Servicios Personalizados
Revista
Articulo
Indicadores
Compartir
Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva
versión impresa ISSN 1517-5545
Rev. bras. ter. comport. cogn. vol.15 no.2 São Paulo ago. 2013
ARTIGOS ORIGINAIS
Avaliação de um programa de tratamento do tabagismo
Evaluation of a program for smoking cessation
Alex Andrade Mesquita*
Universidade Federal do Maranhão (UFMA)
RESUMO
O objetivo do presente estudo foi o de avaliar a efetividade de um programa público de tratamento do tabagismo, baseado nas diretrizes do Instituto Nacional do Câncer (INCA). Foram avaliados 109 pacientes, atendidos em um hospital público durante o período de dois anos. Os participantes passaram por quatro sessões de terapia cognitivo-comportamental em grupo, associada à reposição de nicotina e à bupropiona. Foi verificada a manutenção da abstinência em um mês, quatro meses, e seis meses após o tratamento. Os resultados mostraram que 83,5% dos participantes pararam de fumar ao final do tratamento. Após um mês ocorreram poucas recaídas, porém após quatro e seis meses o número de abstinentes cai quase pela metade. Os resultados mostram que a terapia cognitivo-comportamental associada à medicação é eficaz na cessação do tabagismo e na manutenção da abstinência, reforçando a importância e a eficácia dos programas públicos de tratamento do tabagismo.
Palavras-chave: tratamento, tabagismo, terapia cognitivo-comportamental, medicação.
SUMMARY
The aim of this study was to evaluate a public program for smoking cessation based on guidelines of the National Cancer Institute (INCA). We evaluated 109 patients enrolled in a public hospital during the period of two years. The participants underwent four sessions of cognitive-behavioral group associated with nicotine replacement and bupropion. The maintenance of non smoking was evaluated one month, four months and six months after treatment. The results showed that 83.5% of the participants quit smoking after the treatment. After a month a few relapses occurred, but after four and six months the number of abstinent falls by almost half. The results show that cognitive-behavioral therapy combined with medication is effective in smoking cessation, reinforcing the importance and effectiveness of public programs for smoking cessation.
Keywords: treatment, smoking, cognitive-behavioral therapy, medication.
INTRODUÇÃO
O tabagismo apresenta-se na atualidade como um dos principais problemas de saúde pública. A Organização Mundial de Saúde (OMS) (2011) estima que exista cerca de 1,2 bilhão de fumantes no mundo. No Brasil, estima-se que cerca de 14,8% da população sejam fumantes, sendo 18,1% dos homens e 12% das mulheres. (Ministério da Saúde, 2012). São cerca de 6 milhões de mortes anuais provocadas pelo tabagismo e este número pode chegar a 7,5 milhões por ano em 2020. O tabagismo responde hoje por cerca de 42% das doenças respiratórias crônicas, 71% dos casos de câncer de pulmão, 10% das doenças cardiovasculares e por cerca de 10% de todas as mortes. A expectativa de vida de um indivíduo que fuma é 25% menor que a de um não fumante (OMS, 2011).
Além do aumento de mortes prematuras e das consequências graves à saúde, o tabagismo promove enormes gastos com o tratamento das doenças por ele provocadas. Pinto (2008) afirma que no Brasil o Sistema Único de Saúde (SUS) gasta cerca de R$ 338,6 milhões por ano com internações, remédios e quimioterapia. Os gastos públicos se elevam se forem incluídas despesas com aposentadorias precoces e pelo custo do tratamento do tabagismo na rede pública.
Estudos vêm mostrando que o número de fumantes vem diminuindo nos países desenvolvidos e aumentando nos países em desenvolvimento. No Brasil tem-se observado queda no número de fumantes nos 20 últimos anos (Daudt, 2006) .
