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Psicologia USP

versión On-line ISSN 1678-5177

Psicol. USP v.17 n.3 São Paulo sep. 2006

 

EDITORIAL

 

Sob o signo da paixão bem poderia ser uma expressão, concisa o suficiente e precisa na medida certa da turbulência que evoca, para nomear com rigor a vitalidade e o compromisso ético-político que animam o trajeto de Sylvia Leser de Mello, a quem este número de Psicologia USP é dedicado.

Os depoimentos que o compõem e que abarcam o amplo campo de atividades às quais tem se dedicado, são a orquestração viva de muitas vozes que permitem saborear como é do enlace entre o pensamento disciplinado e a imaginação sonhadora que pode surgir o ato amoroso da produção de conhecimento. É que o amor é a alegoria por excelência, assopra uma inspiração benjaminiana, pois o amado é imprescindível como forma de conhecimento, desde que é parte de nosso auto-reconhecimento. Assim se compreende como do abraço genuíno aberto à diversidade, atitude tão peculiar à Sylvia, advém uma generosidade surpreendente.

De modo que, além de zelar pela identidade editorial de Psicologia USP, em sua vocação para o debate de idéias e para a perspectiva crítica na interlocução da Psicologia com as demais áreas do conhecimento &– legado que nos deixaram Sylvia Leser de Mello como editora e a Comissão Executiva que nos antecedeu &–, importa cultivar o exercício de uma postura, fértil na produção de uma atmosfera, bem emoldurada pela imagem emblemática da mesa oval da sala de trabalho da Sylvia. Neste ninho acolhedor, horizonte de inspiração para alunos, orientandos, discípulos, colegas e amigos, pode ser experimentado o prazer do convívio intelectual fundado no reconhecimento da alteridade, no respeito às diferenças, no estímulo à autonomia e na experiência do poder compartilhado. Desta forma se constituiu uma espécie de matriz, embalada pela pulsação do pensamento emocionado, que se nutre das boas sementes da firmeza na crítica aos dogmatismos, da leveza necessária na diversão e no humor e, sobretudo, sempre que possível, de muita delicadeza, conforme exige o trato com as intensidades complexas que atravessam as situações humanas.

Mais quatro trabalhos compõem este número. Inicialmente, é proposto um encontro crítico entre a fenomenologia e a esquizoanálise, no sentido de favorecer o rompimento do isolamento entre essas propostas filosóficas ou mesmo a apropriação unilateral de uma sobre a outra, dada a importância de ambas nas perspectivas de pesquisa que fornecem para a Psicologia.

O próximo artigo se debruça nos aforismos adornianos presentes em Minima Moralia, tomando como objeto central de investigação a tensão necessária presente na relação entre a anulação da individualidade e os caminhos de resistência passíveis de serem empreendidos pelo indivíduo.

O trabalho subseqüente realiza um estudo das peculiaridades de produção de subjetividades no âmbito institucional de um seminário católico, tomando a rede de relações entre os padres formadores e os seminaristas como um dispositivo privilegiado de análise.

O último ensaio se ampara no pensamento de Iván Illich, em suas críticas à escolarização e à sociedade de consumo, e, ao delinear um horizonte possível de otimismo, no cenário de uma contemporaneidade tão aturdida e quase desencantada, ventila o centro do debate com a idéia de utopia, melhor dizendo, do exercício da eleição contínua de utopias realizáveis por parte de cada coletividade humana.

Temática que faz jus à querida homenageada neste número de Psicologia USP.

 

Ana Maria Loffredo