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Revista da SBPH
versión impresa ISSN 1516-0858
Rev. SBPH vol.14 no.1 Rio de Janeiro jun. 2011
ARTIGOS
Preditores da qualidade de vida e incapacidade funcional em doentes com lombalgia crónica em tratamento diferenciado
Predictors of quality of Life and functional incapacity in patients with low back pain in differentiated treatment
Salomé Ferreira1,I; M.Graça Pereira2,II
I Escola Superior de Saúde, Portugal
II Universidade do Minho, Escola de Psicologia, Portugal
RESUMO
A lombalgia constitui uma causa frequente de morbilidade e de incapacidade e é um motivo frequente de procura dos cuidados de saúde. O presente estudo teve por objectivo identificar os preditores da qualidadede vida e da incapacidade funcional em doentes com lombalgia crónica submetidos a tratamento convencional (fisioterapia) e tratamento por acupunctura e, contribuir ainda para um maior conhecimento dos factores psicológicos na lombalgia. Os resultados mostraram que no grupo de acupunctura, os preditores da qualidadede vida foram as habilitações, depressão, ansiedade, satisfação com as despesas, incapacidade funcional e pertencer a uma família extrema, enquanto que no grupo de fisioterapia, os preditores foram a depressão, ansiedade, incapacidade funcional e consequências da doença. Ao nível da incapacidade funcional, os preditores foram a duração da doença, coerência da doença e qualidadede vida, no grupo de acupunctura, enquanto que a qualidadede vida e as estratégias de alívio activo da dor foram os preditores da incapacidade funcional no grupo de fisioterapia. As implicações do trabalho ao nível da qualidadede vida e incapacidade funcional dos doentes com lombalgia bem como as limitações do estudo são apresentadas e debatidas.
Palavras-chave: Lombalgia; Qualidadede vida; Incapacidade Funcional; Acupunctura; Fisioterapia.
ABSTRACT
Low back pain is a frequent cause of morbidity and disability and the frequent reason for seeking health care. This study aimed to identify predictors of quality of life and functional disability in patients with chronic low back pain undergoing conventional treatment (physiotherapy) and acupuncture treatment and also contribute to a better understanding of psychological factors in low back pain. Results showed, in the acupuncture group, that the predictors of quality of life were number of years of education, depression, anxiety, satisfaction with treatment’s costs, disability and belonging to an extreme family type while in the group of physiotherapy, the predictors were depression, anxiety, disability and illness consequences. In terms of functional disability, the duration of disease, illness coherence and quality of life were the predictors in the acupuncture group while quality of life and strategies for active pain relief were predictors of functional disability in the physiotherapy group. Implications of the study on quality of life and functional disability of patients with low back pain as well as the limitations of the study are presented and discussed.
Keywords: Low Back Pain; Quality of Life; Functional Incapacity; Acupuncture; Physiotherapy.
Introdução
A prevalência da lombalgia é conhecida em vários países e há estudos que demonstram uma tendência para aumentar (Waddell, 2004). Na população em geral, 10 a 45% das pessoas sofre de lombalgia e a sua incidência é de 5 a 10% (Queiroz, 1996). Rosenthal (2003) refere que 60% a 80% das pessoas poderão ter de encarar uma lombalgia pelo menos uma vez durante a sua vida e 90% dessas pessoas apresentarão mais de um episódio. No Reino Unido, a prevalência da lombalgia é de 59%, com um predomínio no grupo etário 45-59 anos. Na Suiça, a prevalência da lombalgia foi estimada em 20,2% a 28,5% nos homens e entre 311 % e 38,5% nas mulheres. Na Noruega, varia de 2,4% nos homens e 1,7% nas mulheres. Na França, esta doença representa 2,5% da prescrição dos medicamentos e 8% dos exames radiológicos e 30% da actividade dos fisioterapeutas. Em Portugal, Ponte (2005) encontrou uma prevalência de lombalgia de 49%, nas mulheres com 54,2% e nos homens 44,2%, não sendo esta diferença estatisticamente significativa e verificou que as faltas ao trabalho devidas a dor lombar foram de 18,6%, com uma média de 2,5 dias de falta.
