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Psicologia para América Latina
versión On-line ISSN 1870-350X
Psicol. Am. Lat. no.29 México dic. 2017
Violência psicológica vivenciada por estudantes do ensino médio
Psychological violence experienced by high school students
Violencia psicológica vivida por estudiantes de secundaria
Edson Arthur Scherer; Jaqueline Rodirgues Estefanini; Luciana Aparecida Cavalin; Zeyne Alves Pires Scherer
RESUMO
Objetivo: investigar a exposição de estudantes do ensino médio de uma instituição pública à violência psicológica, identificar os perpetradores, o local de ocorrência e as características sociodemográficas dessa população.
Método: estudo quantitativo descritivo transversal com a participação de 218 estudantes de ensino médio integrado ao curso técnico. Foi utilizado um questionário de caracterização sociodemográfica e a Escala de Violência Psicológica para coleta dos dados que ocorreu em 2013 na instituição de ensino, em dia e horário agendado. Para análise dos dados foi utilizada estatística descritiva.
Resultados: o estudo mostrou que 96,3% dos adolescentes sofreram violência psicológica. Destes, 94,5 % foram expostos a violência em sua forma leve e moderada, 1,8 % a forma grave, e 3,7 % não vivenciaram a violência. As situações de violência ocorreram no contexto familiar e escolar. Os perpetradores mais frequentes foram pais, mães, irmãos, colegas de classe, amigos e professores. Não houve associações expressivas para as variáveis sociodemográficas estudadas e a violência psicológica.
Conclusão: A exposição leve e moderada à violência psicológica são experiências presentes nas relações da maioria dos adolescentes com pessoas significativas. Para o enfrentamento deste e outros tipos de violência é fundamental ações intersetoriais com envolvimento da escola, família e comunidade, assim como uma equipe interdisciplinar.
Palavras-chaves: Adolescente; comportamento do adolescente; maus-tratos infantis; violência; violência psicológica.
SUMMARY
Objective: to investigate the exposure of high school students of a public institution to psychological violence, to identify the perpetrators, the place of occurrence, and the sociodemographic characteristics of this population.
Method: descriptive cross-sectional study with the participation of 218 high school students integrated into the technical course. A sociodemographic characterization questionnaire and the Psychological Violence Scale were used to collect the data that occurred in 2013 at the teaching institution, in the day and at the scheduled time. Descriptive statistics were used to analyze the data.
Results: The study showed that 96.3% of the adolescents suffered psychological violence. Of these, 94.5% were exposed to violence in their mild and moderate form, 1.8% were severe, and 3.7% did not experience violence. Situations of violence occurred in the family and school context. The most frequent perpetrators were fathers, mothers, siblings, classmates, friends and teachers. There were no significant associations for the sociodemographic variables studied and psychological violence.
Conclusion:The mild and moderate exposure to psychological violence are experiences present in the relationships of the majority of adolescents with significant people. In order to address this and other types of violence, intersectoral actions involving school, family and community involvement, as well as an interdisciplinary team, are essential.
Keywords: Adolescent; adolescent behavior; child abuse; violence; psychological violence.
RESUMEN
Objetivo: investigar la exposición de estudiantes de la enseñanza media de una institución pública a la violencia psicológica, identificar a los perpetradores, el lugar de ocurrencia y las características sociodemográficas de esa población.
Método: Estudio cuantitativo descriptivo transversal con la participación de 218 estudiantes de enseñanza media integrada al curso técnico. Se utilizó un cuestionario de caracterización sociodemográfica y la Escala de Violencia Psicológica para la recolección de los datos que ocurrió en 2013 en la institución de enseñanza, en el día y horario programado. Para el análisis de los datos se utilizó estadística descriptiva.
Resultados: el estudio mostró que el 96,3% de los adolescentes sufrieron violencia psicológica. De ellos, el 94,5% fue expuesto a la violencia en su forma leve y moderada, el 1,8% la forma grave, y el 3,7% no vivenció la violencia. Las situaciones de violencia ocurrieron en el contexto familiar y escolar. Los perpetradores más frecuentes fueron padres, madres, hermanos, compañeros de clase, amigos y profesores. No hubo asociaciones expresivas para las variables sociodemográficas estudiadas y la violencia psicológica.
