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Avaliação Psicológica

versión impresa ISSN 1677-0471

Aval. psicol. vol.12 no.2 Itatiba ago. 2013

 

 

A perícia psicológica em casos de suspeita de abuso sexual infanto-juvenil1

 

The psychological expertise in cases of suspected sexual abuse of children and adolescents

 

Peritaje psicológica ante supuestos de abuso sexual infantojuvenil

 

 

Lara Lages Gava2; Cátula Pelisoli; Débora Dalbosco Dell’Aglio

Universidade Federal do Rio Grande do Sul

 

 


RESUMO

Este trabalho teve como objetivo discutir a perícia psicológica em casos de suspeita de abuso sexual cometido contra crianças e adolescentes. São apresentados diversos modos de realização desse tipo de perícia em diferentes contextos no cenário mundial e é identificada a existência de alguns pontos relativamente consensuais entre os autores. Dentre esses pontos, a avaliação do impacto psíquico na suposta vítima e a avaliação da credibilidade do relato ganham especial ênfase devido às dificuldades de suas aplicações práticas no contexto pericial. Este estudo demonstra uma variedade de estratégias utilizadas nas avaliações psicológicas investigativas em casos de abuso sexual contra crianças e adolescentes, indicando uma tentativa, por parte dos profissionais, de lidarem com a complexidade inerentemente envolvida nestas situações.

Palavras-chave: abuso sexual; perícia psicológica; avaliação da credibilidade.


ABSTRACT

This paper aimed to discuss the forensic psychological evaluation in cases of suspected of sexual abuse against children and adolescents. This study shows several ways this evaluation is carried out in different contexts worldwide, as well as the existence of some relatively consensual points among the authors. Within these issues, the assessment of the impact on the alleged victim and the credibility of the report receive special emphasis due to the difficulties their practical application in the forensic context. This study demonstrates a variety of strategies used on the investigative psychological assessment in case of sexual abuse against children and adolescents, indicating how professionals attempt to handle the inherent complexity involved in these situations.

Keywords: sexual abuse; forensic psychological evaluation; credibility assessment.


RESUMEN

Este estudio tuvo como objetivo discutir el peritaje psicológico ante supuestos de abuso sexual contra niños y adolescentes. Se presentan diversos modos de realización de ese tipo de peritaje en diferentes contextos en el escenario mundial y se identifica la existencia de algunos puntos de consenso entre los autores. Entre esos puntos, la evaluación del impacto psíquico en la supuesta víctima y la evaluación de la credibilidad del relato ganan especial énfasis debido a las dificultades de sus aplicaciones prácticas en el contexto experto. Este estudio demuestra una variedad de estrategias utilizadas en las evaluaciones psicológicas investigativas en casos de abuso sexual contra niños y adolescentes, lo que indica un intento, por parte de los profesionales, para hacer frente a la complejidad inherente en estas situaciones.

Palabras-clave: abuso sexual; peritaje psicológico; evaluación de la credibilidad.


 

 

Atualmente, as avaliações psicológicas nos casos de abuso sexual têm ganhado espaço no contexto jurídico. Na área forense, um tipo de avaliação cada vez mais solicitada é a perícia psicológica, que pode vir a ser considerada pela autoridade jurídica como um dos meios de prova da ocorrência do crime em questão. Segunda Távora e Alencar (2010), a prova é uma evidência factual que visa estabelecer a verdade dos fatos. A perícia, enquanto meio de prova, é considerada como o conjunto de procedimentos técnicos que tem como finalidade o esclarecimento de um fato de interesse da Justiça (Taborda, 2004). No contexto criminal, a prova pericial visa trazer materialidade ao crime, buscando o reconhecimento da existência de vestígios ou indícios de sua suposta ocorrência.

O objetivo pericial de comprovar a existência do fato delituoso é especialmente problemático nos casos de crimes sexuais cometidos contra crianças e adolescentes. Nesse contexto, é comum que as perícias físicas não sejam capazes de detectar a materialidade do fato (Buck, Warren, Betman, & Brigham, 2002; Echeburúa & Subijana, 2008; Welter & Feix, 2010). No Brasil, por exemplo, um estudo realizado no Instituto Geral de Perícias do Estado do Rio Grande do Sul constatou que, no período de janeiro de 2007 a dezembro de 2008, apenas 22,2% dos exames de conjunção carnal nos casos de suspeita de violência sexual infanto-juvenil apresentaram resultados positivos, indicando a materialidade do crime (Rios, 2009).

