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Ciências & Cognição

versión On-line ISSN 1806-5821

Ciênc. cogn. vol.15 no.1 Rio de Janeiro abr. 2010

 

Ensaio Acadêmico

 

Aprendizagem em ambientes virtuais: plasticidade na formação do adulto educador

 

Learning in virtual environments: plasticity in the adult educator training

 

 

Adriana Rocha Bruno

Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Juiz de Fora, Minas Gerais, Brasil

 

 


Resumo

Desde 2000, a autora deste ensaio desenvolve pesquisas que integram as áreas da Educação, Tecnologias e Ambientes Digitais e Neurociência. O foco principal de tais investigações é a aprendizagem do adulto em ambientes online.. Os estudos aqui compartilhados indicam que o adulto aprende por meio de experiências que são desenvolvidas em ciclos dinâmicos, em espiral crescente integrada, ao longo de sua vida. O conceito de plasticidade, advindo da neurociência, é entendido como condição fundamental do organismo humano e foi ampliado para compreender os processos emergentes das relações sociais, em movimentos de adequação e transformação das ações cognitivo-emocionais, essenciais para a aprendizagem humana.. A partir dessas premissas, o texto apresenta os estudos realizados pela pesquisadora / autora, que focalizam a aprendizagem do adulto educador sob dois aspectos: 1) o binômio emoção / razão e suas implicações no processo de aprendizagem e; 2) as contribuições da Neurociência e os conceitos de plasticidade e integração voltados para a aprendizagem do adulto em ambientes virtuais de aprendizagem (AVA). © Cien. Cogn. 2010; Vol. 15 (1): 043-054.

Palavras-chave: plasticidade social; aprendizagem; neurociência; educação online; tecnologias da informação e comunicação.


Abstract

Since 2000, the author of this essay develops researches that integrate the areas of Education, Technology and Digital Environments and Neuroscience. The main focus of such investigations is the learning of the adult within online environments. The studies hereby shared indicate that th. adult learns by means of experiences which are developed fro. dynamic cycles, integrated growing spiral throughout his life. The plasticity concept, resulting fro. the neuroscience, is understood as a fundamental condition of human structur. and has been expanded to understand the emerging processes of social relationships, by movements of adequacy and transformation of cognitive-emotional actions that are essential to human learning. Starting from these premises, this tex. presents the studies carried ou. by the researcher/author, which focus on the learning of adult educator in two ways: 1) the binomial emotion / reason and its inferences in the learning process and; 2) the contributions of Neuroscience and the concepts of plasticity and integration aimed at the learning of the adult in virtua. environments of learning (AVA). © Cien. Cogn. 2010; Vol. 15 (1): 043-054.

Keywords: social plasticity; learning; neuroscience; online education; information and communication technologies.


 

 

Introdução

"A mente e a consciência, seu ponto máximo, são misto de cérebro e de cultura. Entender a articulação destes conceitos pode auxiliar numa naturalização de certos discursos das ciências humanas e na culturalização de certos enfoques restritivos das ciências cerebrais." (Del Nero, 1997: 12)

O cérebro tem sido o grande mistério do corpo humano. Há séculos cientistas vêm se dedicando a estudos que desvelem esse sistema tão complexo que, tal como uma "caixa preta", parece aguardar os exploradores do misterioso tesouro.

O excerto de Del Nero (1997) evidencia o enfoque que desejo dar a este texto e que, a meu ver, mais se aproxima da contemporaneidade: integração, articulação e imbricação de conhecimentos. O respeito e o reconhecimento das especificidades de cada área deve ser mantido, mas perceber o quanto o diálogo entre as ciências possibilita enxergar e ampliar nossos campos de estudo e de ação deve ser o objetivo. As palavras de Del Nero podem ser lidas como o prenúncio do que estamos vivenciando: a não cisão, a impossibilidade de ruptura entre as ciências. Em convergência com tais ideias, Mora (2007), em sua definição sobre neurocultura, alerta sobre a emergência na reavaliação das humanidades para a promoção, crítica, entre as ciências e as humanidades.

A área da educação e, em especial, os estudos sobre a aprendizagem, carecem desta integração de fato. Não é possível mais desenvolver pesquisas sem buscar o conhecimento socializado, independente da área. Os movimentos hoje são de inclusão, de acesso, de produção coletiva; e esta dinâmica pertence a todos os humanos e a todas as ciências.