Conclusión: La exposición leve y moderada a la violencia psicológica son experiencias presentes en las relaciones de la mayoría de los adolescentes con personas significativas. Para el enfrentamiento de éste y otros tipos de violencia es fundamental acciones intersectoriales con participación de la escuela, familia y comunidad, así como un equipo interdisciplinario.
Palabras clave: Adolescente; comportamiento del adolescente; maltrato infantil; violencia; violencia psicológica.
Introdução
Efeitos de eventos violentos e traumáticos na vida das pessoas merecem atenção por causar mudanças de comportamentos e afetar as relações interpessoais do indivíduo. Pesquisas sobre violência com jovens da América Latina revelaram o contínuo aumento desse fenômeno no cotidiano das cidades e o intenso envolvimento de jovens como vítimas e autores em eventos violentos e traumáticos. A exposição à fatores de risco à violência vivenciadas por esses jovens ocorre na fase escolar, no período da adolescência entre 10 e 14 anos (Waiselfisz, 2011; Moreira et al., 2013)
A adolescência, definida pela OMS como a segunda década de vida, ou seja, a faixa etária compreendida entre 10 e 19 anos, configura-se como um período de crescimento emocional, construção da identidade e desenvolvimento da socialização. Nessa fase do desenvolvimento muitas das dificuldades enfrentadas pelos jovens provêm de problemas ambientais. Portanto, estudar as situações de violência que ocorrem com indivíduos dessa faixa-etária é importante, por causarem danos reais e potenciais à saúde física e mental dos adolescentes (Webb, Heisler, Call, Chickering, & Colburn, 2007; Gibb, Chelminski, & Zimmerman,2007)
A escola apresenta um importante papel na sociedade, tendo em vista a necessidade da educação formal na socialização dos indivíduos de maneira integrativa. Esse espaço determinante para o desenvolvimento humano, no entanto, pode se configurar como um sistema excludente que reproduz desigualdades sociais e não se caracterizar como um espaço de oportunidades e garantias universais (Cocco & Lopes, 2010). O ambiente familiar também é primordial para o desenvolvimento do indivíduo, é nesse ambiente que o adolescente se constitui sujeito, com identidade peculiar, suscetível às relações, aos prazeres, às adversidades (Nunes & Werlang 2008).
Os ambientes de maior convivência do adolescente exercem funções importantes para o seu desenvolvimento. Por outro lado, o ambiente familiar onde a punição física e a violência psicológica são empregadas como forma de educação pelos pais, propiciam o desenvolvimento de comportamentos violentos desses adolescentes (Poletto & Kolle, 2008). Assim como a escola que apresenta um importante papel na sociedade, tendo em vista a necessidade da educação formal na socialização dos indivíduos de maneira integrativa, pode se configurar como um sistema excludente que reproduz desigualdades sociais e não se caracterizar como um espaço de oportunidades e garantias universais (Cocco & Lopes, 2010).
A exposição do adolescente à violência psicológica ocorre, quando o adulto humilha ou demonstra falta de interesse, cobra excessivamente, ameaça e deprecia o adolescente causando sofrimento mental (Abranches, Assis, & Pires, 2013). É sabido que dentre as formas de violência, a psicológica, além de danosa à saúde do adolescente, é o tipo de maior prevalência no mundo (Hibbard, Barlow & Macmillan, 2012). No Brasil, a prevalência de violência psicológica na população adolescente é de 13,4%. Esse fenômeno ainda é pouco identificado por se apresentar diluído em atitudes aparentemente não relacionadas ao conceito de violência e muitas vezes consideradas medidas educativas pela sociedade (LACRI, 2000; Silva, Coelho & Caponi, 2007).
Para o enfrentamento da violência psicológica é necessário a articulação de uma rede de apoio com ações intersetoriais e atenção integral ao adolescente. Portanto, conhecer quem são seus perpetradores e o contexto em que ocorre a exposição de adolescentes à violência psicológica se torna importante por fornecer subsídios para construção de programas de prevenção e intervenção (Pedrosa, Diniz & Moura, 2016).
