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Gerais : Revista Interinstitucional de Psicologia

versión On-line ISSN 1983-8220

Gerais, Rev. Interinst. Psicol. vol.10 no.2 Belo Horizonte dic. 2017

 

ARTIGO

 

Análises psicométricas de instrumentos validados em diversos contextos: o caso da Escala de Adaptabilidade de Carreira[/subtitle]

Psychometric analysis of validated instruments in several contexts: the case of the Career Adaptability scale

 

Thaís Cristine Farsen1; Milena Carolina Fiorini2; Marúcia Patta Bardagi3

1 Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC); thais.farsen@gmail.com

2 Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC); milena_fiorini@yahoo.com.br

3 Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC); marucia.bardagi@gmail.com

 

RESUMO

O presente estudo teórico analisa psicometricamente o caso da adaptação e validação da Escala de Adaptabilidade de Carreira (EAC). O instrumento foi criado de maneira conjunta por pesquisadores de 18 paíes, adaptado e validado concomitantemente a sua criação, em 13 deles. Processos de criação de instrumentos semelhantes a EAC não foram encontrados na literatura. Devido ao uso difundido na área de desenvolvimento de carreira, é importante compreender a adequação dos processos psicométricos utilizados, principalmente para embasar novos estudos, em especial aqueles que pretendem empregar processos de adaptação e validação simultâneas em contextos diversificados. O objetivo do estudo foi identificar, comparar e analisar os procedimentos psicométricos utilizados pelos pesquisadores de 13 paíes que validaram e adaptaram o instrumento, de acordo com suas realidades. São apresentadas as potencialidades e eventuais fragilidades da EAC, com vistas a facilitar sua utilização por profissionais e pesquisadores interessados no tema. Finaliza-se o trabalho com a discussão e a argumentação referente a relevância de se realizarem estudos com semelhante escopo.

Palavras-chave: Adaptabilidade de carreira; Validade do teste; Desenvolvimento de carreira; Psicometria;, Avaliação Psicológica.

 


ABSTRACT

The present theoretical study analyzes psychometrically the case of adaptation and validation of the Career Adaptability Scale (CAS). The instrument was created jointly by researchers from 18 countries, adapted and validated concomitantly to its creation, in 13 of them. Processes for creating instruments similar to CAS were not found in the literature. Due to widespread use in the area of career development, it is important to understand the adequacy of the psychometric processes used, mainly to support new studies, especially those that intend to use simultaneous adaptation and validation processes in diverse contexts. The objective of the study was to identify, compare and analyze the psychometric procedures used by researchers from 13 countries that validated and adapted the instrument according to their realities. The potentialities and eventual weaknesses of the CAS are presented in order to facilitate their use by professionals and researchers interested in the subject. The paper ends with the discussion and argument regarding the relevance of carrying out studies with similar scope.

Keywords: Career Adaptability; Test Validity; Career Development; Psychometric; Psychological Evaluation.

 

 

Introdução

Os processos de elaboração e/ou adaptação de uma escala ou teste psicológico são bastante complexos, exigindo a execução de uma série de requisitos relacionados a sua fidedignidade e validade que são determinantes para a sua efetividade. Considerando-se que profissionais da área de desenvolvimento e aconselhamento de carreira comumente utilizam ferramentas como técnicas, escalas ou testes psicológicos nos seus cotidianos de trabalho, é de extrema importância que tenham conhecimento sobre a qualidade do ferramental utilizado. Quando se trata de adaptaçoes e validaçoes em diferentes contextos socioculturais, como é o caso da Escala de Adaptabilidade de Carreira (EAC), o rigor e a preocupação quanto a qualidade dos procedimentos psicométricos é ainda maior (ITC, 2010), tendo em vista as peculiaridades de cada população.

Nesse sentido, o presente estudo delineia-se como um estudo teórico realizado por meio da metodologia de estudo de caso, que teve como objetivo identificar, descrever e analisar os procedimentos utilizados nos processos de validação e adaptação multicultural da EAC (Savickas & Porfeli, 2012a). Além disso, o estudo objetivou inspirar pesquisadores e profissionais que utilizam escalas em seus estudos e práticas a estarem atentos a qualidade dos procedimentos empregados para a validação psicométrica desses instrumentos.

 

Fidedignidade, Validade, Adaptação de Escalas e o caso da EAC

Nos manuais de Psicometria, costuma-se definir a validade de um teste dizendo que ele é válido se de fato mede o que supostamente deve medir (Anastasi, 1986; Pasquali, 2010). Nesse sentido, Primi, Muniz e Nunes (2009) destacam que a validade corresponde aos resultados positivos sumarizados do teste aplicado, tendo por referência a relação comportamento-traço, que caracteriza as interpretaçoes evidentes que legitimam o instrumento. Já a fidedignidade refere-se ao grau em que o escore obtido no teste aproxima-se do verdadeiro escore do sujeito relativo a determinado traço (Pasquali, 1999). Ela se caracteriza pelo nível de precisão do teste e pode ser medida de diversas maneiras, sendo uma das mais frequentes a avaliação da consistência interna.

Uma das formas mais utilizadas para se analisar a consistência interna dos itens é o coeficiente Alpha de Cronbach. Cunha (2000) argumenta que a consistência interna do instrumento será maior quanto maior for a homogeneidade expressa por meio dos itens. Quanto mais próximo de 1 for o valor do Alpha de Cronbach, melhor a fidedignidade do teste. Anastasi (1986), por sua vez, permite compreender que o processo de validação de um teste inicia-se sempre com a formulação de definiçoes detalhadas do traço ou construto. Essas definiçoes são derivadas das teorias psicológicas, de pesquisa anterior, ou de observação sistemática e análises do domínio relevante do comportamento.

A partir da publicação do Manual Standards for Educacional and Psychological Testing (1999), a compreensão do que é validade sofreu alteraçoes. A nomenclatura sobre validade foi agrupada em categorias: validade relacionada a conteúdo (validade de conceito e validade de face), validade relacionada a critério (validade concorrente e validade preditiva) e validade relacionada a construto (validade convergente, validade discriminante e validade fatorial). Diante das novas formulaçoes do conceito de validade de construto, que passou a ser considerado quase como sinônimo de validade, os "tipos de validade" passaram a ser compreendidos enquanto "fontes de evidência de validade".

