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Revista Psicologia Organizações e Trabalho

versión On-line ISSN 1984-6657

Rev. Psicol., Organ. Trab. v.4 n.2 Florianópolis dic. 2004

 

ARTIGOS

 

Significado de responsabilidade social de empresas para o consumidor

 

The meaning of social responsibility of companies for the consumer

 

 

Marley Melo de AraújoI; Alice MoreiraII; Grauben de AssisIII

IDoutoranda do Programa de Pós-Graduação em Teoria e Pesquisa do Comportamento da Universidade Federal do Pará. Psicóloga Organizacional. Prestadora de serviços em Consultaria empresarial (marleymelo@ig.com.br)
IIDoutora pela Universidade de Brasilia. Docente no Departamento de Psicologia Social e Escolar e no Programa de Pós-graduação em Teoria e Pesquisa do Comportamento (alicesm@ufpa.br)
IIIDoutor pela Universidade de São Paulo. Docente no Departamento de Psicologia Experimental e no Programa de Pós-graduação em Teoria e Pesquisa do Comportamento (gjaa@cpgp.ufpa.br)

 

 


RESUMO

Este trabalho tem por objetivos identificar o significado atribuído à responsabilidade social pelo consumidor e verificar a influência de variáveis sócio-demográficas sobre este significado. Foram aventadas, como hipóteses, 4 dimensões para o conceito. Em amostra de consumidores foi aplicada e validada a Escala de Significado de Responsabilidade Social (ESRS). Foram utilizadas estatística descritiva e estatística inferencial (Análise Fatorial e Análise de Regressão) para análise dos dados. Os resultados apontaram uma estrutura ortogonal, constituída por 2 componentes: bem-estar social e qualidade. Todas as variáveis estudadas apresentaram efeito sobre responsabilidade social. Como conseqüência da pesquisa, foi gerado um instrumento de medida capaz de atender a rigorosos critérios psicométricos e subsidiar futuras revalidações.

Palavras-chave: responsabilidade social; consumidor; escala; empresa.


ABSTRACT

The aims of this work are to identify the meaning ascribed to social responsibility by the consumer and verify the influences of social-demographic variables on this meaning. Four dimensions of this concept were hypothesized. In a sample of consumers was applied and validated the Social Responsibility Meaning Scale (ESRS). Descriptive and inferential statistics were used (Factorial Analysis and Analysis of Regression) for data analysis. The results have shown an orthogonal structure, made of 2 components: social well-being and quality. All the variables studied have presented an effect on social responsibility. As a consequence of the research, an instrument of measurement was created, which is capable of attending rigorous psychometric criteria and may subsidize future revalidations.

Keywords: social responsibility; consumer; scale; company.


 

 

A responsabilidade social empresarial é um fenômeno social e econômico. A noção de responsabilidade social empresarial implica que a ação das empresas deve buscar trazer beneficios para a sociedade, propiciar a realização profissional dos empregados, promover benefícios para os parceiros e para o meio ambiente e trazer retorno para os investidores (Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social, 2002).

É corrente no mundo dos negócios a idéia de que consumidores que entendam o que seja responsabilidade social, e que percebam que os produtos/serviços de determinada empresa utilizam este conceito, indubitavelmente serão influenciados no sentido de adquirir este bem/serviço, gerando lucro paraa empresa. Contudo, será que o consumidor percebe a responsabilidade social destas empresas? Ou melhor, o que ele entende por este conceito?

Utilizamos referencial teórico da Psicologia do Consumidor, linha de pesquisa dentro da disciplina Psicologia Econômica. Webley e Walker (1999) definem Psicologia do Consumidor como o estudo das reações e respostas afetivas, cognitivas, e comportamentais das pessoas diante de informaçôes e experiências relacionadas a produtos e serviços, visando a descrição, predição, verificação de influência e explicação das respostas do consumidor.

 

1. Responsabilidade Social

Pinheiro (2001) alega que a preocupação, por parte das empresas, em prestar informações sobre as suas atividades no campo social surgiu nos Estados Unidos, na década de 60, principalmente como forma de preservar o meio ambiente. No Brasil, a Igreja Católica dominou as ações nas obras sociais até o início do século XX, quando começaram a surgir as primeiras entidades de benemerência. A atuação empresarial no setor social teve início na década de 60, com a criação da Associação dos Dirigentes Cristãos de Empresas (ADCE), reconhecendo a função social das empresas. Contudo, responsabilidade social só ganha visibilidade no meio empresarial em 1993, com a campanha nacional Ação da Cidadania contra a Miséria e pela Vida, encabeçada pelo sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, conquistando a adesão do movimento PNBE (Pensamento Nacional das Bases Empresariais), e marcando a aproximação do empresariado brasileiro com os movimentos sociais do país.

Ainda não existe um conceito formal e único de responsabilidade social. Segundo o Instituto Ethos de Empresas e responsabilidade social (2001),

A declaração de visão ou missão da empresa socialmente responsável freqüentemente vai além do propósito de "lucrar" (...) e especifica que a empresa procurará agregar valor a todos os envolvidos ( ... ): acionistas/proprietários, funcionários, clientes, fornecedores, comunidades e o próprio meio ambiente.

