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Boletim - Academia Paulista de Psicologia

versión impresa ISSN 1415-711X

Bol. - Acad. Paul. Psicol. vol.40 no.98 São Paulo ene./jun. 2020

 

I. TEORIAS, PESQUISAS E ESTUDOS DE CASO

 

Apego ao lugar e satisfação ambiental como preditores de bem-estar pessoal em crianças de 10-11 anos

 

Place attachment and environmental satisfaction as predictors of well-being in children age 10-11

 

Apego al lugar y satisfacción ambiental como predictores de bienestar personal en niños de 10-11 años

 

 

Fabrício Duim RufatoI; Eveline FaveroII

IPsicólogo, Mestre em Ciências Ambientais – Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Rua Cristo Rei, 665 - Iporã, PR. CEP: 87560-000 - e-mail: fabricio-rufato@hotmail.com, ORCID: 0000-0002-0514-3882
IIPsicóloga, Mestre em Extensão Rural (UFSM) e doutorado em Psicologia (UFRGS), Rua Engenheiro Ostoja Roguski, 700 - apto 601B - CEP: 80210-390 Jardim Botânico – Curitiba, PR - e-mail: evelinefavero@yahoo.com.br, ORCID: 0000-0003-4381-5755

 

 


RESUMO

O trabalho analisou o relacionamento ambiental em crianças (10-11 anos), considerando as variáveis apego ao lugar, identidade de lugar, satisfação ambiental e a influência dessas sobre o bem-estar, bem como, as diferenças nas médias por sexo. Participaram 886 (478 meninas, 405 meninos), com média de idade de 10,66 anos (DP= 0,64), do sexto ano do ensino fundamental público de Cascavel-PR. Utilizou-se um questionário para a coleta de dados, contendo as escalas Apego ao Lugar a=0,78, Identidade de Lugar a=0,79, Escala Infantil de Satisfação Ambiental (a=0,66, a=0,62) e Personal Well-Being Index-School Children a=0,74. Os dados foram analisados quantitativamente, através de regressão linear múltipla (Método Stepwise) e Teste t de Student. O estudo constatou que as variáveis satisfação ambiental (β=0,430; p=0,001) e apego ao lugar (β=0,143; p=0,001) explicam 25% (R2adj=0,25) do bem-estar pessoal em crianças. A diferença entre as médias por sexo mostrou-se significativa (t=3,910; gl=881; p=0,001; DM=0,28936; EPD=0,07400) apenas na dimensão conectividade com a natureza, sendo a maior média para o grupo dos meninos. As variáveis que mais contribuiram para os resultados foram a limpeza das escolas, o convívio com os animais, a relação afetiva com o bairro e o contato com a natureza, revelando a importância do relacionamento ambiental em seus diferentes aspectos para o bem-estar infantil.

Palavras-chave: satisfação ambiental; apego ao lugar; identidade de lugar; bem-estar pessoal; infância.


ABSTRACT

This paper analyzed the environmental relationship in children (age 10-11), considering the variables place attachment, place identity, environmental satisfaction and their influence on well-being, as well as differences in the averages by gender. The participants were 886 (478 girls, 405 boys), with an average age of 10.66 years (SD = 0.64), students of the sixth grade of a public elementary school in Cascavel-PR. A questionnaire was used for data collection, containing the Scales Place Attachment a = 0.78, Place Identity a = 0.79, Children's Environmental Satisfaction (a = 0.66, a = 0.62) and Personal Well-Being Index-School Children a = 0.74. Data were quantitatively analyzed using multiple linear regression (Stepwise Method) and Student's t-test. The study found that the variables environmental satisfaction (β = 0.430; p = 0.001) and place attachment (β = 0.143; p = 0.001) explain 25% (R2adj = 0.25) of personal well-being in children. The difference between the averages by sex was significant (t = 3.910; gl = 881; p = 0.001; DM = 0.28936; EPD = 0.07400) only in the nature-connectivity dimension, being the highest average for the boys' group. The variables that most contributed to the results were cleanliness of the schools, conviviality with the animals, affective relationship with the neighborhood and contact with nature, revealing the importance of the environmental relationship in its different aspects for child well-being.

Keywords: environmental satisfaction; place attachment; place identity; personal well-being; childhood.


RESUMEN

El trabajo analizó el relacionamiento ambiental en niños (10-11 años), considerando las variables apego al lugar, identidad de lugar, satisfacción ambiental y la influencia de esas sobre el bienestar, así como, las diferencias en los promedios por sexo. Participaron 886 (478 niñas, 405 niños), con promedio de edad de 10,66 años (DP= 0,64), del sexto año de la enseñanza fundamental pública de la ciudad de Cascavel-PR. Fue utilizado un cuestionario para la colecta de datos, conteniendo las escalas Apego al Lugar a=0,78, Identidad de Lugar a=0,79, Escala Infantil de Satisfacción Ambiental (a=0,66, a=0,62) y Personal Well-Being Index-School Children a=0,74. Los datos fueron analizados cuantitativamente, a través de regresión linear múltiple (Método Stepwise) y Test t de Student. El estudio constató que las variables satisfacción ambiental (β=0,430; p=0,001) y apego al lugar (β=0,143; p=0,001) explican 25% (R2adj=0,25) del bienestar personal en niños. La diferencia entre los promedios por sexo fue significativa (t=3,910; gl=881; p=0,001; DM=0,28936; EPD=0,07400) apenas en la dimensión conectividad con la naturaleza, siendo el mayor promedio para el grupo de los niños. La variables que más contribuyeron para los resultados fueron la limpieza de la escuela, el convivio con los animales, la relación afectiva con el barrio y el contacto con la naturaleza, revelando la importancia del relacionamiento ambiental en sus diferentes aspectos para el bienestar infantil.