Primi et al. (2009) mencionam que há estudos que utilizam a análise fatorial e a análise da consistência interna para demonstrar o quanto a estrutura de relaçoes entre os itens do teste e/ou seus componentes ou subtestes são coerentes com a estrutura proposta pela teoria. Para tanto, a fundamentação teórica do construto de um teste pode caracterizar uma ou mais dimensoes, ressaltando a estrutura hierárquica ou fatores isolados. Nesses casos, a busca por evidências com base na estrutura interna envolve a verificação da coesão entre a estrutura prevista e a observada. Destaca-se que, recentemente, além dos métodos exploratórios tradicionais, recursos como a análise fatorial confirmatória e a modelagem com equaçoes estruturais, que permitem grande flexibilidade no teste confirmatório de modelos teóricos, túm sido também aplicados (Primi et al., 2009).

A análise fatorial confirmatória consiste na testagem dos dados a partir do desenvolvimento de um modelo hipotético de mensuração (Hair, Anderson,Tatham e Black 2010). Ou seja, o pesquisador pode utilizar alguns índices de ajuste absoluto, que determinam a adequação do modelo a priori, ou reproduzem os dados, como, por exemplo, o RMSEA (Raiz do erro quadramático médio de aproximação) e o SRMR (Raiz padronizada do resíduo). O RMSEA representa a quantidade de erro de aproximação amostral em uma matriz de covariância. Os valores de RMSEA variam de 0 a 1, sendo que valores iguais ou maiores do que 0,08 refletem um erro considerável de aproximação populacional, enquanto índices menores do que 0,06 sugerem um ajuste de modelo aceitável. Já o SRMR constitui a raiz do quadrado da discrepância média das matrizes de correlação entre o modelo hipotetizado e os dados encontrados. O SRMR também pode variar de 0 a 1, de modo que valores menores do que 0,05 indicam um bom ajuste (Browne & Cudeck, 1993).

Quando se trata de processos de construção de instrumentos "globais", o objetivo é que a mesma medida possa ser utilizada em diversos locais, apresentando resultados comparáveis. Nesses casos, o processo de validação inclui também adaptaçoes, que são realizadas a partir de diferenças culturais de idioma, por exemplo. O processo de adaptação de instrumentos psicológicos é visto por Borsa, Damásio & Bandeira (2012) como uma tarefa complexa, que demanda planejamento e rigor referentes a manutenção do seu conteúdo, das suas caracteríticas psicométricas e de sua validade para o público ao qual se destina. A adaptação, portanto, deve representar muito mais do que a simples tradução do instrumento. Precisa considerar aspectos linguíticos, culturais e idiomáticos de cada contexto específico (Borsa et al., 2012). O processo de adaptação proposto pelos autores inclui tanto a tradução do instrumento para o idioma específico de cada paí quanto a tradução reversa. O principal objetivo da tradução reversa é verificar em que medida a versão traduzida reflete o conteúdo dos itens em consonância com a versão original.

Neste trabalho, é tratado o caso da EAC, escala que tem como construto-chave a adaptabilidade de carreira. Embora o conceito inicial de adaptabilidade de carreira tenha sido formulado por Super (1957) e, posteriormente, por Super & Knasel (1981), a concepção mais atual foi desenvolvida por Savickas (2013) e compreende um processo psicossocial que denota a prontidão e os recursos do indivíduo para enfrentar as tarefas previsíveis de preparação e participação em papéis de trabalho, bem como ajustes imprevisíveis demandados por transiçoes ocupacionais e traumas pessoais.

O construto adaptabilidade de carreira foi dividido por Savickas (2013) em quatro dimensoes: preocupação, controle, curiosidade e confiança. A preocupação refere-se a capacidade para planejar o futuro profissional e preparar-se para os desafios da carreira. O controle diz respeito a habilidade para controlar as tentativas de preparação para o futuro profissional, o nível de responsabilidade, esforço, autodisciplina e persistência. A curiosidade reflete a exploração de si mesmo e de possíveis futuros cenários de carreira. A confiança relaciona-se a crença nas escolhas de carreira e na capacidade para implementar os planos profissionais (Savickas & Porfeli, 2012a; Ambiel, 2014). Essas quatro dimensoes permitem que o indivíduo obtenha recursos e estratégias para administrar tarefas críticas e possíveis transiçoes ao longo da carreira.

A partir da progressiva heterogeneização, flexibilização e complexificação do mundo do trabalho, principalmente no final do século XX, a ruptura do emprego passou a representar o modelo hegemônico de inserção no trabalho (Ribeiro, 2009). Dessa forma, o construto adaptabilidade de carreira foi assumindo importância prática e teórica, em virtude da necessidade cada vez mais evidente de adaptação das pessoas a novos contextos e condiçoes de carreira. Com o objetivo de operacionalizar o conceito de adaptabilidade de carreira, tornando-o uma ferramenta condizente com as necessidades do contexto socioeconômico, um grupo de psicólogos vocacionais de 18 paíes reuniu esforços para desenvolver um instrumento comum (Savickas & Porfeli, 2012a). O grupo reuniu-se inicialmente em 2008, na Alemanha, e posteriormente em 2010, na Austrália. O projeto foi denominado International Career Adaptability Project e teve como produto a versão original da Escala de Adaptabilidade de Carreira (Career Adapt-Abilities Scale). Foram discutidas similaridades e diferenças culturais entre os paíes, além de modelos teóricos relacionados ao conceito de adaptabilidade de carreira. Decidiu-se por elaborar o instrumento geral no idioma inglús, para que as traduçoes posteriores fossem realizadas individualmente nos idiomas correspondentes a cada um dos paíes. A primeira versão da Escala de Adaptabilidade de Carreira foi construída com 100 itens, divididos em quatro dimensoes, com 25 itens cada: preocupação, controle, curiosidade e confiança.

