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Revista Brasileira de Psicanálise
versión impresa ISSN 0486-641X
Rev. bras. psicanál vol.55 no.4 São Paulo oct./dic. 2021
TEMÁTICOS
A supervisão na formação psicanalítica no modelo Eitingon: história, controvérsias, linhas de desenvolvimento1
Supervision in psychoanalytic training in the Eitingon model: history, controversies, developmental lines
Supervisión en la formación psicoanalítica en el modelo Eitingon: historia, controversias, líneas de desarrollo
La supervision dans la formation psychanalytique selon le modèle Eitingon: son histoire, des controverses, des lignes de développement
Gisela Grünewald-ZemschI; Tradução de Elsa Vera Kunze Post Susemihl
IPhD, psicóloga e psicanalista, trabalha em clínica particular em Nuremberg. Membro, analista didata e supervisora da DPG-IPA, atualmente Diretora de Treinamento da IPA na DPG. Nuremberg / gisela.zemsch@t-online.de
RESUMO
Um marco essencial na formação psicanalítica é a supervisão de formação. A autora apresenta como e através do que podem se desenvolver a competência e a identidade, ou pode haver um efeito inibidor. Considera a relação emocional entre supervisor e supervisionando durante a supervisão de formação, permeada pelas próprias experiências de aprendizagem e didáticas, carregadas com material inconsciente e ancoradas no âmbito semipúblico do Instituto. Retoma a história da supervisão de formação, descreve a controvérsia quanto a teach or treat e mostra as teorias psicanalíticas mais utilizadas na supervisão. Constata que também nos contextos mais "racionais" se atualiza uma constelação e uma dinâmica relacional emocional, parcialmente inconscientes, entre o supervisionando e o supervisor.
Palavras-chave: relação de supervisão de formação, história, análise-controle, teach or treat, emaranhamentos institucionais
ABSTRACT
Training supervision is an essential event in psychoanalytic training. This study reveals how and from what competence and identity can be developed, and also if there may be an inhibiting effect. At the same time, it is always about an emotional relationship between supervisor and supervised during the training supervision process, permeated with their own learning and didatics experiences, which are constituted of unconscious material and anchored in the semi-public scope of the Institute. In this paper, the history of training supervision is recapitulated, and its conflict related to the ''teach-or-treat'' controversy is approached. Moreover, a viewpoint on the most used psychoanalytic theories in the supervision process is introduced. Consequently, even in more 'rational' contexts, a constellation, as well as a partially unconscious, emotional relational dynamics between the supervised and the supervisor are always updated.
Keywords: training supervision relationship, history, control-analysis, teach or treat, institutional entanglements
RESUMEN
Un hito esencial en la formación psicoanalítica es la supervisión de la formación. Se presenta aquí cómo y a través de qué competencia e identidad puede desarrollarse, o puede surgir un efecto inhibitorio. Al mismo tiempo, es siempre una relación emocional entre supervisor y supervisionando durante la supervisión de la formación, influenciada por el propio aprendizaje y experiencias didácticas, cargada de material inconsciente y anclada en el ámbito parcialmente público del Instituto. En este artículo se retoma la historia de la supervisión del entrenamiento, se describe su conflicto con la controversia "teach or treat" y se presenta una visión de las teorías psicoanalíticas más utilizadas en la supervisión. De ello se deduce que también en los contextos más "racionales" siempre hay una constelación y una dinámica relacional emocional, parcialmente inconsciente, entre el supervisor y el supervisor.
Palabras clave: relación de supervisión de la formación, historia, análisis-control, teach or treat, enredos institucionales
RÉSUMÉ
Une borne essentielle dans la formation psychanalytique, c'est la supervision de formation. On présente ici comment et par quel moyen la compétence et l'identité peuvent se développer, ou il peut y avoir un effet inhibiteur. En même temps, il s'agit toujours d'une relation émotionnelle entre superviseur et supervisé pendant la supervision de formation, transpercée par ses propres expériences d'apprentissage et didactiques, chargées de matériel inconscient et ancrées dans le cadre semi-public de l'Institut. Dans cet article on reprend l'histoire de la supervision de formation, on décrit son conflit par rapport à la controverse "teach or treat" et on présente un panorama des théories psychanalytiques les plus employées en supervision. Le résultat, c'est que dans les contextes les plus « rationnels » on actualise toujours une constellation et une dynamique relationnelle émotionnelle, partiellement inconsciente, entre le superviseur et le supervisé.
Mots-clés: relation de supervision de formation, histoire, analyse-contrôle, teach or treat, enchevêtrements institutionnels
A própria análise pessoal, a análise didática ... por si só não é mais suficiente para, de fato, fazer isso [um psicanalista] dele(a) [do(a) candidato(a)]. ... O aluno aprende muito na sua análise didática e nos cursos, mas há algo que dificilmente aprenderá ali: como utilizar tudo que aprendeu em si e através de palavras e livros quando está com o paciente vivo, como não confundi-lo e saber reconhecê-lo bem no paciente. ... Todos os estágios mais primitivos da técnica psicanalítica, que foram finalmente abandonados ao longo do seu desenvolvimento por terem sido reconhecidos como erros, ... são novamente vividos pelos nossos alunos em forma de florescentes ressurreições ontogenéticas, ... novas concepções, que brotam das características pessoais do futuro analista, restos e derivações dos seus complexos trabalhados na análise didática. ...