Palabras clave: satisfacción ambiental; apego al lugar; identidad de lugar; bienestar personal; infancia.


 

 

1. Introdução

A psicologia ambiental (PA) explica como o indivíduo percebe e age no ambiente e, qual a influência de sua ação nesse mesmo ambiente. Assim, o ambiente é também capaz de influenciar a percepção do indivíduo. Por exemplo, a casa da pessoa é capaz de influenciar suas percepções, avaliações e atitudes, bem como, satisfazer suas necessidades. Do mesmo modo, uma cidade ou a cultura local e global influenciam o cotidiano dos indivíduos (Moser, 1998; Moser, 2003; Verdugo, 2005; Lima & Bonfim, 2009). Os primeiros estudos sobre PA foram publicados em meados dos anos 60 e 70, sendo objetivo estudar o indivíduo em seu contexto e suas relações com o meio ambiente e o social (Moser, 1998; Wiesenfeld, 2005). O desenvolvimento da área foi influenciado pela preocupação com os problemas ambientais, que surgiu nas ciências naturais e estendeu-se às demais ciências e pelo papel desempenhado pelo ser humano neste contexto (Pinheiro, 1997). Duas teorias psicológicas envolvem os processos psicológicos do indivíduo com o ambiente, sendo elas, a psicologia da percepção e a psicologia social. A primeira define o ambiente a partir da percepção e do espaço físico e a segunda, caracteriza-se por um ponto de vista que abarca a interação entre o indivíduo e o ambiente (Pinheiro, 1997). Segundo Moser (2003), a PA atualmente está relacionada ao bem-estar e a qualidade de vida. Porém, de forma sustentável, na qual a sociedade seja capaz de satisfazer suas necessidades com qualidade de vida e bem-estar social e ambiental, sem prejudicar as necessidades essenciais das gerações futuras: "[...] a referência às necessidades leva à inclusão não só da exigência de que o desenvolvimento seja harmonioso em relação e em respeito ao ambiente, mas também ao reconhecimento do próprio bem-estar do indivíduo" (Moser, 2003, p. 332). Dentre os estudos em PA, Thompson e Barton (1994) desenvolveram uma escala capaz de medir o ambientalismo ecológico das pessoas, considerando assim os comportamentos pró-ambientais. O ambientalismo ecológico pode ser classificado em duas vertentes: antropocentrismo e ecocentrismo. O primeiro remete à adoção de comportamentos de preservação e cuidado ambiental voltados para o benefício próprio ou de uma comunidade, por exemplo, economizar água, pensando apenas no benefício financeiro. O segundo remete, a atitudes pró-ambientais não pensando apenas no benefício próprio, mas sim por pertencer à natureza e respeitá-la por si mesma (Thompson & Barton, 1994).

Autores como Pinheiro e Pinheiro (2007), e Diniz e Pinheiro (2014) entrevistaram indivíduos, a fim de identificar a relação entre esses comportamentos pró- ambientais e se os mesmos condizem a comportamentos antropocêntricos ou ecocêntricos. Foi constatado que a maioria dos participantes possuía comportamentos antropocêntricos, ou seja, apatia ambiental, imediatismo e ausência de práticas de cuidado ambiental. Isto reforça a necessidade de explorar as dimensões psicológicas associadas com o não engajamento em práticas referentes ao cuidado ambiental. Autores como Coelho, Gouveia e Milfont (2006) identificaram que um dos motivos para desenvolver a prática ecocêntrica é o universalismo, pois reconhece a natureza e o homem como um todo, o que representa a compreensão, o apreço, a tolerância e a proteção do bem-estar das pessoas e da natureza. Então, quanto mais alto o nível de universalismo, maior será a predisposição da pessoa em agir favorecendo o ambiente. Desse modo, a educação desses valores leva a uma mudança das crenças e atitudes dos indivíduos, contribuindo para a modificação de condutas de não cuidado ambiental.

Para uma melhor compreensão da relação pessoa- ambiente, a teoria ecológica do desenvolvimento humano traz a luz os processos psicológicos e suas interações (Martins & Szymanski, 2004) e considera os processos psicológicos pertencentes a propriedades de sistemas. Passa da visão individualista, para uma visão, na qual o indivíduo é apenas parte do sistema, sendo o foco principal os processos e as interações (Narvaz & Koller, 2004).

Os níveis ambientais da teoria são quatro: microssistema, mesossistema, exossistema e macrossistema. O primeiro trata das  relações proximais que o indivíduo estabelece, sejam elas físicas, sociais ou simbólicas, por exemplo, a família. O mesossistema consiste no conjunto de microssistemas, no qual amplia-se a cada novo ambiente frequentado, como por exemplo, a escola. O terceiro, exossistema as pessoas não participam ativamente, mas o ambiente age indiretamente sobre o seu desenvolvimento, por exemplo, a comunidade inserida. E, por fim, o macrossistema que envolvem a cultura e a subcultura nas quais o indivíduo é socialmente parte (Martins & Szymanski, 2004; Narvaz & Koller, 2004).