A baixa incidência de indícios físicos encontrados nos exames em casos de suspeita de abuso sexual cometido contra crianças e adolescentes pode ser explicada pela própria definição de violência sexual infantil, fornecida pela Organização Mundial da Saúde (WHO, 1999, 2006). A violência sexual infantil é definida como qualquer interação entre a criança ou adolescente e alguém em estágio sexual de desenvolvimento mais adiantado, que tenha por fim a satisfação sexual deste último. As interações podem variar desde atos em que não se produz o contato sexual (voyeurismo, exibicionismo, produção de fotos) até atos que incluem contato sexual com ou sem penetração (WHO, 1999, 2006). Convém observar, portanto, que de acordo com essa definição, não é sequer necessário o contato físico entre perpetrador e vítima para que um ato seja designado como sexualmente violento, de modo que não se deve esperar necessariamente um indício corporal visível resultante da violência sexual.

As evidências corporais serão encontradas mais facilmente quando houver conjunção carnal ou quando a violência for praticada com uso da força física, o que é mais frequente em casos de violência extrafamiliar (Gonçalves, 2004). É sabido, contudo, que cerca de 80% dos casos de abuso sexual infantil são cometidos por pessoas afetivamente próximas à criança (Amazarray & Koller, 1998; Araújo, 2002). Nesses casos é bastante comum que a violência sexual ocorra no interior de um jogo de sedução gradual (Berkowitz, Bross, Chadwick, & Witworth, 1994), de modo que as marcas físicas decorrentes do episódio abusivo tornam-se raramente disponíveis.

Do ponto de vista da produção da prova pericial, o baixo índice de evidências concretas no corpo da criança ou do adolescente sexualmente abusado traz a seguinte dificuldade: como produzir uma prova sem que existam evidências materiais do crime? Além da dificuldade em encontrar vestígios corporais, há ainda outros elementos que são próprios à dinâmica do abuso sexual infanto-juvenil e que também dificultam a produção da prova pericial, a saber: vítima e perpetrador, em geral, são as únicas testemunhas do crime (Buck e cols., 2002; Javiera Rivera & Olea, 2007; Rovinski, 2007) e o fato delituoso toma a forma de uma síndrome do segredo (Furniss, 1993). Diante desses aspectos, pode-se afirmar que a produção da prova pericial nos casos de violência sexual cometida contra crianças e/ou adolescentes torna-se um desafio.

Uma alternativa a esse desafio, que necessita ser afrontado, pode ser o recurso a perícias psíquicas, isto é, psicológicas ou psiquiátricas. Uma perícia psíquica possui o mesmo objetivo de uma perícia em geral, a saber, o esclarecimento de um fato de interesse da Justiça, utilizando-se, para tanto, de um conjunto de procedimentos técnicos (Taborda, 2004). Nesse caso, o conjunto de procedimentos técnicos utilizado é específico à área da Psicologia ou da Psiquiatria. O presente artigo possui como objetivo descrever modos de realização da perícia psicológica em diferentes contextos do cenário mundial, apresentando especial ênfase nas dificuldades referentes à avaliação do dano psíquico e à avaliação da credibilidade do relato no contexto investigativo.

A perícia psicológica nos casos de abuso sexual contra crianças e adolescentes

No requerimento de perícias psicológicas, em casos de suspeita de abuso sexual cometido contra crianças e adolescentes, o fato a ser esclarecido, em geral, é a própria suspeita do abuso. Embora haja um consenso sobre a importância do perito psicólogo nessas situações, não parece consensual o modo de realização dessa perícia, como será mostrado a seguir, a partir da exposição desse tipo de perícia por autores de diferentes contextos no cenário mundial.

Chagnon (2010), na França, apresenta a concepção de que a perícia psicológica realizada nas vítimas deve abarcar, em geral, três objetivos. O primeiro, de acordo com esse autor, consiste em avaliar se o sujeito que se diz vítima apresenta transtornos ou deficiências que poderiam influenciar o seu comportamento, verificando também se apresenta tendências mitomaníacas, perversas ou de fabulação. O segundo objetivo consiste em apresentar uma avaliação global do periciado, determinando seu grau de inteligência, de atenção, de memória e de representação do real. Como terceiro objetivo a ser atingido, o perito deve avaliar a repercussão dos fatos no psiquismo da vítima, em relação à etapa desenvolvimental em que esta se encontra.

Para atingir os objetivos propostos, Chagnon (2010) propõe que seja realizada, primeiramente, uma entrevista com os responsáveis pela criança, por meio da qual se busca realizar uma anamnese e obter informações acerca da dinâmica familiar. A entrevista com a suposta vítima permitirá obter, dentre outros dados, informações acerca do seu nível de desenvolvimento intelectual articulado a sua dinâmica afetiva. Dessa avaliação global do caso depende a próxima etapa, em que são avaliados a credibilidade do relato e o traumatismo apresentado pelo periciado. Na avaliação da credibilidade, Chagnon propõe que sejam analisadas as características das declarações da criança, suas modalidades gerais, as particularidades do conteúdo e as motivações da declaração, sempre considerando o contexto da relação eventualmente pré-existente com o agressor. Junto à avaliação da credibilidade, deve ser realizada a avaliação do traumatismo, isto é, das consequências decorrentes da suposta agressão sofrida. Com as informações dessa etapa, junto aos dados obtidos nas entrevistas com os responsáveis e o periciado, é elaborado o relatório. Para o autor, o relatório deve enfatizar a descrição do desenvolvimento e da organização da personalidade do periciado anterior e posterior às supostas agressões, sendo esta a etapa final na realização da perícia.

