Servicios Personalizados
Revista
Articulo
Indicadores
Compartir
Psic: revista da Vetor Editora
versión impresa ISSN 1676-7314
Psic v.5 n.2 São Paulo dic. 2004
ARTIGOS
Habilidades visoconstrutivas de crianças com queixa escolar submetidas ao psicodiagnóstico
Visual motor constructive skills of children with school difficulties complaints submitted to psicodiagnosis
Ida Janete Rodrigues I, 1; Elizeu Coutinho de Macedo II, 2
I Universidade Paulista
II Universidade Presbiteriana Mackenzie
RESUMO
O trabalho descreve o desempenho em prova de habilidade visoconstrutiva do Teste Gestáltico Bender de pacientes encaminhados para o Centro de Diagnóstico de uma Instituição para Deficientes Mentais. Foram analisados 90 protocolos com avaliação psicológica que continham os resultados do teste Bender e da Escala Terman-Merrill. Os pacientes foram divididos em dois grupos: Encefalopatias Crônicas Infantis Não-Evolutivas e distúrbios comportamentais ou emocionais. Os resultados mostram que o desempenho no Bender dos pacientes avaliados, como era previsto, foi significativamente abaixo do esperado para a população. Foram observadas correlações significativas entre o nível de inteligência e o desempenho no teste Bender (r = 0,565). Análises de variância indicam que o desempenho do grupo com ECINE foi inferior ao de pacientes com distúrbios comportamentais para: Nível de Inteligência, Bender Total e Bender Corrigido. Análise da freqüência de ocorrência dos erros dos 30 fatores de Koppitz mostra que Integração (fator 8), Ângulos Incorretos (21b) e Rotação (22, 13, 16 e 11) foram os que mais ocorreram. Por outro lado, Linha Reta (18b), Perda de Forma (17a) e Perseveração (9) foram que os sujeitos mais acertaram. Os fatores que melhor discriminaram os sujeitos com ECINE dos demais foram: 12a, 12b, 13, 17b e 18b.
Palavras-chave: Bender, Avaliação neuropsicológica, Dificuldade de aprendizagem, Deficiência mental.
ABSTRACT
Test, of patients sent to the Diagnostic Centre of the Institution for Mentaly Disabled. The protocols of 90 children with learning difficulties complaints were analysed. The patients were grouped with regard to presence of detectable encephalopathies or behavioral/emotionals problems. Results indicate that the performance of the evaluated patients in the Bender test was significantly below the score expected for average population. Significant correlation between the level of intelligence and the performance in the Bender test has been observed (r=0,565). Analyses of variance indicate that the performance of the group with chronic encephalopathy was inferior to the one of patients with behavioral problems mainly for: Level of Intelligence, Total Bender Score and Corrected Bender Score. Analysis of the frequency of error occurrence of the 30 factors of Koppitz showed that: Incorrect Integration (factor 8), Angles (21b) and Rotation (22, 13, 16 and 11) have occurred with greater frequency. On the other hand, Straight Line (18b), Form Deterioration (17a) and Perseveration (9) were the most correctly executed by the evaluated subjects.
Keywords: Bender Test, Neuropsychological assessment, Learning disability, Mentaly disabled.
Introdução
Quando a criança tem dificuldades de aprendizagem, espera-se que a família e a escola se mobilizem e procurem respostas que possam justificar o baixo desempenho acadêmico apresentado. No entanto, nem sempre é fácil identificar o evento causador dos possíveis fracassos. Os transtornos específicos de aprendizagem devem ser diferenciados das variações normais do rendimento escolar, bem como das dificuldades em virtude da falta de oportunidades, do ensino ineficiente e de fatores culturais ou ainda de um prejuízo geral no funcionamento intelectual.
No processo de diagnóstico, o psicólogo deve identificar os elementos específicos das funções cognitivas, fatores emocionais e socioeducacionais intervenientes no aprendizado. No entanto, raramente um único profissional tem capacidade de distinguir todos esses elementos na avaliação, necessitando de apoio de uma equipe multidisciplinar com condições técnicas para o diagnóstico diferencial, inclusive da deficiência mental.
