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Revista Psicopedagogia
versión impresa ISSN 0103-8486
Rev. psicopedag. vol.33 no.102 São Paulo 2016
ARTIGO ORIGINAL
Investigação da atenção de adolescentes que apresentam mau desempenho escolar
Attention research of teen presenting bad school performance
Maria de Fátima GuadagniniI; Adriana Nobre de Paula SimãoII
IPsicóloga, aluna do curso Neuropsicologia Aplicada à Neurologia Infantil, Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (FCM/UNICAMP), Campinas, SP, Brasil
IIPsicóloga; Mestre e Doutora em Ciências Médicas, Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (FCM/UNICAMP), Campinas, SP, Brasil
RESUMO
O objetivo da presente pesquisa foi comparar o desempenho atencional de adolescentes em instrumentos neuropsicológicos que avaliam a atenção. Participaram 40 adolescentes de uma Escola Pública Estadual localizada na cidade de Campinas-SP, de ambos os gêneros, com idades de 14 a 16 anos, com e sem dificuldades escolares. Foram utilizados os seguintes instrumentos: Teste de Inteligência Geral Não-Verbal (TIG-NV); Índices Fatoriais Velocidade de Processamento (VP) e Memória Operacional (MO) da Escala Wechsler de Inteligência para Crianças (WISC-IV); Teste de Cancelamento com Lápis e Papel A/B e Trail Making Test A/B. Os resultados dos grupos foram analisados estatisticamente e obtidas diferenças significativas indicando escores inferiores no grupo de adolescentes com mau desempenho escolar nos instrumentos utilizados, com exceção do Teste de Cancelamento - Letras em Fileiras e do Trail Making Test - Parte B, que não apontaram diferenças significativas em relação ao grupo controle. Os resultados sugerem que a função atencional apresenta prejuízos no grupo de alunos apontados com mau desempenho escolar, corroborando os estudos que afirmam que a atenção é base para o sucesso da aprendizagem.
Unitermos: Testes neuropsicológicos. Atenção. Baixo rendimento escolar.
ABSTRACT
The aim of this research was to compare the attentional performance of adolescents in neuropsychological instruments that assess attention. Forty teenagers from a State Public School in the city of Campinas-SP, of both genders, aged 14-16 years with and without learning difficulties were analyzed. The following instruments were used: General Intelligence Test Nonverbal (TIG-NV); Factorial indexes processing speed (VP) and Working Memory (MO) of the Wechsler Intelligence Scale for Children (WISC-IV); Cancellation test with pencil and paper A / B and Trail Making Test A / B. The results of the groups were statistically analyzed and obtained significant differences indicating lower scores in adolescents with poor school performance in used instruments, with the exception of canceling test - Letters in rows and the Trail Making Test - Part B, which did not show significant differences in the control group. The results suggest that attentional function displays losses in the group of students pointed to poor school performance, corroborating studies that state that attention is the basis for successful learning.
Keywords: Neuropsychological tests. Attention. Underachievement.
INTRODUÇÃO
O mau desempenho escolar refere-se a um rendimento acadêmico abaixo do esperado para a idade, habilidades cognitivas e escolaridade1. De acordo com os estudos, 30% a 40% das crianças nos primeiros anos do ensino fundamental podem apresentar dificuldades escolares2.
Buscar a causa do mau desempenho escolar é importante para traçar a melhor terapêutica para cada indivíduo. As causas do insucesso na aprendizagem são variadas, podendo ser uma disfunção intrínseca da criança que não aprende, tal como um transtorno específico de aprendizagem, ou uma causa extrínseca ao aluno, como a influência do contexto psicossocial, familiar e pedagógico em que ela está inserida3.