A escola apresenta um importante papel na sociedade, tendo em vista a necessidade da educação formal na socialização dos indivíduos de maneira integrativa. Esse espaço determinante para o desenvolvimento humano, no entanto, pode se configurar como um sistema excludente que reproduz desigualdades sociais e não se caracterizar como um espaço de oportunidades e garantias universais (Cocco & Lopes, 2010).
No presente estudo buscou-se investigar a exposição de estudantes do ensino médio de uma instituição pública à violência psicológica, identificar os perpetradores, o local de ocorrência e as características sociodemográficas dessa população.
Método
O projeto de pesquisa obteve aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (EERP/USP), sob o protocolo nº 1276/2011, atendendo as normas estabelecidas pela Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde.
Trata-se de um estudo quantitativo, descritivo transversal realizado com 218 adolescentes de um total de 268 estudantes matriculados no ensino médio integrado de uma instituição pública federal do interior do estado de São Paulo. Essa instituição oferece onze cursos que compreendem ensino superior, educação de jovens e adultos e ensino médio Integrado a cursos técnicos. Os critérios de inclusão foram: ter idade entre 14 e 18 anos; ser aluno regular do ensino médio integrado aos cursos técnicos de automação industrial e de química; o aluno e o pai/responsável concordarem com a participação na pesquisa.
A coleta de dados foi realizada em 2013, na instituição de ensino, em uma sala de aula previamente reservada, assegurando a privacidade e o sigilo. Foi utilizado um questionário com questões elaboradas pelos pesquisadores e submetido à apreciação de três juízes. O questionário continha dados para identificação do perfil sociodemográfico dos participantes, identificação das pessoas significativas na vida do adolescente que foram perpetradores de violência psicológica e em qual contexto ocorreu. Também foi utilizado a Escala de Violência Psicológica (EVP), instrumento que permite classificar a ocorrência de violência psicológica (Avanci, Santos & Oliveira, 2005)
Os dados foram digitados, organizados e tabulados no software SPSS versão 16.0. Foi utilizada estatística descritiva para análise e caracterização sociodemográfica variáveis: idade, sexo, nível socioeconômico, naturalidade, ano escolar, composição familiar, situação conjugal dos pais. Para a análise da identificação de perpetradores e do contexto de ocorrência, também foram utilizadas medidas de tendência central (frequência simples).
Os dados referentes à variável violência psicológica foram analisados segundo os quartis, valores mínimos e máximos, média e mediana. Neste trabalho, foi utilizada a classificação dos escores preconizada por Abranches (2012) em que o ponto de corte foi estabelecido como valores acima e abaixo do terceiro quartil, sendo definidas duas categorias: ausente a moderada; e severa. Diferenciamos ainda a categoria ausente da demais pela relevância de se distinguir os sujeitos que apresentaram pontuação zero dos que apresentaram algum tipo de exposição à violência psicológica.
Resultados
Participaram do estudo 218 alunos correspondendo a 82% do total de 268, de 14 a 18 anos, com idade média de 16 anos (desvio padrão 1,234). Sendo 108 (49,6%) do sexo masculino e 110 (50,4 %) do sexo feminino. Um total de 108 (49,4%) dos adolescentes pertenciam ao estrato social C, 98 (45,2%) aos estratos sociais D e E, 9 (4%) ao estrato social B e 3 (1,4%) não responderam está questão.
Buscando compreender a composição familiar dos adolescentes participantes da pesquisa, no estudo observou que 180 (82,5%) alunos moram com o pai e a mãe, 35 (16%) moram apenas com a mãe, 1 (0,5%) estudante mora só com o pai e 2 (1%) alunos moram com outras pessoas. O padrasto esta presente na constituição familiar de 8 alunos (3,7%). Outros membros da família também fazem parte do arranjo familiar, porém com menor expressividade: avó em 19 (9%) das famílias, avô em 5 (2,3%), tia em 3 (1,4%) e outras pessoas não identificadas em 8 (3,7%).
Situações de violência psicológica foram vivenciadas por 210 (96,3%) estudantes deste estudo. Esse tipo de violência foi classificado em três categorias de exposição: ausente; leve e moderada; e severa, segundo o sexo do aluno conforme gráfico 1.