De acordo com Krinski et al. (1983), a deficiência mental é um vasto complexo de quadros clínicos, produzidos por várias etiologias e que se caracteriza pelo desenvolvimento intelectual insuficiente, em termos globais ou específicos, podendo ou não ser acompanhada de manifestações patológicas
Diament e colaboradores (1996) indicam que as principais causas da deficiência mental estão ligadas às situações: pré, peri e pós-natais. Os autores referem ainda que as doenças orgânicas que comprometem a função cognitiva e/ou motora também podem ser conhecidas como Encefalopatias Crônicas Infantis (ECI). As ECIs podem ser de dois tipos com relação a evolução do quadro clínico: Encefalopatia Crônica Infantil Não-Evolutiva (ECINE) ou Encefalopatia Crônica Infantil Evolutiva (ECIE). Os termos "evolutivo" e "não-evolutivo" são empregados para indicar se a lesão anatomopatológica é progressiva ou não progressiva.
Segundo o DSM-IV-TR (American Psychiatric Association, 2002), os critérios para o diagnóstico da DM são: 1) funcionamento intelectual significativamente inferior à média; 2) déficits ou prejuízos concomitantes no funcionamento adaptativo atual; 3) início inferior aos 18 anos. É importante ressaltar que, segundo estimativa da Organização Mundial de Saúde (1999), a Deficiência Mental Leve (DML) corresponde a 85% das pessoas com QI entre 55 e 70.
Como as crianças com deficiência mental leve apresentam atraso discreto no desenvolvimento neuropsicomotor, o diagnóstico nem sempre é feito na primeira infância (0 a 2 anos). As dificuldades, via de regra, só são percebidas nos primeiros anos escolares, pois essas crianças não conseguem acompanhar a programação escolar comum. As dificuldades nas primeiras séries são freqüentes, principalmente na leitura, na escrita e nos cálculos aritméticos que envolvem maior complexidade (Shaloch, 1999).
Além de dificuldades acadêmicas, crianças com discreto rebaixamento cognitivo (DML) apresentam muitas vezes fracasso da organização visomotora. Observa-se que a produção gráfica tende a ser desorganizada, rompida, suja e com falhas na organização da forma. Em algumas situações nota-se ainda, uma falta de organização, de coerência e de movimento harmônico. Um dos mais importantes instrumentos para avaliação das habilidades visoconstrutivas é o Teste Gestáltico de Bender (Machado, 1978).
Estudos com o Teste Bender vêm sendo conduzidos no Brasil desde a década de 1950 com diferentes enfoques clínicos e educacionais. Entretanto, somente a partir da década de 80 é que começaram os estudos que se preocuparam em criar dados normativos para as crianças brasileiras. Esses estudos, em geral, utilizam o critério de Koppitz para correção (Koppitz, 1974; Rodrigues, 2004).
Os estudos e a criação de normas do Teste Bender para a população brasileira são mais recentes e conduzidos principalmente com base nos critérios de Koppitz (Brito, Alfradique, Pereira, Porto & Santos, 1988; Kroeff, 1988, 1992; La Puente & Maciel Jr., 1984; Pinelli Jr & Pasquali, 1992). No entanto, diferentes críticas têm sido feitas ao sistema de classificação de Koppitz. La Puente & Maciel Jr. (1984) assinalam que o sistema de avaliação Koppitz (Escala Maturacional) foi elaborado sem levar em consideração os aspectos psicopatológicos do examinado, tornando questionável seu poder diagnóstico dos aspectos neurológicos.
Pinelli Jr. e Pasquali (1992) aplicaram o Bender em 620 crianças entre 6 e 11 anos divididas em dois grupos de nível socioeconômicos distintos: classes alta e baixa. Por meio de análise fatorial para a validação do constructo, evidenciou-se uma estrutura multifatorial do Bender (quatro fatores), contrapondo-se à análise unifatorial do sistema de apuração de Koppitz. Os quatro fatores apresentados revelaram baixa consistência interna, merecendo novas pesquisas. Por outro lado, a análise da escala de Koppitz com seus 30 itens também evidenciou problemas naquele estudo, uma vez que alguns itens podem ser eliminados sem prejuízo para a avaliação. Eliminando esses itens, construíram uma escala Bender-Reduzido (BR) com 22 itens. Vale acrescentar que também fizeram análises concorrentes com o Raven Infantil, comprovando elevados níveis de correlação entre eles.