Foram desenvolvidos trús estudos-pilotos nos EUA, que utilizaram análises fatoriais exploratórias e confirmatórias, sendo que os itens acabaram sendo reduzidos a 4 conjuntos de 11, ou seja, 44 itens. A versão resultante foi aplicada em 13 dos 18 paíes representados (Ambiel, 2014), com estudantes e/ou adultos trabalhadores. Por meio de análises de covariância e análises fatoriais confirmatórias, foram excluídos 20 dos 44 itens. A escala revisada ficou, então, com 24 itens, decompostos em 4 conjuntos de 6 afirmativas (Savickas & Porfeli, 2012a). Os itens mantidos na versão final foram escolhidos devido a sua pertinência teórica, as cargas fatoriais e a adequação dos índices de ajuste (Savickas & Porfeli, 2012a). Considerando o resultado do estudo inicial, referente a elaboração do instrumento, os índices de consistência interna das subescalas variaram de satisfatórios a excelentes, com resultados que demonstraram relaçoes semelhantes entre os traços latentes de cada paí, sugerindo que a escala mede, de fato, os mesmos construtos em todos os paíes.

Ao analisar os processos de adaptação e validação realizados por 13 dos 18 paíes que participaram da criação do instrumento, percebe-se que nem todos os procedimentos são descritos de forma detalhada pelos autores. A omissão de dados como esses pode gerar dúvidas nos pesquisadores e profissionais que necessitam avaliar a validade e a confiabilidade da medida antes da sua utilização em práticas e estudos relacionados ao tema. Visando a fornecer subsídios que auxiliem no processo de avaliação e análise da EAC, desenvolveu-se o presente estudo.

 

Procedimentos metodológicos

Para a elaboração do presente estudo, foram analisados os 13 artigos (Dries, Esbroeck, Vianen, Cooman & Pepermans, 2012; Duarte et al., 2012; Maree, 2012; Porfeli & Savickas, 2012; Pouyaud, Vignoli, Dosnon & Lallemand, 2012; Rossier, Zecca, Stauffer, Maggiori & Dauwalder, 2012; Soresi, Nota & Ferrari e Tak, 2012; Teixeira, Bardagi, Lassance, Magalhóes & Duarte, 2012; Tien, Wang, Chu & Huang, 2012; Vianen, Klehe, Koen & Dries, 2012; Vilhjálmsdóttir, Kjartansdóttir, Smáradóttir & Einarsdóttir, 2012; Hou, Leung, Li & Xu, 2012) publicados no ano de 2012 no Journal of Vocational Behavior, que apresentam o processo de validação e adaptação da Escala de Adaptabilidade de Carreira em 13 paíes.

A escolha dos artigos teve como base a publicação Career Adapt-Abilities Scale: Construction, reliability, and measurement equivalence across 13 countries (Savickas e Porfeli, 2012a), na qual os autores fazem referência a construção conjunta do instrumento, realizada por pesquisadores de 18 paíes. No entanto, dos 18 paíes que integraram o grupo, apenas 13 (Taiwan, Paíes Baixos, Portugal, africa do Sul, Suíça, Estados Unidos, Brasil, Bélgica, China, França, Islândia, Itália e Coréia) seguiram com as adaptaçoes e validaçoes em seus respectivos contextos culturais, no mesmo momento da criação do instrumento original.

A leitura dos 13 artigos teve como foco verificar os procedimentos de adaptação e as evidências de validade utilizadas pelos autores, tendo-se como base diretrizes universais da Psicometria. A análise dos resultados obtidos foi baseada em definiçoes de evidências de validade exibidas no manual Standards for Educational and Psychological Testing (1999). Esse manual apresenta, entre outros aspectos, quatro tipos de evidências de validade: 1. Evidências baseadas no conteúdo; 2. Evidências baseadas em variáveis externas; 3. Evidências baseadas na estrutura interna; e 4. Evidências baseadas nos processos de respostas. A análise das informaçoes referentes aos procedimentos iniciais de adaptação foi realizada a partir da orientação de Borsa et al. (2012). De acordo com os autores, a literatura sugere, de modo geral, que o processo de adaptação de instrumentos deve abranger cinco etapas principais: 1. Tradução do instrumento do idioma de origem para o idioma-alvo; 2. Síntese das versoes traduzidas; 3. Análise da versão sintetizada por juízes experts; 4. Tradução reversa para o idioma de origem; e 5. Estudo-piloto.

Assim, primeiro se verificou os tipos de validade utilizados nos processos de adaptação e validação da Escala de Adaptabilidade de Carreira em cada paí, a fim de identificar sua recorrência e adequação. Além disso, foram verificados os dados referentes a distribuição da normalidade dos itens e as mudanças realizadas em cada validação (inclusão ou exclusão de itens). Para finalizar, realizou-se uma análise qualitativa das amostras utilizadas em cada estudo, com o objetivo de identificar se foram satisfatórias para o processo de adaptação, com base nas sugestoes da literatura.

 

Resultados e discussão

Nesta seção, são apresentados e discutidos os resultados obtidos por meio da pesquisa realizada. Inicialmente, evidenciam-se os resultados relacionados ao processo de adaptação, seguidos das evidências de validade com base na consistência interna. Posteriormente, são apresentadas as evidências de validade com base em variáveis externas utilizadas e, por fim, as evidências de validade com base em conteúdo. Após a apresentação dos tipos de validade utilizados pelos autores em seus artigos, são apresentados os critérios utilizados para a escolha das amostras e dados referentes a distribuição da normalidade dos itens e eventuais mudanças realizadas nas adaptaçoes da escala.

 

Procedimentos de adaptação da EAC nos 13 países

Em relação aos procedimentos básicos de adaptação, anteriores as validaçoes psicométricas, foi identificado se os 13 paíes contemplaram os requisitos propostos por Borsa et al. (2012). Tanto a síntese das versoes traduzidas quanto a sua análise por juízes experts foram abarcadas no conjunto de procedimentos adotados pelo International Career Adaptability Project. A avaliação dos 13 artigos permite concluir que todos realizaram tanto a tradução quanto a tradução reversa. Por fim, todas as adaptaçoes apresentaram estudos-pilotos, realizando uma aplicação prévia do instrumento nos diferentes contextos, com o objetivo de adequar os itens para cada realidade, tanto em termos de idioma quanto de cultura. Além disso, os estudos-pilotos serviram para avaliar se as instruçoes para a aplicação do instrumento estavam claras e compreensíveis.