O United States Department of Health and Human Services (1998) concluiu que: (1) o cigarro e outras formas de uso do tabaco geram dependência; (2) a nicotina é a droga presente no tabaco que causa essa dependência; (3) os processos farmacológicos e comportamentais que determinam a dependência de nicotina são similares àqueles que determinam a dependência de outras drogas como a heroína e a cocaína. O CID-10(Organização Mundial de Saúde, 2007) reserva duas categoriais para o tabagismo: dependência de nicotina e abstinência de nicotina.
O hábito de fumar geralmente se inicia na adolescência. Não está clara a velocidade com a qual a dependência se desenvolve. Entre aqueles que continuam a fumar depois dos 20 anos, 95% tornam-se fumantes regulares e diários (American Psychiatric Association, 1995).
Do ponto de vista da análise do comportamento, o fumante quando fuma evita o mal-estar da abstinência, como taquicardia, dores de cabeça, tontura e ansiedade. Também, sente prazer, melhora da concentração, disposição, alerta. Assim, além de evitar o mal-estar, o fumante sente-se melhor e consegue realizar tarefas com mais disposição. No primeiro caso, estão em atuação contingências de reforço negativo e, no segundo, de reforço positivo. O ambiente onde ocorre o fumar fica condicionado ao cigarro, assim, por exemplo, se uma pessoa fuma após tomar café, o café passa a ser um "gatilho" para fumar. Diz-se que esse evento se tornou um estímulo discriminativo, pois sua presença é uma ocasião para fumar, além de ser pareado com a sensação de prazer, tornando-se também um estímulo condicionado (Axerold, 1991).
Um mesmo comportamento pode levar a consequências reforçadoras em curto prazo e punitivas em longo prazo. Skinner (2003) exemplifica contingências que levam tanto a reforço quanto à punição, como no caso de um indivíduo que ingere bebidas alcoólicas, e o álcool provoca sensação de confiança e de esquecimento dos problemas, porém, no outro dia, o sujeito tem uma "ressaca" e sente vergonha por ter bebido. O mesmo se pode dizer do cigarro, a nicotina em curto prazo é estimulante no sistema nervoso central (SNC), aumenta a concentração, a atenção, ajuda a resolver problemas, e ainda reduz os sintomas de abstinência. Porém, em longo prazo, provoca diversos tipos de doença.
O indivíduo "escolhe" fumar para se aliviar e sentir prazer em curto prazo, sendo esta uma alternativa impulsiva. Caso escolhesse não fumar, suportar o mal-estar em curto prazo para receber recompensas maiores no futuro, como evitar doenças, economizar dinheiro e evitar morte prematura, estaria optando pelo autocontrole. O autocontrole envolveria dois parâmetros principais: a magnitude do reforço e a latência da resposta. Optar por uma alternativa que leve à obtenção de uma recompensa de maior magnitude, porém atrasada, é optar pelo autocontrole. Por exemplo, um pombo diante de dois discos, um verde e outro vermelho, bicar no disco verde tem como consequência receber 8 g de alimento após 10 s, bicar o disco vermelho tem como consequência receber 2 g de alimento após 4 s, no primeiro caso temos a opção pelo "autocontrole", e no segundo, pela "impulsividade" (Rachlin, 2000, 1999 e Rachlin & Green, 1970).
Outro fator a se considerar é que o uso frequente de nicotina promove tolerância, isto é, doses cada vez maiores são necessárias para que ocorram os mesmos efeitos. Assim, por efeitos de condicionamento e tolerância, o fumante aumenta seu consumo de cigarros progressivamente.
Daqueles que abandonam o cigarro com sucesso, menos de 25% conseguem fazê-lo na primeira tentativa. A maioria dos indivíduos que fumam tem três a quatro fracassos antes de deixar definitivamente de fumar. Nos Estados Unidos, cerca de 45% daqueles que algum dia fumaram acabam abandonando o hábito. Os sintomas de abstinência podem começar em algumas horas após a cessação, tipicamente atingindo um pico em um a quatro dias, e podem durar até três ou quatro semanas. Os sintomas depressivos pós-cessação podem estar associados a uma recaída do hábito de fumar. O aumento da fome e o ganho de peso frequentemente persistem por pelo menos seis meses. Seis meses depois de parar, 50% dos indivíduos que deixaram de fumar relatam o desejo por um cigarro nas últimas 24 horas (American Psychiatric Association, 1995).