Um construto relevante na perspectiva do microssistema do indivíduo é o apego ao lugar, que se refere à relação complexa existente entre pessoas e ambientes (Giuliani, 2003; Rosa, 2014). Para Alves, Kuhnen e Battiston (2015), o apego ao lugar está relacionado à satisfação das necessidades, por exemplo, alimentação, descanso, privacidade e proteção, fatores estes que demonstram a relação de dependência com o lugar. Está ainda ligado à "[...] continuidade do self, pois o lugar representa conexão entre passado e futuro, significativos para um indivíduo ou grupo, estes lugares geram um sentimento de pertença e são considerados parte da identidade individual ou grupal" (Rosa, 2014, p. 41).

Para o autor, o apego é o nível de relação que o indivíduo estabelece com determinado ambiente. Os autores Felippe e Kuhnen (2012) realizaram uma revisão bibliográfica sobre o tema, laços afetivos com lugares. Observaram que havia uma grande variedade de indicadores de apego ao lugar, como: enraizamento, pertencimento, afiliação, apropriação, compromisso, investimento, dependência, conforto, conhecimento do lugar, desejo de defender o lugar, desejo de proximidade e envolvimento, dificuldades para substituição local, felicidade, atração, cuidado com o lugar, influência do lugar sobre os acontecimentos, mobilidade e interação social, satisfação, orgulho do lugar, dentre outros (Felippe & Kuhnen, 2012). Na mesma direção, Farias e Pinheiro (2013) dedicaram- se a caracterizar os aspectos de vizinhança, como estas se configuram, suas relações sociais, ambientais e culturais, determinando a complexidade do apego ao lugar. Identificaram a interação social, sendo a mais predominante e que indica participação e cooperação entre vizinhos. São exemplos as festas, troca de ferramentas e utensílios, confraternizações entre familiares e vizinhos, conversas na calçada, criar filhos na vizinhança, confiar em deixar a chave da casa com o vizinho e privacidade. Assim, o apego ao lugar está relacionado com os benefícios que o ambiente traz, sejam, econômicos ou simbólicos (Alves, Kuhnen, & Battiston, 2015).

Alguns exemplos foram citados por Farias e Pinheiro (2013), em relação a sociabilidade da vizinhança, tais como, as  falas a respeito das interações entre esse povo: "os vizinhos fazem festas juntos", "movimentação na rua em torno das rodas de conversa", "vou à casa deles", "as pessoas todas se conhecem, sabem quem é de lá, quem não é" entre outras (Farias & Pinheiro, 2013, p. 31). Esse estudo corrobora a importância do suporte social entre esses vizinhos e indica os sentimentos em relação à comunidade, pois essas relações sociais próximas demonstram um investimento no local de moradia, que, consequentemente, condiciona os indivíduos a satisfação em relação à comunidade.

O apego ao lugar está relacionado ao vínculo emocional que envolve um ambiente físico (Felippe & Kuhnen, 2012). É "[...]o vínculo afetivo que as pessoas estabelecem com um determinado lugar, onde tendem a permanecer, sentirem-se cômodas  e seguras" (Hidalgo & Hernández (2001, p. 274). E a partir das cognições provocadas em determinado ambiente físico, configura-se a identidade de lugar, que é um aspecto da identidade pessoal referente ao espaço físico (Felippe & Kuhnen, 2012).

O conceito de identidade de lugar surgiu pela compreensão da importância do ambiente físico para o desenvolvimento da identidade pessoal do indivíduo. Sendo assim, a identidade pessoal também se desenvolve através da relação e interação com ambientes físicos. A identidade de lugar é uma subestrutura da identidade social do indivíduo, determinada a partir de conceitos de espaço geográfico definido, o que gera sentimentos de pertencimento e identidade pessoal (Bernardo & Palma-Oliveira, 2013). Tanto o apego ao lugar quanto a identidade de lugar garantem a satisfação de necessidades, considerando o valor simbólico daquele ambiente e a permanência ou não do indivíduo nele, sendo capazes de influenciar culturalmente determinada população (Lima & Bomfim, 2009). Outro conceito relevante em PA é o bem-estar pessoal. A maioria dos estudos sobre bem-estar tem como foco populações  adultas, sendo  recentes   estudos relacionados ao bem-estar em crianças e adolescentes. E ainda assim, os estudos têm relacionado o bem-estar infantil a partir da visão de pais e professores. Apenas na última década, surge o interesse de pesquisar sobre o bem-estar e a satisfação em crianças partindo do ponto de vista destas, procurando desenvolver instrumentos adequados à linguagem infantil (Casas, 2005; Strelhow, 2013; Galli, 2014; Schütz, 2014). De acordo com Cummins e Lau (2005), o bem-estar pessoal está relacionado à satisfação e à qualidade de vida de forma individual ou global, abrangendo a vida e as condições ambientais. No entanto, são três os aspectos fundamentais referentes ao bem-estar pessoal: satisfação global com a vida, felicidade e satisfação com os âmbitos da vida, ou seja, engloba aspectos psicológicos e psicossociais (Cummins & Lau, 2005).