Tivemos experiências muito boas [com o] ... nosso tipo de análise-controle em Berlim, colocamos muito menos ênfase na maneira como ela é feita do que no fato de ela ser parte indispensável da formação. O acesso que o analista-controle tem sobre o iniciante é completamente diferente daquele que seu analista didata tem - ele pode lhe mostrar que está cometendo erros e como poderia fazer melhor, e pode trazer-lhe a partir do material ... os resultados das últimas investigações. Na medida em que venha a conhecer melhor o iniciante, poderá lhe mostrar mais facilmente por que ele comete erros, ou seja, a partir de quais dos seus complexos. ... O jovem analista ... também aprende algo a seu respeito a partir de outros.
Conforme já mencionado ... o analista-controle logo encontrará erros derivados de complexos do iniciante, porém erros não são cometidos somente porque se tem complexos, mas pelo fato importante de que analisar é uma arte muito difícil, mesmo para os analistas mais velhos (essa arte é longa, e a análise didática breve).
MAX EITINGON
Este artigo apresenta uma visão geral sobre as linhas centrais do desenvolvimento da supervisão na formação psicanalítica e dos seus conflitos atuais. Nesse sentido, é importante dar a palavra inicialmente a Eitingon, o fundador da formação psicanalítica na Associação Psicanalítica Internacional (IPA), que abordou no seu relatório na seção de correspondência da Internationale Zeitschrift für Psychoanalyse [Revista Internacional de Psicanálise] da IPA, em 1925, vários tópicos a respeito da supervisão durante o processo de formação psicanalítica que ainda hoje nos ocupam: 1) Por que a supervisão é uma parte tão importante na formação? Trata-se de um assim chamado controle dos casos atendidos durante a formação ou antes de uma orientação? 2) Quais são as condições pessoais, idiossincrasias e competências que encontramos nos candidatos durante a formação? 3) A relação que se estabelece na supervisão de formação é uma relação de ensino-aprendizagem (teach) ou uma relação de tratamento (treat)? 4) As supervisões devem ser assumidas pelo analista didata?
Outras questões e aspectos permanecem em aberto. Por exemplo, a avaliação dos tratamentos [supervisionados] de formação do candidato, a aptidão ou não do candidato para essa profissão e - o que tem sido discutido mais recentemente - se existem pré-requisitos diferentes para o exercício das funções de analista didata e de supervisor.
Assim, após algumas observações sobre a conversão linguística de análise-controle para supervisão, e sobre a controvérsia ainda atual a respeito de ensinar ou tratar (teach or treat), será feita uma tentativa de delinear as áreas de conflito atuais na discussão sobre a supervisão e apresentá-las, por fim, à luz de um exemplo fictício de relação conflituosa de supervisão de formação.
A supervisão de formação psicanalítica mostra, como que por uma lupa, o conflito central da formação psicanalítica. Nessa formação queremos e devemos convencer os candidatos da existência do inconsciente e capacitá-los a utilizar esse conhecimento - que é sempre também um des-conhecimento - para realizar o tratamento de problemas psíquicos. Enquanto local de formação ou enquanto supervisores, temos a tarefa de conduzir, e não apenas de acompanhar os jovens analistas, ainda que não participemos presencialmente do tratamento. Isso leva a dificuldades específicas numa época em que valores como transparência, democratização e diversidade de métodos são importantes, pois esses valores não são passíveis de serem transpostos de modo simplista à formação psicanalítica. Entre outros motivos, isso se dá, por um lado, porque a formação psicanalítica institucionalizada ocorre em uma relação mestre-aprendiz e, por outro, porque ela quer e precisa se abrir a conceitos válidos e atuais sobre formação de adultos2 e participação sociopolítica.
A supervisão de formação psicanalítica é, portanto, um "construto ambíguo": ocupa-se com a utilização dos conceitos psicanalíticos (sobre tratamento), com o discurso técnico-terapêutico profundo e intensivo (o que ajuda a aliviar o sofrimento psíquico?), e lida simultaneamente com o ensinar e o aprender; é permeado por processos inconscientes (Grünewald-Zemsch, 2014) e, ao mesmo tempo, precisa se confrontar, no âmbito social e comunitário, com as ideias emancipatórias de participação.
Em função disso, também serão mencionados os conceitos psicanalíticos que, em minha opinião, são usados pela maioria dos supervisores, de uma ou de outra forma. Sua menção é importante porque a nomeação e o esclarecimento da própria visão teórica pelo supervisor provavelmente ajudarão o candidato a desenvolver a sua maneira pessoal de se utilizar da supervisão de formação. Um aprofundamento desse tema poderia ajudar a mostrar em que medida o uso de certas orientações teóricas durante a supervisão influi na relação que se estabelece na supervisão de formação psicanalítica. Isso ainda não será possível no âmbito deste artigo.
Na última parte, serão apresentadas reflexões sobre as origens dos muitos emaranhamentos de difícil apreensão que acontecem na formação institucional - logo, também na supervisão de formação. A supervisão de formação psicanalítica, com seus diversos atores (supervisionando, supervisor, analista didata do supervisionando, grêmios de formação no Instituto, grupo de candidatos em formação), é o lugar da formação onde inúmeras situações emocionais não transparentes - incômodos, ressentimentos, sucessos, transformações de perspectiva de vida - se apresentam e onde devem, finalmente, ser levadas a uma conclusão bem-sucedida. Ao final, chega-se a algumas reflexões sobre até que ponto nós temos, na formação psicanalítica, uma responsabilidade generativa com relação à continuidade do desenvolvimento da psicanálise.
