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Boletim - Academia Paulista de Psicologia

versión impresa ISSN 1415-711X

Bol. - Acad. Paul. Psicol. vol.35 no.88 São Paulo ene. 2015

 

RESENHAS DE LIVROS

 

 

González Blasco, (2011). Humanizando a medicina: uma metodologia com o cinema. São Paulo: Centro Universitário; São Camilo - Setor de Publicação. ISBN 978-8587121-26-4

 

 

Marco Aurelio Janaudis1

Faculdade de Medicina de Jundiai (FMJ)

 

 

Neste livro, o autor aborda o tema da humanização da medicina, o qual está cada vez mais presente e é verdadeira preocupação dos profissionais e dos gestores dos diversos sistemas de saúde. O motivo é evidente: a humanização da medicina consiste em reinserir a ciência nas suas verdadeiras origens. Não é difícil entender que nos dias de hoje a ciência tem de ser forçosamente humana, se quer pautar-se pela qualidade e pela excelência. Humanizar as ciências da saúde, inclusive a medicina, é, além de uma obrigação educacional, uma condição de sucesso para o profissional da saúde.

Como médico e professor de medicina, o autor se dirige aos médicos e estudantes desta área de modo mais direto, mas o livro é certamente de interesse de todos os profissionais da área de saúde e destacamos aqui os psicólogos.

O autor explica porquê é preciso humanizar a medicina, e outras ciências da saúde que nasceram no âmago mais profundo do ser humano. Pergunta se porquê a Medicina, como outras ciências congêneres, desumanizaram-se. A discussão é longa, repleta de matizes e perspectivas, muitas delas abordadas no presente trabalho. O autor inspira-se no conselho que Guimarães Rosa(2001) ao colocar na boca do jagunço Riobaldo ao confessar o quanto gostaria de decifrar as coisas que são importantes, e traz uma luz a esta discussão acadêmica: "esquecemos do que temos perto de nós, não sabemos apreciá-lo". E afirma que a desumanização da medicina é, sobretudo, um esquecimento lamentável do que tendo perto diariamente, deixamos passar sem reparar. Humanizar a medicina, bem como as demais profissões voltadas à área da saúde, é, de algum modo, recordar um exercício ativo, da memória, para lembrar quem somos como médicos, psicólogos, enfermeiros, o que buscamos e qual é a nossa história.

A primeira parte desta obra - Caminhos para a Humanização: Encontros vitais, o autor recolhe a uma história de vida que reúne mais de vinte anos da biografia do autor. Lá, constam vivências, experiências e reflexões concomitantes que transitam pelo mundo do paciente, do aluno, da Medicina de Família como foco profissional e, finalmente, do Humanismo e, em particular, do Cinema como expressão artística.

A humanização das áreas da saúde, da medicina em particular, começa pelo encontro com o paciente: esse é o ponto de partida imprescindível em qualquer tentativa de humanização. Sem contemplar o paciente - coisa que todo profissional da saúde deve fazer, independente da sua área ou especialidade - não há humanização possível. Segue-se o encontro com o estudante, como fonte inspiradora. O estudante das áreas da saúde, inclusive da medicina, que entra nas faculdades com ideais humanitários, com freqüência vai perdendo-os aos poucos, e com isso apaga-se o verdadeiro motivo que o conduziu a ser profissional da saúde (médicos, psicólogos, etc). Entender o quê acontece é também uma luz que ilumina os desejos humanizantes. As artes e humanidades, que são um elemento clássico na formação humanística dos profissionais da saude, vêm aqui representadas pelo Cinema, como recurso educacional.

A utilização do Cinema como uma experiência educacional humanizante ocupa toda a segunda parte do livro. O Cinema, que sintoniza com o universo do estudante onde impera uma cultura da emoção e da imagem, tem uma particular utilidade educacional. A autor nos adverte que educar as atitudes supõe mais do que oferecer conceitos teóricos ou mesmo simples treino; implica promover a reflexão -verdadeiro núcleo de processo humanizante- que facilita ao estudante a descoberta de si mesmo, e permite extrair do seu interior o desejo de um compromisso vocacional perdurável.

Esta segunda parte inclui ainda a pesquisa que culminou na Tese de Doutorado do autor1, assim como muitas outras experiências educacionais posteriores havidas com a Metodologia do Cinema. Ele explica a natureza da Pesquisa Qualitativa, instrumento adequado para avaliar o impacto educacional do Cinema como recurso pedagógico. O olhar qualitativo se destina a explicar e compreender os fenômenos que se descrevem, mais do que comprovar hipóteses. Daí, o convite ao leitor para que assuma essa perspectiva qualitativa na análise da obra. Significa deixar de lado a postura habitual com que nos debruçamos sobre os trabalhos científicos, para adotar uma atitude de abertura à compreensão do discurso. Transportar o foco de interpretação, e dos parâmetros quantitativos, para centraliza-lo num universo qualitativo, mais trabalhoso de focalizar por serem seus perfis difíceis de mensurar, menos nítidos. O Professor Pablo nos diz ainda que o olhar qualitativo expõe a quem o adota a uma atitude arriscada. Mas que o risco da aventura fenomenológica é, talvez, o risco da própria vida tecida de interrogações. Uma procura não de soluções, mas que seja princípio para a reflexão que nos conduz ao universo do desconhecido. E que esse era o tesouro de Sócrates, -somente sei que nada sei- educador da juventude, condenado por fazer perguntas, as quais ele mesmo não se aventurava a responder.

A terceira parte do livro oferece, através das reflexões sobre os processos de humanização, uma gama de possibilidades que poderão ser aproveitadas por formadores acadêmicos e gestores de saúde, na tomada de decisões que pretendem fazer frente a esse desafio, necessário como é a Humanização da Medicina.

Por tudo isto, estamos certos de que a obra do Professor Pablo González Blasco é de grande interesse dos profissionais de saúde, principalmente aqueles ligados à educação e preocupados com a formação de seus estudantes.

 

 

1 Prof. Adjunto da FMJ e Secretario Geral da SOBRAMFA (Sociedade Brasileira de Medicina da Familia) contato: R.Silva, 56, Bela Vista, S.Paulo, Brasil. Site: www.medicinafamiliar.com.br; e- mail: marcojanaudis@sobranfa.com.br
1 Blasco P.G. Educação Médica, Medicina de Família e Humanismo: expectativas, dilemas e motivações do estudante de medicina analisadas a partir de discussões sobre produções cinematográficas. Tese Doutoral. Faculdade de Medicina, USP. São Paulo, 2002.

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