 

Evidências de validade com base na consistência interna e na análise fatorial confirmatória

Nesse tipo de validade, há o levantamento de dados sobre a estrutura das correlaçoes entre itens que avaliam o mesmo construto e também sobre as correlaçoes entre subtestes que avaliam construtos parecidos. A análise da consistência interna dos itens é apresentada na maioria das vezes pelo Alpha de Cronbach, que se relaciona a confiabilidade do teste e a sua precisão, e a análise fatorial confirmatória.

Nos artigos analisados, evidências com base na estrutura interna foram as mais recorrentes, aparecendo em todos os artigos. Enquanto o Alpha de Cronbach para o escore total de adaptabilidade na escala internacional (Savickas & Porfeli, 2012a) foi de 0,92, os demais paíes apresentaram valores excelentes, sendo que o maior índice (0,96) foi obtido por Taiwan (Tien et al., 2012) e o menor (0,85) foi o da França (Pouyaud et al., 2012). Os demais variaram de 0,88 (Bélgica) (Dries et al., 2012) até 0,94 (EUA) (Savickas & Porfeli, 2012b). Em relação as dimensoes da adaptabilidade, os valores do Alpha de Cronbach relativos a escala internacional (Savickas e Porfeli, 2012b) foram: preocupação (0,83); controle (0,74); curiosidade (0,79); e confiança (0,85). Os demais artigos demonstraram índices de consistência interna entre satisfatórios a excelentes, de modo que os menores valores identificados foram para a subescala controle, variando de 0,64 na França (Pouyaud et al., 2012) até 0,89 em Taiwan (Tien et al., 2012). Já os maiores índices foram representados pela subescalas confiança: 0,78 (França) (Pouyaud et al., 2012) a 0,91 (Taiwan) (Tien et al., 2012); e preocupação: 0,74 (França) (Pouyaud et al., 2012) a 0,90 (Taiwan) (Tien et al., 2012). Os Alpha de Cronbach da dimensão curiosidade variaram entre 0,66 (França) (Pouyaud et al., 2012) a 0,89 (Taiwan) (Tien et al., 2012).

Ao realizar uma análise dos resultados gerais referentes aos índices de consistência interna obtidos pelos 13 paíes, percebe-se que os menores escores são representados pela escala validada na França (Pouyaud et al., 2012), enquanto os índices maiores foram de (Taiwan) (Tien et al., 2012). Embora o artigo internacional (Savickas & Porfeli, 2012a) não fomente uma discussão específica a respeito desses dados, é possível que representem impactos da adaptação diante das diversidades dos aspectos socioeconômicos e culturais entre os paíes. Savickas & Porfeli (2012a) não pontuaram questoes particulares que pudessem explicar as diferenças nos índices de consistência interna. Porém, é possível deduzir que, no caso da França (Pouyaud et al., 2012), por exemplo, o processo de adaptação, apesar de seguir os procedimentos recomendados (Borsa et al., 2012), precisaria incluir outras estratégias, como o envolvimento da análise de novos juízes e/ou aplicação da EAC com amostras diversificadas em termos de idade, região, naturalidade e nível socioeconômico.

Os dados apresentados nas análises fatoriais confirmatórias, por sua vez, demonstraram resultados favoráveis, que indicam que os dados obtidos estavam ajustados ao modelo teórico da escala internacional (Porfeli & Savickas, 2012a) que foram os seguintes: RMSEA = .053 e SRMR = .039. Seguem os demais índices: Coréia (Hou et al., 2012): RMSEA = 0,067 e SRMR = 0,060; Paíes Baixos (Vianen et al., 2012): RMSEA = 0,068 e SRMR = 0,07; Taiwan (Tien et al., 2012): RMSEA = 0,078 e SRMR = 0,049 ; Bélgica (Dries et al, 2012): RMSEA = 0,054 e SRMR = 0,052; Brasil (Teixeira et al., 2012): RMSEA = 0,059 e SRMR = 0,047; China (Hou et al., 2012): RMSEA = 0,064 e SRMR = 0,057; França (Pouyaud et al., 2012): RMSEA = 0,046 e SRMR = 0,061; Itália (Soresi et al., 2012): RMSEA = 0,058 e SRMR = 0,049; Portugal (Duarte et al., 2012): RMSEA = 0,061, SRMR = 0,049; africa do Sul (Maree, 2012): RMSEA = 0,046 e SRMR = 0,048; e EUA (Porfeli & Savickas, 2012): RMSEA = 0,052 e SRMR = 0,040; O artigo da Suíça (Rossier et al., 2012) não demonstrou o SRMR , porém testou alguns modelos para o índice RMSEA, que variaram entre 0,05 e 0,12. A Islândia (Vilhjálmsdóttir et al., 2012), embora tenha apresentado índices menores do que os dos demais paíes, obteve resultados aceitáveis: RMSEA = .073 e SRMR = .062.

Esses resultados vão ao encontro do que é apresentado por Browne e Cudeck (1993) de que o SRMR pode variar de 0 a 1, sendo que valores menores do que 0,05 indicam um bom ajuste. Além disso os autores argumentam que os valores de RMSEA devem variar de 0 a 1, de modo que valores iguais ou maiores do que 0,08 refletem um erro considerável de aproximação populacional, enquanto índices menores do que 0,06 sugerem um ajuste de modelo aceitável, o que ocorreu com as escalas adaptadas nos 13 paíes e demonstrou que estavam ajustadas ao modelo teórico da escala internacional (Porfeli & Savickas, 2012a). Esses resultados, juntamente com as evidências com base na estrutura interna dos artigos, demonstraram que a adaptação da EAC nos 13 paíes obteve índices de confiabilidade e precisão bastante favoráveis.