Análise-controle e supervisão
O conceito de supervisão na formação psicanalítica só passou a ser usado nos países de língua alemã há cerca de 30 anos. Antes disso, esse terceiro pilar, parte da formação psicanalítica, era denominado de análise-controle.
A Policlínica de Berlim não apenas oferecia a oportunidade de tratamento psicanalítico gratuito para berlinenses sem recursos financeiros como também treinava analistas para se tornarem "analistas profissionais" (Schröter, 1996, p. 1156).
Com o intuito de estabelecer a psicanálise como um método de cura sério, a formação psicanalítica se tornou semelhante à formação médica especializada. Além de seminários teóricos e análise didática, os jovens analistas deveriam ser orientados e acompanhados durante as primeiras experiências de tratamento. Na formação médica da época, era usual que houvesse conversas entre o mentor e o jovem médico ao pé do leito do paciente, ou instruções presenciais durante as cirurgias. Tratava-se de uma forma de supervisão ao vivo. Esse modelo serviu de inspiração para a análise-controle na formação psicanalítica. O analista-controle era, em última instância, quem detinha a autoridade e a responsabilidade final sobre o transcorrer do tratamento dos pacientes: "Protegemos os pacientes encaminhados aos analistas iniciantes na medida em que nós, que controlamos o tratamento, estamos sempre prontos para retirar o paciente do iniciante e levar adiante o tratamento, se for preciso" (Eitingon, 1922, p. 514).
A análise-controle controla e acompanha o tratamento do paciente que é feito pelo colega inexperiente. Para tanto, o analista-controle discute com o analista-aprendiz, em consultas semanais, seus erros e deficiências de competência, com os quais ele entra em contato repetidamente nessas sessões de análise-controle. Eitingon justificava a necessidade da análise-controle pela consideração de que a personalidade e a história de aprendizado do candidato em formação são importantes para a maneira como o analista em formação exerce o tratamento.
As análises-controle eram geralmente realizadas por um analista-controle que não era o analista didata do candidato. No entanto, havia um questionamento permanente sobre até que ponto essa separação de funções era útil e necessária. Kovács, por exemplo, cita razões que, do seu ponto de vista, sugerem que pelo menos a primeira análise-controle de um tratamento deveria ser feita pelo analista didata:
Considerei uma tarefa difícil compreendê-los totalmente e acompanhá-los [os candidatos em formação] em seu trabalho sem a ajuda da situação analítica. ... Quando tive que conduzir uma análise-controle dessa forma, fui obrigada a confessar que me sentia perdida. Não conseguia me orientar no material patológico ... pois não conhecia a personalidade do candidato e a maneira como reagia e, portanto, não podia dizer de que ponto de vista ele estava julgando as várias situações que encontrava. (1936, p. 353)
Por muito tempo, a expressão análise-controle não foi questionada. Essa era a maneira de nomear a terceira coluna da formação psicanalítica de Eitingon.
Em 1983, Deutsch descreve a análise-controle como uma "experiência prática com pacientes sob a direção e instrução de um professor" e que ocorre na ausência do paciente. A autora vê uma dificuldade no fato de o analista-controle também ser um "agente de seu Instituto" responsável, na medida em que tem o dever de "informar (o Instituto) sobre a aptidão do candidato - dever cujo cumprimento é particularmente importante quando o analista a quem é confiada a análise didática tem, ele próprio, dúvidas quanto à capacidade do candidato". Deutsch nomeia aqui uma interação talvez indireta, mas inevitável e significativa, entre analista didata e analista-controle em um Instituto. Segundo a autora, o analista didata necessita do apoio do analista-controle quando os conflitos em relação à qualificação do candidato se tornam claros. Deutsch constata a existência de conflito na "dupla tarefa": "A primeira é o objetivo terapêutico, que precisa ser cumprido em quase todos os casos didáticos; a outra diz respeito a sua responsabilidade como professor. ... A atitude objetiva do analista-controle é invocada para resolver esse conflito" (1983, p. 60).
A mudança na designação - de análise-controle para supervisão - deve ser compreendida em pelo menos dois níveis:
1) O conceito de controle se relaciona com um processo didático e pedagógico, e está conectado à teoria psicanalítica do desenvolvimento e à compreensão psicanalítico-política de que o controle sobre aquilo que é instintivo e arcaico se faz necessário. Por outro lado, também pode levar rapidamente a uma ideia de supressão dessa parte e impor um modelo de bom comportamento. Ainda que com conotação bem-intencionada, forma-se dessa maneira um entendimento básico a respeito da formação psicanalítica de que o analista-controle experiente não apenas orienta e avalia o candidato inexperiente em formação (aprendiz), mas também o controla. Nos tempos atuais, em que vivemos ideologias emancipatórias na sociedade e na educação, a nomeação análise-controle veicula, sob certas circunstâncias, ideias ligadas a adaptação excessiva, rebelião, reação e sentimento de ter que se submeter a um aparato de poder.