A neurociência tem realizado grandes avanços nas últimas décadas. Suas descobertas oferecem contribuições significativas sobre a aprendizagem para a área da educação. Integrar os conhecimentos destes campos fortalecerá as ações educacionais. Como aprendemos? Que processos sinápticos são realizados e o que acontece com nosso cérebro (e conosco) durante a aprendizagem? Quais são os melhores caminhos que os docentes devem trilhar para auxiliar a aprendizagem dos alunos? Como o adulto aprende? São algumas das questões que ainda representam parte de um quebra-cabeças, embora tenhamos boas pistas sobre o que envolve todo este processo.

Hipócrates (460-379 a.C.) já sinalizava a integração cérebro / mente quando atribuía ao cérebro a responsabilidade por alojar as funções mentais. Os estudos de Luria (1981), no início do século XX, também anunciavam o caráter sistêmico do cérebro e, portanto, as "funções" atribuídas a cada um dos lobos (esquerdo ou direito), a sua interdependência e interconexão, hoje confirmadas pela Ciência, informam, junto a tantos outros pesquisadores, que tais investigações não são novas. Baseado nos estudos de Vygotsky, Luria (1981) afirmava que as funções mentais humanas não se localizam em zonas isoladas do cérebro e podem, muitas vezes, habitar locais diferentes e distantes uns dos outros - daí seu caráter sistêmico, interdependente e ontogênico. Tais prenúncios são confirmados pelos neurocientistas atuais.

A mente é entendida como a expressão de um conjunto de funções cerebrais e, por seu caráter subjetivo, não há localização específica para elas, pois o fenômeno decorre de uma série de conexões sistêmicas. Segundo Del Nero (1997), dentre suas funções estão a consciência, a vontade, o pensamento, a emoção, a memória, o aprendizado, a imagem, a criatividade e a intuição.

A sociedade contemporânea, em suas múltiplas denominações e acepções (do conhecimento, da aprendizagem colaborativa, autoral, cibercultural, neoliberal, pós-moderna, neurocultural, líquida, dentre outras), apresenta outro cenário não somente para as pesquisas científicas, mas também para os sujeitos sociais, que se informam por hipertexto na Internet, se relacionam por redes sociais e virtuais (MSN, Orkut, Youtube, Ning, Twitter etc), criam comunidades incorporando avatares (Second Life): não apenas consomem, mas sobretudo se constituem como geradores de produtos e conhecimento.

Especialmente a partir da segunda metade do século XX, a visão de aprendizagem ao longo da vida (lifelong learning) suscita mudança de paradigma e maximiza as relações das ciências sobre a aprendizagem, inserindo o adulto como potencial para cursos de formação continuada. Os desdobramentos deste processo todos conhecem: diversos cursos são oferecidos na modalidade a distância, tendo como foco principal a aprendizagem do adulto.

As pesquisas na área da Neurociência, neste contexto, explicam os processos que envolvem funções e dinâmicas cerebrais e suas implicações no processo de aprendizagem humana, indicando que tais conhecimentos não podem se esgotar numa área especifica.

Na área da Educação, em especial para os educadores e pesquisadores que atuam com a aprendizagem do adulto, todos os conhecimentos afeitos à formação e desenvolvimento humanos são importantes. O que deve ser considerado sobre a aprendizagem de adultos em ambientes online? Como o adulto, aluno dos cursos a distância, aprende? Associados às ciências cognitivas, à comunicação, à filosofia, à psicologia, à sociologia, às tecnologias da informação e comunicação, às ciências da computação, dentre outras, os conhecimentos se imbricam, redimensionando as propostas de educação e formação humanas.

O presente texto propõe socializar possibilidades de integração por meio dos estudos realizados pela pesquisadora / autora; estudos que focalizam a aprendizagem do adulto educador em ambientes online sob dois aspectos: 1) o binômio emoção / razão e suas implicações no processo de aprendizagem e; 2) as contribuições da Neurociência e os conceitos de plasticidade e integração, voltados para a aprendizagem do adulto em ambientes virtuais de aprendizagem (AVA).

 

A plasticidade sócio-cultural e a aprendizagem do adulto

Os estudiosos da Neurociência (Lombroso, 2004; Izquierdo, 2004; Damásio, 2000, 2003, 2004; pesquisadores da OCDE, 2003; Ledoux, 1998; Luria, 1981; dentre outros) afirmam que os sistemas cerebrais são multicomponentes e plásticos. Igualmente indicam que a possibilidade de novas conexões celulares, ao longo da existência humana, é extraordinária.