Kroeff (1988, 1992) elaborou normas com base em uma amostra de 1086 crianças de 54 escolas dos sistemas de ensino público e particular da cidade de Porto Alegre (RS). Verificou nesse estudo que, comparando as crianças brasileiras com as norte-americanas, as brasileiras apresentaram um duplo déficit, precisando em geral de um tempo superior para alcançar um desempenho inferior. Para recuperar esse duplo déficit, o autor propõe que seja dada ênfase aos programas de treino percepto-motor das crianças na educação pré-escolar. Concluiu, portanto, que o Bender está sujeito à influência cultural, diferentemente do que indicam os estudos de Bender (1955), Koppitz (1987) e Hutt (1975).
Outro estudo conduzido para obtenção de dados normativos para o Teste Bender foi feito no final da década de 90. Brito e colaboradores (1998) conduziram avaliações neuropsicológicas em 398 crianças de escola pública do Rio de Janeiro usando, entre outros instrumentos, o Teste de Bender. As crianças deveriam desenhar a partir da memória e não fazer cópia como nas aplicações tradicionais. Os resultados obtidos com base no critério de Koppitz indicam que o desempenho no teste foi sensível ao gênero e à idade. Além disso, a comparação dos resultados obtidos com os das crianças americanas mostrou desempenho significativamente inferior das crianças brasileiras. Em função dessa discrepância, os autores apontam para a necessidade de mudanças, principalmente, no sistema de escola pública brasileira, que apresenta falhas para suprir o desenvolvimento das habilidades cognitivas secundárias de nossas crianças.
Nos últimos anos, observa-se um aumento significativo na utilização dos critérios desenvolvidos por Koppitz para a correção dos resultados. Esses estudos, em sua grande maioria, foram conduzidos com escolares sem queixa de dificuldade escolar e, mais raramente, com crianças com suspeita de dano cerebral. Neste último caso, a análise do padrão de respostas das crianças e a busca de causas orgânicas é ainda mais raro. Assim, análises mais detalhadas do padrão de respostas aos itens levantados por Koppitz merecem mais estudos. Além disso, no processo de avaliação diagnóstica, raramente é usado um único instrumento, pois fatores emocionais e comportamentais são levados em conta. Assim, testes específicos de avaliação, incluindo o visomotor e de inteligência têm sido amplamente empregados. Diferentes estudos indicam a existência de correlações significativas entre os testes tradicionais de inteligência e o Teste Bender corrigido de acordo com os critérios de Koppitz (Bandeira & Hutz, 1994; Brito & Santos-Morales 2002; Koppitz, 1987; Pereira, 1997; Pinelli Jr. & Pasquali, 1992; Wood, Carnalho, Rothe-Neves & Haase, 2001).
Em suma, o objetivo deste artigo é descrever o perfil socioeducacional e avaliar o padrão de desempenho em prova de habilidade visomotora por meio do teste Gestáltico Bender de pacientes com queixa escolar encaminhados para o Centro de Diagnóstico de uma Instituição para Deficientes Mentais em São Paulo. O desempenho foi analisado em função de idade, sexo, nível intelectual e hipótese diagnóstica.
Método
Sujeitos
Foram selecionados 90 sujeitos com idade variando de 7 a 14 anos, encaminhadas com queixa de dificuldade escolar para avaliação multidisciplinar no Centro de Diagnóstico de uma Instituição para Deficientes Mentais em São Paulo. Foram incluídos apenas os protocolos de pacientes que apresentassem o resultado do Teste Bender e da Escala Terman-Merrill (Terman & Merrill, 1975). Os sujeitos foram divididos em dois grupos, sendo um formado por sujeitos diagnosticados com Encefalopatia Crônica Infantil Não-Evolutiva (ECINE) e outro sem alteração orgânica identificada, mas cujos sujeitos apresentassem alterações comportamentais ou emocionais.
Instrumentos
Foram utilizados como instrumentos de pesquisa, os protocolos com avaliação psicológica que continham os resultados do teste Bender (Koppitz, 1987) e da Escala Terman-Merrill. O protocolo-padrão da instituição contém informações de identificação do paciente e dos familiares ou responsáveis. Informa ainda dados de anamnese, resultados das avaliações multidisciplinares, hipótese diagnóstica e encaminhamento.