A lombalgia afecta igualmente os dois sexos até aos 60 anos de idade, embora seja mais frequente entre os 30 e os 40 anos e parece haver, depois dos 60 anos, uma predominância no sexo feminino (Krause, Rugulies, Ragland, & Syme, 2004) embora a dor lombar tem maior prevalência no grupo de 50-65 anos de idade sendo mais frequente nos viúvos e divorciados comparativamente com os solteiros e casados (Ponte, 2005). Estima-se que por ano se perdem aproximadamente 175 milhões de dias de trabalho, com perda adicional de produtividade de 20 biliões de dólares. Não devem ser só as consequências físicas a preocupar os profissionais de saúde mas também as psicológicas. De facto a dimensão psicológica parece influenciar em termos da presença/ausência de dor, diminuição ou agravamento da dor e, nomeadamente, a depressão, a ansiedade, o significado atribuído à dor, o coping, a qualidadede vida, atitudes e comportamentos face á dor, e a satisfação com os cuidados recebidos, entre outros factores psicológicos, podem influenciar a forma como o sujeito percepciona a dor (Melzac & Wall, 1987).
A forma como as pessoas percepcionam a dor pode afectar o modo como lidam com ela e como reagem aos sintomas físicos (Reis, 2005). De facto, o comportamento e a atitude do indivíduo em relação à dor, as estratégias de coping e o significado atribuído aos sintomas fisicos constituem factores modificáveis da percepção de doença. Assim, a explicação das reacções à dor, não faz sentido sem a avaliação das representações que o indivíduo tem da dor e da doença a ela associada (Pinctus, 2006). Por outro lado, as reprsentações proporcionam ao paciente um esquema que lhe permite compreender a sua dor, servindo de guia sobre os cuidados e procedimentos a realizar bem como a forma de melhor lidar com a dor (Ogden, 2004).
As representações cognitivas que os doentes constroem relativamente aos profissionais de saúde e à medicina em geral interferem nos comportamentos de saúde e doença (Conner & Norman, 2005). As convicções e atitudes perante os médicos influenciam a utilização dos serviços de saúde (Fullen et al., 2006) e tem impacto na adesão terapêutica (Menckeberg et al., 2008). Assim, a adesão aos medicamentos é influenciada pelas características individuais, crenças subjectivas sobre o tratamento e representações da doença que o sujeito possui (Figueiras, Marcelino & Cortes, 2007). As preocupações com a medicação podem traduzir uma reacção emocional de medo e ansiedade diminuindo a adesão ou influenciando a escolha por um certo medicamento e, se o doente for um participante activo no processo de tomada de decisão, vai também influenciar a forma como adere ao tratamento e a percepção dos cuidados de saúde que recebe i.e. a satisfação com os cuidados torna-se um factor importante no controlo da doença e adesão terapêutica (Arrol, 2004; Hespanhol, 2005).
Na lombalgia crónica, os pacientes deparam-se com mudanças em todas as áreas de funcionamento pessoal e social tendo que realizar mudanças que levam à alteração da sua qualidadede vida (Katon & Sullivan, 1990). O coping com a dor torna-se importante porque se trata dum processo de resposta a um acontecimento stressante (doença) centrado nos esforços do indivíduo para lidar com a dor (Turk & Melzack, 1992) e nas estratégias utilizadas (Heppner, 1998, Degood, 2000; Tan et al., 2001).
A presença de problemas psicológicos, como depressão ou outros distúrbios emocionais estão relacionadas com manifestações dolorosas crónicas e incapacidade. Muitos pacientes de lombalgia experimentam os efeitos da depressão como restrição da sua mobilidade e do seu bem-estar geral, impedindo-os de ecercer a sua actividade profissional (Smith, Timothy, Carmody & Smith, 2004). Estes doentes têm frequentemente que enfrentar o desconforto e a incapacidade funcional, modificar comportamentos para minimizar os resultados indesejáveis devido às suas limitações funcionais e, ainda, lidar com as consequências emocionais da doença (Lorieg et al., 2001).
A avaliação do funcionamento familiar não pode ser esquecida na dor crónica porque a doença crónica num elemento da família acarreta mudanças no processo familiar que afecta a família como um todo (Olson, 1986). A lombalgia crónica assume-se como um factor de risco para a manutenção do equilíbrio familiar na medida em que implica um desequilíbrio na estrutura familiar.
Neste sentido, o presente trabalho pretendeu identificar os preditores da Qualidadede vida e da Incapacidade Funcional em pacientes com lombalgia em tratamento convencional (fisioterapia) versus acupunctura.