2) Há algumas décadas, as sociedades psicanalíticas reconhecem que psicanalistas ativos psicanaliticamente - mesmo após uma formação bem-sucedida - também necessitam, com frequência, a ajuda de colegas e professores experientes em determinadas situações de seu trabalho. Essas discussões de caso são então entendidas como trocas entre colegas, e não como análises-controle. Obviamente, não é feita nenhuma avaliação nessa ocasião, não há nenhum tipo de dependência na relação estabelecida entre o supervisor e o colega que busca apoio. Destaca-se, assim, na mudança terminológica, o fato de que também colegas que trabalham como supervisores podem buscar o apoio de outros colegas (por exemplo, em uma supervisão). Dessa forma, o termo geral supervisão indica o reconhecimento de que a experiência de supervisão entre colegas não difere necessariamente da supervisão que se dá durante a formação (entre o candidato e o analista-controle). A partir desse ponto de vista, podemos perceber que, subjacente a essa renomeação, está o reconhecimento de uma necessidade permanente de orientação.
A supervisão clínica: o supervisor como "porteiro"
A supervisão clínica, sua teoria e pesquisa, trata dos processos e do andamento da supervisão de formação em diferentes procedimentos terapêuticos e da supervisão de um tratamento entre colegas. Na medida em que também nos referimos à supervisão na formação psicanalítica, surge uma relação com a chamada supervisão clínica, tal como ela é exercida em outras áreas psicoterapêuticas e de formação de adultos e aprimoramento profissional. Estão aqui em primeiro plano a competência do supervisor e a capacidade de aprender do candidato. No entanto, em geral as condições da formação não são registradas e descritas, e a inserção da supervisão no processo de formação não é considerada separadamente.
A atividade de supervisão é baseada principalmente na experiência terapêutica individual. Bernard e Goodyear escrevem:
A supervisão é uma intervenção oferecida por um membro sênior de uma profissão a um colega ou colegas mais novos, que normalmente (mas nem sempre) são membros da mesma profissão. Esse relacionamento é hierárquico e de avaliação, estende-se por um longo tempo e tem como objetivo, simultaneamente, valorizar o funcionamento profissional da(s) pessoa(s) mais jovem(ns), monitorar a qualidade dos serviços profissionais oferecidos aos clientes que ela, ele ou eles atendem e servir como um porteiro para a profissão específica que o supervisionando busca exercer. (2014, p. 9)
Aqui a tensão básica da supervisão clínica fica evidente. Não se trata apenas de apoio profissional e de orientação para o candidato; a partir da supervisão de formação, abre-se uma porta que possibilita o pertencimento a um grupo profissional (por exemplo, psicanalistas com formação concluída, qualificação), que pode assim ser alcançado.
Watkins Jr., em seu Handbook of psychotherapy supervision (1997), definiu sete fatores que, do seu ponto de vista, contribuem, influenciam e moldam a função de supervisão. Entre outras coisas, ele menciona os pressupostos do supervisor sobre o mundo ("mundo assumido"), isto é, suas experiências (de vida), seus valores e sua visão fundamental de vida, suas teorias básicas e modelos, que se imiscuem na supervisão, e que organizam e integram seu conhecimento e seu estilo individual de supervisão.
Ensinar ou tratar? Sobre uma controvérsia persistente e impossível de decidir
Desde o projeto Cope3 nos eua, na década de 1960, as condições de formação são examinadas mais detalhadamente, assim como a supervisão. Arlow (1963), Fleming e Benedek (1964, 1987), Wallerstein (1972, 1981), entre outros, entendem a supervisão como uma técnica de formação que é complicada pelo fato de ser uma inseparável mistura de transmissão da teoria, discussão de caso clínico e experiência emocional particular de aprendizagem entre supervisor e supervisionando - lembrando ainda as semelhanças e diferenças entre uma experiência emocional na supervisão e na sessão de análise didática.
Inicialmente, a supervisão foi concebida como orientação fornecida pelo supervisor ao supervisionando ainda pouco experiente. Esse último busca se aconselhar com o supervisor sobre a psicodinâmica do paciente, o manejo do tratamento (no que diz respeito a interpretação, enquadre, abstinência etc.) e a técnica de tratamento (Arlow, 1963; Fleming & Benedek, 1964; Wallerstein, 1981).
A técnica específica de supervisão era deixada a cargo do supervisor. Partia-se da ideia de que supervisores experientes também poderiam fazer valer sua experiência enquanto analistas na função de supervisores. Embora Wallerstein (1981), em particular, indique claramente que o supervisor deve levar em conta certos princípios básicos de supervisão em sua técnica, pouco se encontra sobre a técnica de supervisão na literatura.
O foco central da crescente discussão foi a questão a respeito da necessidade de separação entre o conteúdo discutido em supervisão e aquele da análise didática. Fleming e Benedek (1987) descrevem a supervisão como situação de aprendizagem na qual se dá uma integração entre a aprendizagem a partir da experiência (proveniente da própria experiência em análise didática) e a aprendizagem cognitiva (proveniente da etapa de formação teórica).
Schlesinger (1981a, 1981b) vê o supervisor conclamado a apoiar o candidato em todas as áreas, de forma que ele possa investigar a situação analítica afetivamente de maneira mais aprofundada e, ao mesmo tempo, desenvolver um maior distanciamento dos processos de transferência e contratransferência que ele, candidato/analista, vivencia nos tratamentos.
Uma das tarefas do supervisor é avaliar em que medida o candidato traz problemas neuróticos não resolvidos (Wallerstein, 1981) para a supervisão e para a situação clínica/tratamento, e também de que maneira o supervisor (não intencionalmente) contribui para que o candidato tenha dificuldades no tratamento ou na supervisão.