Na Espanha, em um artigo que se propõe a ser um guia de boa prática para o tratamento judicial de crianças sexualmente abusadas, Echeburúa e Subijana (2008) afirmam que a entrevista psicológica, junto à observação, é um meio fundamental de avaliação de abusos sexuais. Segundo os autores, na realização da entrevista devem ser levados em consideração o estado emocional da criança, seu desenvolvimento evolutivo, seus recursos psicológicos, suas aflições, suas fontes de apoio familiar e social e sua adaptação na vida cotidiana. Dessa forma, é possível detectar indicadores significativos relacionados à existência de abuso sexual e, portanto, verificar se as respostas emocionais, comportamentais e físicas emitidas pelas crianças são compatíveis com os sintomas comumente considerados efeitos do abuso sexual.

Do ponto de vista técnico, Echeburúa e Subijana (2008) afirmam que a entrevista deve utilizar uma técnica de recordação livre, organizada em torno de uma bateria de perguntas abertas e não diretivas, evitando perguntas fechadas de natureza sugestiva ou indutora. Segundo os autores, a entrevista deve ser realizada individualmente, não deve possuir um tom paternalista ou de interrogatório e deve ser gravada. Com os dados da gravação da entrevista, deve ser realizada a avaliação da veracidade da declaração fornecida pela criança, por meio do uso da técnica Statement Validity Assessment (SVA). Todos esses dados devem ser complementados com outras fontes de conhecimento, tal como o próprio processo judicial ou entrevistas com os pais ou responsáveis, de modo a obter informações sobre a dinâmica familiar, o histórico desenvolvimental da criança ou adolescente e seu grau de adaptação à vida cotidiana. Considerando, portanto, a complexidade do testemunho de abuso sexual, a proposta de Echeburúa e Subijana é a de uma avaliação cuidadosa e baseada em métodos múltiplos e fontes de informações diversas.

Nos Estados Unidos, alguns autores (Corwin & Keeshin, 2011; Faller, Cordisco-Steele, & Nelson- Gardell, 2010; Kellog, 2005; Rohrbaugh, 2008) citam um guia prático de avaliação em casos de suspeita de abuso sexual, produzido pela American Professional Society on the Abuse of Children (APSAC, 1997). Nesse guia é sugerido que o profissional a atuar em casos de suspeita de abuso sexual deve possuir no mínimo dois anos de experiência nestes mesmos casos em outro âmbito que não o forense. Em relação ao processo de avaliação no contexto jurídico, a APSAC aponta a necessidade, num primeiro momento, da revisão e análise dos documentos disponíveis acerca dos fatos em questão. Sugere também que o entrevistador realize uma entrevista com o cuidador primário, com fins de obter informações sobre o histórico da notificação e sobre aspectos desenvolvimentais da criança.

Uma vez realizada a análise dos documentos e a entrevista com o cuidador, a criança deve ser entrevistada individualmente. Segundo a APSAC (1997), é importante que o entrevistador possua conhecimentos acerca do desenvolvimento infantil, além da dinâmica e das consequências possivelmente associadas ao abuso sexual, de modo que possa considerar estes dados durante a entrevista. Não é necessário utilizar um protocolo de entrevista, mas esta deve ser iniciada com questões gerais sobre tópicos neutros, tais como a escola e a família. Num segundo momento, podem ser utilizadas perguntas abertas para questionar sobre o motivo que ensejou a perícia e, apenas num terceiro momento, deve ser feito uso de questões específicas. O guia propõe ainda que encontros conjuntos com a criança e o cuidador não acusado ou mesmo com o indivíduo suspeito podem ser úteis para a obtenção de informações sobre a qualidade geral das relações. Tais sessões conjuntas, contudo, não devem ser conduzidas com a finalidade de determinar se o abuso ocorreu com base nas reações da criança e dos adultos envolvidos. Segundo o guia, o uso de testes psicológicos não é necessário para provar ou refutar uma história de abuso sexual, mas podem ser úteis para obter informações acerca do nível intelectual e estado emocional da criança. A etapa final da avaliação consiste na escrita do relatório. Segundo o guia prático de avaliação em casos de suspeita de abuso sexual (APSAC, 1997), o avaliador pode emitir uma opinião sobre a ocorrência do abuso, sobre a probabilidade de ocorrência do abuso ou, ainda, apenas fornecer uma descrição da análise da informação recolhida.

