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Revista Brasileira de Psicodrama
versión On-line ISSN 2318-0498
Rev. bras. psicodrama vol.21 no.2 São Paulo 2013
RESENHAS
Psicodrama do trauma: o sofrimento em cena
Psychodrama with trauma survivors: acting out your pain
Waldeck Barretto D'Almeida
Psicodramatista, didata-supervisor da Associação Bahiana de Psicodrama e Psicoterapia de grupo (Asbap), professor de Psicologia Médica e Psicopatologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia (UFBA).
PETER FELIX KELLERMANN E M. K. HUDGINS (orgs.) TRADUÇÃO DE MOYSÉS AGUIAR SÃO PAULO: ÁGORA, 2007
O Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT) ocorre quando, diante de um evento intenso, as barreiras do aparelho psíquico do individuo são ultrapassadas além do limiar de tolerância, de enfrentamento e suporte.
O TEPT como um transtorno de ansiedade cada vez mais comum em nossa sociedade, na qual somos avassalados por eventos catastróficos, vem se tornando mais conhecido nas últimas décadas. Em 1980, o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais – DSM-III (sigla de Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, em inglês) inaugura essa tipificação que continua no DSM-IV e na Classificação Internacional de Doenças (CID-10).
O TEPT atinge de 2% a 5% da população geral em alguns países, e dados sugerem que essa prevalência pode ser ainda maior no Brasil. Por exemplo, temos a terceira maior taxa de mortalidade por arma de fogo entre jovens de 15 a 24 anos e somos um dos líderes mundiais em acidentes automobilísticos. Apesar disso e do importante impacto pessoal e social inerentes ao TEPT, muito poucos estudos foram realizados no Brasil.
Autores afirmam que a maioria de nós vivenciou ou vivenciará pelo menos uma experiência passível de causar trauma psicológico. Enquanto lia este livro, fui relembrando das situações por mim vividas e que de certa maneira me aproximaram da condição de que ele trata. Quem de nós não experimentou em nossos dias eventos tão comuns nos centros urbanos: sequestro-relâmpago, assalto, violência interpessoal? E outros, como estupro, perdas agudas e violentas de pessoas significativas, assistir a eventos de violência interpessoal (humilhação, maus-tratos etc.).
Quanto ao tratamento do TEPT, é consenso que "[...] os sobreviventes do trauma precisam executar algum ato que simbolize o triunfo sobre o desamparo e o desespero" características do quadro clínico (VAN DER KOLK). E por isso, especialistas afirmam que a terapia vivencial é a mais recomendada, e merece destaque o Psicodrama.
A capa do livro desta edição brasileira, idealizada por Buono Disegno, já nos sugere o efeito devastador do TEPT. Nela, vemos que a parte mais fragmentada corresponde a três quartos da caixa craniana, onde fica abrigado o encéfalo, apontando como ponto central a região em que repousa o mesencéfalo.
Estudos atuais da neurobiologia relatam que o trauma ocasiona danos profundos nos circuitos neurais e na estrutura do cérebro – córtex cerebral, sistema límbico, tronco cerebral – a consequente falha nas sinapses e a diminuição da produção de neurotransmissores.
Nesse contexto, os organizadores apresentam-nos este livro, constituído de 17 capítulos agrupados em cinco partes.
A parte I apresenta o impacto que causa o TEPT, com vinhetas explicativas de cada etapa do processo. Pela intensidade do trabalho com o Psicodrama, há que ter a cautela necessária para evitar o risco da retraumatização/revitimização e estar atentos às necessidades básicas de segurança e sustentação.
A parte II aborda a questão do luto e sua facilitação. Com estudos de casos, o leitor pode ver como se desenrola "o encontro final", uma variante da técnica da cadeira vazia. Além disso, vê-se a contribuição do Psicodrama antropológico em uma abordagem de psicoterapia breve, recuperando o valor de ritos antigos que emprestam maior significado à vida e incrementam os recursos e as habilidades dos vitimizados.
A parte III, a mais extensa, apresenta um leque amplo de situações traumáticas em diversas partes do mundo. Nela o leitor tem a oportunidade de conhecer alguns trabalhos com crianças e pessoas adultas que sofreram estupro, tortura, dissociação da personalidade, estados dissociativos da consciência, sobreviventes de acidente de trânsito, trabalho com crianças abusadas, trabalho com o trauma dos agressores sexuais adolescentes, com o trauma dos agressores sexuais adultos, com os indivíduos aprisionados na dependência de drogas.
A parte IV aborda modelos de terapia baseados no Psicodrama muito esclarecedores que focalizam a "espiral terapêutica" e os traumas do desenvolvimento, estabelecendo uma relação com as estações do ano. E, por fim, a parte V estuda os elos de transmissão sociogenética entre núcleos familiares que abrangem várias gerações, fundamentando a terapia transgeracional, e entre indivíduos pertencentes à rede social de apoio, provocando vítimas secundárias do trauma e estabelecendo uma relação com a teoria do caos.
Em todos os capítulos são apresentados casos que ilustram a condução do processo e a relevância para que a reencenação seja conduzida de maneira que não retraumatize e para o cuidado de manejo dos sobreviventes primários e secundários, porque eles sofreram danos dolorosos em sua alma e, por isso, devem ser tratados com alma.
Dessa forma, o livro cumpre aquilo a que se propõe, servindo de valiosa e concisa fonte de consulta para psicodramatistas, de qualquer nível e de qualquer área, que desejam um guia de práticas atualizadas de manejo de sobreviventes de traumas. Ele abre perspectivas para o incremento de pesquisas que fundamentem mais consistentemente o valor do trabalho com o Psicodrama.
Waldeck D'Almeida
Rua Érico Verissimo, 291, apto. 1002
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E-mail: walba63@yahoo.com.br