Wallerstein afirma explicitamente que o supervisor deve presumir que as dificuldades do candidato estejam relacionadas à falta de conhecimento; somente se o supervisionando se mostrar incapaz de fazer uso "efetivo" do conhecimento adquirido durante a supervisão é que o supervisor deve dirigir-se a ele e abordar o candidato sobre a sua "dinâmica difícil".
A supervisão direciona seu foco às identificações, ao reconhecimento dos mecanismos de defesa e aos pontos cegos do supervisor e do supervisionando, e também à oscilação entre a experiência direta consigo mesmo e com o inconsciente, tanto quanto ao relato do supervisionando sobre o tratamento realizado, portanto à realidade externa.
Nas primeiras décadas da formação psicanalítica, a supervisão - ou análise-controle - estava principalmente comprometida com o teaching, o ensino, ao mesmo tempo que havia amplo consenso de que um conteúdo pessoal e inconsciente do supervisionando estava presente durante a supervisão. Ainda assim, o trabalho de supervisão era visto principalmente como fornecimento de instrução didática ao supervisionando sobre a condução do tratamento de seu paciente. Partia-se da existência de uma configuração mestre-aprendiz. Um estilo de supervisão baseado em ensino representa, em essência, uma relação hierárquica, orientada ao conteúdo das sessões de tratamento, à teoria ensinada e à avaliação do supervisor sobre se e em que ponto o supervisionando apresenta problemas psicológicos pessoais não resolvidos que o impedem de ajudar seu paciente de maneira adequada.
Ao longo da discussão a respeito da delimitação entre a análise didática e a análise-controle, e da questão sobre se e como os aspectos pessoais do candidato podem ser acolhidos e interpretados na supervisão, tornou-se claro que um componente de tratamento [treat] é inevitável em situações de supervisão.
Tendo em vista que uma parte essencial da aptidão para realizar tratamentos analíticos está vinculada ao desenvolvimento pessoal do ana- lista/supervisionando, o supervisor será colocado repetidamente em uma situação de relacionar os aspectos idiossincráticos do supervisionando, suas defesas e seus conflitos inconscientes, com as dificuldades que eventualmente surgem durante o tratamento que está sendo supervisionado.
Com a crescente influência das teorias psicanalíticas que se voltam à relação que se estabelece durante um tratamento, a controvérsia entre ensinar ou tratar [teach or treat] durante a supervisão psicanalítica continua - por exemplo, com Frawley-O'Dea (2001), que escreve, no âmbito do seu postulado sobre a supervisão relacional em psicanálise, que o supervisor não somente ensina e orienta, a partir do lugar daquele que tem a compreensão, mas permite experiências regressivas, primitivas, pré-verbais e dissociativas na supervisão, convidando para tanto, estimulando-as e, assim, criando uma experiência análoga a uma possível abordagem terapêutica. Dessa forma, o relacionamento entre o supervisor e o supervisionando se transforma em um empreendimento analítico amplamente orientado para a experiência - "um esforço analítico em si e por si só" (Rock, 1997, citado em Frawley-O'Dea & Sarnat, 2001).
Weigelt (1957), Kemper (1959) e Ungar e Busch de Ahumeda (2001) afirmam que as emoções e a patologia do paciente são, por um lado, um objeto de estudo da supervisão e, por outro lado, os primeiros movimentos [primum movens] da situação de supervisão com seus processos inconscientes. A tarefa central do supervisor consiste então em ajudar o supervisionando a conter os medos inconscientes (no sentido de continente-contido) e desvelá-los para que possam ser abordados e processados nas sessões de tratamento analítico. Desse modo, a supervisão acrescenta ao mundo emocional, realmente central, da experiência da análise didática mais um campo de aprendizagem a partir da experiência.
Canestri também indica nesse ponto uma "confusão babilônica de línguas", em que a análise-controle, entendida como análise da contratransferência do candidato à formação, deve ser distinguida do controle analítico, ou seja, o acompanhamento das análises efetuadas, que ensina e orienta (2007, p. 1017). A teoria psicanalítica confirma
que o trabalho clínico está enraizado em uma relação na qual ambas as partes inevitavelmente colocam em jogo suas idiossincrasias e limites pessoais. ... Se o supervisor não tem permissão para interpretar e o analista didata não tem permissão para supervisionar, o candidato e o paciente permanecem presos na patologia da transferência-contratransferência não decodificada. (p. 1023)
Canestri defende a compreensão da supervisão como um "tipo de psicanálise" especial, que "pode trazer à luz algo sobre a outra psicanálise - a do paciente com o analista" (p. 1024). Dessa forma, cria-se um movimento pendular: da prática à teoria e de volta à prática. O supervisionando está assim inserido no material clínico, e também o supervisor está presente, na medida em que supervisiona com base nas suas teorias implícitas e na sua própria tradução do material da supervisão.
A partir dessa visão, é possível livrar a supervisão psicanalítica da bipolaridade e não ficar preso à controvérsia entre ensinar ou tratar. Os polos ensino e terapia permitem então um terceiro (no sentido de Ogden): a ideia de um lugar onde o conhecimento teórico/profissional e a própria experiência emocional conduzem a algo novo, à compreensão e à experiência, tanto para o supervisionando quanto para o supervisor.
