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Boletim - Academia Paulista de Psicologia
versión impresa ISSN 1415-711X
Bol. - Acad. Paul. Psicol. vol.33 no.85 São Paulo dic. 2013
RESENHAS DE LIVROS
Trinca, W. (2011) Psicanálise Compreensiva: uma concepção de conjunto. São Paulo: Vetor Editora, 434p.
Aracê Maria Magenta Magalhães1
Clínica Psicológica A. Magalhães
Todo ser humano está, por assim dizer, no centro de uma guerra, cujo
andamento e desfecho dão a medida de sua sanidade e de sua loucura.
Trinca (2011) p.44
A apreciação deste livro é indicada aos profissionais que atuam no atendimento psicanalítico e constitui uma contribuição valiosa tanto teórica como clínica. É raro encontrar na literatura o domínio teórico profundo, aliado a preciosos exemplos clínicos, como podemos reconhecer o do autor.
O conhecimento total da obra nos insere na dimensão teórica e metodológica da Psicanálise Compreensiva, entretanto, o leitor, ávido por saber mais sobre alguma perturbação psíquica específica, poderá ir direto ao ponto, auxiliado pelo sumário. Neste último caso, recomenda-se a leitura do primeiro capítulo, para o leitor se inteirar da proposta do autor.
Nesta obra, o autor apresenta a psicanálise como uma ciência compreensiva de conjunto da vida mental. É importante frisar, como ele faz, que não se trata de uma nova reformulação dos conceitos clássicos da psicanálise, mas de uma nova compreensão psicanalítica baseada na inter-relação de alguns fatores, inscritos num contexto coerente e englobador. Uma nova visão, outro olhar, mas preservando os conceitos da psicanálise, sem os quais esta se diluiria em alguma outra coisa divergente.
A proposta é desafiadora e instiga o leitor a querer saber mais sobre a construção desta.
O autor destaca a organização metodológica dos dados e o embasamento teórico na noção do ser interior – não do self, sendo aquele que expressa essencialmente quem sou, o que há de fundamental em mim, minha realidade primária, a qual me define, a meus alicerces, verdade e realidade da experiência comigo, de ser eu próprio.
Na sequência, o autor analisa os efeitos da proximidade e do afastamento que a pessoa estabelece consigo mesma e que varia de pessoa para pessoa, definindo o distanciamento de contato de si mesmo como um fator não isolado, mas preponderante nas perturbações psíquicas.
Trinca estabelece um eixo contínuo de contato da pessoa com o ser interior, onde destaca três estados: o consciente (contato ampliado; normalidade), o inconsciente (personalidades neuróticas) e o oclusivo (contato restringido; personalidades psicóticas). Ao distanciar do ser interior, o autor ressalta a incidência de consequências no self, como a fragilidade deste, devido ao seu enfraquecimento ou esvaziamento e o incremento da sensorialidade intensificada, revelada por exemplo, no ciúme patológico, possessividade, voracidade, inveja,narcisismo e falso self (drogadição e destrutividade antissocial).
Para ilustrar sua teoria, o autor utiliza-se de recortes de casos clínicos, observadas as exigências éticas pertinentes. Neles podemos localizar os pontos cruciais da teoria proposta, na prática clínica, em experiências de integração psíquica e inteireza quando há a maior presença de contato com o ser interior e na falta ou diminuição deste contato. Neste último caso, Trinca denomina a constelação do inimigo interno, como um fator central que, movido pela pulsão de morte, comanda um trabalho de ataque e destruição do contato com o ser interior, oposto ao que este realiza na vida mental. Em decorrência deste processo, as ligações com a vida, o viver e a individualidade ficam desestabilizadas, suprimidas ou aniquiladas.
O autor analisa um conjunto de elementos psíquicos associados à autodestrutividade e à heterodestrutividade, bem como diversos estágios da constelação do inimigo interno, conforme a natureza e tipo de ataques. Aqui o clínico e outros profissionais que atuam na área psicológica, poderão reconhecer vários estágios como dúvidas e descréditos, autodepreciação, desqualificações amplificadas, dentre outros, desde os mais brandos até os mais graves como a anestesia, o colapso e o aniquilamento, caracterizados pela perda de noções da realidade, destrutividade, ruptura, desligamento e anestesia.
Também um conjunto expressivo de sintomas, frequentemente trazidos, de diversas áreas de atuação do profissional psicólogo, no formato de queixas tais como insônia, depressão, mania, agressividade, aflição, solidão, alcoolismo, drogadição, angústia, é analisado pelo autor como também o papel determinante que estes desempenham na vida psíquica de cada ser. Como ilustração, o autor lança mão de exemplos para cada um dos casos, numa estratégia que facilita ainda mais o entendimento do leitor, enriquecendo a reflexão teórica, anteriormente explicitada.
Tendo verificado a possibilidade de se efetuar a classificação das perturbações psíquicas em um eixo unificador do contínuo de contato, Trinca propõe a realização de uma ampla pesquisa sistemática de análise profunda das perturbações psíquicas onde cada variável teria um peso, uma ordenação no conjunto de variáveis e deste em relação a outros conjuntos.
A obra Psicanálise Compreensiva: uma concepção de conjunto, de Walter Trinca, apresenta contribuições em vários seguimentos, tais como ao atendimento psicanalítico, ao aprofundamento teórico e um campo de pesquisa a ser explorado. Além disso, o autor propõe uma estruturação de trabalho clínico num contexto unitário que pretende facilitar o entendimento bastante complexo, do pensamento clinico.
1 Psicóloga, Mestra em Psicologia do Ensino e Aprendizagem pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo. Contato: Rua Antonio Alves, 28-21, CEP 17012-431, Bauru,SP - Brasil. Tel.: (14) 3011-2248. E-mail: aracemagalhaes@hotmail.com