RESENHAS

 

Atitude empreendedora: descubra com Alice seu país das maravilhas

 

Entrepreneurial attitude: discover with Alice her wonderland

 

Actitud emprendedora: descubrir con Alicia su país de las maravillas

 

 

Cassilda Borges da Silva

Casa das Cenas. Uberlândia, MG e-mail: cassildaborges@hotmail.com

 

 

MARA SAMPAIO
SÃO PAULO: EDITORA SENAC, 2014

Embora não se apresente como um trabalho técnico, 100% apoiado nas referências teóricas do psicodrama, o livro Atitude Empreendedora: Descubra com Alice seu País das Maravilhas, de Mara Sampaio, contém elementos que permitem reconhecer a presença das ideias de Jacob Levy Moreno em diversas passagens do texto. A autora, psicodramatista reconhecida, parte da história escrita há 150 anos pelo inglês Lewis Carroll para identificar as características de comportamento e, sobretudo, as atitudes que permitem empreender com sucesso -tanto na abertura de um negócio próprio quanto na condução da vida profissional em uma organização.

Já na apresentação, Mara Sampaio convida o leitor a interagir com as personagens da história não apenas para definir e explicar seu conceito de atitude empreendedora, mas também para conduzir a uma reflexão pessoal que poderá levar o leitor a desenvolver ou transformar sua própria atitude diante de seu papel profissional. Assim, o Coelho Branco, o Chapeleiro Maluco, o Gato de Cheshire e, claro, a própria Alice servem como exemplos de reflexão para a busca dos sonhos e a realização profissional. Para a autora, a menina Alice tem algumas características que a levam a ter uma atitude extremamente empreendedora. Ela é curiosa, persistente, sonhadora e tem clareza do objetivo que pretende atingir.

Com uma vasta experiência acumulada em programas de capacitação e em cursos de Cultura Empreendedora para entidades como Sebrae e Senac, a autora enfatiza a importância da dimensão comportamental no desenvolvimento do empreendedorismo. Como ela deixa claro no livro, as histórias de empreendedores bem-sucedidos que normalmente parecem cercadas por passes de mágica e golpes de sorte são, na verdade, consequência de uma série de posturas que os levam a tomar decisões, a agir e a escolher caminhos gratificantes.

A analogia com Alice, personagem feminina, pode dar a impressão de que o livro se destina apenas às mulheres. Nada disso. A autora realmente vê e registra o avanço e o crescimento do espaço ocupado pelas mulheres no mundo do empreendedorismo. Refere-se às inúmeras empreendedoras bem-sucedidas, que inovam, transformam os espaços sociais, desde os lares até os cargos mais importantes nas organizações, na ciência, na política. No entanto, esse não é o eixo principal do texto, pois o livro é dirigido a todos, independentemente do gênero.

Mara Sampaio define "atitude empreendedora" como uma predisposição para agir com intenção dirigida para um alvo, com um objetivo definido e sempre em busca de mudança e inovação. Ela embasa as escolhas e a tomada de decisões. É uma resposta deliberada, coerente, realista em direção a um objeto ou situações. São nesses os pontos que mais fica claro que a autora tem como pano de fundo a teoria moreniana, privilegiando os conceitos de espontaneidade e criatividade em sua proposta de desenvolvimento atitudinal.

O psicodrama também se faz presente na utilização do conceito de papéis que é o fio condutor para diferenciar o termo empreendedor como uma qualificação que pode ser desenvolvida para qualquer papel profissional (e não apenas para o empresário - dono de um negócio). Para ser empreendedor, é necessário ter um papel profissional específico e saber desempenhá-lo com maestria. A autora, embasada em Moreno, afirma que a forma como a pessoa desempenha o papel que lhe é atribuído se torna sua marca, sua característica. O desenvolvimento e o desempenho dos papéis são influenciados pelas atitudes espontâneas e criativas, sendo capaz de promover mudanças inovadoras e prosperidade profissional.

Para Mara Sampaio, o empreendedor é um "caçador de sonhos". Está sempre em busca de algo novo, e muitas vezes é considerado inadequado pela cultura dominante por ter visão antecipada dos fatos e das mudanças sociais. Dessa forma, é importante destacar a analogia com o livro de Lewis Carroll. No início da história, Alice, que vive em uma sociedade conservadora, com regras rígidas, sente-se extremamente entediada. Seu ambiente é hostil às novidades e às diversidades. Em determinado momento da história, ela decide tornar-se protagonista da viagem fantástica que faz ao País das Maravilhas. Assim, no empreendedorismo e também no psicodrama, o sujeito da ação empreendedora deve ser o protagonista de sua história profissional.

A autora explica seu conceito de atitude empreendedora em três partes: a técnica, a estratégica e a pragmática. Cada uma delas é relacionada com as seguintes personagens: a Lagarta Azul, o Chapeleiro Maluco e o Gato Cheshire.

A primeira dimensão, a técnica, parte da pergunta que a Lagarta Azul insiste em fazer quando a menina se depara com ela: quem é você? A partir dessa questão aparentemente simples, a autora propõe, ao leitor, uma reflexão sobre o autoconhecimento: quanto ele é capaz de se envolver, se dedicar e se apaixonar pelo sonho que pretende concretizar?

Nesse caso, a autora deixa claro que o sujeito de qualquer movimento empreendedor precisa, antes e acima de tudo, acreditar em si mesmo, desenvolver a autoestima e a autoconfiança. Nesse ponto, ela trabalha o conceito de resiliência como capacidade de lidar com as mudanças frequentes no mundo atual.