Teorias psicanalíticas na supervisão psicanalítica
Em recente conversa, os candidatos da IPA disseram que gostariam que nós, supervisores, fornecêssemos indicações sobre o estilo e o método de supervisão. Eitingon, do mesmo modo que muitos autores posteriores, afirmava não ser importante como uma supervisão era realizada, quais eram os conceitos psicanalíticos ou teorias implícitas que orientavam o supervisor em seu trabalho. Penso, no entanto, que existe grande necessidade de transparência na atividade do supervisor, que possibilite uma identificação com o supervisor ou uma diferenciação em relação a ele por parte dos candidatos.
Além da difícil pergunta sobre ensinar ou tratar [teach or treat] e das próprias experiências de ensino-aprendizagem do supervisor, que adentram de forma mais ou menos consciente a atividade de supervisão, parece que os candidatos também querem saber qual é a fundamentação teórica do supervisor, quais são os conceitos que ele utiliza. Nem sempre é fácil nomeá-los e, por diversos motivos, também nem sempre é fácil discuti-los com o candidato - seja porque o supervisor desenvolve sua concepção a respeito de supervisão principalmente a partir de sua experiência prática com os tratamentos, seja porque às vezes não é fácil sustentar, no respectivo Instituto, determinada teoria que não faz parte do seu mainstream e, com isso, ser (fantasiosamente) marginalizado pela comunidade do Instituto. Finalmente, a própria atitude analítica e o exercício concreto do tratamento, às vezes, estão mais distantes da concepção teórica do que a própria pessoa pensa.
Considerando a participação na formação psicanalítica e o desejo de que esses candidatos venham a ser posteriormente nossos sucessores na generatividade dos Institutos, pode ser útil, como supervisor, ter mais clareza sobre a própria posição teórica em relação ao tratamento a ser supervisionado. A função do supervisor como porteiro, descrita por Bernard e Goodyear (2014), é também aquela de quem vai abrir a porta, vai permitir que o supervisionando tenha a esperança de ter sua "entrada" autorizada em algum momento.
Segue, brevemente, a indicação de alguns conceitos psicanalíticos:
1) processo paralelo, processo de espelhamento (Gediman & Wolkenfeld, 1980; Sachs & Shapiro, 1976; Stimmel, 1995);
2) matriz triádica intersubjetiva (Brown & Miller, 2002);
3) identificação projetiva e contraidentificação projetiva (Grinberg, 1979, 2001) e, dentro dessa perspectiva pós-kleiniana, outras "ferramentas" teóricas que podem ser aplicadas de maneira excelente à situação de supervisão;
4) modelo continente-contido (Bion, 1963), capacidade negativa (Bion, 1963), fato selecionado (Bion Talamo, 1981, 1997), curiosidade (Fisher, 2011) e outros;
5) terceiro analítico (Ogden, 2004, 2005).
A (supervisão de) formação institucionalizada: tendência ao emaranhamento
Muito foi escrito sobre as vantagens e desvantagens do modelo de formação de Eitingon nas décadas de 1950 e 1960, particularmente por membros de institutos de formação psicanalítica americanos. Críticas detalhadas sobre a formação psicanalítica podem ser encontradas em Balint (1948) e Bernfeld (1962) e, na Alemanha, em Cremerius (1987, 1992).
Em contraposição a isso, Arlow (1963), Fleming e Benedek (1964), Wallerstein (1981), Windholz (1970) e outros concordam com o modelo de formação de Eitingon, especialmente em seu caráter misto de textura analítico-terapêutica e educacional.
Sobretudo Auchincloss e Michels (2003), Cabaniss, Glick e Roose (2001), Kernberg (1986, 1998, 2000, 2010, 2013), Reeder (2004), Zimmermann (1987), e nos últimos anos também Herrmann (2014), Kahl-Popp (2007, 2012, 2014), Kavanaugh (2006), Lazar (2014), Nagell et al. (2009, 2014), Wiegand-Grefe e Schuhmacher (2006) e mais recentemente Zagermann (2017) lidam com os conflitos de poder paralisantes e muitas vezes destrutivos nos institutos de formação psicanalítica.
Na discussão crítica, o foco está mais nos conflitos institucionais, especialmente no que se refere à análise didática, e menos na relação concreta de formação ou nos emaranhamentos entre supervisionandos e supervisores.
Surpreendentemente, nem por parte do supervisionandos nem por parte dos supervisores existem relatórios concretos sobre os problemas complexos que surgem na relação de supervisão no contexto da formação. Eles são apenas sugeridos ou mencionados em alguns artigos (Astor, 1991; Martinez del Pozo, 1997; Target, 2003; Tuckett, 2005; Zimmermann, 1987) em que a interação da relação de supervisão com os problemas institucionais é abordada. O que tende a ser omitido, entretanto, é uma descrição detalhada e uma discussão sobre as consequências do emaranhamento na supervisão, seus aspectos emocionais e comunicativos e os componentes institucionais.
Não se nega que nesse campo existam queixas e distorções, emaranhados e complicações com grande carga emocional. Mas quase não há publicações que investiguem as implicações e os emaranhamentos específicos da supervisão e das condições institucionais.
Nas poucas publicações existentes nessa área, há uma oscilação entre dois polos que representam duas visões a respeito da supervisão feita sob condições institucionais: em um deles, ela é vista principalmente do ponto de vista psicanalítico, do "processo profundamente inconsciente" - por exemplo, Langs (1994); no outro, o que passa para o primeiro plano é o "contexto social", o componente comunicativo que pode se tornar consciente - por exemplo, Emch (1955).