Avaliação do Fumante
Reichert et al. (2008) dizem que uma avaliação efetiva deve incluir os aspectos fisiológicos, psicológicos e sociais do paciente sempre que possível. Esta avaliação serve tanto como indicador para fornecimento da medicação mais adequada ao indivíduo, quanto para adequação das técnicas psicoterápicas. Os itens a serem avaliados são:
História tabagística: Idade de início, número de cigarros fumados por dia, tentativas de cessação, tratamentos anteriores com ou sem sucesso, recaídas e prováveis causas, sintomas de abstinência, exposição passiva ao fumo, formas de convivência com outros fumantes (casa/trabalho).
Teste de Fagerström para dependência à nicotina (FTND): Trata-se de um teste que mede o grau de dependência do fumante, sendo o mais utilizado no mundo para esta finalidade.
Grau de motivação: Modelo transteórico comportamental de Prochaska e DiClemente.
Sintomas físicos: Tosse, expectoração, chiado, dispneia, dor torácica, palpitações, claudicação intermitente, tontura e desmaios.
Investigação de comorbidades: Doenças passadas ou atuais que possam interferir no curso ou no manejo do tratamento: lesões orais, úlcera péptica, hipertensão arterial sistêmica, diabetes mellitus, cardiopatias, transtornos mentais, uso de álcool ou outras drogas, doenças respiratórias, epilepsia, acidente vascular encefálico, doenças dermatológicas, câncer, doença renal ou hepática, anorexia nervosa, bulimia, história de convulsão, entre outras.
Medicamentos em uso: Levantamento dos medicamentos que possam interferir no manejo do tratamento, como antidepressivos, inibidores da MAO, carbamazepina, cimetidina, barbitúricos, fenitoína, antipsicóticos, teofilina, corticosteróides sistêmicos, pseudo-efedrina, hipoglicemiante oral e insulina, entre outros.
Além dos aspectos citados, deve-se realizar a avaliação funcional do comportamento de fumar que permite identificar o contexto que antecede o ato de acender o cigarro e as consequências do fumar. Estas consequências podem incluir além do alivio dos sintomas de abstinência a presença de reforçadores positivos. O conhecimento de tais fatores ajuda na manutenção da abstinência e facilita o entendimento das causas de fumar (Axerold, 1991). Por exemplo, se um indivíduo usa o cigarro como um "relaxante" para enfrentar as demandas do trabalho, caso outra forma de obter este relaxamento não lhe seja ensinada, ou uma maneira de resolver os problemas do trabalho, ele poderá voltar a fumar ou se engajar em outro comportamento prejudicial, como beber álcool ou comer em excesso, por exemplo.
Tratamentos
Nos Estados Unidos (Fiore, Bailey & Cohen, 1995), na França (Le Foll, Cheinin, Rostoker & Largrue, 2005) e também no Brasil (Instituto Nacional do Câncer, 2001), o tratamento recomendado atualmente para o tabagismo é a terapia cognitivo-comportamental associada à reposição de nicotina e à bupropiona e mais raramente à nortripitilina (Fiori et al., 1995). Mais recentemente, a vareniclinan tem se mostrado a droga mais eficaz no tratamento do tabagismo (Alves, 2010).