Em um estudo utilizando a Escala de Bem-Estar Pessoal (Personal Well-being Index – School Children/ PWI-SC), realizado por Schütz (2014), foi possível identificar diferenças significativas no bem-estar pessoal entre crianças com família intacta e crianças de famílias reconstituídas. As primeiras apresentaram maior bem-estar, enquanto que as crianças de família reconstituída apresentavam menor bem-estar quando novo membro passava a participar dela. O estudo também identificou diferenças entre a idade, sendo que quanto mais velha a criança, menor o seu índice de bem-estar.

Outro aspecto a ser considerado é a satisfação ambiental e, segundo Galli (2014), atitudes favoráveis ao ambiente e com relação à natureza favorecem a formação de comportamentos pró-ambientais. A satisfação ambiental está relacionada com as condições dos ambientes frequentados pelas crianças. De acordo com Evans (2006), fatores como qualidade do bairro, comércio, transporte, saúde, exposição a produtos tóxicos e espaços de recreação interferem indiretamente no bem-estar e na satisfação ambiental da criança no entorno onde vive. Também, segundo o autor, as crianças preferem ambientes naturais que desenvolvem melhor a interação social e motora. De acordo com Galli (2014), faz-se necessário compreender a experiência afetiva na relação de cada indivíduo com a natureza para provocar o interesse em atitudes ambientais a favor do meio ambiente. No entanto, as atitudes ambientais podem ser definidas como sentimentos favoráveis ou não frente ao meio ambiente. Estão relacionadas com a percepção dos espaços  físicos, com os problemas ambientais complexos, como poluição, superpopulação, etc. E é por meio das experiências e das crenças aprendidas sobre o ambiente que o comportamento do indivíduo será influenciado (Coelho, Gouveia, & Milfont, 2006).

É de ampla divulgação na literatura que a psicologia ambiental permite explorar a relação entre a cognição, o comportamento e as situações reais, avaliando a qualidade de vida e as necessidades dos indivíduos em seu contexto social (Moser, 2003). Ao estudar a interação do indivíduo com o meio ambiente é indispensável avaliar o apego ao lugar, ou seja, os vínculos e as conexões, que o ser humano estabelece com o ambiente, já que esses interferirão na sua satisfação ambiental. Destarte, busca-se comprovar que a relação com o ambiente, também interfere na satisfação e na formação de comportamentos pró-ambientais das crianças.

Considerando a necessidade de ampliar os estudos na área, o presente trabalho tem por objetivo apresentar uma análise sobre o relacionamento ambiental em crianças com idades entre 10 e11 anos, considerando variáveis como apego ao lugar, identidade, satisfação ambiental e bem-estar pessoal. O estudo buscou ainda, analisar se as variáveis, apego ao lugar, identidade de lugar e satisfação ambiental, predizem bem-estar, bem como, identificar possíveis diferenças entre os sexos nas médias de apego ao lugar, identidade de lugar, bem-estar e satisfação ambiental em crianças com idades entre 10 e 11 anos. Foram levantadas as seguintes hipóteses para este estudo: a) O bem-estar pessoal em crianças é influenciado por fatores como o apego e a identidade de lugar e a satisfação ambiental. b) Meninos e meninas apresentam diferenças nos níveis de apego e identidade de lugar, bem como de satisfação ambiental, o que pode ser medido por meio das médias nesses construtos.

 

2. Método

2.1 Participantes

Participaram do estudo 886 alunos do sexto ano do Ensino Fundamental da rede estadual de ensino de Cascavel/PR, pertencentes a 16 escolas estaduais que atendem alunos nesse ano escolar. Segundo dados da Secretaria da Educação no ano de 2016, ao todo, 3.625 alunos frequentaram o sexto ano de escolas da zona urbana da cidade de Cascavel, num total de 29 escolas. A pesquisa contemplou 65% das escolas estaduais  do  município  e  obteve  amostra representativa da população investigada. A idade dos participantes era entre 9 e 11 anos (12 anos incompletos), média de 10,66 (DP 0,64), sendo 54% meninas e 46% meninos.

O sexto ano do Ensino Fundamental foi escolhido para compor a amostra porque, além dos alunos terem adquirido habilidade de leitura e interpretação suficiente para responder a um questionário, já possuem algum conhecimento relativo ao meio ambiente e às questões que envolvem a relação do homem com o mesmo.

2.2 Instrumentos

a) A Escala de Apego ao Lugar (EAL) consta de cinco itens likert (Hidalgo & Hernández, 2001). A Escala de Identidade de Lugar (EIL) consta com cinco itens likert (Vidal, Valera, & Peró, 2010). As duas escalas foram traduzidas do espanhol e adaptadas quanto à linguagem para o português pelos autores do atual estudo. Foi realizado teste piloto com 30 participantes, fim de verificar a adequação da linguagem para uso com crianças nesse estudo.