O cérebro, a mente, nosso organismo são, em alguma medida, plásticos. O Nobel de Fisiologia/Medicina de 2000, Eric Kandel, asseverou que somos o que somos graças às sinapses.

Pela seara da Sociologia, Bauman (2001) apresenta, em sua "Modernidade Líquida", uma sociedade marcada pela flexibilidade e pela fluidez nas relações contemporâneas. Mais uma vez, fala-se de plasticidade, desta vez social, histórica e cultural. Nessa direção, somos seres plásticos em nossa constituição orgânica e em nossas relações sociais. Assim, podemos entender que a aprendizagem, enquanto fruto da relação integrada do sujeito com o meio, do ser biológico com o social-cultural, da emoção com a razão, ela é plástica, fluida, flexível e dinâmica.

A aprendizagem não somente é plástica, mas pode promover plasticidade. Segundo Oliveira e colaboradores (2001), o processo de aprendizagem promove a plasticidade na medida em que ocorrem alterações estruturais e funcionais nas células neurais e suas conexões. Tais alterações estão presentes também na representação dos mapas corticais, que sofrem modificações neste processo, decorrentes das experiências vivenciadas pelos humanos.

Os estudos sobre a memória estão sempre presentes nas publicações sobre a aprendizagem. Isso porque a memória é um dos componentes essenciais para a aprendizagem. São os diversos tipos de memórias que possibilitam o armazenamento de informações no cérebro e é por meio das memórias (mas não somente delas) que são atribuídos significados ao aprendido, especialmente por estarem associadas às lembranças advindas dos eventos emocionais. Isso significa que o processo de aprendizagem é influenciado pelo nosso estado emocional. Os cientistas descobriram (Morris e Fillenz, 2003) que neurotransmissores (substâncias químicas) estão presentes no processo de aprendizagem, favorecendo-o e podendo tornar a memória (retenção de informações) mais duradoura.

Izquierdo (2004) alerta sobre o ditado "a função faz o órgão", no sentido de que, quanto mais se exercita o cérebro, maiores e melhores serão suas respostas. Um dos exercícios mais favoráveis para preservar e melhorar a memória, por exemplo, é a leitura, por envolver os sentidos visuais e verbais (nos deficientes visuais, auditivos e verbais) e por viabilizar a recriação de imagens e a classificação de elementos diversos. Não há como dissociar capacidade de leitura - função biológica - da leitura enquanto processo histórico-cultural. Quanto mais se exercita a memória, melhor o resultado. Ao se pensar em memória, em sociedade flexível ou em relações dialógicas, a referência, direta ou indiretamente, é a plasticidade.

Vive-se cercado de informações. Não é incomum o homem se indagar se o excesso delas pode prejudicar sua memória ou mesmo suas funções cerebrais. Tal preocupação deve ser ponderada, pois a memória de trabalho, responsável pela seleção breve de informações, possui capacidade mais que suficiente para gerenciar uma 'avalanche' de informações. O que pode interferir na aprendizagem e na memória é a atenção, pois o fato de estar exposto a informações em demasia pode causar déficits de atenção e, desse modo, pode-se ter a impressão de que a memória e, por consequência, a aprendizagem foram afetadas.

Os processos que envolvem a aprendizagem humana não são simples. Não há regiões fixas para que as memórias e a aprendizagem sejam acionadas, pois temos um sistema complexo de conexões, não limitado a um único sistema neural ou processo. "Existem múltiplos sistemas de memória, espalhados por diferentes áreas cerebrais, com conexões e vias que podem interconectá-las em distintos meios, variando até mesmo de indivíduo para indivíduo" (Eslinger1, 2003).

Segundo Damásio (2003), os diversos tipos de aprendizado humano decorrem de sistemas cerebrais distintos. O desenvolvimento de habilidades, como andar de bicicleta ou tocar um instrumento, tem, nos gânglios da base e no cerebelo, funções essenciais. O mesmo para o hipocampo, fundamental para a aprendizagem de características que envolvam pessoas, lugares ou acontecimentos.

Considerando que os sistemas cerebrais são multicomponentes e plásticos, as ferramentas para a aprendizagem também devem considerar esta plasticidade, pois estes processos se desdobram nos contextos sociais. Chamo este movimento de plasticidade sócio-cultural.