No Canadá, Casoni (2001) propõe que a avaliação das alegações de agressão sexual contra as crianças seja realizada em três etapas. A autora afirma que antes mesmo de iniciar a primeira etapa, o perito psicólogo necessita estar aberto e disponível a enxergar todas as hipóteses possíveis, sem se colocar de um ou de outro lado das pessoas em causa. Estando isso assegurado, a primeira etapa da avaliação consiste numa avaliação contextual, em que o perito psicólogo deve estar seguro de possuir todos os documentos e informações relacionados à alegação de abuso sexual. Segundo Casoni, nessa etapa é importante saber se a primeira verbalização feita pela criança aconteceu de modo espontâneo, isto é, sem questionamento ou pressão por parte de um adulto, o que, segundo a autora, traria mais credibilidade ao caso. Na segunda etapa, a autora propõe a avaliação psicológica de todas as pessoas envolvidas no caso, a fim de traçar um perfil da personalidade e das motivações de cada um. Em relação a essa etapa da avaliação, a psicóloga lembra que nenhum instrumento psicométrico ou projetivo permite determinar se uma criança, adolescente ou adulto foi ou não vítima de agressão, e que, portanto, o perito deve estar ciente destas limitações durante a avaliação. Na terceira etapa, é proposta a observação das interações entre a criança e os parentes, assim como a observação entre a criança e o próprio suspeito. Segundo a autora, essa reunião não deve ser encarada como suscetível de constituir uma revelação da verdade, mas pode permitir a coleta de alguma informação relevante, tal como o grau de dominação que um dos parentes exerce sobre o filho.

No Chile, por sua vez, o Servicio Nacional de Menores do governo deste país elaborou em 2005 um manual de estratégias de avaliação pericial em abuso sexual infantil (Maffioletti & Salinas, 2005). Seguindo esse manual, Javiera Rivera e Olea (2007) afirmam que a avaliação pericial psicológica nos casos de suspeita de abuso sexual infantil se constrói fundamentalmente sobre três pilares: avaliação psicodiagnóstica, avaliação do contexto e análise de credibilidade do relato fornecido.

Javiera Rivera e Olea (2007) explicam que, no pilar da avaliação psicodiagnóstica, deve ser realizada uma descrição do funcionamento global do periciado, avaliando- o em seus funcionamentos cognitivo, afetivo, social, familiar, escolar e comportamental. Os métodos utilizados para esses fins são a entrevista forense e a psicometria. O pilar do contexto, por sua vez, refere-se a descrições que permitem situar os fatos investigados em um cenário concreto. Essa avaliação deve ocorrer em duas áreas: a do contexto da denúncia e a do contexto do desenvolvimento do examinado. Os métodos utilizados para essa avaliação são a própria entrevista de investigação e a análise das investigações já realizadas pelo Ministério Público. Por fim, o pilar de análise de credibilidade se refere à avaliação, por parte de um perito em Psicologia, do grau de ajuste do relato a critérios de credibilidade definidos a priori. Para essa etapa, os métodos utilizados são o Criteria-Based Content Analysis (CBCA) e o Statement Validity Assessment (SVA).

No Brasil, Serafim e Saffi (2009) propõem cinco etapas para a realização de uma perícia psicológica nos casos de suspeita de abuso sexual. A primeira etapa deve ser a de estudos dos documentos relativos ao caso, importante para levantar questões a serem investigadas na entrevista. A segunda etapa é a de entrevista. Nessa entrevista, a primeira coisa a ser feita é o contrato de trabalho, explicando ao periciado o motivo de ele estar ali, delimitando em quantos encontros será realizada a perícia e avisando que tudo o que for importante para entender o caso será posto em relatório, pedindo autorização, por escrito, para que a perícia seja realizada. Com o consentimento assinado, a entrevista começa com o relato do ocorrido. Depois, são coletados dados de anamnese completa, como de gestação, parto, desenvolvimento neuropsicomotor, sociabilidade, doenças prévias e antecedentes hereditários. Segundo os autores, a anamnese é importante para comparar o funcionamento prévio do sujeito, isto é, antes do suposto fato, com o funcionamento na época da realização da perícia. A terceira etapa é a de avaliação cognitiva, em que é realizada uma análise das principais funções cognitivas para visualizar o funcionamento global do periciado e saber se ele apresenta algum déficit que possa comprometer sua capacidade de compreensão e/ou autodeterminação. Na quarta etapa, uma avaliação de personalidade fornece informações tanto de características estruturais como da dinâmica da personalidade, percebendo como o periciado lida com o mundo que o circunda e com situações difíceis. Por fim, na etapa de análise de dados e conclusão, são considerados todos os dados levantados nas etapas anteriores e é elaborada uma conclusão sobre o periciado e o fato em que ele está envolvido.