Um estudo de Rodrígues e Jiménez (2010) encontrou Alfa de Cronbach de 0,93 para EAL e 0,95 para EIL. Hidalgo e Hernández (2001) encontraram Alfa de Cronbach de 0,85 para EAL e Duarte e Lima (2005) encontraram na EIL Alfa de Cronbach de 0,87. No presente estudo encontrou-se Alfa de Cronbach de 0,78 para EAL, e 0,79 para EIL. (não está nas referências)

b) A Personal Well-Being Index-School Children (PWI-SC) que é composta de sete itens (Cummins, Eckersley, Pallant, Vugt, & Misajon, 2003). A escala foi traduzida e validada no Brasil por meio de um estudo de Bedin e Sarrieira (2014), que encontrou Alfa de Cronbach de 0,79. O estudo atual apresentou Alfa de Cronbach 0,74 para a escala.

c) A Escala Infantil de Satisfação com o Ambiente (EISA), com seis itens, adaptada por Galli (2014). A autora encontrou dois componentes: 1) Satisfação com o entorno medido por quatro itens – Estou satisfeito com a limpeza de minha escola; Estou satisfeito com a separação do lixo (reciclagem) na minha casa; Estou satisfeito com o jeito que os animais são tratados em geral e; Estou satisfeito com a quantidade de árvores nas ruas; 2) Conectividade com a natureza, medido por dois itens – Fico feliz quando passotempo com os animais e Fico feliz quando estou em contato com a natureza.

No estudo atual, o primeiro fator apresentou Alfa de 0,62 e o segundo fator com Alfa de 0,66 e índices de ajuste satisfatório (NFI, TLI e CFI de 0,94).

2.3 Procedimentos

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade Estadual do Oeste do Paraná conforme pareceres 1.124.474 de 25/06/2015 e 1.450.652 de 14/03/2016. Primeiramente, foi contatado o Núcleo Regional de Educação que autorizou a realização da pesquisa nas escolas. Posteriormente, as escolas foram contatadas e assinaram um termo de concordância institucional para o desenvolvimento do estudo. Termos de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) foram distribuídos aos alunos para que entregassem aos pais ou responsáveis.

Foi combinado com a escola a data de devolução dos TCLEs, bem como, da aplicação dos questionários. Durante a aplicação, houve a presença de pelo menos um pesquisador para esclarecer dúvidas. Os participantes foram informados dos objetivos do estudo e do caráter voluntário da participação. O questionário foi aplicado no ano de 2016.

2.4 Análise de dados

Os dados relativos à caracterização da amostra foram analisados quantitativamente, a partir de técnicas de estatística descritiva (média e desvio padrão, frequência e porcentagem), com auxílio do Statistical Package for Social Sciences (SPSS), versão 23.0. Foram analisadas as diferenças entre as médias dos grupos por sexo e se essas são significativas. Também foram empregadas análises de estatística avançada (análise fatorial, correlações, análise de regressão linear (VIs: Apego ao lugar, Identidade de lugar, satisfação ambiental; VD: Bem-estar), de modo a explorar os dados e testar as hipóteses da pesquisa.

 

3. Resulatdos e Discussão

3.1 Análise de preditores de bem-estar pessoal em crianças (10-11 anos)

Após a verificação da adequação das escalas utilizadas no estudo, foi aplicada a análise de Regressão Linear Múltipla pelo método Stepwise, a fim de identificar quais variáveis melhor explicam o bem- estar pessoal em crianças de 10 a 11 anos  no município de Cascavel.

As variáveis independentes foram os itens das escalas de apego ao lugar, identidade de lugar e satisfação ambiental e para a variável dependente, foi criada uma variável a partir da média do somatório dos itens da escala de bem-estar.

A Tabela 1 apresenta os coeficientes da regressão. Das quinze variáveis analisadas, apenas seis entraram no modelo e apresentaram significância estatística. São elas: a) Itens Escala infantil de Satisfação Ambiental: Estou satisfeito com a limpeza da minha escola; Fico feliz quando estou em contato com a natureza; Estou satisfeito com a separação do lixo na minha casa; Fico feliz quando passo tempo com os animais; b) Itens da Escala de Apego ao Lugar:

Eu sentiria muito se tivesse que me mudar para outro bairro; Eu gosto de viver no meu bairro. Os itens da escala de identidade de lugar não apresentaram significância estatística para compor o modelo que prediz bem-estar.Constata-se que as variáveis que exercem influência sobre o bem-estar estão relacionadas ao contato e às vivências na relação com a natureza. Segundo Collado, Staats e Corraliza (2013), quando as crianças entram em contato direto com a natureza, realizando trocas de experiências, eleva-se o entendimento e a sensibilização com as questões ambientais.

 

 

Dos construtos estudados, apenas variáveis relativas à satisfação ambiental e ao apego ao lugar contribuem para o bem-estar na amostra analisada. As variáveis excluídas do modelo foram: Eu me sinto apegado ao meu bairro (EAL), No meu bairro eu me sinto como se estivesse em casa (EAL); Quando estou fora eu sinto falta do meu bairro (EAL); me identifico com meu bairro (EIL); Meu bairro faz parte da minha identidade (EIL); Sinto que pertenço ao meu bairro (EIL); Meu bairro é diferente de outros bairros (EIL); Meu bairro tem a ver com minha história de vida (EIL); Estou satisfeito com o jeito com que os animais são tratados em geral (EISA) e Estou satisfeito com a quantidade de árvores nas ruas (EISA).