A empresa é socialmente responsável quando vai além da obrigação de respeitar as leis, pagar impostos e observar as condições adequadas de segurança e saúde para os trabalhadores (...) demonstra sua Responsabilidade Social ao comprometer-se com programas sociais voltados para o futuro (...) da sociedade. (Instituto Ethos de Responsabilidade Social, 2001).

Montana e Charnov (2000) acreditam que a preocupação demonstrada nas últimas décadas pelas empresas relativamente às suas obrigações sociais deve-se ao crescimento dos movimentos ecológicos e de defesa do consumidor, pois estes focam o relacionamento entre empresa e sociedade. Outro fator explicativo é a evolução da economia mundial no sentido do fenômeno da globalização, fazendo com que empresas ingressem numa concorrência em escala internacional para garantir a sua entrada e a sua permanência em mercados potenciais. As empresas precisam se mostrar produtivas, competitivas e singulares a fim de captar a atenção do público consumidor.

Drucker (1995) explica o fenômeno responsabilidade social empresarial por dois fatores: 1. o fracasso do governo no cumprimento de suas obrigações sociais a contento e em tempo hábil, e 2. o sucesso do sistema empresarial como co-responsável pelas expectativas aumentadas quanto às ações provenientes deste setor.

A função da empresa privada traduz-se no desempenho econômico, o qual constitui o seu fundamento lógico e a sua finalidade. As empresas existem para fornecer bens e serviços aos seus clientes, e fornecer excedentes econômicos à sociedade. Estas atividades demandam um capital que precisa ser coberto pelo lucro alcançado pela empresa. O objetivo último da empresa é obter lucro, subtraído o custo do capital investido. Neste ponto se encaixa o entendimento do fenômeno responsabilidade social.

Consultores e "gurus" dos negocios apontam responsabilidade social como algo além de simples filantropia, como verdadeira vantagem competitiva a agregar valor à empresa. A lógica implícita nesta afirmação é a de que o aspecto social pesa na formação da imagem da empresa e na conseqüente utilização e consumo de seus serviços e produtos. Ao associar uma causa simpática ou um viés humanitário à marca da empresa, busca-se a transferência de uma imagem positiva para os produtos e serviços comercializados, de forma a se obter um apelo emocional e um nível de identificação maiorjunto aos consumidores, influenciando na preferência e na tomada de decisão entre um produto e outro, uma marca e outra. Consequentemente, o consumo seria alavancado, e a empresa teria a sua imagem valorizada junto ao público consumidor. Logo, responsabilidade social pode ser encarada como uma estratégia de marketingutilizada pelas empresas para se diferenciar no mercado e favorecer o consumo.

O consumidor é estudado em marketingnos seguintes aspectos: verificação de seu posicionamento frente à empresa e sua imagem, aceitação ou rejeição do produto e opinião em relação a preços, distribuição e serviços. O seu comportamento e a sua motivação são estudados principalmente em termos de reações frente aos produtos, preços, serviços e promoções (Gade, 1980). Dois conceitos de marketingsão cruciais: posicionamento e marca. O posicionamento expõe a ideologia da empresa, criando um lugar na memória do consumidor através do que se tem a oferecer. A marca é a identidade do produto ou serviço, sendo central no processo de diferenciação e de singularização.

Por um lado, a marca participa do processo de identificação entre consumidor e produto ou serviço; por outro lado, é o posicionamento da empresa detentora da marca o que promove a manutenção de sua força, através de mecanismos de associação entre a proposta da empresa e os sentimentos evocados nas pessoas por ocasião da aquisição do bem ou do serviço. Logo, um posicionamento socialmente responsável de empresas é transferido para os seus produtos e serviços, objetivando alcançar identificação e associação a valores e sentimentos dos consumidores, evidenciando-se como uma provável estratégia de marketing da empresa. Algumas vantagens atribuídas a uma atuação socialmente responsável são: singularização e consolidação da marca; qualidade no posicionamento; receptividade do consumidor; incremento de vendas; relações públicas com formadores de opinião; acesso à mídia espontanea; formação de mercado; interesse de investidores; engajamento de funcionários nas iniciativas; atração de talentos profissionais; vantagens fiscais; recebimento de certificações.

Uma pesquisa que apurou o impacto das ações sociais na opinião das pessoas foi realizada pelo Instituto Ethos, e editada em dezembro/2000 com o título "Responsabilidade social das empresas: percepção e tendências do consumidor brasileiro":

Quando perguntadas sobre que nível de responsabilidade as empresas deveriam ter sobre cada tipo de comportamento, a maioria das pessoas atribuiu-lhes total responsabilidade nas questões ligadas ao respeito ao trabalhador, gerenciamento do impacto ambiental e respeito ao indivíduo. As questões às quais foram atribuídas as menores responsabilidades dizem respeito à filantropia e a investimentos sociais. Portanto, ao contrário do que se diz sobre a tendência dos consumidores, eles não lhes atribuem a responsabilidade por ações sociais amplas, dirigidas a toda a comunidade, seja porque estas são de responsabilidade do governo, seja porque as empresas ainda não cumpriram adequadamente etapas anteriores do processo de Responsabilidade Social (Barroso, 2001: 2).