Pode ser observada, portanto, uma diversidade dos modos de realização da perícia psicológica, descritos por diferentes autores situados em variados contextos do cenário mundial, o que pode auxiliar o leitor na compreensão da complexidade envolvida na avaliação pericial nos casos de abuso sexual. Contudo, frente a essa diversidade, ao menos alguns pontos parecem consensuais entre os autores, como, por exemplo, a exigência da entrevista com a criança ou adolescente supostamente vítima. Reconhecendo a capacidade infantil de fornecer um relato sobre o episódio abusivo, há atualmente uma série de técnicas ou recomendações gerais sobre a entrevista, visando obter tanta informação quanto possível de crianças por meio de uma narrativa livre (Faller, 2007).

Atualmente, um protocolo de entrevista investigativa estruturado e largamente utilizado no contexto internacional é o NICHD (Lamb, Hershkowitz, Orbach, & Esplin, 2008; Lamb, Orbach, Hershkowitz, Esplin, & Horowitz, 2007), desenvolvido por pesquisadores do National Institute of Child Health and Human Development (NICHD). O protocolo propõe uma fase introdutória em que o entrevistador se apresenta, esclarece que a criança deverá descrever os eventos com detalhes e deve dizer somente a verdade. Também é importante esclarecer que a criança pode e deve responder “Eu não me lembro” ou “Eu não sei” quando for o caso, além de corrigir o entrevistador quando achar necessário. Segue-se, então, a fase de rapport, cujo objetivo é criar um ambiente descontraído e de apoio, para que seja estabelecido um vínculo entre a criança e o entrevistador. Ainda nessa fase, é pedido à criança que descreva com detalhes algum evento neutro vivenciado recentemente. Com isso, busca-se verificar o nível de detalhamento apresentado pela criança, demonstrando, se for o caso, a qualidade das informações que dela é esperada. Se o entrevistador, por exemplo, pergunta à criança como foi o seu dia anterior e ela responde que “foi tudo bem”, cabe ao entrevistador demonstrar que este não é o tipo de resposta esperada, demonstrando que a criança deve responder com um nível maior de detalhamento. Essa etapa é de extrema importância, pois atua como “um treino” para as etapas posteriores, no qual a criança relatará sobre o episódio sexualmente abusivo. Após a fase de rapport, com perguntas não sugestivas e abertas, isto é, que demandam a livre recordação da criança, o entrevistador tenta identificar, no relato da criança, o evento que está sendo investigado, isto é, o abuso sexual. Se a criança fizer uma acusação, a denominada fase da narrativa livre tem início com um convite para que a criança relate sobre o ocorrido (“Me conte tudo o que aconteceu”). Após a primeira declaração, visando à obtenção de maiores informações, o entrevistador deve guiar a criança ainda com as perguntas ou orientações abertas. Para guiá-la, por exemplo, o entrevistador pode dizer “O que aconteceu depois?” ou “Você mencionou [uma pessoa/um objeto/uma ação]. Conte-me tudo sobre isso”. Se após essa fase ainda faltarem detalhes cruciais, o entrevistador pode usar perguntas cuja resposta é sim/não (por exemplo: “ele pedia pra você deitar no sofá?”) ou de escolha forçada, na qual a criança escolhe uma dentre as respostas oferecidas (por exemplo: “vocês estavam no seu quarto, na sala ou no quarto dos seus pais?”). Ao final da entrevista, deve-se retomar a conversa da suposta vítima com temas neutros, agradecendo, perguntando se ela tem algo mais a dizer e respondendo a qualquer pergunta que a criança tenha para fazer.

Deve ser ressaltado que esse protocolo, embora seja utilizado por psicólogos, não é de uso exclusivo dos profissionais da saúde mental, sendo utilizado em algumas localidades por policiais (Cyr, Dion, McDuff, & Trotier- Sylvain, 2012; Cyr & Lamb, 2009). Cabe ainda dizer que mais de um terço das crianças supostamente vítimas de abuso sexual não revelam o abuso no contexto das entrevistas investigativas (Hershkowitz, Horowitz, & Lamb, 2005). Embora o protocolo NICHD auxilie o entrevistador a estabelecer o vínculo com a criança, facilitando a emissão do relato abusivo, ele não oferece alternativas de manejo dos fatores motivacionais que fazem com que as crianças não revelem o abuso (Pipe, Lamb, Orbach, & Cederborg, 2007). A perícia psicológica, pelo fato de não se restringir à entrevista (embora essa seja de extrema importância), possibilita o manejo de fatores emocionais e motivacionais, fornecendo maior suporte à criança na emissão de seu relato.