Os problemas relacionados à aprendizagem são divididos em dois tipos: Dificuldades Escolares (DE), relacionadas a problemas de ordem pedagógica, e Distúrbios de Aprendizagem (DA), relacionados a uma disfunção no sistema nervoso central (SNC), caracterizada por uma falha no processo de aquisição e/ou desenvolvimento das habilidades escolares. Tal compreensão sobre os distúrbios de aprendizagem é base para o planejamento dos processos avaliativos e valoriza-se o trabalho de uma equipe interdisciplinar para o diagnóstico do problema, já que na maioria das vezes os problemas de aprendizagem são de origem complexa e desvendá-los requer a união de múltiplos profissionais da área da saúde e da educação2.
Outros autores4 também apontam que os processos experimentados pelos escolares, considerando-se tanto as dificuldades e disfunções dos indivíduos quanto as inadequações do ensino que geram os atrasos escolares, devem ser investigadas, sendo o objetivo dos profissionais que acompanham o aluno realizar as intervenções necessárias para que todos permaneçam na escola e alcancem o aprendizado possível dentro de suas reais condições.
A tarefa de aprender algo novo requer um grande esforço cognitivo e a atenção é uma das primeiras funções requisitadas, e por isso é base para a ocorrência do aprendizado. Na realização da leitura de uma palavra ou texto, por exemplo, é necessária a integração das informações do processamento visual (discriminação, organização visual e visuo-espacial), sua fixação, codificação e posterior compreensão. Todos estes processos requerem capacidade e controle atencional, assim como integralidade das funções executivas5.
De acordo com um estudo realizado a fim de descrever os motivos de encaminhamento e as queixas recebidas no Ambulatório de Distúrbios de Aprendizagem (DISAPRE), no Hospital das Clínicas da UNICAMP, nota-se que as funções de atenção/memória possuem frequência de 18,9% no relato dos pais durante coleta de dados na anamnese e tais funções vem acompanhando a queixa principal referida no serviço que é a de dificuldade de aprendizagem (46,3%)6.
Luria7 define atenção como sendo um processo mental que possui um grau de direção e de seletividade, responsável pela escolha de elementos importantes para a atividade mental, possibilitando ao organismo tornar-se receptivo a estímulos, a reagir às excitações internas ou externas. Sem essa capacidade de seleção, as informações absorvidas ocorreriam de forma acentuada e desorganizada, resultando na impossibilidade de ocorrência de atividades mentais.
Autores destacam a classificação da atenção considerando a maneira como ela é operacionalizada: seletiva, sustentada, alternada e dividida8.
A atenção seletiva é a capacidade de direcionar o foco para um determinado estímulo e, ao mesmo tempo, ignorar os outros estímulos irrelevantes. Por exemplo, em uma sala de aula, o aluno deve ser capaz de se atentar para o que o professor está dizendo e ignorar os ruídos de fora da sala de aula. A atenção sustentada refere-se à capacidade de um indivíduo manter a atenção seletiva sobre determinado estímulo ou objeto para a execução de tarefas. Para tarefas que demandam alternar o foco atencional entre diferentes estímulos, como, por exemplo, ouvir música e estudar, a atenção alternada está sendo utilizada. Já a atenção dividida refere-se à divisão do foco atencional para o desempenho de duas tarefas simultaneamente8.
Alguns instrumentos de avaliação neuropsicológica são voltados para a avaliação da atenção visual sustentada e seletiva, como Trail Making Test, subtestes Código e Procurar Símbolos da Escala WISC IV e os testes de cancelamento como o TCLP, que podem avaliar tanto a atenção seletiva - uma vez que são constituídos por tarefas que exigem a seleção e a sinalização de um estímulo-alvo, quanto a atenção sustentada - por demandarem do sujeito manutenção da atenção e persistência na execução da tarefa9.
Outros instrumentos são direcionados para avaliação da atenção auditiva, como é o caso dos subtestes Dígitos e Sequência Números e Letras da Escala WISC IV. Tais instrumentos são amplamente utilizados em clínica para fins de levantamento de sintomas que podem sugerir um distúrbio de aprendizagem e possibilitam traçar as intervenções necessárias para cada caso.