Por etapas anteriores entenda-se cuidados com a saúde e a segurança do trabalhador e com o meio ambiente. É difícil saber qual o real posicionamento da sociedade e dos consumidores sobre o tema, pois a grande maioria das empresas ainda não realiza pesquisas sobre a sua imagem junto ao consumidor e sobre as avaliações do serviço prestado. É interessante comparar estes dados de ausência de feedbackconsistente para as empresas com a concepção - dominante no novo pensamento empresarial - de que responsabilidade social

é um diferencial de mercado que agrega valor à empresa através de uma estratégia mais "apelativa" junto ao consumidor. Resta a dúvida sobre em que se baseiam tais concepções, já que não tem sido venficado, atraves de uma quantidade maior de pesquisas senas e articuladas, qual a repercussão destas atividades no consumidor. Uma das possíveis explicações para este aparente paradoxo é a suspeita de que as atividades empresariais em responsabilidade social sejam esporádicas e transitórias, de caráter informal e descomprometido - o que não fixa na memória do consumidor as iniciativas realizadas. Não seria possível emitir opinião sobre algo que não se vê ou não é lembrado.

 

2. Objetivos

1º) Identificar o significado que o consumidor atribui ao construto responsabilidade social, a fim de comparar estes dados com o entendimento corrente no mundo empresarial.

2º) Avaliar o efeito de cinco variáveis independentes sobre o significado atribuído ao termo. As variáveis sóciodemográficas utilizadas foram sexo, idade, escolaridade, renda familiar e setor profissional, conforme Figura 1. Apesar de não terem sido encontradas referências de pesquisa que conduzissem ao teste destas variáveis em específico, partiu-se do raciocínio lógico de que responsabilidade social parece ser um conceito de alto refinamento, talvez acessível somente a um estrato populacional de maior escolaridade, com maior poder aquisitivo, e que trabalhe em meios nos quais a idéia de responsabilidade social poderia estar mais presente, como o ambiente empresarial e o educacional.

 

 

3. Dimensionalidade do construto

O termo responsabilidade social de empresas é composto de dimensões que traduzem a sua abrangência semântica. Especialistas classificam estas dimensões de diferentes maneiras. Para Barroso (2001: 2), as dimensões do construto responsabilidade social referem-se:

1. às atividades regulares da empresa, saúde e segurança dos funcionários e qualidade do ambiente de trabalho;

2. ao ônus das externalidades negativas ao meio ambiente, à sociedade e aos seus consumidores;

3. à sociedade de modo geral, abrangendo questões de bem-estar social.

O Instituto Ethos de Responsabilidade Social (2002) recomenda sete dimensões:

1. Valores e transparência: preconiza compromissos éticos externados na declaração de missão da empresa, difundidos na empresa através de comunicação eficaz objetivando a sua absorção na cultura organizacional. Estabelece padrões éticos de concorrência através de diálogo no setor. Avalia o cumprimento destas atitudes éticas através de Balanço Social e verificação pelo cliente interno e externo.

2. Público interno: traduz investimentos em diversidade, desenvolvimento pessoal e profissional dos empregados e aprendizes; melhoria das condições de trabalho e de remuneração através de participação nos resultados, bonificação e do estreitamento de relações com sindicatos em torno de objetivos comuns; uso de política demissional responsável, de mecanismos de complementação previdenciária e participação de empregados aposentados em projetos sociais da empresa. Respeito às culturas locais e instituições representantes destas.

3. Meio ambiente: manutenção e melhoria das condições ambientais; minimização de impactos ao meio; redução de desperdícios e poluição através de reciclagem e uso de biodegradáveis; desenvolvimento de práticas sustentáveis e democratização do conhecimento através de projetos e campanhas de educação ambiental.

4. Fornecedores: transmissão de princípios de conduta da empresa aos fornecedores, incentivando a adoção de práticas socialmente responsáveis. Uso de critério de responsabilidade social para seleção de fornecedores, empresas parceiras e terceirizadas. Fiscalização de observância de práticas socialmente responsáveis por fornecedores. Busca de fornecedores em entidades comunitárias.

5. Consumidores/clientes: desenvolvimento de produtos e serviços confiáveis, eficientes e seguros. Fornecimento de informações detalhadas sobre o produto (sua disponibilidade e possíveis danos que possa ocasionar). Uso de propagandas educativas, éticas e claras. Garantia de suporte ao cliente antes, durante e após o consumo.

6. Comunidade: respeito aos costumes e culturas locais. Disseminação de valores educativos e melhoria das condições sociais da comunidade. Incentivo ao voluntariado entre os seus empregados.

7. Governo e sociedade: relacionamento ético e transparente com poderes públicos e partidos políticos. Cumprimento de leis visando melhoria das condições sociais e políticas do país. Contribuição em projetos e ações governamentais de políticas sociais.

Hipotetizamos outro quadro de dimensões através da união de algumas definições utilizadas por Barroso (2001) e pelo Instituto Ethos, visando alcançar uma compreensão sincronizada do construto. Em nosso entendimento, a composição teórica do construto assumiu uma forma concêntrica, como as camadas de uma cebola, partindo do nível micro-interno até ao macro-externo à empresa, conforme mostra a Figura 2.

 

 

Seguem-se as dimensões hipotéticas com suas definições constitutivas, e algumas atuações socialmente responsáveis tradutoras das defimções operacionais.