Método
A amostra foi constituída por 213 pacientes dos quais 90 faziam tratamento com acupunctura e os restantes tratamento de fisioterapia. Os critérios de inclusão na amostra foram: sofrer de Lombalgia há mais de 3 meses; não estar a fazer tratamento para mais nenhuma situação patológica causadora de dor; ter idade superior a 20 anos; saber ler e escrever; estar a realizar fisioterapia ou acupunctura (sem acumular com outro tipo de tratamento para a lombalgia com excepção de medicação para a dor).
Procedimento
Após o contacto de várias clínicas de fisioterapia e de acupunctura foi pedida a colaboração na identificação dos doentes com lombalgia para entrega/recolha dos questionários. Nessa altura foi tambem explicado à equipa, os objectivos do estudo e a forma como o estudo deveria ser apresentado aos pacientes. Este procedimento foi idêntico nas clínicas de fisioterapia e de acunpunctura.
Os doentes receberam a bateria de instrumentos do seu fisioterapeuta ou acupunctor que explicava os objectivos do estudo. A bateria foi preenchida no final do quinto tratamento. A participação dos doentes foi voluntária e foi garantida a confidencialidade dos resultados.
Caracterização Sócio - Demográfica e Clínica da Amostra
A média da idade é de 51.64 anos, ligeiramente superior no grupo de Acupunctura (GA), 55.27, quando comparada com o grupo de Fisioterapia (GF), 48.75. No GA, a maioria são mulheres 72,22%, enquanto no GF, verifica-se que a maioria, 57.5%, é homens. Relativamente ao estado civil, predomina o estado civil casado, em ambos os grupos, com 75.5% e 79.7% no GA e GF, respectivamente.
Relativamente às habilitações literárias, no GA 33.3% dos doentes têm o ensino superior completo e 10% incompleto, enquanto no GF apenas 3.5% dos doentes têm o ensino superior completo e predominam os doentes com o ensino primário completo (52.2%) e o ensino secundário incompleto (25.8%). Relativamente à situação profissional verifica-se que 60% das pessoas do GA encontram-se a trabalhar versus 23.9% no GF estando a maior parte das pessoas de baixa médica (40.7%).
A média de duração, em meses, da lombalgia situa-se nos 69 meses de duração sendo no grupo de Acupunctura de 90 meses e no grupo da Fisioterapia de 53 meses. Relativamente à frequência de dor verificamos que em ambos os grupos, a maior parte dos doentes sente dor constantemente, 66.4% e 41.1%, no GF e GA, respectivamente. Verifica-se ainda que em ambos os grupos á um grande número de sujeitos que caracteriza a dor como uma dor que irradia para os membros inferiores, (48.7% e 38.9% no GF e GA, respectivamente). Em ambos os grupos, a dor agrava-se com a actividade ( 47.8% no GF e 45.6% no GA).
Instrumentos
Questionário de Representações de Doença (IPQ-R) de Moss-Morris, Weinman, Horne, Cameron e Buick (2002), (versão Portuguesa de Figueiras, Marcelino, Horne & Weinman, 2007). Este questionário encontra-se dividido em 3 secções distintas. Na primeira secção, sub-escala identidade, é pedido aos sujeitos que identifiquem, dos 15 sintomas apresentados, os experienciados, e depois os associem ou não à sua lombalgia. Quanto maior o valor obtido, maior identificação de sintomas. A segunda secção inclui 38 items distribuídos em 7 sub-escalas: Duração aguda/crónica, Duração cíclica, Consequências (6 itens), Controlo Pessoal, Controlo de Tratamento, Coerência da Doença e a Representação Emocional. Resultados mais elevados nas escalas de duração da doeçna significam que mais crónica é a percepção da doença e sua periodicidade. Na subescala representação emocional e coerência da doença um valor elevado significa percepção mais negativa da doença e menor compreensão da doença. Nas subescalas de controlo e consequências, valores elevados significam maior contolo e maior percepção das consequências da doença. A terceira secção é constituída por 18 causas possíveis de doença e um resultado elevado significa maior concordância com a atribuição causal. O alfa na presente amostra variou entre .70 e .78 á excepção do controlo pessoal e duração cíclica cujos valores foram inferiores a .70 e, por esse motivo, não foram consideradas no teste de hipóteses.