A reposição de nicotina nas formas de goma de mascar, adesivo, spray e inalador (no Brasil apenas os dois primeiros estão à venda) contém uma pequena quantidade de nicotina que é absorvida pela boca ou pela pele, o que faz com que sua liberação seja lenta, diferentemente da fumada que é rapidamente absorvida. A bupropiona é um antidepressivo monocíclico, um inibidor, relativamente seletivo, da recaptura de catecolaminas (norepinefrina e dopamina), com mínimo efeito na recaptura de indolaminas (serotonina), e não inibindo a monoaminoxidase (MAO). O exato mecanismo de ação através do qual a bupropiona aumenta a capacidade dos pacientes em abster-se do ato de fumar é desconhecido. Presume-se que o mecanismo de ação da bupropiona seja mediado por mecanismos noradrenérgicos e/ou dopaminérgicos, minimizando os sintomas da abstinência nicotínica (Fiori et al., 1995).
Fiori et al. (1995), após a realização de metanálise com mais de 600 estudos, observaram que algumas técnicas cognitivo-comportamentais eram eficazes no tratamento do tabagismo, e as destacadas foram: terapia aversiva, relaxamento, solução de problemas, treino de habilidades e esvanecimento de nicotina (redução gradual do teor de nicotina do cigarro).
Porém, mais comum é o uso de pacotes com várias técnicas juntas, especialmente as relacionadas à prevenção da recaída (Marlatt & Donavan, 1993). Pode-se também destacar a "entrevista motivacional" que consiste em um conjunto de técnicas que podem ser utilizadas no momento anterior à parada, com objetivo de reduzir ambivalência de parar ou não de fumar (Miller & Rollnick, 2001).
A medicação tem vantagens, como fácil administração e boa taxa de cessação em curto prazo, porém obervam-se taxas elevadas de recaída em longo prazo. Além de não ser recomendada para todos os casos e ter efeitos colaterais, sobretudo a bupropiona e a nortripitilina. Fiori et al. (1995) apresentam taxas de abstinência após seis meses de cerca de 30% para bupropiona, 27% e 23% para o adesivo e goma de mascar de nicotina. As psicoterapias têm desvantagens em curto prazo, principalmente em relação à adesão ao tratamento e ao custo, porém em longo prazo reduzem o número de recaídas e não têm contraindicação. Carlson, Taenzer, Koopmans & Bultz (2000), avaliaram 971 participantes que passaram por oito sessões de terapia cognitivo-comportamental. Três meses após tratamento, 39,3% estavam sem fumar e, após nove anos, 47,7% dos participantes que pararam de fumar continuavam abstinentes.
Um programa de tratamento do tabagismo realizado no Brasil, no Ambulatório de Auxílio ao Abandono do Tabagismo da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, tinha o seguinte formato: os fumantes eram classificados conforme o grau de dependência à nicotina, recebendo diferentes formas de tratamento: a) dependência leve: terapia cognitivo-comportamental; b) dependência moderada: terapia cognitivo-comportamental e farmacoterapia (bupropiona 300mg/dia ou terapia de reposição de nicotina/TRN em doses decrescentes); c) dependência grave: terapia cognitivo-comportamental, bupropiona e TRN. Foram realizadas oito consultas (em intervalos semanais) para a fase inicial, perfazendo, com as etapas subsequentes, um período mínimo de seis meses de acompanhamento por um médico clínico, na maior parte das vezes, pneumologista. Os resultados mostraram que dos 124 pacientes que completaram o tratamento, 49,1% pararam de fu-mar (Haggstram et al., 2001).
Mesmo com a união dos tratamentos psicoterápico e medicamentoso, observam-se resultados variáveis com taxas de sucesso e fracasso. Porém, a maior dificuldade para o tratamento é seu custo elevado, que exclui o acesso da maior parte da população e onera os cofres públicos.
Os objetivos do estudo foram: avaliar a efetividade de um programa público de tratamento do tabagismo, constituído por sessões em grupo de psicoterapia cognitivo-comportamental associadas à reposição de nicotina e à bupropiona, e verificar a manutenção da abstinência após um, quatro e seis meses depois do tratamento nos participantes que pararam de fumar.