1. Qualidade de Vida no Trabalho (QVT): qualidade do ambiente físico e psicossocial do ambiente de trabalho; garantiade saúde e segurança dos trabalhadores; promoção de desenvolvimento e realização profissional.

• Qualidade e salubridade das instalações e equipamentos da empresa (limpeza, iluminação, periculosidade do ambiente).

• Desenvolvimento de políticas e sistema de suporte (investigação, comissão deliberativa e setor de aconselhamento) contra assédio sexual.

• Capacitação funcional através de liberação de horário de expediente para a realização de cursos. Subsídios e/ou reembolso dos custos de cursos de qualificação profissional.

2. Relaçõesde Mercado (RM): posicionamento ético nas relações com podes públicos e seus representantes políticos; definição de critérios nas relações com fornecedores; cuidados com a saúde, segurança e integridade do público consumidor.

• Segurança durante o ciclo de vida (produção, uso e descarte) de produtos contra danos à saúde do consumidor.

• Compromisso com o combate à corrupção.

• Manutenção de relações comerciais com fornecedores comprometidos com a causa social.

3. Bem-estar Social (BS): promoção de melhorias nas condições de vida e de justiça na sociedade.

• Proteção à segurança e à saúde de comunidades circunvizinhas a fábricas e complexos industriais.

• Não-utilização de mão-de-obra infantil ou escrava.

• Doações financeiras para projetas e programas não-governamentais de cunho social.

4. Meio Ambiente (MA): cuidados com a proteção e preservação do meio ambiente.

• Adoção de princípios e práticas ambientalistas.

• Redução de resíduos, reutilização de materiais e reciclagem.

• Promoção de educação dos consumidores quanto à forma de descarte dos produtos da empresa menos agressora ao ecossistema.

 

4. Construção do instrumento

As dimensões hipotéticas foram traduzidas em itens que pertenceriam ao instrumento de medida de significado. A elaboração dos itens seguiu orientações de Pasquali (1999) e Günther (1999), e foi baseada nas definições operacionais dos fatores.

Foram elaborados 93 itens que afirmavam ações pertinentes ou não à atuação socialmente responsável de empresas. Os itens foram dispostos em nível de mensuração intervalar, na forma de escala Likertde cinco pontos desde a discordância total (1) até à concordância total (5) (vide apêndice, Escala de Significado de Responsabilidade Social - ESRS).

Como preparação do instrumento, procedeu-se a uma avaliação teórica dos itens através de pré-testes (análise semântica e análise de juizes), visando garantir maior fidedignidade dos dados a serem coletados. A análise semântica verificou a inteligibilidade dos itens. Participaram sete voluntários de ambos os sexos e nível secundário. Solicitou-se que, após a leitura das instruções do questionário e de cada item, os sujeitos os reproduzissem com as suas próprias palavras. Também foi permitido que preenchessem a escala de 5 pontos conforme o seu grau de concordância com o que os itens afirmavam sobre responsabilidade social. Foram eliminados dois itens redundantes, e alterada a grafia de outros.

A análise de juizes verificou a pertinência entre itens e fatores, para garantir confiabilidade de que os itens estão medindo o que se propôs que medissem nas definições dos fatores hipotéticos. Participaram quatro peritos das áreas empresarial e de pesquisa. Foi-lhes entregue uma tabela de dupla entrada contendo os itens e o nome dos fatores, com espaço em branco para marcação. Também receberam uma folha com as definições constitutivas dos fatores. Era instruído que cada item deveria ser preferencialmente atribuído a somente um fator. O critério estipulado para manter o item no instrumento final foi 75% de concordância entre os juizes sobre a que fator pertencia cada item. Oito itens foram eliminados. A distribuição de itens por fator hipotético ficou a seguinte: FH1 = 25; FH2 = 13; FH3 = 38; FH4 = 7. Tendo o conteúdo da ESRS testado e aprovado 83 itens, procedemos à formatação definitiva do questionário.

 

5. Método

Foram investigados a estrutura do construto responsabilidade social e o poder das variáveis sócio-demográficas sexo, idade, escolaridade, renda familiar e profissão, como antecedentes do significado de responsabilidade social. As ferramentas estatísticas utilizadas foram análise fatorial, técnica que se presta a reduzir os dados e simplificar a estrutura, sem perda de qualidade da informação, e análise de regressão múltipla, técnica que investiga a dependência entre variáveis e seu potencial preditor.

5.1 Participantes

Amostra de consumidores belenenses, ambos os sexos, nível secundário completo, no mínimo. O critério de nível médio de escolaridade para delimitar a amostra foi uma condição imposta pelo instrumento, o qual exige um nível mediano de conhecimentos para garantir sua inteligibilidade. Foram aplicados 750 questionários contendo a ESRS e folha de dados pessoais, dos quais 695 eram aproveitáveis, uma vez retirados os que totalizavam 10% ou mais de respostas faltosas (missings)e itens com mais de uma resposta assinalada na escala, além de questionários com dados não preenchidos. A distribuição da amostra quanto ao sexo foi de 55% de homens e 45% de mulheres. A idade obteve média de 29 anos e desvio padrão de 9,03, com amplitude de 15 a 74 anos. A variável escolaridade possuía alta discriminação, indo de segundo grau completo até pós-graduação, passando por terceiro grau incompleto e completo. Contudo, a distribuição nas categorias estava imprópria para efeitos de comparação, com muitos sujeitos na categona segundo grau, decrescendo gradativamente até o nível pós-graduação.

