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Trivium - Estudos Interdisciplinares
versión On-line ISSN 2176-4891
Trivium vol.3 no.1 Rio de Janeiro enero/jun. 2011
ARTES
Uma nova cena
Halina Grimberg
Psicanalista e escritora
Peça Teatral O SINTOMA da série "Variações Freudianas" QUINET, Antonio. Rio de Janeiro, 2011.
Antonio Quinet, psicanalista e dramaturgo, ousa em ato cênico e conceituai. Uma série dramática, Variações Freudianas iniciou-se com O Sintoma, em temporada de abril e maio de 2011 na Casa de Cultura Laura Alvim. Seguir-se-ão mais duas variações, no sentido musical e estético da palavra. Um novo significante - "Inconsciente em Cena" é lançado ao mundo, desdobrandose no laço social que estabelece com a platéia e com a psicanálise em extensão. Como nota musical dominante vibra em temas onde tônicas e intervalos se expandem, como a música de cena de Jose Eduardo Costa e Silva.
Por variação podemos entender, ainda, cada uma das manifestações possíveis de alguma coisa que, oferecendo alternativas na sua forma, conserva sua natureza intrínseca. É uma natureza de compromisso entre algo recalcado e outro algo gozosamente vivido. Eis o sintoma. Daí a ousadia. Escrever um texto teatral sendo psicanalista. E como dramaturgo pensar e dizer psicanaliticamente.
Quinet, psicanalista, instala um ato simbólico no exercício de um fazer dramático. Diante de um público atento, em cadeiras dispostas de tal maneira que a face de cada um torna-se espelho para a leitura dos próprios sentimentos. O palco divide a platéia em duas partes e uma encara a outra. Mimetiza-se o sujeito divido, que dolorosamente somos, entre um ego que se envaidece e quer aparecer, e um inconsciente que se faz cena outra, sempre outra e que, apesar disso, busca revelar-se, fazer-se ouvir, fazer-se ver, fazer-se ler e escrever, fazer-se discurso que não cessa de insistir em evidencias que se marcam no corpo ou na auto-tortura mental. Identificações cruzadas e intercambiáveis. Projeções do olhar sobre corpo alheio onde visualizo a tensão que me arrasta. Reúne-os uma película de musica instrumental ao vivo que é pele de ovo ninando embrião.
Oferecer corpo ao personagem do analista sobre o palco, este é Quinet dramaturgo e ator. Dar voz efetiva (em alto e bom som) e dramática a conceitos eventualmente herméticos do thesaurus da psicanálise freudiana e lacaniana - eis a outra face deste gesto ousado. Convidar a um outro produzir teórico - dentro do mal estar da civilização - é o que se realiza belamente.
Os personagens, modelados pela direção de Regina Miranda, são três apenas. Um psicanalista - no exercício de seu savoir- faire, pensante e interiorizado, senta-se à mesa de trabalho - ouve sua própria voz gravada e faz anotações sobre um quadro negro enquanto constrói uma conferência sobre psicopatologia e psicanálise. Dois outros atores encarnam - isso mesmo! - emprestam sua carne viva e dela fazem escritura de reflexões internas do psicanalista: uma histérica (atriz: Aline Deluna) e um obsessivo (ator: Ilya São Paulo) debatem-se sobre o palco. Mas a cena está dentro da cabeça de quem pensa, de quem vê, de quem é pensado, de quem diz e é dito.
Um novo paradigma: transmite-se psicanálise assim, em ato, em uma nova cena. Algo acontece, há um novo saber nesta tênue margem entre a ética do desejo e a estética poética. Quinet, qual um Colombo, coloca o ovo em pé: a psicanálise e o teatro lidam com a encenação e fazem do desejo e suas errâncias um ato. Travessias. Variações freudianas 1: O sintoma é poiesis interior e exterior em deslizamento que se faz laço, e laço feito fita, e fita como uma banda de Moebius. Coragem de avançar no campo do sem sentido e enunciar: sou, estou - e vocês?