Questionário de Modos de Lidar com a Dor de Brown (1999), (versão Portuguesa de McIntyre, Jonhston, Gouveia, Trovisqueira & Araújo, 2004). A escala é composta por 18 items distribuidos por três subescalas: Transformação da Sensação de Dor, Distracção da Dor e alívio Activo. Em todas as sub-escalas, quanto mais elevado o resultado, maior o uso das respectivas estratégias para lidar com a dor. Os valores de alfa encontrados na presente amostra foram de 0.77 para a sub-escala Transformação da Sensação de Dor, 0.59 para a sub-escala Distracção da Dor e 0.74 para a sub-escala Estratégias de Alívio Activo.
Questionário de Satisfação do Utente (QUASU), (Mclntyre, Pereira, Silva, Fernandes, & Correia, (1999). A escala avalia a satisfação do utente em relação aos cuidados recebidos nas suas várias dimensões da prestação dos cuidados de saúde. A avaliação é feita em seis dimensões: Acessibilidades (17 itens), Despesas (3 items); QualidadeTécnica (3 items); Comunicação e informação (11 items); Relações interpessoais (13 items), Coordenação de equipa (1 item); e avaliação global (1 item). Um resultdo elevado significa maior a satisfação com os cuidados recebidos. Os valores de alfa, na presente amostra variaram entre .75 a .90. à excepção de acessibilidade que, por esse motivo, não foi considerada no teste de hipóteses.
Questionário das Crenças Acerca dos Fármacos – (BMQ), de Horne (2006), (Versão Portuguesa de Pereira & Roios, 2007). A escala é composta por duas secções: (1) BMQ-específica, e (2) BMQ-geral. A primeira avalia as representações de fármacos prescritos para uso pessoal (5 itens) enquanto a segunda avalia crenças acerca dos medicamentos em geral, 4 itens). Um resultado elevado significa maior percepção dos efeitos nocivos da medicação e que são prescritos fármacos a mais. Os valores de alfa encontrados, na presente amostra, foram de .74 para a subescala especifica e.73.para a subescala geral.
Escala da Ansiedade e da Depressão – (HADS), de Zigmond e Snaith, 1983, (versão Portuguesa de Gouveia & McIntyre, 2003). A escala é constituída por 14 itens, divididos em duas sub-escalas, uma de ansiedade e outra de depressão, cada uma com 7 itens, respectivamente. Valores iguais ou inferiores a 7 indicam ausência de sintomatologia, de 8 a 10 são considerados casos limite e superiores a 11 são indicativos de ansiedade e depressão clínica. O alfa encontrado, na prsente amostra, foi de 0.80 para a subescala Ansiedade e 0.75 para a subescala depressão.
Questionário de Qualidadede vida – (MOS 20), de Stewart, Hays e Ware (1998), (versão Portuguesa de Geada, 1996). O MOS 20 é uma escala constituída por 20 questões distribuidas por seis dimensões da qualidadede vida: Funcionalidade Física; Desempenho do Papel Social; Funcionalidade Social; Saúde mental; Percepção do Estado de Saúde e Dores. A escala permite obter um resultado global que quanto maio significa melhor qualidadede vida. Os valores encontrados para o alfa, na presente amostra, para a escala total foram de 0.90. Nao foram utilizadas as subescalas nos testes de hipóteses.
Questionário de Incapacidade Funcional – (RMDQ), de Rolland e Morris, (2000), (versao Portuguesa de Pereira & Ferreira, 2007. Este instrumento avalia as limitações físicas resultantes das dores referidas sobre a coluna lombar e é composto por 24 questões que descrevem a própria situação de dor.. A versão original do RMDQ, é constituída apenas por um factor como medida da incapacidade e apresenta uma fiabilidade teste-reteste muito alta (0.91) demonstrado uma boa correlação com outras escalas de dor. O alfa de Cronbach foi de 0.84 na presente amostra.
Escalas de Coesão e Adaptabilidade Familiar - FACES II, de Olson, (2000), (versão Portuguesa de Fernandes (1995). Esta escala permite a classificação das famílias segundo o Modelo Circumplexo (Olson, 2000) e avalia duas grandes dimensões da dinâmica familiar: a coesão da família e a adaptabilidade. A combinação dos resultados obtidos nestas duas dimensões permite categorizar as famílias, em três tipos gerais: extremas, meio-termo e equilibradas (Olson, 2000). O alfa encontrado, na presente amostra, foi de 0.78 para a Adaptabilidade e 0.87 para a Coesão.