Decidimos unir as categonas em dois níveis: médio e superior, este último agregando terceiro grau incompleto, completo e pós-graduação. Assim, 54,9% de participantes eram de nível médio e 45, 1 % superior. A renda familiar teve amplitude de R$200,00 a R$10.000,00, com média de R$2.208,14 e desvio padrão de R$1.774,48. Neste trabalho não foi utilizada a variável renda individual por possuir alta correlação com renda familiar, e por esta última refletir melhor a situação econômica de certos sujeitos (estudantes, donas de casa, etc.). Além disto, a renda familiar da amostra encontrava-se mais adequada aos parametros de normalidade exigidos para análises multivariadas (Tabachnick e Fidell, 1996). Foram declaradas 151 Profissões/Ocupações diferentes, as quais, através de Análise de Conteúdo: foram reduzidas aos seguintes Setores Profissionais, conforme Figura 3:

 

 

• Administrativo: pessoas atuando em cargos de comando, administração de selores, serviços ou processos, tarefas burocráticas de escritório ou empresa referentes ao funcionamento interno.

• Comércio: profissionais de vendas e atividades em torno da comercialização de produtos e serviços.

• Saúde: profissionais da área de saúde fisica e psicológica.

• Educação e Cultura: pessoas envolvidas com processos e/ou tarefas educativas e culturais.

• Tecnologia e Máquinas: profissionais de setares técnicos, tecnológicos, operacionais e de criação e produção.

• Diversos: profissões/ocupações variadas que não congregam grupo semântico homogêneo.

• Estudantes: estudantes de cursinho pré-vestibular e faculdade.

5.2 Procedimento

A coleta estendeu-se de agosto a setembro de 2002, em Shopping Gemerda cidade. Aos passantes era solicitada a sua participação na pesquisa, através do preenchimento do questionário. Para tentar prevenir co.ntra vieses foram utilizados: definição de cronograma de dias e horários variados para a coleta; seleção indiscriminada de sujeitos. O cronograma definia 3 dias variados em cada semana, nos quais a pesquisadora e uma assistente permaneciam em períodos de tempo de três horas consecutivas em um ponto fixo do Shopping para proceder à coleta. A seleção dos períodos de tempo foi sistemática dentro do intervalo de 10 às 22 horas. Este cuidado visou oportunizar a abordagem dos mais variados sujeitos que possam freqüentar o Shoppingem dias e horários diferentes.

5.3 Análise dos dados

Conforme sugestão de Tabachnick e Fidell (1996), procedeu-se à limpezade outliers univariados e multivariados, de forma a retirar sujeitos atípicos. Na limpeza de univariados, melhorou-se a distribuição normal da variável renda familiar através da retirada de cinco sujeitos extremos. Para a limpeza de outliers multivariados, lançou-se mão da análise de regressão, usando o número do sujeito na amostra como dependente e os 83 itens de responsabilidade social como preditores. Foram excluídos 18 sujeitos pelo critério da distância Mahalanobis,excedendo três desvios-padrão da média. A amostra de 695 sujeitos reduziu-se para 672.

A princípio, foi executada a extração dos componentes principais, com rotação Várimaxpara os 83 itens da ESRS e os 672 sujeitos remanescentes dos procedimentos de limpeza dos dados. Foi indicado bom nível de fatorabilidade (KMO = 0,893). Estabeleceu-se um critério de carga fatorial maior do que 0,30 para inclusão dos itens. Com critério de eingenvaluemaior do que 1, foram apontados 23 componentes, explicando 57,39% de variância. Através do scree plot,verificou-se que quatro componentes explicavam 27,71% de variância. Foi então realizada a extração, através da mesma técnica, estipulando-se quatro componentes. O resultado, quanto à interpretabilidade, não foi considerado claro, além da matriz de cargas fatoriais apresentar itens com cargas relativamente altas em diferentes componentes simultaneamente. Verificamos a possibilidade de aceitar resultados da análise fatorial dos eixos principais com rotação oblíqua, estipulando a extração de quatro fatores, os quais explicaram, juntos, 23,58% de variância. A solução foi menos satisfatória do ponto de vista da interpretabilidade e da qualidade psicométrica. Foi realizada outra extração de eixos principais pedindo três componentes, na qual a limpeza e a agregação das cargas fatoriais por fator melhoraram; contudo, apenas uma correlação entre os componentes foi superior a 0,30, não justificando a aceitação da análise de eixos principais, devido à clara ortogonalidade dos componentes.

Tentou-se ainda uma outra extração dos componentes principais estipulando-se três componentes, a qual também foi rejeitada devido a interpretabilidade dúbia e baixo alpha de Cronbachdo terceiro fatoro. Finalmente, foi aceito o resultado de uma extração dos componentes principais com rotação Várimax,critério de carga fatorial maior do que 0,40 para inclusão dos itens, e determinação de dois componentes. Os itens que não alcançaram a carga fatorial estipulada foram eliminados.