A partir de tal classificação, nota-se que a maioria dos adolescentes (94,5%) participantes deste estudo, de ambos os sexos, foram expostos à violência psicológica de forma leve e moderada. A exposição à este tipo de violência de forma severa ocorreu apenas com adolescentes do sexo feminino (1,8%). Também foi identificado que a ausência de violência psicológica ocorreu apenas com 4 (1,8%) adolescentes do sexo masculino
Na Tabela 1 estão as distribuições de frequências das variáveis referentes à violência psicológica em suas três modalidades, estrato social, arranjo familiar (número de pessoas que mora com a família e número de irmãos).
A maioria dos adolescentes (94,5%) sofreu violência psicológica na sua forma leve a moderada. Esse grupo de adolescente compõe/participa de todos os seguimentos sociodemográficos estudados na pesquisa. Dessa forma, não foi possível verificar associação quanto à exposição a violência psicológica e variáveis sociodemográficas.
O gráfico 2 indica os locais onde ocorreras as situações de violência psicológica vivenciadas pelos adolescentes e aponta os contextos casa e escola com maior freqüência.
A apresentação dos dados em porcentagem foi inviável, pois o total do número de ocorrência não corresponde ao número de perpetradores (N), uma vez que os adolescentes tiveram a opção de identificar mais de um agressor e diferentes locais onde foram expostos à violência psicológica.
O gráfico 3 apresenta os agressores nos contextos casa e escola. Quando a exposição à violência psicológica ocorreu na casa do adolescente, a mãe e o pai foram identificados como principais agressores, seguidos de irmão e irmã. Na escola, os colegas, amigos e professor foram identificados como os principais autores deste tipo de violência.
De acordo com o gráfico 4, observamos que os perpetradores de violência psicológica praticada na rua mais citados pelos adolescentes foram amigo (31) e colega de escola (19). No contexto casa de amigos, esses dois autores são mais uma vez apontados como os mais frequentes, amigo (37) e colega de escola (7).
Um outro ambiente familiar de ocorrência de violência, a casa de parentes, apresenta como autores mais freqüentes prima (16), primo (13), tio (10) tia (9).
No contexto local trabalho foram identificados os seguintes perpetradores: amigo (2), mãe (1), pai (1) e colega de escola (1). A opção outros locais, foi indicada 29 vezes, identificando os seguintes perpetradores: colega de escola (7), amigo (7), irmã (4), namorado (3), pai, mãe (2), professor (2), tio (1) e namorada (1).
Discussão
A importância em estudar a adolescência advém das repercussões danosas a curto e longo prazo que as vivências de violência, em especial a violência psicológica, promovem como danos reais e potenciais na saúde física e mental e desenvolvimento social dos adolescentes (Webb et al., 2007). Ao estudar a população de adolescentes de uma instituição escolar se torna possível realizar comparações com adolescentes da mesma faixa etária de outras populações ou da população em geral, uma vez que estes não trazem características específicas como populações de adolescentes abrigados ou em conflito com a lei (Abranches, 2012).
Constatamos elevado percentual de adolescentes que vivenciaram violência psicológica perpetrada principalmente por familiares, amigos, colegas de escola e professores. Essa modalidade de violência é uma das formas mais difíceis de ser identificada, uma vez que não produz evidências imediatas, sendo conseqüentemente, pouco notificada (Costa et al., 2007). A violência emocional em alguns estudos nacionais (Garbin, Dias, Rovida & Garbin, 2015) e internacionais (Tourigny, Hébert, Joly, Cyr & Baril, 2008). é apontada como a mais frequente em estudos cuja a fonte de dados são as próprias vítimas como a metodologia adotada neste estudo. Em estudos de notificação compulsória a violência psicológica não aparece entre as mais frequentes porque a percepção de terceiros é limitada e de direciona para agressões mais evidentes como a física e a negligência (Garbin et al., 2015).
Consideramos importante a caracterização do sexo dos adolescentes participantes do estudo pelo fato da literatura nacional e internacional indicar esse item como relevante para o risco de vitimização, uma vez que indivíduos do sexo feminino podem ser vítimas mais atrativas em função de sua menor capacidade de reação aos agressores (Doriam, 2013).