MÉTODO
Participantes e Local
Foram avaliados 109 fumantes com idade média de 42,9 anos, a maioria com 2.º grau completo, e fumando uma média de 21,6 cigarros por dia. Atendidos em um hospital público da cidade de Brasília, em sete diferentes grupos, durante o período de dois anos.
Procedimento
Em uma avaliação inicial, o paciente preenchia uma ficha de inscrição com dados pessoais, número médio de cigarros fumados por dia, e tinha sua pressão arterial aferida. Também, preenchia o Fagerström Nicotine Dependence Test, que é um instrumento de rastreamento para dependência física de tabaco, amplamente utilizado em diversos países. Suas propriedades psicométricas foram validadas no Brasil (Meneses-Gaya, Zuardi, Loureiro & Crippa, 2009).
Foi utilizado o manual para tratamento do tabagismo do Instituto Nacional do Câncer (INCA) (Ministério da Saúde, 1997). O programa é composto por quatro sessões de grupo, estruturadas. A primeira ressalta as causas do tabagismo, a ambivalência da parada, e os pensamentos e crenças que podem fazer com que o fumante adie a decisão de parar de fumar. Os participantes devem identificar as ocasiões onde o fumar é mais frequente e também escrever os prós e contras de parar de fumar. Por fim, são apresentados os métodos de parada abrupta ou gradual, e é solicitado que o fumante escolha um método e pare de fumar. A segunda aborda os sintomas da síndrome de abstinência dos primeiros dias sem fumar. São ensinadas estratégias de enfrentamento para se combater os sintomas de abstinência. São ensinadas ainda, técnicas de relaxamento e respiração abdominal. Também são discutidas as crenças disfuncionais sobre abstinência e sobre o pensamento construtivo. A terceira ressalta a importância de se recompensar por parar de fumar, buscar apoio social quando sentir que pode recair, e o problema da substituição do cigarro por outras adições, como comer em excesso e beber álcool. Há informações sobre como evitar o ganho de peso. Na quarta se enfoca os benefícios alcançados com a cessação e como evitar a recaída, são oferecidas "dicas" do que deve ser feito. Também é enfatizado que cada um tenha suas estratégias para os momentos difíceis.
As sessões de terapia cognitivo-comportamental ocorriam uma vez por semana, no total de quatro sessões. Participavam das sessões dois de quatro profissionais: psicólogo, médico, assistente social e enfermeiro. As sessões tinham a seguinte estrutura: uma parte inicial, em que o participante se apresentava e falava sobre seu consumo de cigarro ou como foi sua semana sem fumar, e uma parte final com instruções do manual. Também havia espaço para retirada de dúvidas e comentários. Os participantes eram encorajados a dar apoio e sugestões uns aos outros. As sessões tinham cerca de 20 participantes e duravam 90 minutos em média.
Conforme o grau de dependência, o paciente recebia apenas reposição de nicotina ou a reposição de nicotina associada à bupropiona.
a) Pacientes com escore do teste de Fagerström entre 5 a 7, e/ou fumante de 10 a 20 cigarros por dia e que fumam seu primeiro cigarro nos primeiros 30 minutos após acordar, utilizavam o seguinte esquema: semana 1 a 2: adesivo de 14 mg a cada 24 horas; semana 3 a 4: adesivo de 7 mg a cada 24 horas.
b) Pacientes com escore do teste de Fagerström entre 8 a 10, e/ou fumante de mais de 20 cigarros por dia, utilizavam o seguinte esquema: semana 1 a 2: adesivo de 21 mg a cada 24 horas; semana 3 a 4: adesivo de 14 mg a cada 24 horas; semana 5 a 6: adesivo de 7 mg a cada 24 horas. Bupropiona em comprimidos de 150 mg. Posologia: 1 comprimido de 150 mg pela manhã nos primeiros 3 dias de tratamento; 1 comprimido de 150 mg pela manhã e outro comprimido de 150 mg, oito horas após, a partir do 4º dia de tratamento, até completar 12 semanas.