Procedimentos
No presente estudo, os protocolos foram selecionados do arquivo da instituição, e seu uso foi devidamente autorizado pela coordenação. Foi realizado o levantamento de todos os protocolos das avaliações conduzidas pela autora deste trabalho entre outubro de 2000 e setembro de 2003. Com base na seleção dos protocolos, foi feita a tabulação dos dados referentes à idade, ao sexo, ao grau de escolaridade, aos encaminhamentos, à classificação socioeconômica, hipótese diagnóstica, aos problemas de conduta, ao QI e a observações adicionais dos pacientes selecionados.
As análises quantitativas e qualitativas dos 90 testes Bender foram realizadas segundo o critério de Koppitz. Todas as análises foram conduzidas pela autora do presente trabalho. Além disso, uma estudante de psicologia conduziu análises paralelas. O índice de concordância entre os dois avaliadores foi significativamente alto (0,97).
Os dados de identificação e socioeducacionais foram analisados em função de: gênero, idade, escolaridade, nível econômico, tipo e condição de parto, hipótese diagnóstica e grau de inteligência.
As variáveis dependentes consideradas nas análises inferenciais foram: QI obtido com base na escala Terman-Merrill, Pontuação Total no Bender (Bender Total) e Pontuação Corrigida no Bender (Bender Corrigido). Essa última medida foi obtida com a identificação da idade esperada para a pontuação e, em seguida, foi atribuído um ponto para cada faixa etária especificada pelos dados normativos até a idade cronológica do sujeito. Por exemplo, uma criança de 8 anos e 8 meses com pontuação equivalente a de outra entre 6 e 6 anos e meio obteve 5 pontos, pois existem 5 faixas etárias diferentes correspondentes a cada 6 meses. Portanto, quanto maior a pontuação, maior será a discrepância e pior desempenho.
Foi feita análise dos 30 itens de Koppitz a fim de identificar aqueles que melhor distinguem os sujeitos com relação ao grau de deficiência mental. Foi utilizado o software SPSS 11.5.
Resultados
Análise descritiva dos dados socioeducacionais dos protocolos analisados mostram que 74% eram meninos (N = 67) e 26% meninas (N = 23). A idade média dos sujeitos foi de 10,33 anos (dp = 2,15), sendo 13 na 1ª série; 12 na 2ª; 12 na 3ª; 25 na 4ª; 21 a partir da 5ª e uma criança em escola especial. Com relação ao nível socioeconômico, 37 eram carentes, 35 classe média inferior e 18 classe média segundo caracterização da Assistente Social. Com relação ao tipo de parto, 58 sujeitos tiveram parto normal e o restante cesárea. Das crianças que nasceram 44 foram a termo e 29 pré-termos.
Quanto à Hipótese Diagnóstica, 33 sujeitos foram diagnosticados como tendo ECINE, 50 com dificuldade comportamental ou emocional, 6 com epilepsia e 1 com meningite pregressa. A principal fonte de encaminhamento foi composta de profissionais da área de saúde (34), escola (34) e os próprios pais (22).
As análises foram conduzidas com relação a gênero, idade, escolaridade, nível econômico, tipo e condição de parto, hipótese diagnóstica e grau de inteligência em função do QI, Bender Total e Bender Corrigido.
A Correlação de Pearson entre as três medidas foram significativas (p = 0,000). A correlação do QI com o Bender Total e o Bender Corrigido foi negativa (r = -0,565 e r = -0,375, respectivamente). A correlação entre o Bender Total e o Corrigido foi positiva (r = 0,378).
Não foram observadas diferenças significativas entre meninos e meninas para QI, Pontuação Total e Corrigida no Bender. A Tabela 1 resume os resultados para meninos e meninas para as três variáveis observadas.
A pontuação no Bender Total variou em função da idade (F[7,82] = 2,508, p = 0,022). Análises Post Hoc indicam desempenho inferior das crianças de 7 anos quando comparadas com as de 10, 11, 12 e 14 anos. Pacientes com 14 anos de idade pontuaram mais do que os de 7, 8, 9, 10 e 11 anos de idade. Não foi encontrada diferença significativa para o Bender Corrigido e nem para o QI.