 

Evidências de validade com base em variáveis externas

Nesse grupo de evidências de validade, é incluída a validade de critério, que aborda a qualidade da escala ou teste, funcionando como preditor presente ou futuro de outra variável operacionalmente independente (Cunha, 2000). A validade de critério é subdividida entre validade concorrente e preditiva. Na validade concorrente, destaca-se a simultaneidade da obtenção dos escores do teste e dos escores de critério, e é calculada com base em medidas já existentes a época do teste (Cunha, 2000). Nesse sentido, este tipo de escala se relaciona com o desempenho do sujeito no tempo em que ela está sendo aplicada. Pasquali (2003) afirma que a validade concorrente só faz sentido se existirem testes comprovadamente válidos que possam servir de critério contra o qual se quer validar um novo teste e que este novo teste tenha algumas vantagens sobre o antigo.

Evidencia-se que na adaptação norte americana (Porfeli e Savickas, 2012b), os autores fizeram uso da validade concorrente. Os pesquisadores correlacionaram os escores da Escala de Adaptabilidade nos EUA (CAAS-EUA) com os escores da escala VISA, Avaliação do Status de Identidade Vocacional (Porfeli, Lee, Vondracek & Weigold, 2011). Essa escala é composta por trús dimensoes indicadas por seis subescalas. Tais subescalas avaliam os processos de formação profissional que consistem em indicativos de progresso em direção a uma identidade profissional (Porfeli & Savickas, 2012b). Foram obtidos coeficientes de correlação que demonstraram um padrão consistente de associação entre a escala VISA e as subescalas da CAAS-EUA, sendo cinco das seis correlaçoes significativas ao nível α = 0,01. Não houve relação estatisticamente significativa apenas entre a dimensão da VISA compromisso de flexibilidade e o escore geral de adaptabilidade. As correlaçoes mais expressivas foram entre a adaptabilidade e as subescalas exploração em profundidade (0,52) e identificação de compromisso (0,44). A correlação mais fraca foi para a dimensão autodúvida do compromisso (-0,20). O padrão de associação entre a pontuação da CAAS-EUA e os seis domínios da VISA foram geralmente reproduzidas na associação de cada uma das quatro subescalas da CAA-EUA. Destaca-se que em nenhuma outra adaptação foi utilizada a validade de critério para avaliar a Escala de Adaptabilidade de Carreira.

Dentro das evidências com base em variáveis externas também se encontram a validade convergente e a validade discriminante. Na validade convergente realizam-se correlaçoes com testes que avaliam construtos parecidos, ou com construtos que estejam relacionados. Assim, a evidência de alta correlação entre um novo teste e um teste similar já existente é considerada como evidência de que o novo teste mede (aproximadamente) o mesmo traço de comportamento (ou construto) que o antigo teste (já validado) estava designado para medir (Cunha, 2000). A diferença da validade discriminante é a utilização de construtos muito pouco relacionados ou até mesmo opostos ao construto a ser medido. Nesses casos, esperam-se correlaçoes altas ou significativas com testes que mensuram construtos parecidos e correlaçoes nulas ou não significativas com os testes que avaliam construtos diferentes ou opostos (Pasquali, 2010). Pasquali (2003) afirma que a correlação com outros testes que meçam o mesmo traço e a não correlação com testes estranhos ao traço medido é também demonstração da validade do construto. A validade de construto "constitui a maneira direta de verificar a hipótese da legitimidade da representação comportamental dos traços latentes" (Pasquali, 2003, p. 164).

Como exemplo, apresenta-se o artigo de Vianen et al. (2012), referente ao processo de adaptação da Escala de Adaptabilidade de Carreira nos Paíes Baixos, que fez uso da validade discriminante e da validade convergente. Vianen et al. (2012) examinaram a validade discriminante da medida de adaptabilidade, investigando sua relação com a capacidade mental geral. A mensuração da capacidade mental geral foi realizada a partir das Matrizes Progressivas Padrão de Raven (Raven, Raven & Court, 2000), que consiste em uma técnica não verbal com 60 itens projetados para medir a capacidade de formar comparaçoes, analogias e organizar a informação espacial em conjuntos relacionados. Os autores encontraram correlaçoes baixas e não significativas (média de 0,05) entre a capacidade mental geral e as quatro dimensoes de adaptabilidade (preocupação, controle, curiosidade e confiança), fato que apoia a validade discriminante. Quanto a validade convergente, Vianen et al. (2012) esperavam que o construto adaptabilidade estivesse relacionado com traços de personalidade relativamente estáveis, como cogniçoes, estados afetivos e comportamentos que fossem importantes para a carreira e para o trabalho. Para realizar a validade convergente, Vianen et al. (2012) utilizaram os construtos: autoestima, traços de personalidade a partir da teoria do Big five e foco regulatório. Os autores encontraram correlaçoes significativas entre as quatro subescalas de adaptabilidade e a maioria dessas medidas de personalidade. A correlação entre autoestima e a CAAS- Paíes Baixos, por exemplo, foi de 0,38 (p<0,01), a maioria dos traços de personalidade também tiveram correlaçoes positivas, a 0,39 (abertura), e os ênicos construtos negativamente relacionados com a CAAS- Paíes Baixos foram foco regulatório (r = -0,21, p<0.01) e neuroticismo (-0,18). Segundo os autores, a correlação negativa entre adaptabilidade e foco regulatório mereceria maior atenção em estudos futuros. Além disso, Vianen et al. (2012) pontuam que o fato das correlaçoes encontradas apresentarem índices baixos (r < 0,40) indica que os recursos adaptativos de carreira não derivam totalmente de traços de personalidade estáveis, mas tendem a receber influência, também, da relação entre o indivíduo e o contexto.