A ideia de plasticidade humana transcende o próprio organismo enquanto máquina biológica. Para a educação, a plasticidade que é social e cultural, além de biológica, sinaliza que quanto mais rico for o ambiente, de modo a estimular atividades mentais e sociais, maior o impacto sobre as capacidades cognitivas e da memória (Bruno, 2007, 2008). Plástica é a sociedade, plástico é o organismo humano, plásticas são as ideias e o conhecimento: plásticas devem ser as aprendizagens. Plasticidade sócio-cultural é a expressão que melhor representa a dinâmica desses fenômenos da chamada cibercultura, que significa, segundo Santaella (2007), a cultura do computador e das mídias digitais e Internet.

As características da plasticidade no contexto sócio-cultural e tecnológico podem ser ressaltadas em cinco pontos: a) flexibilidade: rompe com as barreiras que impediriam desdobramentos e integrações de ideias, de pessoas, de informações, de conhecimentos, de funções, pois cria trilhas de possibilidades e emergências; b) conectividade: possibilidade de interligação de temas e experiências, de modo a se desdobrar em outras conexões / ligações sem forma definida; c) integração: diferente de agrupamento, esta característica indica os processos decorrentes entre eventos plurais, não fragmentando ou excluindo grupos e contextos, mas criando elos de ligação; d) abertura: com sistemas de entradas e saídas múltiplas, em fluxo e em constante emergência, a plasticidade não possui uma organização ou estrutura pré-estabelecida - não são fixas; e) dinamicidade: como organismos vivos e em constante devir, os elos se interconectam e se integram (desintegram / reintegram), mas se re/desconstituem por meio de conflitos, assumindo funções, até aquele momento, inimagináveis (Bruno, 2010). Estas características, no entanto, não se esgotam, pois a plasticidade pode indicar outros elementos e, desse modo, se abrir para múltiplas configurações.

Nos ambientes de aprendizagem, as relações entre professores e alunos são co-construídas, e nesse processo os aspectos sócio-afetivos saltam como elementos essenciais para a aprendizagem. A Linguagem Emocional (Bruno, 2002) pode auxiliar os processos de conscientização, na concepção freireana (Freire, 2005), e de afetivação (Bruno, 2002) em espaços de formação, na medida em que:

"A linguagem emocional reflete, sistematicamente, as múltiplas formas com que os seres humanos estabelecem relações, utilizando-se das diversas linguagens, considerando o fator emocional como importante desencadeador das transformações decorrentes neste processo." (Bruno, 2002: 203)

A linguagem emocional é fundamental para os dias de hoje, pois o homem vive cercado por ambientes digitais cujas linguagens apresentam potencial significativo para a indução de emoções (Damásio, 2000). Os sujeitos sociais são indutores de emoções e, na educação, a consciência da força que a linguagem emocional possui pode transformar as relações de ensino e de aprendizagem. Nos ambientes virtuais de aprendizagem, mais especificamente em cursos realizados a distância, via online, em que o uso da escrita via fóruns de discussão e chats são muito explorados, o tom da escrita pode induzir a emoções convergentes ou divergentes do esperado. Se utilizado intencionalmente para este fim, este aspecto pode ser um facilitador da aprendizagem.

Claxton (2005: 55-7) apresenta quatro caminhos para a aprendizagem: imersão, imaginação, intelecto e intuição. A aprendizagem por imersão tem como foco direto a experiência, conceito que se coaduna com os pressupostos da aprendizagem experiencial, proposta por Kolb (1984). Esta aprendizagem propõe que o processo de aprender não se dá apenas de forma consciente, mas igualmente pela exploração, experimentação e experiência, envolvendo aspectos sociais, como a interação e a imitação. Pode atingir maior complexidade que a razão, pois envolve mergulhos consecutivos no contexto a ser incorporado, o que faz com que a emoção esteja presente. A imersão promove identificação de padrões recorrentes nos contextos e experiências vivenciados, o que permite fazer previsões, projeções e escolher as melhores ações e caminhos para se atingir os objetivos esperados. Os dados que emergiram de minhas investigações (Bruno, 2002, 2007) revelaram que a questão primeira para o desenvolvimento de um curso online, e que deve permear todas as ações pedagógicas (presenciais ou virtuais), se faz por meio da pergunta: quem é o aluno? Desta indagação, chega-se ao contexto e, portanto, às experiências pelo caminho da imersão.

A imaginação, outro caminho apontado por Claxton (2005), é uma ferramenta poderosa para a aprendizagem, já que oferece meios para a simulação de situações que "ainda" não estão presentes ou não são "verdadeiras", preparando o aprendente para o que está por vir. Do mesmo modo que o "jogo de faz de conta" desenvolve a criatividade e a aprendizagem sobre a vida cotidiana na criança, trabalhando emoções e sentimentos, memória e cognição, as metáforas proporcionam ao adulto a possibilidade de brincar e de desenvolver seu poder criativo para aprendizagens mais complexas.