O bem-estar infantil está relacionado aos lugares em que frequentamos, como por exemplo, a escola, a igreja e a casa, bem como, a saúde, lazer e segurança, etc. (Strelhow, 2013). Nesse estudo, as variáveis que contribuem para o bem-estar estão relacionadas ao ambiente escolar, ao ambiente do bairro e ao contato com animais e natureza, ou seja, relacionadas ao lazer. Já os demais construtos podem não ter contribuído para o bem-estar, pois abordam de forma genérica as bases referentes ao que corresponde o bem-estar segundo teóricos.

O modelo de regressão linear múltipla para preditores de bem-estar pessoal mostrou que a associação entre as variáveis de critério (Bem-Estar Pessoal) e as explicativas (variáveis selecionadas das escalas de Apego ao lugar e Satisfação ambiental) correspondem ao valor R²= 0,25. Juntas as variáveis foram responsáveis por explicar 25,1% do bem-estar pessoal em crianças com idade entre 10-11 anos. O valor de Durbin-Watson foi de 2,024 (está entre 1 e 3) o que indica que os erros na regressão são independentes, portanto, não decorrem de auto-correlação, sendo a significância do modelo confiável (Field, 2009).

A análise de ANOVA por sua vez (Tabela 2) mostrou-se significativa (p<0,001) com estatística F= 49,189, de modo que é improvável que o resultado tenha ocorrido por acaso.

 

 

Após análise dos resultados conclui-se que o apego ao lugar e satisfação ambiental, e bem-estar. No entanto, identidade de lugar não aparece como um fator que possa influenciar o bem-estar em crianças. Assim, a hipótese foi parcialmente confirmada.

A satisfação ambiental diz respeito à satisfação com o entorno e à conectividade com a natureza, sendo que a satisfação com o entorno remete à percepção de algo externo ao indivíduo, enquanto que a conectividade está relacionada à interação entre pessoa-ambiente (Galli, 2014). Segundo Collado (2012), as crianças têm passado menos tempo em contato com ambientes naturais. Como consequência da tecnologia, as mesmas têm ficado mais em casa e entretidas em aparelhos como videogames, computadores e têm vivido menos experiências em contato real com a natureza. E essa falta de contato com ambientes naturais influencia negativamente para a conservação do ambiente, pois o indivíduo não presencia a relação direta que possui com a natureza e nem vivencia os problemas ambientais do local onde está inserido (Collado, 2012).

Para Evans (2006), o contato em ambientes naturais e atividades relacionadas a estes ambientes propiciam o bem-estar em crianças, pois colaboram para o desenvolvimento de habilidades motoras e aliviam o estresse dos afazeres cotidianos. Segundo Collado, Staats e Corraliza (2013), a exposição direta das crianças à natureza, aumenta a afinidade emocional com o ambiente natural, favorecendo o vínculo emocional com o mesmo. O estudo de Galli (2014), por sua vez, reportou que os indivíduos veem os ambientes urbanos públicos e de contato com a natureza (parques, praças, etc.) como transitórios, que interligam a passagem de um lugar seguro para outro, como por exemplo, ir de casa para a escola, hospitais, lojas, etc. Na mesma direção, Homel e Burns (1989) afirmaram que, quanto mais próximo de zonas urbanas e indústrias a criança vive, menor é seu bem- estar, pois essas áreas possuem em menor quantidade, locais de lazer e segurança para as crianças interagirem e estarem em contato direto com o ambiente onde vivem. Ainda em relação ao contato com a natureza, foi realizado um estudo comparativo entre crianças acampadas em ambientes naturais e crianças acampadas em ambientes urbanos. Os resultados identificaram que o primeiro grupo apresentou maiores crenças ecológicas e maior interesse em conhecer e aprender sobre lugares naturais, do que o grupo de crianças do acampamento urbano (Collado, Staats, & Corraliza, 2013). Howe, Kahn Jr e Friedman (1996), em estudo comparativo entre crianças brasileiras e americanas, obtiveram resultados semelhantes para ambas, no qual, crianças de quinta série identificaram a importância do cuidado ambiental, através de comportamentos como a separação do lixo, não jogar lixo nos rios, cuidado com os animais. Também foram considerados como importantes para o sistema ecológico, os animais e a preservação das florestas.

Em relação ao apego enquanto preditor de bem- estar, Dalbem e Dell'aglio (2005) afirmaram que o mesmo já é definido na relação mãe e bebê, onde a vinculação afetiva de ambos influencia no desenvolvimento cognitivo, social e afetivo da criança, sendo que o mesmo, passa uma base de segurança para a criança explorar o ambiente. A partir deste construto, Lima e Bomfim (2009) ressaltaram que o apego ao lugar está relacionado aos sentimentos e acontecimentos em relação a lugares que vivenciam experiências significativas. Giuliani (2004), cita três processos que podem gerar sentimento de apego, são eles: satisfação das necessidades da pessoa no local; nível simbólico a partir dos significados que o lugar remete a identidade da pessoa, como por exemplo, o lugar define parte do que o indivíduo é; tempo que a pessoa reside e convive no lugar, levando em consideração o sentimento de segurança e bem-estar provocado pelas interações sociais.