Análise de Dados
Inicialmente foram calculadas as correlações entre todas as variáveis, nos dois grupos, a fim de conhecer quais as variáveis a considerar no modelo. A fim de determinar quais os melhores predictores da Qualidadede vida e da Incapacidade Funcional efectuou-se uma regressão Linear Múltipla por blocos com a incapacidade Funcional e a Qualidadede vida como variáveis dependentes. No Bloco 1 e 2 foi utilizado o método stepwise e no Bloco 3, dado tratar-se de variáveis psicológicas relevantes do ponto de vista teórico que pretendíamos estudar o seu contributo, utilizamos o método enter. Foram introduzidas no Bloco 1, as variáveis Idade, Género, Duração de Doença e Habilitações, no Bloco 2 as variáveis psicologicas que se correlacionavam com as variáveis dependentes Qualidadede vida e Incapacidade Funcional e, finalmente, no Bloco 3 as variáveis que do ponto de vista teórico eram consideradas relevantes para o presente estudo apesar de nao estarem correlacionadas com as variaveis dependentes: tipo de família (Martins & Silva, 2002; Viana, Barbosa, & Guimarães, 2007) e crenças acerca dos fármacos (Katon & Sullivan, 1990). Como a variável “Tipo de Família” possui três categorias (famílias equilibradas, intermédias e extremas) teve que ser transformada em duas variáveis “dummies”: A primeira corresponde às famílias intermédias, a segunda às famílias extremas, ficando as famílias equilibradas como categoria de referência.
Resultados
Preditores da Qualidade de Vida no Grupo de Acupunctura (GA)
As variáveis psicológicas que se correlacionavam positivamente com a qualidade de vida foram: controlo de tratamento, despesas e avaliação global dos cuidados. Por sua vez, as variáveis: identidade, duração aguda/crónica, consequências, coerência da doença, representação emocional, causas, ansiedade, depressão e incapacidade funcional correlacionaram-se negativamente com a qualidadede vida.
Os resultados revelaram que as habilitações são uma variável com capacidade predictiva da qualidadede vida e explicam 14,5% da variância total dos resultados, indicando que quanto mais elevadas as habilitações melhor é a qualidadede vida. Quando introduzido o 2º Bloco verificou-se que as habilitações se mantêm como variável predictora. Das variáveis incluídas neste bloco, a depressão, ansiedade, incapacidade funcional e satisfação com as despesas apresentam-se como significativas logo predictoras da qualidadede vida determinando um acréscimo de 53.6% na variância, totalizando assim, 68.1%. Quando introduzidas as variáveis relevantes do ponto de vista teórico, (tipo de família e crenças acerca dos fármacos) no 3º Bloco, verificou-se que as habilitações continuam a ser uma variável significativa, a depressão, ansiedade, incapacidade funcional e satisfação com as despesas mantiveram-se também significativas bem como a variável família extrema que também prediz negativamente a qualidadede vida. A inclusão desta variável determinou um acréscimo de 4.6%. O modelo final explica 72.7% da variância dos resultados.
Deste modo, no GA, as variáveis que contribuem significativamente para a qualidadede vida são: habilitações, depressão, ansiedade, incapacidade funcional, satisfação com as despesas e pertencer a uma família extrema. Assim, os doentes com pior qualidadede vida são os que apresentam menos habilitações, têm mais ansiedade e depressão, mais incapacidade funcional, pertencem a famílias extremas e estão menos satisfeitos com as despesas.
Preditores da Qualidade de Vida no Grupo de Fisioterapia (GF)
Ao analisarmos as variáveis psicossociais que se correlacionam com a qualidadede vida, no GF, verificamos que apenas o controlo de tratamento se correlaciona positivamente com a qualidadede vida, enquanto todas as outras variáveis: identidade da doença, duração da doença, consequências da doença, coerência da doença, representação emocional da doença, percepção das causas da doença, ansiedade, depressão e incapacidade funcional se correlacionam negativamente.