Há, ainda, o modo intelectual, que envolve a linguagem e o raciocínio e suscita análise e comunicação das experiências; e a intuição, vista como um processo mais sutil e receptivo, por meio do qual as ideias são concebidas e desenvolvidas. Este último modo é alvo constante de resistência, já que a intuição é vista como algo menor, sobrenatural e excessivamente subjetivo. Entretanto, as "vozes" da intuição emergem no processo de aprendizagem e são compreendidas por meio de outras denominações: articulações, insights, suposições, inspirações etc. As intuições, ainda conforme Claxton (2005), desencadeiam sensações físicas de desconforto, taquicardia, sudorese ou sensação "estranha" nos ossos. Todas estas características da aprendizagem estão relacionadas com a Linguagem emocional do adulto, que entrelaça a emoção e a razão, como processos interdependentes.

As transformações propostas nos ambientes de aprendizagem geram mudanças nesse espaço operacional. Pode-se então considerar que, quando as emoções são alteradas ou quando são induzidas determinadas emoções, o ambiente ou espaço operacional (lócus pedagógico) se redimensiona e, consequentemente, interfere e transforma o processo reflexivo e as ações entre os sujeitos sociais. As mudanças estruturais podem ainda desencadear recursivamente outras reflexões e ações nos seres envolvidos. As pesquisas indicaram também que o tom utilizado pelo mediador pedagógico (professor) no início e no processo de interação (aulas online) influencia o tipo de resposta do interlocutor (Bruno, 2002).

Os pesquisadores Fenker e Schutze (2008) alertam para a importância de serem oferecidos novos conteúdos aos alunos, no lugar do tão explorado levantamento de conhecimentos prévios. Segundo estes pesquisadores, os conhecimentos prévios podem e devem ser trabalhados, mas não nos momentos iniciais das aulas, pois tais dinâmicas podem favorecer a dispersão diante de temas já conhecidos pelos alunos, enquanto saberes novos, desconhecidos, ativam áreas cerebrais que melhoram significativamente a memória. Estudos indicaram que as "novidades" potencializam as atividades no hipocampo, bem como a substância negra e a área tegmentar ventral, podendo favorecer o aprendizado e a memória, assim como sua duração.

Tais descobertas são de fundamental importância para a área educacional, pois as revisões de conteúdo, muito utilizadas como procedimentos diagnósticos a serem desenvolvidos antes de apresentar o novo ao aluno, são realizadas como parte introdutória em grande parte das aulas. É natural que haja certa dispersão da aula quando é realizado o levantamento de conhecimentos prévios e, em várias ocasiões, quando os alunos "retornam à aula" - saem do desligamento - já perderam o início da apresentação de um conteúdo novo, prejudicando sua compreensão e sua aprendizagem. As retomadas de conteúdo poderão ser feitas ao final das aulas ou posteriormente, diluídas em outros momentos.

No caso da Educação online e de cursos oferecidos a distância para adultos, como os conteúdos são apresentados em formatos diversos (textos, vídeos, áudios, webconferências, animações etc), é recomendado que os conhecimentos prévios ou as revisões sejam realizados ao longo das atividades propostas.

Como já sinalizado, o adulto, ou jovem adulto, tem sido o principal sujeito das propostas formativas que utilizam os ambientes virtuais de aprendizagem, seja na formação continuada ou na inicial. Para Kolb (1984), que desenvolveu a teoria da aprendizagem experiencial, o adulto aprende em decorrência de um processo de transformação pela experiência, que resulta na construção do conhecimento. Em seus estudos, Kolb (1984) apresentou duas fases do processo de aprendizagem do adulto, por ele denominados: especialização e integração.

Na fase de especialização, o adulto vive e cede aos apelos do ambiente, fruto das escolhas pessoais e profissionais realizadas. Isto pode significar a-criticidade, na medida em que o adulto se sujeita ao que está dado, por conformismo, sem vislumbrar outras possibilidades de mudança e escolha. "O forte apelo da sociedade atual, globalizada e neoliberal, com incentivo ao consumismo exacerbado e a informações em quantidade extrema, promovem a imersão e a permanência dos sujeitos sociais nesta fase" (Bruno, 2008).