Além da exigência da entrevista com a criança ou adolescente supostamente vítima, também parece consensual a necessidade da entrevista com os responsáveis. Embora essa não seja explicitamente citada por Serafim e Saffi (2009) e por Javiera Rivera e Olea (2007), estes autores sugerem a coleta de dados acerca do desenvolvimento neuropsicomotor e história clínica do periciado, o que, no caso da criança, em geral, é realizada a partir de entrevista com o responsável. Parece consensual ainda a relevância de o perito realizar a análise de documentos provenientes das investigações, o que foi referido por todos os autores, à exceção de Chagnon (2010). No Brasil, esses documentos consistem basicamente nos autos do inquérito policial, quando a investigação está na fase préprocessual, e nos autos do processo judicial, quando se encontra na fase processual (Távora & Alencar, 2010). Não tão consensual, contudo, parece ser o uso da entrevista conjunta com a criança e o suposto agressor. Dentre as seis propostas de procedimentos periciais em casos de suspeita de abuso sexual, apenas duas apontam o seu uso (APSAC,1997; Casoni, 2001). Ainda assim, a APSAC (1997) ressalta que essa entrevista conjunta só deve ser realizada se não trouxer sofrimento significativo para a criança.

Por fim, há outros dois aspectos que estão envolvidos nesses modos de fazer perícia e que merecem destaque pelas dificuldades que suas aplicações práticas suscitam. Trata-se, primeiramente, da avaliação relativa às possíveis alterações emocionais e comportamentais apresentadas pelo periciado na época do suposto acontecimento, e em segundo lugar, da avaliação da credibilidade do relato fornecido pelo periciado. Considerando a importância desses aspectos, Machado (2005), ao fazer uma revisão acerca de aspectos consensuais e controversos na realização da perícia psicológica nas alegações de abuso sexual, aponta que a perícia é usualmente solicitada com vistas justamente à clarificação destas duas questões. Considerando a relevância tanto da avaliação do impacto psíquico dos eventuais fatos na vítima bem como da avaliação da credibilidade do relato, são descritas a seguir as justificativas, na prática pericial, para a realização de cada uma destas duas avaliações, apontando as dificuldades que suas aplicações suscitam.

Avaliação do impacto psíquico do suposto abuso sexual na criança ou adolescente

Uma variedade de prejuízos emocionais, comportamentais, sociais e cognitivos tem sido associada à ocorrência do abuso sexual infantil (Briere & Elliot, 2003; Kendall-Tacket, Williams, & Finkelhor, 1993; Tyler, 2002). Pesquisas apontam que crianças vítimas de violência sexual podem apresentar sentimentos de culpa, dificuldade em confiar no outro, comportamento hipersexualizado, medos, pesadelos, isolamento, sentimentos de desamparo e ódio, fugas de casa, baixa autoestima e agressividade, dentre outros sintomas (Amazarray & Koller, 1998; Kendall-Tacket, Williams, & Finkelhor, 1993; Nurcombe, 2000; Tyler, 2002). Transtornos psicológicos como Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT), depressão, ansiedade, Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), Transtorno de Conduta e Transtorno de Abuso de Substâncias também têm sido associados à ocorrência de abuso sexual na infância (Lynskey & Fergusson, 1997; Paolucci, Genuis,& Violato, 2001).

Considerando essas evidências, muitas vezes as perícias são realizadas a partir de uma abordagem da psicologia clínica, com enfoque na presença ou ausência de sintomas que são esperados nas vítimas, em decorrência da vivência desse tipo específico de trauma (Rovinski, 2007). A lógica subjacente que parece justificar esse modo de realização da perícia é esta: assim como um dano físico, identificado numa perícia física, pode se constituir em um meio de prova da violência sexual, também um dano psíquico, identificado numa perícia psíquica, poderia vir a se constituir em um meio de prova do fato delituoso. Contudo, esse tipo de raciocínio, que parece ter sentido quando se considera a série de prejuízos psíquicos associados à ocorrência do abuso sexual, é extremamente falho do ponto de vista da produção da prova pericial, podendo prejudicar ou mesmo deturpar os resultados de uma avaliação.

Em primeiro lugar, esse raciocínio é problemático porque enquanto algumas vítimas desenvolvem severos problemas emocionais ou psiquiátricos, outras apresentam consequências mínimas ou nenhuma consequência aparente (Heflin & Deblinger, 1999; Saywitz, Mannarino, Berliner, & Cohen, 2000; Welter & Feix, 2010). Ora, se pode acontecer de uma criança ou adolescente ser vítima de abuso sexual e não apresentar nenhuma consequência aparente, então uma avaliação que possui como foco principal a identificação de sintomas certamente não será capaz de avaliar consistentemente a situação em foco.