O controle executivo da atenção está relacionado à detecção da relevância de um estímulo e à inibição das interferências dos distratores, exigindo, portanto, esforço do processamento atencional10. Este apontamento nos remete citar, embora não seja objeto de análise deste estudo, que o transtorno mais prevalente na infância que envolve prejuízo no controle executivo, de ordem atencional, é o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), que além de desatenção persistente pode manifestar hiperatividade e impulsividade. O índice de incidência deste transtorno gira em torno de 3% a 5% das crianças em idade escolar11.
Embora dificuldades escolares não signifiquem necessariamente a presença do TDAH, as crianças com este transtorno estão sob maior risco de mau desempenho escolar e devem receber cuidados especiais12.
Desse modo, consideramos a investigação da atenção de alunos que apresentam dificuldades escolares importante para o conhecimento do perfil atencional em relação às idades estudadas e para a identificação de disfuncionalidades, entendendo que déficits nesta função podem gerar impactos negativos na vida escolar da criança e do adolescente, uma vez que a atenção está diretamente relacionada ao processo da aprendizagem.
MÉTODO
Participantes
Participaram da pesquisa um total de 40 adolescentes, de ambos os gêneros, com idade entre 14 anos completos e 16 anos e 11 meses de idade, cursando do 9o ano do Ensino Fundamental ao 2o ano do Ensino Médio. A amostra foi dividida em dois grupos distintos:
•Grupo de Pesquisa: 20 adolescentes que apresentavam mau desempenho escolar;
•Grupo Controle: 20 adolescentes que apresentavam bom desempenho escolar.
Os critérios de inclusão e exclusão dos participantes do grupo de alunos com mau desempenho escolar foram: a) apresentar mau desempenho escolar, ou seja, notas abaixo de 5 em matemática e português em um dos dois bimestres do ano letivo vigente; b) assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) pelos pais; c) assinatura do Termo de Assentimento Livre e Esclarecido (TALE) pelos adolescentes; d) estar matriculado e frequentando a escola regularmente; e) não apresentar rebaixamento no nível intelectual, isto é, apresentar Quociente de Inteligência (QI) dentro da média (QI>80); f) não ter distúrbios neuropsiquiátricos comprovados com diagnóstico médico e/ou fazer uso de medicações para transtornos de aprendizagem que constassem no prontuário do aluno na escola.
Instrumentos
Para a coleta dos dados foram utilizados os seguintes instrumentos:
• Classificação do QI: Teste de Inteligência Geral Não-Verbal (TIG-NV) (Tosi, 2006)13: o teste permite identificar os tipos de raciocínios errados e os processamentos envolvidos na sua execução. Possibilita uma classificação dos sujeitos em termos de Percentil ou QI, além da classificação da inteligência de acordo com o grau de escolaridade (Fundamental, Médio e Superior). Pode ser aplicado na faixa etária de 10 a 79 anos. A correção é realizada por meio da grade de análise de respostas.
•Índice de Memória Operacional (IMO) da WISC-IV (Wechsler, 2013)14, composto pelos subtestes: Dígitos e Sequência de Números e Letras. Avaliam a memória de trabalho, atenção, concentração, raciocínio e controle mental. O subteste Dígitos é composto por duas partes: na primeira é solicitado ao avaliado que repita uma sequência de números pronunciados pelo avaliador, e, na segunda parte, é solicitado que o avaliado fale os números na ordem inversa, após o avaliador pronunciar uma sequência de números. Além dos escores totais, considerou-se também a avaliação da maior sequência de dígitos em ordem direta (UDIOD) e a maior sequência de dígitos em ordem inversa (UDIOI) que o avaliado conseguiu repetir.