Por sua vez, Macedo, Oliveira, Günther, Alves e Nóbrega (2008) reportaram que o apego ao lugar está mais relacionado às interações sociais que o ambiente possibilita para o indivíduo, do que à estrutura física do mesmo. O apego não se desenvolve somente no viés de que, para se tornar significativo ao self do indivíduo, o mesmo necessita ter a vivência do lugar, pois  o lugar pode remeter a um significado já existente, como por exemplo, o lugar que remete a uma experiência vivida anteriormente (Gillford, 2014). Assim, situações como assaltos, criminalidade, poluição, ruídos, falta de saneamento e não atendimento de necessidades básicas no bairro, são fatores estressantes que podem levar a diminuição do apego a este lugar (Martín, Hernández, & Ruiz, 2006).

Considerando que os resultados deste estudo relacionam o bem-estar pessoal com a satisfação com a limpeza da escola e a separação do lixo em casa, cabe observar que Olivos (2010), realizou estudo sobre as condições do espaço físico. Para o autor, tanto da percepção do físico quanto a condição ecológica, relacionadas à sustentabilidade e à organização, influenciam na aprendizagem dos alunos, como também na aquisição de comportamentos pró- ambientais. No mesmo estudo, o autor coloca exemplos de escolas onde estão presentes ruídos e poluição, os quais interferem indiretamente na aprendizagem dos alunos, pois, podem afetar a atenção e serem dispositivos geradores de estresse.

3.2 Difernças entre os sexos nas variáveis apego ao lugar, identidade de lugar, bem-estar e satisfção ambiental

A Tabela 3 apresenta as médias de satisfação ambiental, apego ao lugar, identidade de lugar e bem- estar, comparando-as por sexo. Os itens de cada escala (EAL, EIL, EISA e PWI-SC) foram somados de modo a criar uma variável para cada construto. No caso da Escala de Satisfação Ambiental, foram criadas duas variáveis, a partir do somatório dos itens dos dois fatores – conectividade com a natureza e satisfação com o entorno.

 

 

A Tabela 4 apresenta os resultados do teste de amostras independentes, no qual o teste de Levene resultou não significativo para a maioria das variáveis. Desse modo, a hipótese nula é verdadeira e a diferença entre as variâncias é zero, sendo as variâncias praticamente iguais e as suposições convincentes. Os resultados indicam que não há diferenças significativas entre as médias por sexo, para as escalas de apego ao lugar, identidade de lugar, satisfação com o entorno e bem-estar pessoal. Porém, no fator conectividade com a natureza, a diferença entre os sexos mostrou-se significativa, sendo que as meninas apresentaram menores médias quando comparadas aos meninos.

 

 

Segundo Galli (2014), a conectividade com a natureza está relacionada à experiência afetiva com a natureza, com o quanto o indivíduo se sente como pertencente à natureza. Do mesmo modo, Olivos (2009) ressaltou que a valorização do ambiente está relacionada com a satisfação pessoal, sendo que o contato com o ambiente gera impacto na qualidade de vida e oportuniza a construção de uma identidade positiva. Uma possível explicação pode estar vinculada às questões de gênero no que diz respeito ao aspecto cultural. De acordo com a psicologia evolucionista as diferenças de gênero são consolidadas no ambiente pela adaptação do ser humano, considerando os papéis entre homens e mulheres instituídos pelos ancestrais, os quais geram um sistema de crenças e valores estabelecidos culturalmente (Hansen, Macarini, Martins, Wanderlind, & Vieira, 2007). Essas diferenças podem estar relacionadas às questões culturais, por exemplo, população mais tradicional e diferenças de classes econômicas. Em seu estudo Carvalho,  Beraldo,  Santos  e  Ortega  (1993) compararam crianças da cidade de São Paulo e Recife, de diferentes classes econômicas (classe média alta e média baixa). O estudo encontrou diferenças estereotipadas pelas crianças em relação às brincadeiras de futebol e "lutinha", como também identificou que em São Paulo as diferenças entre classes foram mais acentuadas do que em Recife, o que pode estar associado às questões culturais, por Recife ser cidade menor e mais tradicional em relação à São Paulo. A partir desse dado no presente estudo, também podem estar presentes questões culturais da cidade de Cascavel-PR, como por exemplo, preocupações com a violência sexual contra o sexo feminino e outros fatores que precisariam ser investigados. No que diz respeito aos papéis, Wanderlind (2006) estudou as  diferenças  nas brincadeiras em um pequeno grupo de crianças de ambos os sexos, constatando que os  meninos buscavam por brincadeiras mais realistas e de confronto, onde exploram o ambiente físico sem a supervisão de adultos. Já as meninas brincam mais de faz-de-conta em pequenos grupos e geralmente não se importam com a supervisão de um adulto, de modo, que os primeiros passam mais tempo em contato com a natureza em atividade outdoor.

No estudo de Noronha e Corasolla (2014) foram realizadas atividades lúdicas com crianças de ambos os sexos sobre a representação do meio ambiente, na qual foi evidenciado que crianças do sexo feminino possuem uma compreensão de meio ambiente mais complexa do que os meninos. Elas conseguiram expressar o meio ambiente de diferentes modos, como espaço natural e modificado, ambientes construídos, de lazer, bem como, os indivíduos habitantes do ambiente como possuindo sentido de pertencimento. Já os meninos representaram o meio ambiente de forma difusa, como ambiente natural e construído pelo homem, porém de forma aleatória e com menor percepção em relação às meninas.