Foi realizado contato telefônico com os participantes para verificação da manutenção da abstinência, porém diversas dificuldades ocorreram, como preenchimento errado dos dados pessoais, mudança de número de telefone, dificuldade em encontrar o participante e desconfiança de repassar informações por medo de se tratar de algum tipo de golpe. Estes fatos reduziram muito o tamanho da amostra, sendo possível avaliar apenas três grupos. Recomenda-se que o registro dos dados do paciente seja efetuado minuciosamente e que sejam solicitados, além do telefone do próprio paciente, mais dois telefones para recado, sendo um deles fixo, para se evitarem tais problemas.
RESULTADOS
Ao final do tratamento, 83,6% dos participantes que estiveram presentes às 4 sessões pararam de fumar e 16,4% estavam fumando. Houve uma taxa de desistência de 33,1%, isto é, 66,9% dos participantes chegaram ao final do tratamento (figura 1).
Foram avaliados três grupos de participantes para verificação da manutenção da abstinência, pois nos demais grupos a maior parte dos sujeitos não foi encontrada, e desta forma a medição não seria fidedigna. No primeiro grupo (G1), dos 11 participantes que iniciaram o grupo, 10 participantes terminaram o tratamento e todos estavam abstinentes. Após um mês a taxa de abstinência continuava em 100%. No segundo grupo (G2), dos 21 participantes que iniciaram o grupo, 18 terminaram o tratamento, sendo que 16 (88,8%) pararam de fumar. Após quatro meses a taxa de abstinência era de 43,8%. No terceiro grupo (G3), dos 18 participantes que iniciaram o tratamento, 14 chegaram à última sessão e, destes, 11 estavam abstinentes (78,5%). Após seis meses, 36,6% ainda estavam abstinentes (figura 2).
DISCUSSÃO
O estudo mostrou que um programa público de tratamento do tabagismo composto por psicoterapia breve associada à medicação pode promover uma alta taxa de cessação do fumo em curto prazo. Observou-se que 83,5% dos participantes pararam de fumar ao fim das quatro sessões. Este número é superior a alguns estudos realizados no Brasil e no exterior.
Haggstram et al. (2001) utilizando procedimento semelhante ao empregado no atual estudo, mas com maior número de sessões, verificou que após o tratamento 49,1% dos pacientes estavam abstinentes.
Azevedo et al. (2009) avaliaram 171 pacientes atendidos em um ambulatório especializado em dependência química. O tratamento consistia em grupos terapêuticos, com sessões semanais e medicação com reposição de nicotina, bupropiona e nortriptilina. Os resultados mostraram que 79,1% dos participantes pararam de fumar e, após 25 meses, 62% continuavam abstinentes.
Meier, Vannuchi e Secco (2011) avaliaram a eficácia de um programa de tratamento do tabagismo baseado no manual de tratamento do INCA. Participaram do programa 92 pacientes. Ocorreram quatro sessões de terapia cognitivo-comportamental e 88,8% dos pacientes também utilizaram farmacoterapia. Após o tratamento 66,6% dos participantes estavam sem fumar e houve uma taxa de desistência de 23,8%.
Sales, Figueiredo, Oliveira e Castro (2006) avaliaram um programa público de tratamento do fumante também baseado nas diretrizes estabelecidas pelo INCA, cujo tratamento consistia em sessões de terapia cognitivo-comportamental, combinado com bupropiona e goma de nicotina. Como resultado, verificaram que dos 320 pacientes atendidos, 50,8% atingiram o sucesso terapêutico ao final do programa de quatro sessões e, após um ano, apenas 17,8% recaíram.
A tabela 1 apresenta um comparativo dos estudos supracitados realizados no Brasil em programas públicos de atendimento ao fumante.