A área de tensão torna-se clara e leva à compreensão de que, no momento, é preciso apenas descrever as possíveis áreas de conflito. Especificamente, são conflitos nos quais aspectos institucionais da formação conduzem diretamente a emaranhamentos quanto à continuidade da formação ou à qualificação, e que, no Instituto, estão menos frequentemente vinculados de forma aberta ao supervisor. De acordo com a minha hipótese, esses conflitos podem manifestar-se de maneira clara, mas indireta, na supervisão de formação, até porque se trata especificamente da concretização de um objetivo - no caso, a apresentação final do relatório. Essa parece ser a perspectiva na qual não se pode negar a dimensão conflituosa da formação institucional segundo o modelo de Eitingon.
À primeira vista, é possível identificar pelo menos três níveis, que também podem ser entendidos com a ajuda de coordenadas analíticas individuais: 1) questões de poder e impotência; 2) questões de independência e submissão; 3) a formação institucional no âmbito do chamado modelo de família como uma fantasia generativa ou uma fantasia ligada ao superego - e como um serviço de formação de adultos.
A conexão com os acontecimentos institucionais é particularmente evidente na última coordenada. A esperança está na capacidade de substituir a equação metafórica, parcialmente opaca e criticável, da formação do Instituto com a família (Reeder, 2004; Zimmermann, 1987) pela ideia de que os institutos de formação psicanalítica devem funcionar como prestadores de serviço no contexto de uma formação de adultos. Uma orientação pedagógica, isto é, uma orientação em direção a processos de aprendizagem principalmente cognitivos, seria uma oportunidade de deixar para trás os diversos emaranhados emocionais da formação do Instituto que objetiva essencialmente um aspecto generativo.
Exemplo fictício
Segue um exemplo fictício para ilustrar a ligação entre as várias coordenadas em uma supervisão de formação. Apresento questões condensadas a partir de 49 entrevistas que realizei na pesquisa para a minha tese de doutorado, Thinking under fire: die psychoanalytische Ausbildungssupervision [Pensando sob fogo cruzado: a supervisão de formação psicanalítica] (Grünewald-Zemsch, 2019), que foi feita ao longo de vários anos com cinco pares de supervisão, investigados individualmente. A partir dessas entrevistas com supervisionandos e supervisores, pude obter uma visão sobre as diferentes fases, medos, esperanças, expectativas e complicações que ocorrem de forma particular em cada supervisão. O exemplo fictício se compõe das linhas de desenvolvimento e emaranhamentos ali vividas.
A Sra. O entra em contato comigo depois que eu convidei supervisores/analistas didatas da DPG4 para participarem de meu projeto de pesquisa. Considera o projeto muito interessante e pensa que pode se beneficiar com ele: "Tenho a impressão de que o supervisor fica entregue à própria sorte no seu papel". Perguntou a uma candidata, a Sra. G, se gostaria de participar do estudo com a supervisão do tratamento que estava iniciando, com o que ela concordou. Ambas já se conheciam e tinham grandes expectativas a respeito dessa supervisão.
Já nas primeiras semanas surge irritação: a supervisionanda sente-se muito exigida, quase oprimida, e sobrecarregada com as suas expectativas, as expectativas do Instituto e as da supervisora.
Entre outras coisas, isso faz a supervisionanda levar uma quantidade enorme de material de sessões para a supervisão, que ela interpreta de maneira rápida, ao mesmo tempo que se sente frequentemente abandonada e não suficientemente protegida e amparada pela Sra. O.
Já a Sra. O, ao longo da supervisão, sente repetidas vezes que está em uma situação complicada: gostaria de ajudar a Sra. G a organizar seu material e prestar mais atenção à sua "melodia inconsciente", mas ao mesmo tempo, e com frequência, se sente pressionada pelas demandas abertamente formuladas pela Sra. G de obter uma melhora rápida na condição do paciente por meio de uma interpretação correta, de uma assistência ou de uma resposta de apoio.
Em ambas, essa situação resulta em decepção. A supervisora, a Sra. O, pensa que a Sra. G aproveita pouco tanto da supervisão cuidadosamente realizada para o tratamento quanto das discussões teóricas. Já a Sra. G sente-se deixada sozinha com seu paciente e expressa isso em uma conversa com outros candidatos; ela tem a impressão de que as ideias da supervisora pouco a ajudam e é ela que precisa cuidar de si - "Afinal, sou eu que estou sentada sozinha com meu paciente durante o tratamento".
O Instituto entra em foco na medida em que a candidata, a Sra. G, passa a ter uma visão mais crítica a respeito da supervisora, quando percebe nela algumas idiossincrasias, suas decisões no contexto de seu trabalho nas comissões de formação e talvez também sua orientação teórica.
Para ambas as partes, o clima nas sessões de supervisão se caracteriza por grande necessidade de benevolência e por evitação de afetos de vergonha e agressivos, embora haja, ao mesmo tempo, indicações de sentimentos de raiva, mágoa, transferência/contratransferência que não são nomeados.
A seguir, surgem conflitos abertos com o (e no) Instituto. No seu relatório ao Comitê de Formação, a Sra. O nomeia pontos críticos na condução do tratamento feito pela Sra. G, e na supervisão pensa que a Sra. G precisa se desenvolver mais em alguns pontos antes de ser admitida à conclusão da formação. A Sra. G, por sua vez, sente que foi julgada incorretamente e que teve pouco apoio em alguns momentos.