•Índice Velocidade de Processamento (IVP) da WISC-IV (Wechsler, 2013), composto pelos subtestes Código e Procurar Símbolos que avaliam a atenção sustentada visual, memória visual a curto prazo e coordenação visuomotora. O subteste Procurar Símbolos (PS) é um instrumento não-verbal. A tarefa demanda que o avaliado observe um símbolo modelo e realize um rastreio visual, a fim de encontrá-lo em um conjunto, registrando se o símbolo modelo está presente no conjunto ou não. O avaliado responde ao maior número de itens possíveis dentro de um limite de 120 segundos. O subteste Código (CD) é um instrumento não-verbal que consiste em identificar e copiar símbolos que estão associados a figuras geométricas dispostos em um modelo. A pontuação é determinada pelo número de símbolos copiados corretamente em 120 segundos. Escala Weschler de Inteligência para Crianças 4ª Edição - WISC-IV pode ser aplicada na faixa etária de 6 anos e 0 meses a 16 anos e 11 meses e a correção é realizada a partir dos dados normativos padronizados, considerando-se a idade exata do avaliado. Ao final, foram obtidos os pontos compostos dos índices VP e MO e a descrição dos escores totais dos subtestes aplicados.
• Teste de Cancelamento com Lápis e Papel (TCLP): trata-se de um teste que avalia a atenção sustentada, ressaltando o aspecto visuoespacial, composto por duas partes, A e B. A Parte A (Figuras Geométricas) consiste na apresentação aleatória de figuras geométricas simples apresentadas em uma folha de papel, com o objetivo do sujeito marcar todos os círculos encontrados o mais rápido que conseguir15. A parte B (Letras em Fileiras) consiste na apresentação de letras em fileira na folha de papel, organizadas visuoespacialmente, com o objetivo do avaliado marcar todas as letras "A" encontradas, orientado a realizar a tarefa o mais rápido possível16. Para avaliação, foram considerados os escores de tempo (em segundos), erros por omissão (número de estímulos-alvo não assinalados) e erros de adição (número de estímulos não-alvo assinalados).
•Trail Making Test (TMT - A/B): mede a habilidade de manter e alternar atenção entre dois conjuntos sequenciais de respostas17. A Parte A avalia atenção sustentada visual e a Parte B, flexibilidade cognitiva. A Parte A é composta por uma folha de papel com círculos numerados de 1 a 25, distribuídos aleatoriamente e o avaliado tem como objetivo traçar uma linha conectando os números em ordem crescente. A Parte B é composta por círculos com números e letras e o avaliado deve ligar alternadamente os círculos com números e letras, seguindo respectivamente as ordens numérica e alfabética. Foram utilizados os escores de tempo, erros de sequência (número de vezes em que o avaliado não segue a sequência correta de números e/ou letras) e erros de alternância (Na Parte B), sendo este o número de vezes em que o avaliado não alternou as ligações entre números e letras.
Procedimentos
A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas/UNICAMP, conforme consta no Parecer de Aprovação de número 1.242.515.
Os adolescentes de ambos os grupos foram indicados pela coordenação pedagógica da escola. Posterior à seleção dos adolescentes por desempenho escolar, a pesquisadora apresentou aos pais o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Após obter as assinaturas no TCLE, a pesquisadora apresentou individualmente a cada adolescente o Termo de Assentimento Livre e Esclarecido (TALE), esclarecendo os objetivos da pesquisa e garantindo o caráter voluntário da participação. Todos os adolescentes foram avaliados individualmente após a assinatura do TCLE pelos pais e do TALE pelos participantes. A aplicação dos instrumentos obedeceu ao tempo previamente estimado de 60 minutos, realizado em um único encontro, dentro do espaço da escola, em horário antecipadamente combinado com os pais e adolescentes, sendo utilizado o período contraturno para não retirar o aluno de suas atividades em horário de aula regular. A aplicação dos instrumentos foi realizada em sala que proporcionava um ambiente sem distratores que pudessem prejudicar o desempenho do adolescente. Após o término das avaliações, aos pais que solicitaram devolutiva, foi realizado encontro individual entre a pesquisadora e os responsáveis na reunião de pais da escola para comunicação dos resultados. Por fim, foi realizada a tabulação e análise estatística dos dados.