Em estudo de mapas mentais em crianças sobre a percepção ambiental numa área de preservação, Abdo (2005) encontrou diferenças entre os sexos. O autor referiu que, de acordo com as tendências culturais os meninos convivem mais ligados ao ambiente natural, por exemplo, saem para pescar, ajudam o pai com afazeres que envolvem animais e plantas, enquanto as meninas ficam dentro de casa com afazeres domésticos junto à mãe, demorando assim para entrar em contato com o "mundo" lá fora. De acordo com o estudo do autor, a interpretação dos mapas mentais por meio dos desenhos das crianças identificou que as meninas possuíam contato com um ambiente restrito, desenhando laranjeiras, roseiras, dentre outros elementos que se relacionam ao ambiente ao redor de sua casa. Já os meninos  desenharam equipamentos de agropecuária e seus afazeres na pastagem, revelando um contato maior de exploração com o ambiente natural (Abdo, 2005). O estudo de Silva, Pontes, Silva, Magalhães e Bichara (2006) corroborou com o estudo de Abdo (2005), que identificou a frequência e as brincadeiras de crianças que brincam na rua. Entre os registros da pesquisa, na grande maioria foram meninos, ao invés de meninas que convivem em brincadeiras na rua. Na pesquisa atual, os meninos apresentaram maior conectividade com a natureza (Média 31,8; DP 106,8) do que as meninas (Média 28,9; DP 111,8) e essa diferença foi significativa (p=0,001).

Os estudos de Silva e outros (2006) e de Abdo (2005), indicaram que, por meio do viés cultural, os meninos frequentam mais ambientes externos e exploram o ambiente como um todo. Já as meninas, possuem responsabilidades domésticas e também uma preocupação maior, já que o sexo feminino é considerado mais vulnerável do que o masculino.

Uma possível explicação para o fato das outras variáveis não apresentarem diferenças entre os sexos é porque as mesmas se referem a questões mais amplas do que a simples experiência de contato com a natureza. Por exemplo, identidade pressupõe o tempo em que se reside no lugar, apego tem relação com o vínculo, o bem-estar aparece ligado à situação econômica e social, a satisfação com o entorno está relacionada com a forma e com a organização do ambiente, enquanto que a conectividade apresenta relação com a experiência em si, independentemente se a mesma for no bairro, na escola, etc.

Para os meninos, as brincadeiras no ambiente natural possibilitam reproduzir cenários do seu interesse, como exemplo o futebol, andar de bicicleta etc. Já para as meninas seu contato com ambiente natural é mais restrito devido às atividades domésticas, por exemplo, ajudar a mãe em afazeres de casa (lavar louça, cuidar do quintal, faxinar, etc.). Por fim, a maioria das brincadeiras de meninas são dentro de casa, como brincar de boneca, casinha, etc., diferenças essas que se devem aos  construtos culturais, que socialmente indicam diferenciações de atividades de acordo com o gênero.

 

4. Considerações finais

O estudo contribuiu para mensurar as variáveis que compõem o bem-estar em crianças. As escalas utilizadas mostraram-se adequadas na amostra da pesquisa e conseguiram explicar 25% do bem-estar pessoal em crianças de 10-11 anos (12 anos incompletos) do município de Cascavel-PR. Variáveis como a limpeza das escolas, o convívio com os animais, a relação afetiva com o bairro onde vivem e o contato com a natureza, estão relacionadas com o aumento do bem-estar na amostra estudada. A escala EISA apresentou baixa confiabilidade estatística por apresentar dois fatores, os quais são compostos por poucos itens. Com isso, estudos futuros precisam aperfeiçoar o instrumento, tornando-o mais preciso em relação aquilo que pretende medir e incluindo variáveis que possam ser pertinentes à satisfação ambiental em crianças. Tais variáveis, podem ser levantadas em estudo qualitativo e descritivo.

O estudo também contribuiu com pesquisas no campo do relacionamento ambiental em crianças, no qual, as pesquisas em psicologia são bastante escassas. Indica-se a necessidade de aprofundar como as crianças percebem o ambiente e o que compreendem por bem-estar, sendo adequado proceder novas investigações, que possam identificar variáveis para compor futuros instrumentos para a análise mais aprofundada do bem-estar infantil e da satisfação ambiental, em especial. Por fim, estudo mais abrangentes poderiam utilizar o socioambiente como objeto, incluindo aquelas  variáveis  que são pertinentes socialmente, como as condições de moradia, as dificuldades de acesso às áreas verdes por pessoas de diferentes classes sociais, a relação com as áreas verdes, sendo elas para atividade física, lazer e contemplação, ou para se deslocar de um lugar para outro em função da escola ou trabalho.

Agradecimentos:

Às crianças participantes do estudo e aos profissionais que contribuíram para o desenvolvimento da pesquisa. Ao CNPq pelo financiamento da pesquisa através do Edital Universal Número 455229/2014-7 (Chamada: MCTI/CNPQ/ Universal 14/2014).

 

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Recebido: 16.03.2019
Corrigido: 14.11.2019
Aprovado: 25.02.2020

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