A evidência de validade convergente também foi realizada no Brasil por Teixeira et al. (2012), por meio de uma lista de marcadores referentes ao modelo dos cinco grandes fatores de personalidade. Conscienciosidade foi o fator com correlaçoes mais fortes com as dimensoes de adaptabilidade e a pontuação total de adaptabilidade (correlaçoes que variam de 0,31 a 0,53), seguido de abertura a experiência (0,27 a 0,47), neuroticismo (-0,19 a -0,36), extroversão (0,17 a 0,32) e socialização (0,18 a 0,27). Os autores pontuaram que todas essas correlaçoes foram significativas (p<0,05)

Outro exemplo é o estudo da França (Pouyaud et al., 2012). O artigo descreve que as evidências de validade utilizaram uma escala de motivação (Motivation Formation Questionnaire - QMF) e duas escalas de ansiedade (Trait Anxiety Inventory, Fear of Failing Scale), sendo a primeira para avaliar a validade convergente e as duas últimas para avaliar a validade discriminante. A justificativa para coletar a evidência de validade em relação a motivação e a ansiedade deve-se ao fato de que a adaptabilidade tem sido identificada como a metacompetência para a construção de carreira em sociedades da informação. Os coeficientes de correlação mostraram um padrão consistente de associaçoes entre o escore geral de adaptabilidade e da motivação (r=0,49), bem como entre adaptabilidade e ansiedade (r=-0,34). Porém, as relaçoes entre as duas formas de ansiedade e adaptabilidade tiveram resultados que fornecem suporte parcial as relaçoes entre adaptabilidade e ansiedade geral ou de carreira. Mesmo que globalmente as escalas de ansiedade e adaptabilidade estejam relacionadas de forma negativa (validade discriminante), nem todas as dimensoes de adaptabilidade apresentaram esse efeito. A curiosidade não demonstrou correlação estatisticamente significativa (r=-0,07) com o escore global de ansiedade e a preocupação apresentou correlação muito fraca (r=-0,23). Todas as correlaçoes obtidas foram consideradas significativas (p<0,05) (Pouyaud et al., 2012). Para os autores, esse resultado merece maior atenção em estudos futuros.

 

Evidências de validade com base em conteúdo

Pasquali (2003) salienta que para viabilizar um teste com validade de conteúdo é preciso que se façam as especificaçoes do teste antes da construção dos itens, e que essas especificaçoes comportem a definição de trús grandes temas: (1) definição do conteúdo; (2) explicitação dos processos psicológicos (os objetivos) a serem avaliados; e (3) determinação da proporção relativa de representação no teste de cada tópico do conteúdo. Essas trús etapas foram levadas em consideração pelos autores da versão original da escala (Savickas & Porfeli, 2012a). Conforme já citado, deduz-se, a partir da análise de todos os artigos, que a validade de conteúdo foi realizada em conjunto e contemplada pela pesquisa inicial, que abarcou os estudos-pilotos realizados nos 13 paíes. Porém, na maioria dos artigos não houve descriçoes claras sobre o uso de procedimentos que evidenciam o uso da validação com base em conteúdo.

No artigo da Suíça (Rossier et al., 2012), por exemplo, são apresentadas evidências de validade com base no conteúdo, porém de forma indireta. Os autores argumentam que a tradução da escala seguiu as diretrizes referentes a tradução de questionários, de modo que foram consultados os autores da versão original da Escala de Adaptabilidade de Carreira e, juntamente com os autores da tradução francesa (para a Suíça), chegaram a um acordo quanto a versão final dos itens. Rossier et al. (2012) argumentam que dois especialistas em aconselhamento de carreira que tinham o francús como língua-móe traduziram os itens. Essa tradução, por sua vez, foi revista e alterada por um grupo de peritos na língua francesa, especialistas em aconselhamento de carreira da Bélgica, França e Suíça, e depois os itens foram retraduzidos para o inglús. Nesse momento, os autores da versão internacional da escala verificaram a retradução e fizeram as alteraçoes necessárias. Os mesmos procedimentos de tradução reversa também foram explicitados claramente nos artigos da China (Hou et al, 2012), Bélgica (Dries et al., 2012), Islândia (Vilhjálmsdóttir et al., 2012), africa do Sul (Maree, 2012) e Taiwan (Tien et al., 2012).

 

Critérios de amostra

A Tabela 1 (Dados das Amostras dos 13 Paíes) especifica as principais caracteríticas das amostras escolhidas para a adaptação e validação da Escala de Adaptabilidade de Carreira em cada um dos países.

 

 

Em relação aos critérios da amostra, Pasquali (2010) afirma que esta deve ser claramente definida e delimitada, indicando quais sujeitos constituem o público-alvo do estudo, em termos de caracteríticas biossociodemográficas. Os estudos-pilotos realizados pelos 13 paíes priorizaram amostras de adolescentes e/ou adultos. Acredita-se que os pesquisadores optaram por essa população devido as especificidades do construto em questão, sendo que a necessidade de desenvolvimento da adaptabilidade de carreira, embora ocorra ao longo de todo o ciclo de vida, tende a potencializar-se entre o período da adolescência e a idade adulta.

Quando há segurança em relação aos fatores que o instrumento mede, Pasquali (2010) afirma que a amostra do estudo-piloto deve conter, no mínimo, 100 sujeitos para cada fator a ser mensurado. O autor complementa que são necessários 10 sujeitos para cada item do instrumento, quando houver dúvida em relação ao número de dimensoes mensuradas pela escala. Ao considerar a elaboração da Escala de Adaptabilidade de Carreira, o artigo referente ao estudo principal (Savickas e Porfeli, 2012a) não apresenta os dados das amostras referentes aos trús estudos iniciais, realizados nos EUA. Porém, com base na versão final do instrumento, que contém 24 itens, uma amostra mínima deveria compor-se de, pelo menos, 400 sujeitos (100 representantes para cada um dos quatro fatores: preocupação, controle, curiosidade e confiança). Se o segundo critério citado por Pasquali (2010) for respeitado, uma amostra de 240 sujeitos contempla a validação do estudo-piloto.

Dessa forma, foi possível perceber que todos os estudos-pilotos posteriores, realizados individualmente pelos 13 paíes, cumprem o segundo parâmetro de amostragem sugerido por Pasquali (2010). Embora o número de participantes em cada amostra varie de 278 na Coréia (Tak, 2012) a 1740 na Islândia (Vilhjálmsdóttir et al., 2012), e a maioria dos paíes tenha contado com amostras suficientes, considera-se que as amostras menores -da Coréia, com 278 participantes (Tak, 2012), da China, com 289 (Hou et al., 2012), e da Suíça, com 391 (Rossier et al., 2012) - seriam inadequadas, uma vez que não satisfazem o primeiro critério de amostra, apresentado por Pasquali (2010), de um mínimo de 400 sujeitos.