Dados do presente estudo mostram que a violência psicológica, mesmo que vivenciada com intensidade leve e moderada, é um comportamento presente na relação com pessoas significativas na vida da maioria dos adolescentes de ambos os sexos. Essa naturalização da violência foi observada em um estudo sobre violência familiar e intervenção do Programa Saúde da Família de Niterói/RJ em que a violência psicológica nos lares das famílias estudadas mostrou-se frequente e banalizada tanto pela sociedade que a produz quanto pelos profissionais de saúde (Rocha & Moraes, 2011). Pesquisadores identificaram que 26,4% dos adolescentes do estudo foram expostos a violência psicológica severa. Os autores acreditam que tal achado indica que a violência psicológica é uma forma de comunicação familiar corriqueira (Abranches et al., 2013). Essa naturalização da violência expressa características do nosso macrossistema (sociedade) cuja cultura, valores e ideais expressam a aceitam a violência como forma de relacionamento sendo manifestada em todas as classes e segmentos sociais.
A literatura aponta que dados sóciodemográficos não são considerados fator de risco para a ocorrência da vitimização de adolescentes, pois esse tipo de violência "atinge todas as populações do mundo, independente do nível cultural, social e econômico (Day et al., 2003). No entanto, outros estudiosos apontam a violência estrutural no Brasil como um aspecto que contribui para a ocorrência da violência doméstica. Esse tipo de violência, oriunda do sistema social e responsável pela desigualdade social, contribui com o desenvolvimento da violência interpessoal, particularmente na dinâmica e no modelo familiar. A violência doméstica faz parte de um contexto socioeconômico e cultural, que pode influenciar o comportamento agressivo dos familiares, os quais tendem a repetir as condições de exploração e abandono de que são vítimas, contribuindo assim para a perpetuação da violência contra crianças e adolescentes, num ciclo vicioso (Costa et al., 2007).
O presente estudo indicou os pais como os principais perpetradores de violência psicológica no contexto familiar. Em estudo sobre notificação de violência contra adolescentes em Feira de Santana (BA), os familiares também se apresentaram como principais agressores. A frequência desse tipo de abuso é alta e se perpetua, pois é justificado pelos agressores como medida educativa, de correção de comportamentos indesejáveis e culturalmente considerado direito dos pais (Costa et al., 2007, Santini & Williams, 2011). A predominância da mãe e do pai na perpetração desta forma de violência encontra respaldo na literatura (Rocha & Moraes, 2011), bem como é relevante a presença dos irmãos(ãs) (Abranches, 2012). Alguns trabalhos confirmam que crianças e adolescentes que sofrem violências por parte de seus responsáveis tendem a vivenciar mais violência entre irmãos e na família ampliada expressando o ciclo de violência nas relações familiares (Pinto & Assis, 2013). Tais estudos corroboram com nossos achados, uma vez que observamos a perpetração de violência por parte de irmãos e de outros parentes.
Adolescentes que sofreram violência familiar, por pessoas importantes como seus pais, estão mais vulneráveis e podem tornar-se mais suscetíveis à violência em outros ambientes sociais, como escola, comunidade e nas relações de namoro. Dessa forma, a violência familiar se caracteriza como fator de risco para a ocorrência de outras situações de violência em diferentes contextos de convívio do adolescente (Abranches, & Assis, 2011).
Estudo com 239 estudantes entre 11 e 15 anos, encontrou associação entre intimidação entre pares e violência intrafamiliar ao demonstrar que estar exposto à violência interparental direta ou indireta se associa a ser alvo/autor de bullying na escola, especialmente para as meninas (Williams, 2009).
No nosso estudo, a escola foi o segundo contexto de maior ocorrência de situações de violência contra os adolescentes cujos principais autores foram amigos, colegas de escola e professores, personagens comumente mais lembrados quando se discute violência na escola (Stelko-Pereira & Williams, 2010). Em pesquisa sobre violência escolar estudantes do ensino fundamental e médio revelaram que sofreram a violência psicológica. Estes referiram ser humilhados na escola, devido a brincadeiras entre amigos e opiniões negativas dos educadores, agressões verbais e exposição ao ridículo quando estes não compreendiam o conteúdo (Marriel, Assis, Avanci & Oliveira, 2006) Dados semelhantes aos nossos estudos foram encontrados em estudo que observaram o despreparo dos professores em lidar com a realidade violenta das escolas, sendo a humilhação e agressões verbais a forma de violência mais sofrida pelos alunos (Njaine & Minayo, 2003).
