disso, procurou-se comparar o modelo de dois fatores com um modelo alternativo de um fator, no qual tanto os itens de Vitimização e Perpetração saturam no mesmo fator. Para comparação de modelos, têm-se utilizado indicadores como o Δχ2 (que deve apresentar diferenças estatisticamente significativas, com o modelo de menor χ2 considerado mais ajustado), ECVI e CAIC (valores menores indicam um modelo de melhor ajuste). Esses indicadores são apresentados na Tabela 1.

 

 

Conforme observado na Tabela 1, o modelo de dois fatores apresentou-se superior ao unifatorial, sendo mais ajustado ao conjunto de dados, uma vez que indicou melhores índices (χ2=392,3; ECVI=1,272; CAIC=690,41).

Invariância fatorial

Uma vez testada a estrutura de dois fatores da versão adaptada da FBS, pretendeu-se verificar sua invariância em relação ao sexo dos participantes. Para tanto, testaram- se três invariâncias com restrições relativas às cargas fatoriais dos itens (invariância de saturações e métrica), à covariância entre os fatores (invariância de covariâncias e estrutural) e aos erros da medida subjacentes aos itens (invariância de erros e residual). Essas invariâncias foram testadas comparando os indicadores de ajuste dos modelos restritos aos daquele sem restrição (modelo de linha base). Os resultados são apresentados na Tabela 2.

 

 

Como se observa na Tabela 2, tal estrutura se mostrou invariante em relação ao sexo dos participantes. Esse resultado pode ser apreciado na coluna correspondente aos valores de ΔRMSEA para cada modelo restringindo: cargas fatoriais (ΔRMSEA=0,002), estrutura (ΔRMSEA=0,002) e residuais (ΔRMSEA=0,006). Consistentemente, todos resultaram em valores inferiores a 0,015.

Consistência interna, confiabilidade composta e validade convergente e discriminante

Conforme mencionado, pretendeu-se verificar a consistência interna, a validade convergente e discriminante e a confiabilidade composta da FBS. Inicialmente, foram calculados os alfas de Cronbach (α) para cada um dos fatores. O primeiro fator, Perpetração, apresentou α=0,80, enquanto o fator Vitimização teve α=0,83. Portanto, parecem existir evidências desse parâmetro psicométrico. Esse resultado é reforçado pela confiabilidade composta (CC), cujos valores foram 0,81 e 0,83, respectivamente. As VMEs desses fatores, indícios de validade convergente, foram 0,77 e 0,80, respectivamente. Por fim, ambos os fatores apresentaram validade discriminante, sendo a raiz quadrada das suas VMEs iguais a 0,89 para o fator Perpetração e 0,87 para o fator Vitimização, ambas superiores à correlação padronizada entre esses fatores (λ=0,47).

 

Discussão

O presente artigo teve como principal objetivo validar a Forms of Bullying Scale (FBS) para o contexto brasileiro, reunindo evidências de sua validade de construto (validades fatorial, convergente e discriminante), bem como indícios de precisão (consistência interna), averiguando a pertinência de empregá-la no âmbito de pesquisas acerca do bullying neste país. Procurou-se justificar sua adaptação em razão das vantagens que esse instrumento apresenta (equivalência dos itens entre perpetração e vitimização, abrangência de diferentes formas do bullying) se comparado a outros conhecidos na literatura (OBVQ, Olweus, 1996; PRQ, Rigby, 1998). Acreditamos que o objetivo proposto tenha sido alcançado.

Seguindo o procedimento adotado por Shaw et al. (2013), quando da elaboração da FBS, procedeu-se diretamente a realização de uma análise fatorial confirmatória. Como no estudo realizado pelos autores, constatou- -se que um modelo de dois fatores é mais adequado do que um modelo alternativo unifatorial. Os dados sugeriram a adequação da estrutura de dois fatores da medida, com índices que, embora ambíguos, reúnem evidências de sua validade de construto; além disso, a estrutura apresentou-se ainda invariante quanto ao sexo dos participantes, com todos os modelos restritos (invariância métrica, estrutural e residual) apresentando valores de ΔRMSEA<0,015, considerado como critério para que o modelo apresente invariância fatorial entre os grupos (Chen, 2007; Wu et al., 2007).

Cabe assinalar que os indicadores, embora não tenham tido valores perfeitos, aproximaram-se daqueles recomendados na literatura (Byrne, 2010; Hair et al., 2009). Dessa forma, estima-se que, no conjunto, tenham sido satisfatórios como evidências de validade fatorial da FBS.