A variabilidade dos sujeitos pesquisados é outro ponto que chama a atenção em relação as amostras. Em sua maioria, as amostras foram constituídas por adolescentes e estudantes de graus de escolaridade diversos, como ensino fundamental, médio e superior. Porém, as amostras da Suíça (Rossier et al., 2012), de Portugal (Duarte et al., 2012) e do Brasil (Teixeira et al., 2012) foram compostas também por trabalhadores adultos, e as da Suíça e de Portugal, por trabalhadores desempregados. Esses dados permitem analisar que mesmo priorizando adolescentes, os estudos indicam a preocupação com a adaptabilidade de carreira em diferentes circunstâncias. Tal fato confirma a necessidade de desenvolver a adaptabilidade nas mais diversas fases de carreira, ainda mais em um contexto de imprevisibilidade, como é o atual mundo do trabalho, que diariamente exige a adaptação das pessoas a novos contextos e condiçoes de carreira. Nesse sentido, permitir verificar as propriedades psicométricas da escala nesses indivíduos amplia sua futura utilização com maior confiança. Ressalta-se que nem todos os artigos descreveram as caracteríticas biossociodemográficas da amostra, conforme recomendado por Pasquali (2010). Esse aspecto mereceria maior atenção dos autores, tendo em vista que as questoes socioculturais, políticas e econômicas podem variar consideravelmente, em diferentes regioes e contextos do mesmo paí.

 

 

Distribuição da normalidade dos itens e mudanças na escala

Nos 13 artigos analisados, os autores apresentaram dados referentes a skewness (assimetria) e a kurtosis (curtose), que se relacionam a distribuição da normalidade dos itens, conforme pode ser observado na Tabela 2 (Distribuição da Normalidade dos Itens nos 13 Paíes).

De modo geral, os dados demonstraram que não houve resultados muito destoantes entre as amostras. A maioria dos valores demonstrados pelas validaçoes sugere que a distribuição dos itens está de acordo com os pressupostos das estatíticas baseadas em correlação. Segundo Savickas &Porfeli (2012a), os valores de assimetria dentro dos paíes eram geralmente mais alinhados com as hipóteses do que os valores de curtose, o que é favorável a luz das estatíticas baseadas em correlação, que apresentam maior robustez para violaçoes de curtose. Eles atentam, porém, para os dados da amostra taiwanesa (Tien et al., 2012), que, por utilizar uma escala de 6 pontos, e não de 5, como os demais paíes, obteve algumas violaçoes nos dados de assimetria e curtose. Savickas & Porfeli (2012a) salientam que as distribuiçoes dos dados de Taiwan podem ser potencialmente problemáticas e refletem uma tendência dos participantes marcarem itens consistentemente mais elevados do que os participantes de outros paíes.

Além disso, cada artigo apresentou a forma como a Escala de Adaptabilidade de Carreira foi utilizada, bem como a necessidade de realizar modificaçoes. Do total da amostra analisada, apenas as adaptaçoes de Portugal e Brasil realizaram alteraçoes no número de itens. A versão portuguesa (Duarte et al., 2012) contou com 28 itens, de maneira que a cada subescala foi adicionado um item. A versão brasileira, testada por Teixeira et al., (2012), por sua vez, excluiu dois itens, um na dimensão controle e outro na dimensão confiança, que ficaram com cinco itens. Teixeira et al. (2012) afirmam que as instruçoes e a chave de respostas foram também alteradas com o objetivo de se tornarem mais compreensíveis em portuguús brasileiro, tendo em vista a necessidade de adaptaçoes linguíticas.

 

 

Consideraçoes finais

A adaptabilidade de carreira desenvolve-se por meio da interação entre o mundo interno e externo, portanto a cultura e as condiçoes do contexto influenciam significativamente no seu aprimoramento. Diferentes paíes apresentam níveis distintos de promoção da capacidade de adaptabilidade, isso sugere que eles forneçam oportunidades e recursos específicos em cada contexto socioeconômico e cultural (Savickas & Porfeli, 2012a). Percebe-se que tanto na elaboração da escala quanto nas adaptaçoes realizadas houve a preocupação referente a adequação do instrumento para cada realidade específica. No entanto, algumas consideraçoes quanto aos estudos já realizados e também no sentido de propor novas possibilidades podem ser discutidas.

A partir da análise dos 13 artigos, constatou-se que as evidências com base na estrutura interna foram as mais recorrentes, sendo apresentadas em todos os artigos, por meio de dados referentes a análise fatorial confirmatória e a consistência interna, representada pelo Alpha de Crombach. Com menos frequência, foi evidenciada a presença de validade com base em variáveis externas. Dentro dessa categoria de validade, 23% dos paíes utilizaram a validade convergente (Pouyaud et al., 2012; Soresi et al., 2012; Teixeira, et al., 2012); 15,3% empregaram a validade divergente e a discriminante (Pouyaud et al., 2012; Vianen et al., 2012); e somente os EUA (Savickas & Porfeli, 2012b), representando 7,6%, empregou a validade concorrente. Também foi possível verificar que nenhuma das validaçoes empregou evidências de validade baseadas nos processos de resposta e apenas a validação dos EUA (Savickas & Porfeli, 2012b) utilizou a validade de critério. A validade de conteúdo foi, de certa forma, contemplada pelo artigo principal (Savickas & Porfeli, 2012a). Esse artigo, que sintetiza a elaboração inicial do instrumento e os resultados finais dos 13 paíes, abrange a definição das propriedades, a dimensionalidade, as definiçoes constitutivas e operacionais, a análise de juízes e a análise semântica, conforme indicado por Pasquali (1999).

As vantagens do processo de adaptação de instrumentos, em detrimento da elaboração de um novo, ficaram bastante visíveis. Borsa et al. (2012) afirmam que o processo de adaptação permite ao pesquisador a comparação entre dados obtidos em diferentes amostras e em contextos diversificados, oportunizando maior equidade na avaliação. Além disso, os autores defendem que a utilização de escalas adaptadas fornece maiores possibilidades de generalização e investigação de diferenças existentes entre as populaçoes. No processo de elaboração e adaptação da Escala de Adaptabilidade de Carreira houve um trabalho conjunto que contou com a contribuição de diferentes olhares, culturas e conhecimentos. A configuração de um projeto comum otimizou o trabalho posterior referente a validação em cada um dos paíes envolvidos e colaborou para um resultado final mais preciso, o que poderia servir de inspiração para a construção de novos instrumentos de medida.