A maior parte da violência identificada no âmbito da relação professoraluno está relacionada a um conjunto de situações que progridem quantitativa e qualitativamente a cada dia, constituídas principalmente pelo desrespeito, ameaças e agressões verbais. Essa categoria de violência proporciona o aumento dos conflitos nessa relação e contribui para o desenvolvimento de violências maiores (Lopes, 2008). Dessa forma, para prevenir a violência que ocorre nas escolas é necessário se atentar para as suas manifestações mais sutis, e que muitas vezes são utilizadas como recurso corretivo para comportamentos inadequados, como é o caso da violência psicológica identificada no presente trabalho.
Devemos considerar a informação de que uma pequena parcela dos estudantes, apenas 8, convivem com padrastos e metade desses indicou ter sofrido abuso por eles. Dados fornecidos pela literatura nacional constataram uma associação direta entre a violência, dirigida contra o adolescente, com determinadas configurações familiares, dentre elas está a presença do padrasto (Ferrari & Vecina, 2002).
Namorado(a) também foi apontado como perpetrador de violência psicológica, no entanto, em nosso estudo foi coletada a informação de quantos estudantes namoravam, o que não permitiu avaliar a associação entre namorar e ser vítima de abuso cometido pelo namorado(a).
Achados do nosso estudo revelaram o contexto familiar onde ocorreu a maior parte das situações de abuso emocional, seguido pela escola com a presença de pessoas próximas como pais, irmão, amigos, colegas e professores. Esses ambientes têm um papel privilegiado junto aos adolescentes e podem se constituir em um contexto de proteção capaz de atuar preventivamente sobre as formas de violência praticadas ou em um contexto de risco. Os agravos decorrentes da violência dependem da idade do adolescente, da frequência com que ocorre o tipo de abuso, da relação de proximidade que ele tem com o autor da agressão (Ferreira et al., 2009).
Considerações finais
A violência é um problema complexo e com consequências prejudiciais para o desenvolvimento físico, emocional e social dos adolescentes.
Nosso estudo demonstrou que o relacionamento com pessoas consideradas importantes para a maioria dos adolescentes da população estudada apresenta-se permeado por situações de abuso emocional. Instituições que tem por obrigação a garantia da segurança desses jovens, como a família e a escola, podem estar envolvidas com a autoria e perpetuação de violência contra esses adolescentes.
Devemos nos atentar para o fato da violência ser utilizada como forma de disciplinar os filhos, demonstrando a carência de informação e preparo dos pais de adolescentes vítimas em reconhecer as fases do desenvolvimento, repreendendo violentamente comportamentos de crianças e adolescentes completamente normais para esta fase de suas vidas, que infelizmente não são reconhecidos pela família.
Acreditamos ser necessário dar maior visibilidade a violência contra o adolescente, a fim de impedir que a sua prática seja entendida como "normal", e consequentemente se torne uma forma de violência mais grave ou até mesmo fatal.
Como limitações do estudo ressaltamos a impossibilidade de identificar em que etapa do desenvolvimento do adolescente ocorreu a vivência de violência, em função dos próprios instrumentos e da metodologia aplicada. A ausência dessa informação impossibilita a identificação de qual etapa do desenvolvimento esse adolescente (infância, pré-adolescência, adolescência) esteve mais vulnerável ao abuso emocional
No presente estudo, a identificação do perpetrador e do contexto de ocorrência mais frequentes possibilitaram compreender a dimensão do fenômeno na população estudada. Esses dados contribuirão para a construção de projetos de prevenção, mais coerentes com as características e necessidades dessa população, destinados não apenas ao adolescente e sua família, mas também a comunidade escolar. Esperamos ainda que o presente estudo possa auxiliar outros profissionais ligados à área da educação no entendimento da violência contra o adolescente auxiliando-os para uma prática profissional mais consciente da necessidade da integração entre adolescentes, família e escola.
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