Decidimos testar o poder de algumas variáveis sóciodemográficas como antecedentes do significado de responsabilidade social. As variáveis foram sexo, idade, escolaridade, renda familiar e profissão. Foi utilizado o mesmo banco de dados da validação do instrumento, após serem eliminados os sujeitos que apresentavam missing nas variáveis de interesse. Também saíram pessoas acima de 60 anos e com renda familiar excedendo R$8.000,00 mensais, por representarem apenas 0,5% e 1,4% da amostra respectivamente, com vistas a melhorar os critérios de normalidade destas variáveis. Foi eliminada a categoria profissional diversos devido à sua alta heterogeneidade interna, e eliminados os oudiersmultivariados. Após esses procedimentos de limpeza, esta sub-amostra ficou composta de 392 sujeitos, dos quais 50,3% homens e 49,7% mulheres, 51% nível médio de escolaridade e 49% superior, idades variando de 15 a 57 anos renda familiar mensal entre R$200,00 e R$7.500,00, e profissão/cupação distribuída conforme ilustra Figura 4:

 

 

Para a análise dos preditores, foram utilizados os dois componentes resultantes da validação da ESRS. A exploração de preditores foi feita através de análise de regressão múltipla, sendo realizadas duas análises separadas - uma porcomponente. Utilizouse como variáveis contínuas idade e renda familiar; escolaridade, sexo e setor profissional foram codificados pelo sistema dummy,sendo:. sexo (feminino, tendo masculino como dummy);setor profissional (administrativo, comércio, saúde, educação/cultura, tecnologia/máquinas, tendo estudantes como dummy);e escolandade (superior, tendo nível médio como dummy).

 

6. Resultados

A solução final da análise fatorial ficou constituída por 46 itens, que explicam, em conjunto, 21,29% da variância dos dados. A Tabela 1 apresenta cada componente da solução final, sua variância explicada e alphas de Cronbach.

 

 

Após análise de conteúdo dos itens que agruparam nos componentes, as definições constitutivas ficaram do seguinte modo:

1. Bem-estar social:promoção de justiça, bem-estar e inclusão social através de ações nas áreas de cultura, esporte, educação, saúde, emprego e segurança.

2. Qualidade:promoção de qualidade e ética nas relações com o funcionário, com o consumidor e com o meio ambiente.

As médias dos fatores na amostra encontram-se representadas na Figura 5:

 

 

O fator hipotético Bem-estar socialfoi confirmado pelo componente Bem-estar social,não apresentando o deslocamento de nenhum item de outro fator para o seu espaço semântico, embora dos 38 itens que compunham o fator hipotético só tenham restado 26 (carga fatorial = 0,40) no componente encontrado.

Os fatores hipotéticos Qualidade de vida no trabalho, Relações de mercado e Meio ambientetiveram alguns de seus itens deslocados para o componente Qualidade,da seguinte forma: 10 itens vieram de Qualidade de vida no trabalho,sete itens de Relações de mercadoe três de Meio ambiente.

Para a sub-amostra de 392 sujeitos, os alpha de Cronbachpadronizados foram: Bem-estar social(0,91) e Qualidade (0,77).Somente o segundo componente caiu em qualidade psico métrica, o que se explica pela redução da amostra a pouco mais da metade daquela utilizada para a validação do instrumento. Contudo, mesmo tendo sofrido queda de 13 pontos, o índice continua com boa confiabilidade. Seguem-se, na Figura 6, as médias dos fatores para a sub-amostra. Os principais resultados da análise de regressão para os preditores de responsabilidade social estão na Tabela 2.

 

 

 

 

Embora as equações de Regressão tenham resultado em R2 significativos para os dois componentes, os valores desses índices foram baixos, somando aproximadamente 18% de variância explicada, Bem-estar Socialfoi predito por sexo feminino, Conforme diminui a escolaridade, maior a importância confenda às ações sociais. Profissionais da área educacional e cultural percebem Responsabilidade Social mais fortemente como instrumento de bem-estar coletivo do que estudantes. Quanto maior a idade do sujeito, mais peso atribuído aos dois componentes do construto responsabilidade social. O preditor de maior peso para este componente foi sexo.

O componente Qualidade foi predito por idade e por renda familiar mais baixa. Idade obteve mais peso neste componente. Em geral, todas as variáveis sócio-demográficas usadas paraverificar influência sobre o significado de responsabilidade social tiveram poder preditivo, conforme pode ser visualizado na Figura 7. Os preditores com beta positivo são representados por linhas cheias, e aqueles com beta negativo por linhas tracejadas.

 

 

7. Discussão

Responsabilidade social é um conceito eminentemente empresarial, criado e utilizado amplamente neste meio. Contudo, para que o conceito se materialize em ações por parte da empresa e alcance os objetivos de propulsor de lucro e meio de diferenciação no mercado, é necessário equacionar a participação esperada por parte do consumidor. Como foi relatado anteriormente, é corrente no meio empresarial que, se o consumidor percebe e entende o que seja responsabilidade social, aumenta-se a probabilidade de que ele tenha o seu comportamento de compra influenciado por esse significado.