Os dados foram analisados estatisticamente usando o software SAS versão 9.0. Para comparação dos grupos, foi utilizado teste não-paramétrico de Mann-Whitney, com nível de significância de p <0,05. Foi incluída medida de magnitude de efeito (Cohen's d), para comparação das diferenças de médias entre dois grupos independentes, conforme recomendação da APA18. De acordo com os critérios de Cohen, a magnitude de efeito é interpretada a partir dos seguintes valores: d=0,20 (pequena), d=0,50 (média) e d=0,80 (elevada).
RESULTADOS
Caracterização da amostra
Com relação à amostra total, participaram do estudo 40 adolescentes com idade média de 14,9 anos (DP=0,89), sendo 19 (47,5%) do gênero masculino e 21 (52,5%) do feminino. Não houve diferenças na distribuição dos gêneros em relação aos grupos (Teste de Fisher, p=0,7364). Não houve diferenças (p=0,1849) entre as idades médias do gênero masculino (14,76±0,83 anos) e feminino (15,21±0,92 anos).
A Tabela 1 mostra a frequência dos anos escolares em relação aos grupos.
A Tabela 2 apresenta a caracterização da amostra em função dos anos escolares. Nota-se que as médias de idade nas séries foram: 9º ano do Ensino Fundamental (14,33±0,59), 1ª ano do Ensino Médio (15,0±0,82), 2ª série do Ensino Médio (15,92±0,29).
Em relação ao desempenho cognitivo no Teste de Inteligência Geral Não-Verbal - TIG-NV13, nota-se que a maioria dos alunos avaliados (n=21/52,5%) se encontra dentro da classificação média de inteligência, sendo que nenhum aluno obteve classificação de QI<80, sendo este um dos critérios para inclusão dos adolescentes nos grupos.
Comparação do desempenho
A Tabela 3 apresenta a estatística descritiva dos escores dos testes na amostra geral, em relação aos testes aplicados com os sujeitos.
Foi conduzida a Análise de Variância (ANOVA) para comparar as diferenças entre os escores dos testes nos grupos, como está descrito na Tabela 4.
Os resultados indicaram que houve diferenças significativas entre os grupos nos escores dos testes: Teste de Cancelamento - Figuras Geométricas (Tempo e Erros de Omissão); Trail Making Test - Parte A (Tempo e Erros de Sequência); Trail Making Test - Parte B (Tempo); Índice Memória Operacional (subtestes Dígitos e Sequência de Números e Letras); Sequência Maior de Dígitos Ordem Direta (UDIOD); Sequência Maior de Dígitos Ordem Inversa (UDIOI); Índice Velocidade de Processamento (subtestes Código e Procurar Símbolos). Houve diferenças significativas (p=0,028) também em relação ao desempenho dos dois grupos no Teste de Inteligência Geral - Não-Verbal (TIG-NV), apontando que o grupo de adolescentes que apresentam bom desempenho escolar possui perfil cognitivo com escores superiores quando comparados ao grupo propósito, apesar de todos pontuarem dentro da média esperada para o grau de escolaridade.
Os grupos não diferenciaram significativamente no Teste de Cancelamento - Letras em Fileiras e no Trail Making Test - Parte B, os erros não foram estatisticamente significativos quando comparados entre os grupos.
DISCUSSÃO
A atenção é uma função básica para todo o processo comunicativo e de aprendizagem, pois influencia no "o quê" e no "como" a criança percebe, armazena e reconhece os estímulos que lhe são apresentados19. É necessário considerar, para a avaliação da atenção, que ela é resultado da inter-relação de fatores ambientais (socioculturais), ontogenéticos e filogenéticos, estando envolvida desde a execução de tarefas simples, como a detecção de estímulos, até as mais complexas, como a leitura20.