Na fase de integração, o adulto se conscientiza dos significados de suas escolhas, percebe suas reais necessidades e apresenta compreensão profunda de suas experiências; não é mais susceptível aos apelos do meio, mas sua imersão social passa a ser ativa. O adulto integrado equilibra suas necessidades e seus desejos às possibilidades, sem se deixar levar acriticamente pelas demandas do ambiente. Sabe do potencial de suas escolhas e cede, em acordo com sua consciência crítica, não mais ingênua.

Os desdobramentos da permanência na fase de especialização ou a imersão na fase de integração poderá ser decorrente das formações promovidas aos adultos. Ainda que estes sujeitos sejam singulares em seu processo de aprendizagem, os apelos e influências do meio social serão corresponsáveis pelas migrações de uma fase a outra. Os conflitos ocorridos na fase de especialização são importantes para a constituição do adulto integrado e, desse modo, para a formação de um sujeito não fragmentado. Vale dizer que o adulto integrado incorpora o especialista, ou seja, as aprendizagens advindas da fase de especialização.

Dos estudos sobre a aprendizagem do adulto, Placco e Souza (2006) elencaram quatro características:

- a experiência: ponto de partida e de chegada da aprendizagem, é por meio das relações advindas de experiências que envolvem a ação de conhecer e a possibilidade de escolha que o conhecimento se torna significativo. Deve-se considerar que o adulto possui outras experiências e que elas influenciarão no desenvolvimento de novas ideias;

- o significativo:"envolve interação de significados cognitivos e afetivos. O que foi aprendido tem que fazer sentido para o sujeito, no contexto de suas aprendizagens e de seus conhecimentos e, ao mesmo tempo, mobilizar interesses, motivos e expectativas" (2006: 19);

- o proposital: é a meta a ser atingida pelo adulto, o que o estimula, o impulsiona; são os desafios a serem superados;

- a deliberação: aprender é o resultante de uma escolha deliberada de participar ou não de um processo.

Com as contribuições dos estudos de Placco e Souza (2006), Bruno (2007) identificou em suas pesquisas algumas das características da aprendizagem do adulto em ambientes online: consciência de si e do outro, potência para a alteridade, capacidade de dominar seus impulsos, potencial para tomar decisões, fazer escolhas conscientes e assumi-las, consideração e relevância por suas experiências no processo de aprendizagem, atribuição de significados (em acordo com a cultura e suas emoções) ao aprendido e às suas experiências, realização de planos e objetivos a atingir.

Diferentemente do que se pensou até o momento, não existe possibilidade de trazer para o plano da consciência todo o processo de aprendizagem. Existe algo que fica oculto em nossa "caixa preta" e que, até o momento, não temos (a Ciência não tem) acesso completo. Na dinâmica de aprender, o indivíduo passa por momentos diferenciados desse mesmo processo e parte desses momentos se dá de forma inconsciente. São muitas conexões simultâneas, e não se pode racionalizar tudo para verbalizar todo o processo.

Todos esses elementos são parte do que está sendo denominado plasticidade sócio-cultural: flexibilidade de pensamento, aprendizagem plástica, integração de áreas, conhecimentos, recursos e tecnologias combinados (convergência de mídias), relações sociais híbridas. A aprendizagem do adulto educador, por suas implicações com os processos de ensino e de aprendizagem, busca, por meio desta plasticidade, a emergência do adulto integrado e não apenas especializado.

 

Os ambientes virtuais de aprendizagem como espaços plásticos para a formação de adultos

"Existe aprendizagem sempre que o sujeito é confrontado com obstáculos ou resistências nas ações que normalmente pratica." (Holzkamp2, 1996: 29)

Pensar em educação online e em aprendizagem do adulto em ambientes virtuais é ponderar diversos aspectos, muitas vezes paradoxais, deste processo. As mudanças ao longo do século XX/XXI possibilitaram a convergência de mídias e de tecnologias, o que significa que o mundo atual convive com as tecnologias e culturas de massa e de mídias, e com a cibercultura ao mesmo tempo.

Hoje, multicomponentes tecnológicos permitem a criação de ambientes de aprendizagem ciberculturais, em que todos sejam co-produtores, não simplesmente consumidores de informação. Sistemas integrados de áudio e vídeo oferecem possibilidades de criação coletiva, comunicação, redes de relacionamento e de informação, imersão, em que o tempo e o espaço são redimensionados e reconfiguram também os espaços presenciais.