Peritos empresariais não comungam da constituição do construto responsabilidade social, variando de três a sete dimensões distintas. A proposição com sete dimensões é a mais corrente em discussões sobre o assunto. Pelos resultados desta pesquisa, encontramos que o significado de responsabilidade social para o consumidor é composto de apenas dois fatores, nomeados de Bem-estar social e Qualidade.E uma compreensão menos refinada e mais sintética do que aquela dos agentes responsáveis por criar e difundir o conceito, embora não contrarie a idéia principal do que seja responsabilidade social segundo os peritos empresariais. Também não foi contrariada a idéia de composição do conceito hipotetizada pela autora com base nas literaturas empresariais. Os dois componentes que resultaram das análises encerram condensadamente a idéia de que uma empresa é socialmente responsável quando se preocupa e atua com os funcionários, consumidores, sociedade e meio ambiente, aspectos contemplados nas definições dos fatores hipotéticos. Contudo, para o consumidor não compareceu a distribuição destes públicos em componentes distintos, como proposto nas dimensões hipotéticas (Qualidade de vida no trabalho- funcionários; Relações de mercado- fornecedores e consumidores; Bem-estar social- sociedade; Meio ambientemeio ambiente). Aparentemente, para o consumidor, existem dois públicos para ações socialmente responsáveis, um interno e outro externo à empresa, e esses públicos se encontram misturados nos componentes definitivos: Bem-estar socialsociedade (externo); Qualidade- funcionários (interno), consumidores (externo) e meio ambiente (externo).

A noção de uma apresentação concêntrica do conceito, partindo de ações de nível mais interno até ao mais externo, não foi confirmada. Talvez não existam, para o consumidor, estágios de atuação de uma empresa socialmente responsável (primeiro se executam ações que beneficiem funcionários, depois se parte para consumidores, sociedade, etc). Possivelmente o consumidor perceba a empresa socialmente responsável fazendo algo que é intrínseco às suas atividades e existência quando entende que responsabilidade social consiste em a empresa ter relações saudáveis com funcionários, consumidores e meio ambiente, ou fazendo algo que não é necessariamente de sua alçada mas que também é legítimo, quando entende que a empresa socialmente responsável contribui para a construção e a existência de uma sociedade melhor. Nesta amostra, prevaleceu o sentido de Qualidade,dentre os dois componentes, como o mais forte para definir o construto responsabilidade social. Logo, se uma empresa possuir ações tanto em Bem-estar socialquanto em Qualidade,será provavelmente considerada responsável, mas se apresentar ações apenas em Qualidadeserá igualmente assimilada como responsável. Este dado contraria o senso comum de que são eminentemente as ações voltadas para a resolução de problemáticas sociais que fornecem a imagem de socialmente responsável a uma empresa.

Quanto à exploração dos preditores do significado de responsabilidade social, os resultados possuem limitações de generalização, já que a amostra usada na análise de regressão foi reduzida a fim de garantir os critérios de normalidade nas variáveis renda familiar e idade, e também as exigências para análises multivariadas. Acreditava-se que se encontraria grande influência de renda e escolaridade na concepção de responsabilidade social, de forma positivamente correlacionada. Verificou-se que mulheres atribuem maior peso apenas ao componente Bem-estar social O componente Qualidadenão foi significativo para sexo. Uma possível explicação seria o fato do componente Bem-estar scialencerrar uma idéia de amparo social e solidariedade, preocupações aparentemente mais peculiares ao sexo feminino, de forma que mulheres podem apresentar maior sensibilidade a este componente. Alguns estudos sobre hierarquia de valores no Brasil (Tamayo, 1994) apontaram que mulheres priorizam o bem-estar dacomunidade mais ampla e de pessoas próximas como princípios direcionadores de vida.

Quanto maior a idade do sujeito, maiores as médias nos dois componentes do construto. Conforme o tempo passa, parece aumentar a percepção das nuances do conceito, ou seja, das ações socialmente responsáveis que podem estar incluídas nas dimensões Bem-estar social e Qualidade.

Sujeitos com menor escolaridade atribuíram mais importância à componente Bem-estar social para definir responsabilidade social. Esta componente reflete uma concepção de ações filantrópicas por parte da empresa, traduzidas pelos itens "Acho que responsabilidade social de uma empresa é realizar ações para diminuir a problemática da saúde pública" e "Acho que responsabilidade social de uma empresa é oferecer refeições gratuitas à população carente", entre outros. Na realidade brasileira de grandes injustiças sociais, pouca escolaridade reduz as oportunidades de conquistar melhores empregos e usufruir melhores condições de vida. Uma empresa que reflita uma imagem de preocupação com desigualdades sociais pode alcançar maior identificação de públicos menos escolarizados, já que estas pessoas podem já ter sido ou vir a ser beneficiadas por ações empresariais desta categoria, ou ainda conhecer pessoas próximas que o sejam. Estes indivíduos seriam mais simpáticos e sensíveis a esta componente do conceito por estarem muito próximas dele, conferindo assim à empresa maior legitimidade como socialmente responsável.

Pessoas que trabalham no setor de educação e cultura também privilegiam a dimensão Bem-estar social.A própria constituição desta componente por itens versando sobre educação e cultura ("Acho que responsabilidade social de uma empresa é apoiar financeiramente eventos culturais comunitários"; "Acho que responsabilidade social de uma empresa é colaborar no gerenciamento da escola pública com apoio técnico especializado", etc.) pode ter influenciado na prevalência desta componente para este segmento profissional em específico.