Na literatura, encontramos estudos que avaliaram o desempenho de crianças nos testes utilizados nesta pesquisa e os achados sugerem haver uma progressão do desempenho nas tarefas com o avançar da idade da criança e da série escolar, mostrando redução do tempo e número de erros cometidos21-23. Além da atenção, os referidos testes demandam bom funcionamento da memória operacional, responsável pela manipulação da informação e velocidade com que elas são processadas. A memória operacional aumenta com a idade da criança, sendo que entre os 5 e 11 anos de idade esta capacidade duplica, atingindo um nível próximo às habilidades do adulto24.
Dessa forma, espera-se que, na adolescência, a utilização dos mecanismos atencionais e sua sustentação para concluir tarefas estejam mais evoluídas, apesar de ainda estarem em desenvolvimento. Com o avançar da idade da criança, vai ocorrendo a maturação das funções do lobo frontal, sendo estas funções responsáveis por proporcionar à criança a habilidade do controle inibitório, importante para relevar estímulos externos à tarefa e essa maturação é básica para o desenvolvimento da atenção sustentada20.
Quando realizada a comparação do desempenho dos grupos com e sem queixas nos instrumentos, foram verificadas diferenças significativas em diversos escores.
Nenhum adolescente dos grupos desta pesquisa apresentou rebaixamento cognitivo (QI<80), porém observou-se significância estatística e forte impacto (d=0,77) da classificação da inteligência (QI) no resultado obtido pelo grupo de alunos que apresentam mau desempenho escolar em relação ao grupo controle, sugerindo que o perfil de inteligência dos adolescentes avaliados possa estar rebaixando o desempenho escolar.
No TCLP - FG, considerando-se o tempo de execução da tarefa, foi observada diferença estatisticamente significativa entre os grupos, apontando que o grupo de adolescentes com prejuízo no desempenho acadêmico levou mais tempo para realizar a tarefa quando comparado ao grupo controle. A análise do Tempo de Execução do TCLP-FG não foi apontada com uma diferença significativa, porém podemos observar que a média de tempo no grupo de pesquisa foi maior.
Em relação aos erros de omissão, o desempenho na parte FG do TCLP também foi inferior ao desempenho na parte LF. O grupo de mau desempenho escolar apresentou uma magnitude de efeito média (d=0,64), sugerindo que este resultado possa ter relação com o mau desempenho escolar por eles apresentado, levantando-se a hipótese de que a atenção do grupo de pesquisa influencia negativamente no desempenho acadêmico.
A maior dificuldade na realização da parte FG do TCLP pode ser explicada pela apresentação dos estímulos: na parte FG, os símbolos estão distribuídos aleatoriamente na folha de papel, o que não ocorre na parte LF, em que as letras estão dispostamente alinhadas, facilitando a organização perceptual.
No Trail Making Test Parte A e B, o tempo de execução da tarefa apresentou diferenças significativas entre os dois grupos e elevada magnitude de efeito (verificado através da análise do d de Cohen)18, demonstrando que os adolescentes com mau desempenho escolar apresentaram menor velocidade na realização de tarefas que requisitam estas funções e este achado tem forte relação com o desempenho acadêmico que apresentam.
Em relação aos erros de sequência no TMT - A/B, os resultados não apresentaram diferenças estatísticas significativas entre os grupos. A parte B do TMT avalia flexibilidade cognitiva e requisita o funcionamento dos mecanismos inibitórios para a execução da tarefa. Os erros de alternância entre números e letras não foi significativa e este erro teve baixa frequência nos grupos estudados.
Em relação aos subtestes que compõem o Índice de Memória Operacional da Escala WISC IV (Dígitos e Sequência de Números e Letras), ambos apresentaram diferenças significativas e elevada magnitude do impacto (Cohen's d) quando comparados ao grupo de pesquisa. Sabe-se que a atenção auditiva requisitada para a realização dos subtestes Dígitos e Sequência de Números e Letras comumente é comprometida em sujeitos com TDAH, e isto pode ocorrer por falha no processamento auditivo (PA)25. Com isso, podemos considerar que déficits no PA podem comprometer a qualidade da aprendizagem escolar, uma vez que a recepção e o processamento das informações auditivas, como a fala do professor, por exemplo, é composição importante do processo de aprendizagem acadêmica.