No entanto, quando foram considerados os anos de escolaridade, foram observadas diferenças significativas apenas para o QI (F[7,80] = 2,376, p = 0,025) e para o Bender Total (F[7,80] = 5,380, p = 0,000). Análise Post Hoc da Pontuação Total no Bender indica que sujeitos com um e dois anos de escolaridade apresentaram desempenho significativamente inferior aos demais. À medida que os anos de escolaridade aumentam, a diferença na pontuação no Bender Total diminui. A análise Post Hoc da pontuação total no Bender indica que sujeitos com oito anos de escolaridade apresentaram pontuação significativamente maior que aqueles com dois, quatro e sete anos de escolaridade.
O nível socioeconômico explica a diferença de pontuação de QI (F[2,84] = 4,070, p = 0,020), mas não do desempenho no Bender. O desempenho dos participantes carentes foi significativamente menor que os da classe média inferior, e este menor que o da classe média.
Crianças que nasceram de parto normal ou cesárea não diferiram. Já com relação à condição do parto, foi encontrada diferença significativa entre as que nasceram a termo e pré-termo (F[1,84] = 10,749, p = 0,002). O desempenho no Teste Bender das nascidas prematuramente foi inferior em cerca de um ano e meio.
Foram observadas diferenças entre pacientes diagnosticados com ECINE daqueles diagnosticados como tendo problemas comportamentais e emocionais para: QI (F[1,83] = 15,610 , p = 0,000), Bender Total (F[1,83] = 4,357, p = 0,040) e Bender Corrigido (F[1,83] = 5,195, p = 0,025). A Tabela 2 resume a pontuação obtida em função da Hipótese Diagnóstica nas provas: Terman-Merrill, Bender Total e Bender Corrigido. Observa-se que os sujeitos diagnosticados com ECINE tiveram desempenho inferior, pois apresentaram em média diferença de 10 pontos para o QI, 1 ponto para o Bender Total e um ano e meio para o Bender Corrigido.
A análise da freqüência de ocorrência dos erros dos 30 itens de Koppitz mostra que Integração (fator 8), Ângulos Incorretos (21b) e Rotação (22, 13, 16 e 11) foram os que mais ocorreram. Por outro lado, Linha Reta (18b), Perda de Forma (17a) e Perseveração (9) foram os itens que os sujeitos mais acertaram. A Tabela 3 resume os 30 itens em ordem decrescente do número de ocorrências incorretas.
A Correlação de Pearson conduzida entre os 30 fatores mostra que os itens 21b e 24 apresentam as maiores freqüências de correlações. Já o item 8, o mesmo que os sujeitos mais erraram, não apresenta correlação com nenhum outro item.
A fim de identificar os itens que melhor discriminam sujeitos diagnosticados com ECINE dos demais, ANOVA unifatorial foi conduzida com os 30 itens do teste Bender. Diferenças significativas foram observadas para os fatores 12a (F[1,58] =5,604, p=0,020), 12b (F[1,58] = 10,023, p = 0,002), 13 (F[1,58] = 15,020, p = 0,000), 17b (F[1,57] = 6,016, p = 0,016) e 18b (F[1,58] = 5,007, p = 0,027).
Discussão
A proporção maior de indivíduos com queixa escolar encaminhada para avaliação diagnóstica pode ser explicada tanto em função de efeitos ambientais quanto estruturais. As explicações ambientais apontam, por exemplo, para fatores presentes em uma cultura que exige desempenho diferenciado de meninos e meninas. Halpern (1997) indica que as meninas superam os meninos nos testes de fluência verbal, língua estrangeira, habilidades motoras finas, articulação da pronúncia, escrita, leitura e raciocínio matemático. Os meninos mostram melhor desempenho que as meninas em tarefas mentais de rotação de imagens, raciocínio mecânico, conhecimento matemático e analogia verbal. Dessa forma, pode-se observar que as tarefas em que as meninas apresentam um desempenho melhor são precisamente aquelas que a escola em geral mais utiliza e valoriza.
Com relação aos anos de escolaridade, observa-se melhora de desempenho nos Teste Bender. Esse resultado parece estar relacionado com o fato de essas crianças se beneficiarem do ensino formal.
No presente estudo foi encontrada correlação significativa entre o QI obtido com a escala Terman-Merrill com o Teste Bender. Esses resultados estão de acordo com os encontrados por pesquisadores que usaram outros testes de inteligência (Bandeira & Hutz, 1994; Pinelli Jr. & Pasquali, 1992; Popovic et al., 1969). Assim, o desempenho no teste Bender e as provas da escala TM parecem apresentar elementos em comum. Além disso, a utilização dos critérios de Koppitz para a correção do Bender pode ter contribuído para as altas correlações observadas.