Além disso, a concepção de que a presença de um sintoma pode se constituir num meio de prova do crime é falha no contexto pericial, em segundo lugar, porque não há um único quadro sintomatológico que caracterize a maioria das vítimas abusadas sexualmente (Habigzang & Caminha, 2004; Javiera Rivera & Olea, 2007), sendo extremamente variada a gama de possibilidades de alterações emocionais e comportamentais apresentada. Por fim, não se pode concluir a ocorrência do abuso sexual a partir da identificação de sintomas na realização de uma perícia, uma vez que estes, quando presentes, não são específicos, isto é, podem ser decorrentes também de outra situação que não a sexualmente abusiva (Dammeyer, 1998).

Considerando essas dificuldades, não é razoável que o perito parta da pressuposição de que o fato delituoso tenha ocorrido e, portanto, realize apenas uma avaliação do impacto psíquico sofrido pela vítima. Isso, sobretudo, se acontece na fase pré-processual, também conhecida como fase de produção do inquérito policial, em que os supostos delitos estão sendo preliminarmente investigados (Távora & Alencar, 2010). Além disso, não parece adequado também partir desse tipo de pressuposição quando se considera a possibilidade da realização de falsas denúncias ou de falsas memórias. As falsas denúncias ocorrem, em geral, para obtenção de ganhos individuais – por exemplo, destituição do poder familiar em uma disputa de guarda dos filhos (Rovinski, 2007) – e têm aumentado nos últimos anos provavelmente como reflexo do aumento da quantidade de separações e divórcios conflitivos (Echeburúa & Subijana, 2008). As falsas memórias, por sua vez, consistem em lembranças de eventos no todo ou em parte compostas por informações que nunca aconteceram (Barbosa, Ávila, Feix, & Grassi- Oliveira, 2010; Hall & Kondora, 2005).

Tanto no caso de uma falsa denúncia como no caso de uma falsa memória, poderia acontecer de uma criança supostamente vítima apresentar uma série de sintomas que estivessem relacionados, por exemplo, à pressão nela exercida por parte de um dos genitores, mas os sintomas serem interpretados pelo perito como decorrentes do episódio abusivo. Numa situação como essa, as consequências decorrentes de uma má intepretação do perito são graves e poderiam até mesmo levar um inocente à condenação. Considerando, portanto, a possibilidade de falsas denúncias e de falsas memórias junto às consequências que uma má avaliação destas situações pode suscitar, é comum que, além de serem questionados sobre possíveis repercussões psíquicas decorrentes do suposto abuso, os peritos também sejam questionados pelo juiz sobre a veracidade das denúncias realizadas (Rovinski, 2007).

Avaliação da credibilidade do relato da suposta vítima

A habilidade da criança de prover informação acurada é uma preocupação fundamental em casos de suspeita de abuso sexual, visto que criança e o alegado perpetrador são tipicamente as únicas testemunhas e a evidência física raramente está disponível (Buck e cols., 2002). Considerando a possibilidade de uma falsa denúncia, é relativamente comum que os peritos sejam questionados sobre a veracidade do relato fornecido pela suposta vítima. Atualmente, o Statement Validity Assessment (SVA), um método compreensivo para a avaliação dos relatos de testemunhos (Juárez López, 2004), é reconhecido como a técnica mais popular no mundo para medir a veracidade de uma declaração verbal (Vrij, 2000, 2005).

O SVA é composto, atualmente, de cinco etapas, a saber: a) revisão cuidadosa acerca das informações disponíveis em relação ao caso; b) entrevista estruturada; c) análise de conteúdo baseada em critérios (Criteria-Based Content Analysis – CBCA), em que são avaliados, de forma sistemática, o conteúdo e a qualidade dos dados obtidos a partir da presença ou ausência de 19 critérios objetivos; d) checklist de validade, no qual os resultados do CBCA são avaliados a partir de uma lista de controle da validade dos critérios levantados; e) integração de todos os dados colhidos para a elaboração da conclusão, em termos probabilísticos, acerca da ocorrência do abuso (Steller & Boychuk, 1992).

Opiniões a respeito da utilização da técnica SVA em investigações não são consensuais. Alguns autores defendem que a validade do SVA já foi demonstrada (Raskin & Esplin, 1991; Zaparniuk, Yuille & Taylor, 1995) e que, portanto, este método deve ser amplamente utilizado (Honts, 1994). Outros autores, contudo, são mais céticos quanto ao uso do SVA nos tribunais, justificando que a técnica não é segura e devidamente validada para ser utilizada como prova (Brigham, 1999; Davies, 2001; Lamb, Sternberg, Esplin, Hershkowitz, & Orbach, 1997; Wells & Loftus, 1991). Dentre as principais críticas endereçadas à utilização do SVA estão: a falta de sistematização e definição quantitativa dos critérios (Juárez López, 2004), a ausência de regras de decisão quanto à presença de um número mínimo de critérios para definir se uma declaração deve ser considerada verdadeira (Buck e cols., 2002; Juárez López, 2004; Rovinski, 2007), a ausência da definição de pesos específicos para cada um dos critérios, considerando que nem todos possuem o mesmo peso na hora de valorar a credibilidade (Alonso-Quecuty, 1999), a tendência de crianças mais velhas mostrarem mais critérios do que as mais jovens (Buck e cols., 2002; Ruby & Brigham, 1997) e a tendência de alegações falsas serem consideradas verdadeiras (Ruby & Brigham, 1997).