Consideramos, para uma avaliação mais aprofundada das funções cognitivas exigidas para a realização dos instrumentos a análise do item Dígitos Ordem Direta (UDIOD) e Ordem Inversa (UDIOI) pertencentes ao subteste Dígitos da Escala WISC IV, por ser um item que avalia além da atenção, a memória operacional e a capacidade de manipulação mental da informação, principalmente quando é solicitado que o avaliado repita uma sequência de dígitos em ordem inversa. A análise dos resultados apontou que os alunos com mau desempenho escolar obtiveram escores significativamente inferiores ao grupo de bom desempenho, destacando a parte de Dígitos em Ordem Inversa (UDIOI), em que o grupo de pesquisa teve pior resultado, apontando magnitude do efeito elevada (d=0,91).
Nos subtestes que compõem o Índice de Velocidade de Processamento da Escala WISC IV (Código e Procurar Símbolos), os grupos apresentaram diferenças estatisticamente significativas de elevada magnitude, observáveis através da análise do d de Cohen, sugerindo, conforme a literatura23,26,27, que a atenção visuo-espacial e a velocidade de seleção e realização de tarefas, quando adequadas, permitem que a criança acompanhe as tarefas escolares, como, por exemplo, ler um texto na lousa e copiá-lo no caderno.
Atividades estas que envolvem, além da capacidade de livrar-se de estímulos distratores, a habilidade do movimento óculo-motor e destreza manual. Contudo, podemos estabelecer relações diretas do desempenho rebaixado no Índice de Velocidade de Processamento com o mau desempenho dos adolescentes avaliados, sugerindo que as habilidades descritas possam estar comprometidas, dificultando a aprendizagem.
Contudo, compreendendo que a avaliação das dificuldades escolares deve considerar as muitas funções cognitivas e afetivas envolvidas na aprendizagem e os fatores socioculturais, que não foram abordados neste estudo, destacamos a importância de trabalhos que relacionem estas outras funções e fatores com o mau desempenho acadêmico dos adolescentes.
CONCLUSÃO
Os adolescentes que apresentam mau desempenho acadêmico obtiveram resultados inferiores nos instrumentos que avaliam a inteligência e a atenção em comparação aos adolescentes com bom desempenho escolar. As habilidades visuo-espaciais que envolvem atenção, destreza manual e movimentos óculo-motores foram as que mais diferiram entre os grupos, sugerindo que alunos que possuem estas habilidades rebaixadas levam mais tempo para realizar tarefas escolares, tais como a leitura e cópia de um texto, o que pode gerar prejuízos no desempenho acadêmico de um modo geral.
Entende-se, portanto, que a atenção é um processo básico para a ocorrência da aprendizagem, e seus déficits causam impacto negativo no desempenho escolar, assim como nas demais atividades do sujeito.
Considerando-se tais achados, sugere-se a continuidade de pesquisas que estabeleçam a relação das habilidades da atenção com outras habilidades, como velocidade de processamento, memória operacional, linguagem, funções executivas e outros processos cognitivos e afetivos na população analisada para observação do impacto desta habilidade no processo de aprendizagem.
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Endereço para correspondência:
Maria de Fátima Guadagnini
Rua Thiago Jorge Pereira Fogari, 576 - Terras do Barão
Campinas, SP, Brasil - CEP 13085-602
E-mail: fatima_guadagnini@yahoo.com.br
Artigo recebido: 21/7/2016
Aprovado: 2/10/2016
Trabalho realizado na Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (FCM/UNICAMP), Campinas, SP, Brasil.