Embora Kroeff (1988, 1992) tenha indicado que o Bender está sujeito à influência cultural, no presente estudo a diferença de QI observadas em função do nível socioeconômico foi maior que a do teste Bender. Dessa forma, a Escala Terman-Merrill parece ser ainda mais sensível aos elementos da cultura e instrução formal que o Bender. Como os sujeitos encaminhados para avaliação foram em sua maioria de classe social baixa, deve-se buscar instrumentos de avaliação mais precisos e pouco sensíveis a variabilidades socioeconômicas. Entre esses instrumentos destacam-se aqueles que procuram avaliar funções cognitivas específicas (Lezak, 1995).
Os resultados revelaram que crianças nascidas prematuramente apresentaram discrepância maior em termos de idade do que aquelas nascidas a termo. Ou seja, embora os dois grupos tenham apresentado desenvolvimento defasado quando comparadas com os grupos de crianças de Porto Alegre (Kroeff, 1988), as que nasceram prematuramente foram mais sensíveis ao Teste Bender. Magalhães e colaboradores (2003) conduziram estudo comparativo sobre o desempenho perceptual e motor em crianças nascidas pré-termo e a termo. Mesmo as autoras tendo selecionado apenas as crianças que não apresentavam queixas de dificuldade de aprendizagem, os resultados mostram que as crianças prematuras obtiveram desempenho inferior na grande maioria dos teste (no caso, o Bender, acuidade motora, equilíbrio estático e tônus postural).
A maior freqüência de erros para Integração (fator 8), Ângulos Incorretos (fator 21b) e Rotação (fatores 22, 13, 16 e 11), encontrada no presente estudo, parece indicar que esses itens podem ser decisivos no desempenho no Teste de Bender. Por outro lado, Linha Reta (18b), Perda de Forma (17a) e Perseveração (9) foram os que sujeitos mais acertaram e, portanto, parecem ser menos discriminativos para a apresentação de dificuldade de aprendizagem.
Tanto a pontuação no Bender Total quanto no Corrigido discriminaram os sujeitos diagnosticados como ECINE daqueles diagnosticados com alterações comportamentais e emocionais. Entretanto, os itens Perda de Forma (12a), Pontos por Linha (12b e 17b), Rotação (13) e Linha Reta (18b) foram os que melhor discriminaram os dois grupos.
Conclusão
Neste estudo, podemos concluir que o desempenho no Teste Bender de crianças com queixas de dificuldades de aprendizagem, encaminhadas para avaliação foi significativamente abaixo do esperado para a população. A alta correlação entre o Teste Bender corrigido, com os critérios de Koppitz e a escala Terman-Merrill, parece indicar que o critério de correção adotado mostrou-se adequado. Além disso, os resultados do teste discriminaram os sujeitos com hipótese diagnóstica de dano orgânico daqueles com alterações comportamentais.