Além de reunidas evidências da adequação da estrutura e da invariância fatorial da FBS, deve-se ressaltar que seus fatores (perpetração e vitimização) apresentaram coeficientes de consistência interna (alfa de Cronbach e confiabilidade composta) iguais ou superiores a 0,80, valores acima do ponto de corte comumente recomendado para tais indicadores (0,70; Hair et al., 2009; Pasquali, 2003). Ressalta-se, ainda, que esses coeficientes não parecem ter sido resultado de número excessivo de itens, uma vez que cada fator foi constituído por apenas dez itens, quantidade que tem sido recomendada na literatura (Pasquali, 2003).

Foram também reunidas evidências de validade convergente da FBS. Para tanto, em lugar de simplesmente correlacionar suas pontuações com medidas equivalentes (Pasquali, 2003), partiu-se da variância média extraída (VME) de cada fator, estimando o quanto tal variância explica a convergência ou correspondência dos itens (Fornell & Larcker, 1981). A literatura tem indicado um valor de VME superior a 0,50 como evidência adequada desse parâmetro (Hair et al., 2009), sendo que os valores observados neste estudo superaram 0,70, o que reforça a adequação da medida.

Embora considerado que tenham sido alcançados os objetivos deste estudo, é possível identificar algumas limitações potenciais, das quais nenhum empreendimento científico está isento. Inicialmente, destacam-se aspectos relacionados à especificidade da amostra, uma vez que se tratou de uma amostra de conveniência (não probabilística), isto é, contou-se com a participação daqueles que aceitaram colaborar com a pesquisa, sendo todos estudantes de escolas públicas de uma única cidade da Paraíba, o que não representa, portanto, a população paraibana, tampouco a brasileira.

Outra importante limitação, embora não restrita a este estudo, é o fato de se tratar de uma medida explícita do bullying, tipo lápis e papel, susceptível ao falseamento das respostas por parte dos participantes, sobretudo por influência de desejabilidade social (Athayde, 2012), construto cuja influência deve ser reconhecida nas respostas dadas aos itens da FBS. Essas limitações, entretanto, não invalidam os resultados previamente descritos, cujo foco foi reunir evidências de validade de construto e precisão da medida, não estando dirigido a generalizar as pontuações dos participantes em relação ao bullying.

Estima-se que foram dados os primeiros passos para a validação da Forms of Bullying Scale (Escala de Formas de Bullying) ao contexto brasileiro. No entanto, serão necessários estudos futuros que pretendam ampliar o escopo da amostra, bem como elaborar normas diagnósticas, (Pasquali, 2003) e, além de superar as limitações indicadas sobre a amostra, checar sua validade discriminante quanto à desejabilidade social, comprovar sua estabilidade temporal (teste-reteste) e sua validade preditiva.

Finalmente, considerada a escola enquanto instituição que exerce importante papel na socialização e formação das crianças (Fonsêca, 2008; Gouveia, 2009; Sisto et al., 2009), e sabido que o bullying se apresenta como uma das mais comuns formas de violência neste ambiente (Mendes, 2011), é fundamental e de alta demanda a realização de intervenções que se proponham a combater, reduzir e evitar esse comportamento agressivo no contexto escolar, sobretudo em razão das consequências que podem surgir tanto a curto, médio e longo prazo (Lopes Neto, 2005) na vida dos diferentes atores do bullying. Nesse sentido, o presente trabalho contribui com a disposição de um instrumento apto a ser empregado no conhecimento da ocorrência desse fenômeno na escola, possibilitando e orientando possíveis intervenções.

 

Referências

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Recebido em fevereiro de 2014
1ª reformulação em abril de 2014
2ª reformulação em agosto de 2014
Aprovado em agosto de 2014

 

 

Sobre os autores

Layrtthon Carlos de Oliveira Santos: é Doutorando em Psicologia Social na Universidade Federal da Paraíba.
Rildésia Silva Veloso Gouveia: é Doutora em Psicologia Social pela Universidade Federal da Paraíba, Professora do Centro Universitário de João Pessoa.
Ana Karla Silva Soares: é Doutoranda em Psicologia Social na Universidade Federal da Paraíba.
Thiago Medeiros Cavalcanti: é Mestrando em Psicologia na Universidade Federal da Paraíba.
Valdiney Veloso Gouveia: é Professor Titular vinculado ao Departamento de Psicologia da Universidade Federal da Paraíba.


1Endereço para correspondência: R. Alzira Coutinho Araújo, 95, Bancários, 58051-119, João Pessoa-PB. E-mail: layrtthon.oliveira@gmail.com


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