A supervisão termina abruptamente, quando o paciente interrompe o tratamento. A Sra. O considera que o tratamento não chegou a um bom termo, e precisa agora lidar com sua decepção e com o medo que surge de eventualmente não obter reconhecimento como supervisora pelo Instituto. Também põe em questão a avaliação que faz de si mesma como profissional psicanalista e da sua identidade psicanalítica.
A Sra. G tem que lidar com sentimentos de insuficiência e com a preocupação quanto a se o Instituto, o Comitê de Formação e os membros do Instituto vão reconhecer o tratamento como bem-sucedido e se assim o caminho para a conclusão da formação estará aberto.
O exemplo mostra que, apesar de a situação externa ser definida como formação de adultos, podem surgir emaranhamentos entre o conteúdo teórico e a dimensão transferencial diádica/triádica, de difícil reconhecimento e solução, que nas condições de formação, junto com o desejo de identificação do Instituto e do candidato, são significativamente intensificados emocionalmente.
A supervisão de formação psicanalítica: um lugar de emaranhamentos
O Instituto, portanto, não é apenas concretamente um lugar (o local da formação) de emaranhados, mas também ideal e institucionalmente. Somente através do acordo a respeito da supervisão nas condições de formação é que se estabelece uma relação profissional emocional e cognitiva na formação.
A importância desse lugar institucional é dada pela vontade do candidato de aprender e, sobretudo, pelo desejo do Instituto em formar analistas de maneira generativa e criativa, não no sentido de um modelo familiar, mas porque a psicanálise não pode continuar a existir sem "descendência".
Os institutos de formação psicanalítica dependem, assim, da possibilidade de criar um ambiente de formação que convide os interessados a continuar o desenvolvimento da investigação e do trabalho psicanalítico e a não se restringir ao que apresentamos aos nossos sucessores. Do meu ponto de vista, essa é uma situação completamente diferente daquela que Eitingon encontrou em 1920. Naquela época, a psicanálise ainda era um "movimento", uma espécie de corrente subversiva que respondia às tendências do espírito da época. Hoje, a psicanálise está estabelecida e precisa poder ser avaliada em relação a outras formações técnicas psicoterápicas.
Portanto, na melhor das hipóteses, os jovens analistas em formação adotarão os conceitos que ensinamos, mas também ficarão desapontados por ainda não termos resolvido muitos problemas e questões. Sem uma des-idealização isso não é possível, nem mesmo na supervisão.
Nessa medida, transmitir psicanálise significa também criar condições que possibilitem o reconhecimento, a vivência e o domínio do in-transmissível da psicanálise. Isso se aplica sobretudo à supervisão de formação, porque nela se ligam, de maneira pouco nítida, o consciente e o racional do planejamento e condução de um tratamento com o fundamento de processos inconscientes, defensivos, e também dinâmicas de grupo.
Como instituições psicanalíticas, percorremos um longo e interessante caminho para estabelecer e continuar a desenvolver a supervisão de formação psicanalítica, o que possivelmente também significa que precisamos buscar agora os próximos marcos.
Para finalizar, gostaria de delinear brevemente algumas linhas de desenvolvimento para o futuro próximo no âmbito da relação de supervisão de formação:
1) A supervisão de formação psicanalítica necessita de mais investigação, no âmbito qualitativo, a fim de pesquisar melhor e de maneira mais precisa o que funciona e o que não funciona em uma relação de supervisão.
2) A supervisão de formação psicanalítica não deve se esquivar de divulgar seus métodos, conceitos e estilos, com o intuito de estimular o acesso dos candidatos ao tratamento psicanalítico e à reflexão crítica a respeito dele.
3) Do meu ponto de vista, como supervisores, devemos estar cientes de que contribuímos significativamente para o desenvolvimento de uma identidade mais ou menos estável do jovem analista, através da forma como nos utilizamos da psicanálise na supervisão e também nas sessões em conjunto.
4) Em quase todas as Sociedades da IPA não há uma formação própria adicional para a função de supervisor pertencente à função do analista didata, ainda que nos últimos anos Erlich (2017) e alguns outros tenham apontado para a urgência de discutirmos entre nós o nosso próprio desenvolvimento analítico e a competência para a supervisão.
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Recebido em 27/10/2021
Aceito em 10/11/2021
1 Algumas partes deste artigo foram publicadas em: Hermanns, L., Bouville, V. & Wagner, C. (Orgs.). (2021). Ein Jahrhundert psychoanalytische Ausbildung. Psychosozial-Verlag.
2 nt: no âmbito da língua alemã, entende-se por formação de adultos uma continuação ou uma nova etapa da aprendizagem, após a conclusão de uma fase anterior. A formação de adultos está a serviço de um aprimoramento na qualificação e sublinha uma configuração de cooperação e autonomia no processo de aprendizagem.
3 nt: Committee on Psychoanalytic Education (Comitê de Educação Psicanalítica). Comitê da Associação Psicanalítica Americana para descrever e investigar os problemas da formação psicanalítica nos eua. Cf. Fleming, J. (1972). The birth of Cope as viewed in 1971. Journal of the American Psychoanalytic Association, 20,546-555.
4 nt: Deutsche Psychoanalytische Gesellschaft (Sociedade Psicanalítica Alemã). Junto à Deutsche Psychoanalytische Vereinigung (DPV) (Associação Psicanalítica Alemã), são as duas instituições alemãs que oferecem formação psicanalítica e que são ligadas à IPA na Alemanha.