Os espaços ou ambientes educacionais devem apresentar plasticidade para atender à demanda flexível e multimodal que envolve o adulto atual. A diversidade de ambientes, abordagens e recursos do século XXI se prolifera na ânsia de contemplar a coletividade existente, compreendendo a pluralidade cultural e as características individuais. No processo de aprendizagem, são sobretudo as experiências, ancoradas pelo referencial histórico construído, que permitem ao indivíduo incorporar, reformular e criticar conceitos, associá-los e colocá-los em prática. As referências, em qualquer ambiente, refletem o fazer em ambientes de aula construídos na presencialidade. Os ambientes online estão impregnados de referências dos espaços presenciais e da presencialidade, embora haja um longo debate sobre o que isso (presencialidade) significa hoje (Bruno, 2007).

O desenvolvimento tecnológico fez com que se desenvolvessem outras habilidades para aprendizagem, permitindo sair da linearidade para vislumbrar o caos da não-linearidade, que vem ao encontro da forma como pensamos, criamos e aprendemos. Algumas aprendizagens já foram incorporadas por todos (Peters, 2003), como aprender a ler textos pela via impressa, por imagens, pela audição, por meio de entrevistas, filmes, palestras, de relações interpessoais, estudo autodirigido etc.

Eliminar por completo as amarras do presencial seria inviável e também um contrassenso, uma vez que representaria negar o processo de aprendizagem que se fundamenta na historicidade social e individual. Assim, a escolha de abordagens e estratégias pedagógicas para os cursos a distância revela crenças, formas como se compreende o processo educacional e dele se dispõe, mas especialmente revela e favorece a aprendizagem dos sujeitos para os quais se destina o ensino.

O século XXI coloca lado a lado as redes sociais (web 2.0, 3.0) que possibilitam relações interativas online, instantâneas e a distância, e o apartheid sócio-tecnológico que impede o acesso às necessidades básicas da vida humana, (re)criando os paradoxos da existência de nossa espécie.

Hoje, em nome da socialização de ideias, da produção de materiais didáticos de toda ordem e de áreas diversas disponibilizados pela Internet, do "livre" acesso a espaços, ambientes e redes sociais, muitas das instituições educacionais criam cursos em massa (não necessariamente para as massas), muito semelhantes (ou iguais) entre si e cujo objetivo é lucrar mais com o enxugamento do quadro de profissionais, em detrimento da qualidade. Corroboram com esta prática: as péssimas condições de trabalho envolvem a ausência de um planejamento integrado; um número elevado de alunos por turma para cada tutor (o professor, nestes cursos, é substituído por este profissional); a execução de pacotes prontos (cursos em série), construídos por outros profissionais que muitas vezes desconhecem o contexto. Tudo isso faz desses cursos contra-exemplos frente ao que é desejado e proposto por boa parte de educadores e pesquisadores sérios que atuam na área. Esse tipo de curso a distância está a serviço do ideário neoliberal, que promove o aligeiramento da formação profissional e humana, especialmente em cursos de licenciatura - foco do presente texto. Educação é um "produto" dispendioso e as tentativas de se fazer economia utilizando pacotes com recursos e materiais para diferentes cursos e contextos é um equívoco. Os profissionais da educação sabem da necessidade de articulação pedagógica, da integração de áreas, do planejamento contextualizado e da construção de materiais em acordo com cada realidade. E, em meio a toda dificuldade, diversos educadores e pesquisadores brasileiros conseguem desenvolver cursos e formação docente de qualidade e de referência para outros contextos, como PEC-Formação Universitária (PUCSP e USP), Curso de Pedagogia a distância - Sistema UAB-UFJF, UFSCAR, UFMT, Projeto Veredas (UFMG): são apenas alguns exemplos.

Quando se reserva um tempo maior para o chamado pensamento flexível, a tendência é que ideias criativas e interessantes surjam. O pensamento flexível é aquele que representa o processo de construção de ideias (e suas articulações) em nível abstrato, subjetivo. Não é passível de explicação racional, desenvolve-se melhor em momentos de introspecção, com a criatividade latente, sem o uso sistemático de palavras. Acompanhado de devaneios, esse tipo de pensamento é fonte primordial para que as ideias fluam. Podemos associar esse pensamento ao que Bergson chamou de intuição.

Bergson busca, pela intuição, a apreensão imediata do objeto, de forma precisa e "se apresenta como método para a apreensão daquilo que faz a coisa ser o que ela é, em sua diferença a respeito de tudo aquilo que ela não é" (Peres, 2008: 42). A intuição bergsoniana é conhecimento não mediado que se difere do intelectual e "não é um sentimento nem uma inspiração, uma simpatia confusa, mas um método elaborado, e mesmo um dos mais elaborados métodos da filosofia" (Deleuze, 2008: 7).