Por fim, conforme diminui o poder aquisitivo da amostra, mais importância é conferida à componente Qualidadepara definir responsabilidade social. A composição semântica de Qualidade agregou significados de manutenção de boas relações por parte da empresa com os seus funcionários, os seus clientes e o meio ambiente. Nesta componente, o sentido de primar por relações de qualidade com os funcionários compareceu em dez dos vinte itens constituintes deste fator, com cargas fatoriais significativas. Alguns dos itens que versam sobre a relação da empresa com o funcionário são: "Acho que responsabilidade social de uma empresa é ter cuidado com a saúde dos funcionários" (carga= 0,629); "Acho que responsabilidade social de uma empresa é oferecer programas de bonificação para funcionários" (carga= 0,549). Pessoas com renda familiar mais baixa provavelmente se identificam mais com a classe trabalhadora do que com a classe patronal, de forma que a renda pode estar produzindo efeito no componente Qualidade,através da identificação de pessoas menos favorecidas economicamente com o conteúdo de saúde e direitos ocupacionais presentes no fatoro Por outro lado, a componente também é constituída por sete itens de cargas significativas que ilustram a qualidade das relações com o público consumidor - "Acho que responsabilidade social de uma empresa é disponibilizar para o cliente serviços de atendimento ao consumidor"(carga= 0,656); "Acho que responsabilidade social de uma empresa é oferecer garantias e assistência técnica para os produtos comercializados" (carga= 0,635). A priorização da componente Qualidadepor pessoas de renda mais baixa pode também estar sendo explicada pelo ponto de vista do seu comportamento de consumidor. O senso comum nos leva a crer que a aquisição de bens e serviços por pessoas menos abastadas é uma atividade que exige mais manejo de restrições financeiras, mais equacionamento de vantagens, mais ponderação de garantias e expectativas de beneficios alcançados pela compra. Provavelmente, uma pessoa abastada não confere o mesmo valor ao celular comprado do que uma pessoa que teve de parcelar o máximo de vezes e paga com dificuldade tais parcelas. Se uma empresa oferece esse conjunto de beneficios e essa margem de confiabilidade na relação com o seu cliente, provavelmente o consumidor de baixa renda tenderá a percebê-la como socialmente comprometida mais do que consumidores de maior poder aquisitivo o farão, pois as ações empresariais que traduzem Qualidadecorrespondem mais às necessidades dos primeiros sujeitos.

 

8. Conclusão

O objetivo deste trabalho foi o de identificar o significado atribuído à responsabilidade social do ponto de vista do consumidor, e estabelecer as variáveis que influenciam este significado. Justifica-se pelo fato de não terem sido encontradas referências de pesquisa acadêmicas ou empresariais que explorassem o consumidor como sujeito do estudo. Neste trabalho, utilizamos amostra de características sócio-demográficas variadas. Entretanto, como foi imposta à amostra a condição de nível médio completo de escolaridade, estes resultados não são generalizáveis a todo tipo de consumidor. Também não podemos afirmar que todo consumidor belenense esteja representado neste trabalho, uma vez que pode ter havido um viés amostral: os dados foram coletados em um único Shopping Center da cidade. Mesmo assim, consideramos que os achados adicionam ao corpo das ciências humanas e da Psicologia um conceito até então pouco explorado.

Através de critérios psicométricos rigorosos, foi alcançada uma estrutura fatorial clara e bem mais sintética do que as propostas por expertsempresariais. Todos os itens apresentaram cargas fatoriais elevadas em apenas um componente. Os índices de fidedignidade dos componentes foram excelentes. A pesquisa gerou um instrumento de medida de responsabilidade social apto a futuras revalidações.

Nossas hipóteses de constituição do conceito não foram refutadas. O consumidor realmente entende o conteúdo de responsabilidade social agregando o mesmo sentido que é veiculado no meio empresarial, embora não tão didaticamente estruturado em várias componentes como o pretendem os especialistas de mercado. As variáveis preditoras apresentaram efeito significativo sobre responsabilidade social, embora nem todas na direção que havíamos previsto. Foi contrariada a nossa suposição de que escolaridade e renda estariam correlacionadas positivamente com o construto.

A busca da esquematização do conceito partindo do referencial do consumidor amplia as possibilidades de pesquisa em Psicologia do Consumidor. Saber como o consumidor compreende determinado fenômeno contribui para entender, prever ou influenciar seu comportamento de consumo.

 

Apêndice: escala de significado de responsabilidade social

Instruções

Este questionário é composto por diversas afirmativas relacionadas à Responsabilidade Social de empresas privadas. Estamos interessados em saber se você concorda ou não com o que cada frase afirma sobre empresas socialmente responsáveis. Para dar sua resposta, utilize a escala de cinco pontos que está colocada à direita de cada afirmativa, marcando com um X o número que expressa a sua opinião.

Os números da escala significam o seguinte:

1 Discordo totalmente

2 Discordo levemente

3 Nem discordo nem concordo

4 Concordo levemente

5 Concordo totalmente

Marque apenas um número para cada frase e não deixe nenhuma frase sem resposta.

 

 

 

 

Referências

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Recebido: 05/01/04
Revisado: 20/09/04
Aceito: 15/12/04

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