No bloco 1, os resultados revelaram que as habilitações constituem a variável com capacidade preditiva sobre a qualidadede vida explicando 15% da variância total dos resultados. Assim, quanto maiores forem as habilitações, melhor é a qualidadede vida. Quando introduzido o Bloco 2, verificou-se que as habilitações deixam de ser significativas e a ansiedade, depressão, incapacidade funcional e consequências da doença são variaveis psicologicas preditoras. A inclusão destas variáveis determinou um acréscimo de 42.7% na variância dos resultados. Quando incluidas, pelo método enter, as variáveis tipo de família e crenças acerca dos fármacos, no 3º Bloco, verificou-se que nenhuma destas variaveis é preditora da qualidadede vida. Deste modo no GF, as variáveis que contribuem significativamente para o modelo final são: habilitações, depressão, ansiedade, incapacidade funcional e consequências da doença. Este modelo, no seu conjunto, explica 56.3% da variância dos resultados. Assim, no GF, os pacientes com pior qualidadede vida são os que têm menos habilitações, mais depressão, mais ansiedade, mais incapacidade funcional e uma percepção mais negativa das consequências da doença.
Predictores da Incapacidade Funcional no Grupo de Acupunctura (GA)
As variáveis que se correlacionam positivamente com a incapacidade funcional são as consequências da doença, coerência da doença, causas da doença e ansiedade. As variáveis controlo de tratamento e qualidadede vida correlacionam-se negativamente com a incapacidade funcional.
No GA, a duração da doença é a variável com capacidade preditiva da incapacidade funcional explicando 16% da variância dos resultados. Assim, quanto maior a duração da doença, maior a incapacidade funcional. Quando introduzido o Bloco 2, verificou-se que a duração da doença se mantém como variável preditora da incapacidade funcional, associando-se agora a coerência da doença e a qualidadede vida total. A inclusão destas variáveis determinou um acréscimo de 23%, totalizando 38.9% da variancia explicada. Quando incluidas o tipo de família e crenças acerca dos fármacos, no 3º Bloco, verificou-se -se que não foi acrescentado nenhuma variável preditora ao modelo.
Deste modo no GA, as variáveis que contribuem significativamente para a incapacidade funcional são: a duração da doença, a coerência da doença e a qualidadede vida. O modelo total explica 43.9% da variância dos resultados. Assim, maior duração e coerência da doença (menor compreensão) e pior qualidade de vida predizem maior incapacidade funcional.
Preditores da Incapacidade Funcional no Grupo de Fisioterapia (GF)
No GF, as variáveis que se correlacionam positivamente com a incapacidade funcional foram: as consequências da doença, representação emocional da doença, estratégias de alívio activo, ansiedade e depressão. A variável qualidadede vida correlaciona-se negativamente com a incapacidade funcional.
Os resultados revelaram que no Bloco 1, nenhuma variável foi significativa. Quando introduzido o Bloco 2, verificou-se que a qualidade de vida e as estratégias de alívio activo são variáveis predictoras explicando 30.8% da variância. Quando incluidas as variáveis tipo de família e crenças acerca dos fármacos, no 3º Bloco, verificou-se que não se acrescenta nenhuma variável predictora da incapacidade funcional. O modelo explica 29.7% da variância dos resultados. Assim, no GF, as variáveis que contribuem para a Incapacidade funcional, foram a qualidadede vida total e as estratégias de alívio activo da dor. Neste sentido, os doentes com maior incapacidade funcional são os que têm pior qualidadede vida total e os que apresentam mais estratégias de alívio activo da dor.
Discussão
Neste estudo é evidente que, em ambos os grupos, a ansiedade e a depressão contribuem para diminuir a qualidadede vida. Estes resultados são confirmados por Coster e colaboradores (2008) que encontraram uma associação entre a ansiedade e uma qualidadede vida pobre. Também Moussavi e colaboradores (2007) referem que a depressão é co-mórbida com a doença crónica e que pode agravar as consequências desta. Mark e colaboradores (2000) concluíram que a qualidadede vida parece estar directamente relacionada com a ansiedade, a depressão e incapacidade funcional. Na dor crónica, a depressão prediz a incapacidade sendo que este poder predictivo depende da cronicidade da dor (Smith et al., 2004; Boersma & linton, 2005; Carrage et al., 2005; Sullivan et al., 2006).