A cada conceito, a autora propõe uma pergunta a ser respondida que fará o leitor interagir com o texto e refletir sobre sua percepção pessoal. Quem é você? Qual seu sonho? Quais seus valores?

Alguns pontos centrais da história de Lewis Carroll são destacados pela autora como cruciais na trajetória de qualquer empreendedor. Um exemplo é a história da chave que a menina encontra quando, ao tentar seguir o Coelho Branco, cai em sua toca e não consegue sair. A chave, a princípio, deveria abrir a porta que indicaria o caminho de volta para casa. No entanto, a porta que se abre, na verdade, marca o início da viagem pelo País das Maravilhas.

No texto de Mara Sampaio, esse episódio abre espaço para uma analogia importante. Entorno dele, a autora cria um anagrama em que a palavra CHAVE é utilizada para explicar as dimensões do conceito de competência como um conjunto de

Conhecimentos,

Habilidades,

Atitudes,

Valores humanos e

Emoções.

A competência, nesse caso, é um saber mobilizador, um catalisador de realizações empreendidas com base no uso das ferramentas adequadas, com o objetivo de concretizar o sonho de prosperidade pessoal, profissional e social. Por ter uma visão do homem moreniano, a autora demonstra que ser empreendedor pode ser aprendido.

A dimensão estratégica proposta pela autora tem como epígrafe a frase "aqui somos todos loucos", dita pelo Chapeleiro Maluco. O ponto marcante, nesse caso, é a criatividade. Esse personagem marcado pela irreverência e pela crítica ao status quo. Como ele, as pessoas apaixonadas por seus projetos dirigem todos os recursos para sua realização de seus sonhos. Para alcançá-los, muitas vezes é necessário romper com o padrão instituído.

É conveniente, nesse ponto, chamar atenção para um detalhe. Mara adverte que intuição é diferente de palpite, assim como criatividade e espontaneidade são atributos completamente distintos de improvisação. Se a intuição é uma aliada poderosa do empreendedorismo, a improvisação é um de seus maiores inimigos.

A Dimensão Pragmática é ilustrada pelo Gato Cheshire. Na história, ele adverte a menina Alice sobre a necessidade de saber aonde quer chegar antes de escolher o caminho a ser percorrido. Na atitude empreendedora, Mara Sampaio estabelece com essa personagem uma analogia com a necessidade de se estabelecer metas, as quais orientarão a jornada empreendedora e multiplicarão as chances de prosperidade.

Nesse capítulo, estão indicadas as ferramentas mais adequadas para ajudar uma pessoa empreendedora a planejar sua carreira profissional. O livro recomenda, além do sempre necessário plano de negócios, conhecer e utilizar ferramentas mais sistêmicas, como o mapa mental e o modelo Canvas de negócio. Essas ferramentas (cujos modelos estão disponíveis na internet) possibilita que projetos profissionais sejam planejados de forma mais inovadora.

Ainda nessa parte do livro Mara sugere o sociograma (da forma proposta por Moreno) para identificar e visualizar a qualidade e a intensidade das relações interpessoais. É surpreendente a utilização feita pela autora dos conceitos sociométricos para enfatizar a importância das redes de relacionamento para o empreendedor e como as técnicas morenianas podem ajudar a diagnosticar e cuidar das trocas relacionais no mundo do trabalho.

Pessoas com maiores habilidades relacionais têm mais possibilidades de empreender com sucesso. Desenvolver a capacidade de persuadir e conquistar as pessoas para sua rede de relacionamento é sociometricamente possível. A intencionalidade em atrair pessoas e envolvê-las afetivamente impedem que as relações enfraqueçam e morram.

O livro é indicado para as pessoas que se desafiam ao crescimento pessoal, à mudança profissional, sejam empresários ou não. Durante todo o tempo da leitura, a presença do psicodrama e sua teoria é marcante. Alguns conceitos estão explícitos no texto, e outros, nas entrelinhas.

Um aspecto a ser destacado é o da apresentação do livro e do zelo com o projeto gráfico. Isso, naturalmente, torna a leitura muito mais confortável e agradável. A capa, em si, elaborada a partir de uma das ilustrações da edição original de "Alice no País das Maravilhas", é um convite alegre à viagem. Quanto mais se aprofunda na leitura, mais se gosta do livro. A obra faz uma harmonia perfeita entre ciência e literatura e oferece uma combinação rara de suavidade e profundidade. Também merecem menção os esquemas, os quadros e as ilustrações. São elementos motivacionais que facilitam a compreensão, a elaboração e a memorização dos conceitos.

Para finalizar, outro detalhe que caracteriza os empreendedores: compartilhar o sucesso. Fazer junto. Acreditam que empreender nunca é um ato solitário. Pelo contrário, deve ser compartilhado. Assim tem sido minha convivência com a autora. Atitude Empreendedora: Descubra com Alice seu País das Maravilhas, de Mara Sampaio, é um livro para ser lido, sentido e estudado. Um livro que, em si, é uma chave para descobertas sensacionais, alegres e prazerosas.

 

 

Recebido: 20/10/2015
Aceito: 18/03/2016

 

 

Cassilda Borges da Silva: Psicóloga, docente supervisora em Psicodrama pela FEBRAP, criadora e mantenedora do Projeto Casa das Cenas.
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