As pesquisas realizadas em serviços de atendimento, por se tratarem de avaliações de tais programas, costumam não apresentar o rigor metodológico necessário para conclusões efetivas sobre os melhores métodos para abandono do tabagismo. Em geral, os dados de abstinência são apresentados em conjunto, pacientes que fazem apenas psicoterapia, pacientes que combinam psicoterapia e reposição de nicotina ou bupropiona, ou ainda as três formas de tratamento. Dessa forma, não se pode afirmar com certeza qual das alternativas terapêuticas é a mais eficaz ou diferenças entre um método isolado e a combinação dos mesmos. Apesar de tal ressalva, pode-se observar que todos os estudos citados apresentaram taxas de abstinência próximas de 50% ou acima disto. Desse modo, observa-se que as intervenções promovem algum efeito, mas não se sabe em função de quais variáveis.
Porém, não se deve esquecer do grande número de abandonos dos programas de tratamento. Torna-se necessário buscar alternativas para evitar tal situação, como marcar horários adequados à clientela a ser atendida, ligar para o paciente para avisá-lo da sessão, enfatizar e motivar o paciente a comparecer a todas as sessões de tratamento, distribuir o medicamento apenas em quantidade suficiente para uma semana e promover extenso treinamento aos profissionais que venham a participar dos programas de tratamento.
Deve-se ressaltar a participação de diversos profissionais nas equipes responsáveis pelo tratamento, como psicólogos, médicos, enfermeiros, farmacêuticos, nutricionistas e assistentes sociais, o que é um exemplo de bom funcionamento de equipe multiprofissional no serviço público de saúde e pode ser o diferencial para o sucesso dos programas terapêuticos.
O tabagismo constitui-se na maior causa de morte evitável no mundo, e esforços de prevenção e tratamento têm sido realizados na rede pública de saúde. Verificou-se que estes programas são efetivos na cessação do fumo. Porém, dificuldades de acesso à medicação e de recursos humanos qualificados para atender esta clientela ainda são graves no país. Espera-se que a divulgação de experiências bem sucedidas como a do presente estudo sirvam para aumentar e melhorar o tratamento oferecido a população.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Alves, L. B (2010). Avaliação da eficácia da varenicline na cessação do tabagismo Dissertação de mestrado. Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre - RS. [ Links ]
American Psychiatric Association. (1995). Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais - DSM IV, (4ª ed.). Porto Alegre: Artes Médicas. [ Links ]
Axerold, S. Smoking cessation through functional analysis (1991). Journal of Applied Behavior Analysis, 24(1),717-719. [ Links ]
Azevedo, R. C. S., Higa, C. M. H., Assumpção, I. S. M. A., Frazzato, C. R. G., Fernandes, R. F., Goulart, W. et al., (2009). Grupo terapêutico para tabagistas: resultados após seguimento de dois anos. Revista da Associação Médica Brasileira 55(5),593-596. [ Links ]
Catania, C. C. (1999). Aprendizagem: Comportamento, linguagem e cognição. 4 ed. Porto Alegre: ARTMED. [ Links ]
Carlson, L. E., Taenzer, P, Koopmans, J & Bultz, B. D. (2000). Eight year follow-up of a community-based large group behavioral smoking cessation intervention. Addictive Behaviors, 25(5),725-741. [ Links ]
Daut, A. W. (2006). Aspectos epidemiológicos do tabagismo. In: Focchi, G. R. A., Malbergier, A., Ferreira, M. P., (Orgs). Tabagismo dos fundamentos ao tratamento (pp.25-48). São Paulo: Lemos. [ Links ]