O tempo da contemplação é um foco a ser atingido no pensamento reflexivo; nele, quanto mais tempo se dedica a alguma questão, mais qualidade se terá para o pensamento. Essa ideia parece contradizer o tempo atual, em que a valoração das coisas está condicionada à rapidez e palatabilidade da informação. No entanto, o pensamento flexível alerta sobre a qualidade de produção, a qualidade na aprendizagem, e fundamentalmente que o desenvolvimento deste pensamento implica na valorização de elementos que sempre foram preteridos pelo pensamento rígido racional e que a formação do adulto deve incorporar.

Grande parte dos cursos online oferecidos atualmente é destinada a adultos cuja historicidade influencia na maneira como aprendem. Assinale-se que nestes cursos são adultos ensinando adultos. Nesse caso, é natural que as relações sejam de outra ordem. A base do diálogo deve ser o ponto fulcral e os papéis definidos devem permanecer, ou seja, a relação professor-aluno deve ser dialógica. A clareza do papel de cada um nesta relação é fundamental para a aprendizagem individual e coletiva - por isso a mediação pedagógica, como mobilizadora de processos interativos, é essencial.

O espaço para o exercício da autonomia deve ser retroalimentado pelo professor e pelos alunos. A relação de parceria e de cooperação oportuniza a fluidez para a ativação dos processos mentais, essencial para a aprendizagem. Felizmente, o momento atual é fértil, tanto no que se refere aos dispositivos tecnológicos que apresentam plasticidade e flexibilidade, quanto nas possibilidades pedagógicas de interação e mediação.

Tal cenário estimula a formação de espaços híbridos e plásticos, ou o que tem se apresentando como blended learning. O fato é que os ambientes de aprendizagem contemporâneos possuem todas as condições de assumirem sua plasticidade, e essa condição mostra-se a cada dia: twitter, myspace, youtube, Orkut, secondlife, facebook, ning, slideshare, webconference etc. Espaços para produção, co-criação, interação, publicação, socialização, imersão e comunicação não faltam. A cada dia surgem mais recursos que facilitam o trabalho e as relações cotidianas, mas especialmente as alteram. Este é um aspecto a ser investigado em profundidade, pois o século XXI suscita outras formas de relação social e, por conseguinte, desdobramentos deste processo para a aprendizagem.

A aprendizagem do adulto, considerando sua plasticidade e buscando atingir o nível de integração, deve: partir do contexto, usar estratégias e recursos didáticos multimodais, ser instigativa (problematizadora), ter enfoque sistêmico e plástico, estimular a socialização / trabalhos coletivos e colaborativos, favorecer relacionamentos interpessoais, ser dialógica, crítica e criativa, trabalhar com os diversos letramentos, instigar a partir do novo, valorizando o conhecimento já construído.

Na sociedade contemporânea há uma tendência para a manutenção do adulto na fase de especialização. Nesse sentido, o modus operandi do adulto acaba por ser "moldado" por meio de sistemas de estimulação ao consumo (especialmente de informações e tecnologia) acríticos. A aprendizagem do adulto em ambientes virtuais, desenvolvida com as tecnologias e mídias disponíveis, favorece (ou apresenta potencial para tal) as aprendizagens tratadas por Claxton (imersão, imaginação, intelecto e intuição) e também as apresentadas por Kolb (especialização e integração). Toda aprendizagem poderá atender aos propósitos de integração crítica, se houver intenção de que isso ocorra. Fica a questão: que adulto queremos formar?

 

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Notas

Adriana Rocha Bruno
Endereço para Correspodência: Faculdade de Educação (FACED-UFJF), Departamento de Educação. Rua José Lourenço Kelmer, s/n, Campus Universitário, Bairro São Pedro. Juiz de Fora, MG 36.036-900, Brasil.
Telefone para contato: +55-32-3229.3668.
E-mail para correspondência: adriana.bruno@ufjf.edu.br ou arbruno@gmail.com.

(1) Nem todas as referências telemáticas possuem paginação. Por isso, a citação não apresenta número de página.

(2) Extraído e traduzido livremente pela autora deste ensaio do original, em alemão, para o português. Trecho em alemão: "Zum Lernen kommt es immer dann, wenn das Subjekt in seinem normalen Handlungsvollzug auf Hindernisse oder wiederstände".

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