Referências
American Psychiatric Association (2002). Manual de diagnóstico e estatístico de transtornos mentais DSM IV - TR-TM (4ª ed.). Porto Alegre, RS: Artes Médicas. [ Links ]
Bandeira, D. R., & Hutz, C. S. A. (1994). Contribuição dos testes DFH, Bender e Raven na predição do rendimento escolar na primeira série. Revista de Psicologia: Teoria e Pesquisa, 10(1), 59-72. [ Links ]
Bender, L. (1955). Teste gestáltico visomotor: Usos y aplicaciones clínicas. Buenos Aires: Paidós. [ Links ]
Brito, G. N. O., & Santos-Morales, T. (2002). Developmental norms for the Gardner Steadiness Test and the Purdue Pegboard: A study with children of a metropolitan school in Brazil. Brazilian Journal of Medical and Biological Research, (35), 931-949. [ Links ]
Brito, G. N. O., Alfradique, G. M. N., Pereira, C. S., Porto, C. M. B., & Santos, T. R. (1988). Developmental norms for eight instruments used in the neuropsychological assessment of children: Studies in Brazil. Brazilian Journal of Medical and Biological Research, (31), 399-412. [ Links ]
Diament A. et al. (1996). Neurologia infantil (3ª ed.). São Paulo: Atheneu. [ Links ]
Halpern, D. F. (1997). Sex differences in intelligence: Implications for education, American Psychology, 52(10), 1091-102. [ Links ]
Hutt, M. (1975). Tests of personality. Picture and drawing techniques C.: Revised Bender Visual-Motor Gestalt Test. In A. Weider, Contributions toward medical psychology. New York: Ronald Press. [ Links ]
Koppitz, E. M. (1987). O Teste Gestáltico Bender para crianças. Porto Alegre, RS: Artes Médicas. [ Links ]
Krinski, S. et al. (1983). Novos rumos da deficiência mental. São Paulo: Sarvier. [ Links ]
Kroeff, P. (1988). Normas brasileiras para o teste de Bender. Psicologia: Reflexão e Crítica, (3), 10-17. [ Links ]
Kroeff, P. (1992). Desempenho de crianças no teste de Bender e nível sócio-econômico-cultural. Psicologia: Reflexão e Crítica, 5(2), 119-126. [ Links ]
La Puente, & Maciel Jr. (1984). Procedimentos operacionais na avaliação do teste de Bender infantil. Estudos de Psicologia, (3/4), 77-91. [ Links ]
Lezak, M. D. (1955). Neuropsychological assessment (3rd ed.). New York: Oxford University Press. [ Links ]
Machado, M. C. L. (1978). Uso do teste de Bender para avaliar a organização perceptivo-motora de escolares paulistas. Dissertação de Mestrado, Faculdade de Psicologia da PUC-SP, São Paulo. [ Links ]
Magalhães, L. C. et al. (2003). Estudo comparativo sobre o desempenho perceptual e motor na idade escolar em crianças nascidas pré-termo e a termo. Arquivo de Neuropsiquiatria, 61(2-A), 250-250. [ Links ]
Pereira, M. P. (1997). A influência da pré-escola na aprendizagem da leitura e escrita e sua relação com algumas variáveis psicomotoras em crianças de 1ª série do 1º grau. Dissertação de Mestrado. Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, São Paulo. [ Links ]
Pinelli, Jr., & Pasquali, L. (1992, janeiro/dezembro). Parâmetros Psicométricos do Teste Gestáltico Viso-Motor de Bender. Revista de Psicologia, 9(1/2), 51-74. [ Links ]
Popovic, A. M. et al. (1969). Teste de Bender, Teste Metropolitano de Prontidão e E.E.G.: Suas relações em um grupo de crianças de 6 a 8 anos de idade. Revista de Psicologia Normal e Patológica, 15(1/2), 94-110. [ Links ]
Rodrigues, I. J. (2004). Habilidades viso-construtivas de crianças com queixa escolar submetidas ao psicodiagnóstico. Dissertação de mestrado, Programa de Mestrado em Distúrbios do Desenvolvimento da Universidade Presbiteriana Mackenzie. [ Links ]
Shaloch, R. I. (1999). Uma nova maneira de pensar a respeito das deficiências e sua avaliação. In Conferência, Congresso Nacional das APAEs. São Paulo. [ Links ]
Terman, L. M., & Merrill, M. A. (1975). Medida de la Inteligencia: Método para el empleo de lãs pruebas del Stanford- Binet. Madrid: Espasa-Calpe. [ Links ]
Wood, G. M. O., Carvalho, M. R. S., Rothe-Neves, R., & Haase, V. G. (2001). Validação da bateria de avaliação da memória de trabalho (BAMT-UFMG). Psicologia: Reflexão e Crítica 14(2), 325-341. [ Links ]
Endereço para correspondência
Rua Mariano de Souza, 669 - apto. 33A
CEP: 03411-090 - São Paulo-SP
E-mail: idajanete@ig.com.br/idajanete@hotmail.com
Encaminhado em 05/11/04
Revisado em 25/11/04
Aceito em 05/12/04
Sobre os autores:
1 Ida Janete Rodrigues: Mestre em Distúrbios do Desenvolvimento pelo Mackenzie, Psicóloga Clínica, Psicopedagoga e Professora da Unip.
2 Elizeu Coutinho de Macedo: Doutor em Psicologia pela Universidade de São Paulo. Professor do Programa de Mestrado em Distúrbios do Desenvolvimento da Universidade Presbiteriana Mackenzie (ecmacedo@mackenzie.com.br).