Fiore M. C., Bailey W. C. & Cohen S. J. (1996). Smoking cessation. Clinical Practice Guideline, 18. Rockville (Md): U. S., Department of Health and Human Services, Public Health Service, Agency for Health Care Policy and Research. [ Links ]
Haggstarm, F. M., Chatkin, J. M., Cavalet-Blanco, D., Rodin, V. & Fritscher, C. (2001). Tratamento do tabagismo com bupropiona e reposição nicotínica. J. Pneumologia, 2(5),265-261. [ Links ]
Instituto Nacional do Câncer (INCA) (2001). Abordagem e Tratamento do Fumantes - Consenso. Rio de Janeiro: INCA. [ Links ]
Le Foll, B.; Cheinin, P. M.; Rostoker, G. & Largrue, G. Smoking Cessations Guidelines. Evidence Based Recommendations of French Health Products Safety Agency (2005). European Psychiatry, 20(5-6),431-441. [ Links ]
Marlatt, G. A. & Donavan, D. M. (1993). Prevenção da recaída. Estratégias de manutenção no tratamento de comportamentos adictivos. Porto Alegre: Armed. [ Links ]
Meier, D. A. P., Vannuchi, M. T. O. & Secco, I. A. O. (2011). Abandono do tratamento do tabagismo em programa de município do norte do Paraná. Revista Espaço para Saúde, 13(1),35-44. [ Links ]
Meneses-Gaya, I. C., Zuardi, A. W., Loureiro, S. R. & Crippa, J. A. S. (2009). As propriedades psicométricas do Teste de Fagerström para Dependência de Nicotina Jornal Brasileiro de Pneumologia. 35(1),73-82. [ Links ]
Miller, W. R. & Rollnick, S. (2001). Entrevista Motivacional: Preparando as pessoas para a mudança de comportamentos adictivos. Porto Alegre: Artes Médicas. [ Links ]
Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde (2012). Vigitel Brasil 2011: vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico. Brasília: Ministério da Saúde. [ Links ]
Ministério da Saúde (1997). Manual do coordenador. Deixando de fumar sem mistérios. Rio de Janeiro: Ministério da Organização mundial da saúde (OMS) (2011). Global status report on noncommunicable diseases 2010. Geneva: WHO, 2011. Disponível em: http://www.who.int/nmh/publications/ncd_report2010/en/ [recuperado em 21/10/2012] [ Links ].
Organização Mundial de Saúde (OMS) (2007). Classificação estatística internacional de doenças e problemas relacionados á saúde. 10 ed rev. São Paulo: EDUSP. [ Links ]
Pinto, M. (2008). Tabagismo um mal a saúde e aos cofres públicos. Rio de Janeiro: Instituto Nacional do Câncer (INCA) Disponível em http://www.inca.gov.br/revistaredecancer/revista_rede_cancer_5/entrevista.pdf [recuperado em 23/08/2009] [ Links ].
Rachlin, H. (2000). The science of self-control. New York: Harvard University Press. [ Links ]
Rachlin H, Raineri A & Cross D (1991). Subjective probability and delay. Journal of the Experimental Analysis of Behavior, 55,233-244. [ Links ]
Rachlin, H. & Green, L. (1970). Commitment, choice and self-control. Journal of Experimental Analysis of Behavior, 17(1),15-22. [ Links ]
Reichert J., Araújo A. J., Gonçalves C. M. C., Godoy I, Chatkin J. M., Sales M. P. U., Santos, S. R. R. A. et al. (2008). Diretrizes para a cessação do Tabagismo - Abordagem de grupos específicos. Jornal Brasileiro de Pneumologia, 34(10),859-869. [ Links ]
U. S. Department of Health and Human Services (1998). The health consequences of smoking: nicotine addiction. A report of the Surgeon General Public Health Service. Rockville: Office on Smoking and Health. [ Links ]
Sales, M. P. U., Figueiredo, M. R. F., Oliveira, M. I. & Castro, H. N. (2006). Ambulatório de apoio ao tabagista no Ceará: perfil dos pacientes e fatores associados ao sucesso terapêutico. Jornal Brasileiro de Pneumologia, 32(5),410-417. [ Links ]
Skinner, B. F. (2003). Ciência e comportamento humano. São Paulo: Martins Fontes. [ Links ]
Recebido em 23 de julho de 2012
Revisado em 24 de outubro de 2012
Aceito em 8 de fevereiro de 2013