O efeito preditivo da depressão sobre a qualidadede vida já foi devidamente estudado na doença crónica, nomeadamente numa amostra portuguesa de doentes renais crónicos e doentes em hemodiálise (Barbosa, Júnior & Bastos, 2007) com a depressão a apresentar-se como o maior predictor da qualidadede vida. Também no cancro colorrectal, em pacientes portugueseas, as variáveis ansiedade e a depressão exerceram um contributo significativo para a qualidadede vida (Pereira & Figueiredo, in press) e o mesmo aconteceu na esclerose múltipla onde se verificou uma relação negativa entre a depressão e a qualidade de vida (Sousa, 2005). Os resultados, no presente estudo, a nível da lombalgia, vêm assim confirmar estudos anteriores.
Horng e colaboradores (2005) desenvolveram um estudo com doentes com lombalgia seguidos em clínicas de ambulatório e concluíram, entre outros factores, que o nível de educação era um predictor significativo da qualidadede vida. Tal como no presente estudo, vários autores encontraram uma relação entre as habilitações e a qualidadede vida i.e. menos habilitaçõess predizem pior qualidadede vida (Berzon, 1998, Bishop, 2005, Morales et al. 2007). Horng e colaboradores (2005) referem ainda que nos doentes com lombalgia, mais do que a simples deficiência física provocada pela intensidade da dor, a qualidadede vida depende da capacidade física e dos factores psicológicos, entre eles a morbilidade psicológica.
No GF, a percepção das consequências da doença são um predictor da qualidadede vida. Sousa (2005) verificou que a qualidade de vida deve ser entendida como a perspectiva do indivíduo que avalia, vê e sente a interferência da doença na sua vida pessoal, familiar e profissional. Esta perspectiva pode explicar os resultados do presente estudo no que se refere à percepção das consequências da doença como um predictor da qualidadede vida.
As representações de doença baseiam-se na informação, experiência pessoal e crenças culturais. Os resultados deste estudo demonstram, nos dois grupos (GF e GA) que a identidade, a duração da doença, a identificação das causas, as consequências e a representação emocional, contribuem de forma negativa para a qualidadede vida. Estes resultados são confirmados por Lame e colaboradores (2005) que, num estudo em doentes com lombalgia, concluíram que os factores cognitivos eram predictores da qualidadede vida. Também Sousa (2005) concluiu que os doentes com pior qualidade de vida identificaram mais sintomas associados à doença e apresentavam uma percepção mais ciclíca da doença. Os resultados do presente estudo revelam que as representações da doença têm impacto na lombalgia ao nível da qualidade de vida e da incapacidade funcional. De facto, nos dois grupos, os resultados vão também ao encontro de Boersma (2005) que concluiu que as limitações funcionais são sobretudo o resultado das crenças na capacidade do indivíduo do que o nível actual da incapacidade física propriamente dita.
Relativamente à satisfação com os cuidados, no GA, verifica-se uma relação entre a satisfação com as despesas e a qualidadede vida. Este resultado é corroborado por Castaldy e Rita (2008) que num estudo desenvolvido com doentes fisicamente incapacitadas encontraram uma relação significativa entre a qualidadede vida e a satisfação com os cuidados. Segundo os autores, os resultados do seu estudo apoiam a convicção de que aumentando a satisfação com os cuidados recebidos, aumenta a satisfação com a vida e a qualidadede vida. No presente estudo, o facto de a satisfação com as despesas se relacionar com a qualidadede vida, no GA, pode ser explicado pelo facto da maior parte dos doentes trabalhar no sector terciário, o que normalmente se traduz em empregos melhor remunerados e, por isso, com mais disponibilidade económica ao nível da saúde e, consequentemente, ao nivel da qualidade de vida.
A incapacidade funcional não é apenas influenciada pelas condições médicas, nomeadamente a patologia mas também por factores psicológicos e sociais. Segundo Jang e colaboradores (2006) estudos recentes mostram a importância do papel dos factores psicossociais no desenvolvimento do processo de incapacidade e na interacção destes factores com a condição médica. O facto de, no presente estudo, ao nível dos dois grupos, a ansiedade e a depressão contribuírem para a incapacidade funcional, é corroborado por outros estudos, nomeadamente, Brenes e colaboradores (2008) verificaram em sujeitos adultos, depois de controladas as variáveis idade, género, rendimento, saúde percebida, número de doenças crónicas e visitas ao médico durante um ano, que as variáveis ansiedade e depressão estavam associadas a altos níveis de incapacidade física. De facto, a depressão e a ansiedade interagem na percepção da dor através de mecanismos inibitórios (Mark et al., 2000) e tais factores psicológicos estão envolvidos na progressão da cronicidade na lombalgia (Valat, 2004). Alencar e Leila (2002) também verificaram que a depressão prediz com mais eficácia as lombalgia ocupacionais do que os próprios factores biomecânicos.