O esforço dos autores em conferir fidedignidade a EAC ficou bastante evidenciado, embora todos os paíes tenham apresentado evidências de validade consideradas mais simples, como as evidências com base na estrutura interna. Tal fato, porém, é justificado a medida que os próprios autores apresentam seus artigos como validaçoes iniciais da escala, sugerindo que em estudos futuros outros tipos de evidências de validade venham a ser utilizados. Alguns paíes, como Brasil, Paíes Baixos, Itália e França, por exemplo, já apresentaram procedimentos mais avançados de validação, utilizando evidências com base em variáveis externas, o que é bastante positivo e indica o caminho para o seguimento do uso da escala. O uso da Teoria de Resposta ao Item (TRI) poderia ser um passo adiante na análise dos itens e das diferenças no padrão de resposta entre os paíes.

Na maioria dos artigos, os tipos de evidências de validade e de escolha das amostras não foram explicitados de forma clara. Nesse sentido, analisa-se que a falta de clareza denota uma possível limitação também deste estudo, sendo que foi necessário analisar os artigos e deduzir, por meio das descriçoes feitas pelos autores, os tipos de validade utilizados. É possível que os procedimentos de validação tenham sido deixados a critério de cada paí e grupo de pesquisadores, mas uma exposição mais detalhada dos procedimentos favoreceria a compreensão dos leitores. Também uma maior uniformidade nos processos de validação, incluindo tamanhos e caracteríticas das amostras, instrumentos utilizados para as correlaçoes, poderiam permitir maior compreensão do alcance e das possibilidades da escala nos diferentes paíes. No que se refere a média de idade das amostras, por exemplo, observa-se grande diferença entre os estudos, em que alguns lidaram basicamente com adolescentes e outros, com amostras conjuntas de adolescentes e adultos. Uma vez que as associaçoes entre adaptabilidade de carreira e outras variáveis e a própria experiência e sentido da adaptabilidade podem variar de acordo com o contexto em que o indivíduo está inserido (momento de escolhas e definiçoes iniciais de carreira ou momento de transição entre empregos ou mesmo definiçoes quanto a saída do trabalho), é importante que o instrumento seja testado em diferentes grupos de sujeitos, para que sua validade e possibilidade de utilização em pesquisa e intervençoes sejam avaliadas. Os próprios autores de alguns dos artigos concordam com essa necessidade, ao indicar novas aplicaçoes do instrumento com públicos de diferentes idades, níveis de instrução, etapas da carreira ou contextos regionais (Dries et al., 2012; Hou et al., 2012; Pouyaud et al., 2012; Tak, 2012). Nos paíes em que isso já foi feito, pode-se ter maior confiança nas informaçoes do instrumento.

Quanto aos resultados, vê-se que nos estudos de validação a maioria das hipóteses de correlaçoes positivas e negativas foram confirmadas, com algumas exceçoes. Nesse sentido, confirma-se a afirmativa de que os próprios procedimentos de testagem do instrumento servem como feedback aos autores sobre a maturidade do construto e as lacunas que ainda precisam ser preenchidas no escopo teórico que embasa o traço medido. No caso da adaptabilidade, foram observadas, como indicava a literatura, correlaçoes com construtos como os Cinco Fatores de Personalidade (Vianen et al., 2012; Teixeira et al., 2012), autoestima (Vianen et al., 2012), amplitude de interesses e qualidade de vida no período estudantil (Soresi et al., 2012), e motivação (Pouyaud et al., 2012). Por outro lado, algumas relaçoes esperadas não se confirmaram, como com os construtos foco regulatório (Vianen et al., 2012) e ansiedade (Pouyaud et al., 2012). Esses resultados não tão robustos ou mesmo contrários ao esperado indicam as linhas de investigação a serem melhor exploradas no futuro, para melhor compreender o papel da adaptabilidade. Novas correlaçoes, como entre adaptabilidade e criatividade ou inteligência, também são citadas pelos autores como possíveis propostas futuras (Pouyaud et al., 2012). Ainda, como decorrência dos estudos já realizados e também no sentido de demonstrar a maturidade do construto, avaliaçoes de validade de critério podem, no futuro, constituir uma linha de investigação importante no campo da adaptabilidade, com impacto fundamental para os processos de intervenção.

A realização do presente trabalho é relevante teórica e cientificamente, visto que objetivou analisar os processos de adaptação e validação de uma escala que é resultado de um projeto global, cujo escopo é inovador: criar um instrumento de medida global que se adéque as diversas realidades e contextos. Registros de projetos com esse propósito não foram encontrados na literatura, e embora facilite os processos de validação e utilização do instrumento em contextos diversos, ele pode apresentar importantes lacunas no que diz respeito a validade e a fidedignidade das escalas, por isso a necessidade de se analisar pormenorizadamente os processos de adaptação realizados utilizados em cada paí. Além disso, salienta-se que o objetivo do presente trabalho não foi realizar uma metanálise, mas apresentar informaçoes sintetizadas que muitos psicólogos não túm acesso, ou acabam não buscando, ao utilizar um instrumento, seja para o desenvolvimento de pesquisas, seja para intervençoes na área de aconselhamento de carreira.

Por fim, é importante destacar que o tipo de estudo ora realizado, referente a um instrumento de medida específico, é uma forma de avaliar diferentes instrumentos no campo da psicologia, especialmente aqueles usados em diferentes contextos culturais e com públicos diversificados, a fim de apresentar aos pesquisadores suas potencialidades e eventuais fragilidades. Embora a elaboração deste artigo tenha se configurado como um exercício psicométrico de reunião de informaçoes sobre uma escala muito utilizada atualmente em uma área específica, ele pode servir como incentivo para que outras sínteses de processos de validação e análise psicométrica sejam realizadas por outros pesquisadores, sobre outros instrumentos de interesse.

 

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Recebido em: 18/10/2015

Aceito em: 23/05/2017

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