Na lombalgia crónica, a incapacidade funcional é muito frequente fazendo com que os doentes sintam dificuldade em realizar a maioria das actividades, tendo frequentemente que se movimentar de forma lenta e cuidadosa forçando-os a estar em casa a maioria do tempo (Weiner, Rudy, Kim, & Gollas, 2004). Segundo os autores citados, a incapacidade funcional conduz os pacientes a maior isolamento social e a uma falta de actividades agradáveis e, para os sujeitos activos, podem surgir dificuldades financeiras consequencias da incapacidade e morbilidade psicológica. Além disso, a incapacidade funcional exerce grande efeito negativo no bem-estar individual, gerando mais necessidade de apoio formal, informal e cuidados por longos períodos afectando significativamente o bem-estar dos indivíduos. De acordo com Smith e colaboradores (2002), as condições crónicas levam a uma diminuição do potencial dos indivíduos para experienciar o lado positivo da vida. Segundo Lorig e colaboradores (2001), um programa de auto gestão para a doença crónica, em doentes acima de 40 anos, mostrou uma redução significativa na ansiedade e um aumento na eficácia percebida associada ao menor uso dos serviços de saúde. Apesar da incapacidade física, nos doentes, ter piorado devido à doença crónica, os doentes mantiveram ou melhoraram todos os outros aspectos não tendo sido afectadas as suas actividades e papéis sociais.
A relação entre a incapacidade funcional e a qualidadede vida encontrada, no presente estudo, vai de encontro aos resultados de Falcão (2006) que verificou em doentes com lombalgia crónica que a qualidadede vida e a incapacidade funcional estavam relacionadas e eram influenciadas pela intensidade da dor e sintomatologia depressiva. Lillfjell e colaboradores (2007) encontraram altos níveis de intensidade de dor associada a uma capacidade psicológica e fisiológica pobre e altos níveis de ansiedade e depressão, sugerindo que a capacidade física, angústia emocional e estratégias de coping devem ser áreas de prioridade em programas de reabilitação no sentido de melhorar a funcionalidade da vida diária do doente.
Limitações
O facto da amostra do GF ser apenas do norte de Portugal e a amostra do GA ser da região norte e centro do Pais pode ser considerado uma limitação. Alem disso, so foram utilizadas medidas de auto-relato e, nalguns instrumentos, devido aos valores de alfa, algumas subescalas não poderem ser utilizadas.
O presente estudo não permite conhecer ou explicar as diferenças entre os dois grupos de tratamento dado que apenas foi realizada uma avaliação no quinto tratamento e não houve uma avaliação pré-tratamento. Assim, em estudos futuros, seria importante avaliar os dois grupos de pacientes em vários momentos do tratamento dos doentes.
Conclusão
Este estudo vem reforçar a importância dos processos psicológicos nas implicações ao nível da qualidadede vida e da incapacidade funcional dos doentes com lombalgia. Os profissionais de saúde, nomeadamente aqueles que tratam e cuidam dos doentes com lombalgia crónica, devem estar atentos aos aspectos psicológicos, procurando planear e intervir o mais precocemente possível no sentido de desmistificar crenças menos ajustadas que podem comprometer o processo de tratamento e de reabilitação.
Os resultados deste estudo fornecem também um contributo importante para a necessidade de valorizar a avaliação que os doentes com lombalgia fazem dos cuidados recebidos e da importância da familia. De facto, futuras investigações deverão ter em consideração a satisfação com os serviços dado essa variável ter impacto na qualidade de vida bem como o tipo de família onde os doentes com lombalgia estão inseridos e a fase do ciclo de vida familiar em que se encontram (Olson, 1986).
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Endereço para correspondência
Salomé Ferreira
E-mail: salomeferreira@ess.ivpc.pt
1 Escola Superior de Saúde, Viana do Castelo, Portugal.
2 Universidade do Minho, Escola de Psicologia, Portugal. E-mail: gracep@psi.uminho.pt