Diante das críticas endereçadas a essa técnica, cabe aos profissionais que dela se utilizam nas perícias em casos de abuso sexual infanto-juvenil questionar-se sobre sua validade para produzir um elemento de prova. Contudo, Steller, um dos próprios criadores desse método semiestandardizado, reconhece as controvérsias relativas ao uso do seu SVA e propõe que este seja considerado não como a comprovação da validade geral da prova de credibilidade, mas como um método global para avaliar a credibilidade das declarações (Steller & Boychuk, 1992). Vrij (2005), diante dos pareceres favoráveis e contrários ao uso do SVA, realizou um estudo de revisão qualitativa acerca de 37 pesquisas que envolviam este método. Nesse estudo, Vrij concluiu que as avaliações do SVA não são acuradas o suficiente para serem consideradas uma evidência científica, mas que podem ser úteis nas investigações policiais, isto é, na fase mais inicial da investigação.

Para os casos de avaliação da credibilidade em alegações de abuso sexual infanto-juvenil, pode-se concluir, portanto, que o resultado fornecido mediante o uso da técnica SVA não deve ser considerado como uma prova inconteste da ocorrência do delito. Os próprios autores apontam que o resultado do SVA consiste numa estimativa da credibilidade (Steller & Boychuk, 1992), o que é diferente de uma comprovação da verdade. Na medida em que é uma técnica estimativa, parece razoável a sugestão de Vrij (2005), a saber, de que essa técnica deve ser utilizada apenas na fase mais inicial da investigação do crime. No Brasil, isso quer dizer que estão respaldados pela literatura científica para utilizar o SVA aqueles profissionais que atuam na fase pré-processual, devendo evitar seu uso os profissionais que atuam na fase processual, já que esta consiste numa etapa mais avançada da investigação (Távora & Alencar, 2010). Por fim, salienta-se que a indicação para uso do SVA na fase das investigações policiais é internacional, não existindo no Brasil estudos que avaliem a eficácia do SVA, mesmo na fase inicial de investigação. Sugere-se, portanto, que pesquisas nacionais sejam realizadas a fim de verificar essa eficácia.

 

Considerações fi nais

A importância da Psicologia Jurídica nas situações de abuso sexual contra crianças e adolescentes se faz muito mais no sentido de confirmar a ocorrência da violência do que avaliar os impactos sofridos pela criança ou adolescente (Rovinski & Stein, 2009). Sendo assim, quando uma autoridade jurídica solicita uma perícia num caso de suspeita de abuso sexual, ela está mais interessada em saber se o abuso sexual de fato aconteceu do que em ter conhecimento das consequências dele advindas. No trabalho pericial, contudo, a confirmação da ocorrência do abuso deve acontecer dentro das limitações técnicas do trabalho do perito psicólogo. Ora, se tanto a avaliação sintomatológica como a avaliação da credibilidade é alvo de uma série de críticas e não permite extrair logicamente uma conclusão acerca dos fatos ocorridos, então o perito psicólogo não está habilitado a categoricamente afirmar ou negar a ocorrência do abuso. Porque o trabalho do psicólogo nessa área é cercado de incertezas, parece razoável que, na elaboração do laudo pericial, o profissional realize um juízo sobre a ocorrência dos fatos apenas em termos probabilísticos (Juárez-López, 2004; Machado, 2005), não assertivos.

Embora o perito não possa ter a absoluta certeza de estar se apropriando da verdade dos fatos, entendese que ele pode, no entanto, utilizar-se de meios para tentar aproximar-se dessa verdade, compreendendo-a ao menos parcialmente. Pode-se presumir, dessa forma, que tão mais próximo da verdade estará o perito e, por conseguinte, mais consistente será sua prova, quanto mais artifícios ele puder utilizar para a confirmação ou exclusão das hipóteses elaboradas acerca de cada caso. Nas situações de abuso sexual cometido contra crianças e adolescentes, cabe ao profissional psicólogo que atua como perito, portanto, ter conhecimento das técnicas e estratégias atualmente utilizadas e realizar uma avaliação abrangente e compreensiva, baseando-se não em fatores isolados, mas na integração de diferentes fontes de informação.

Foram expostos, neste trabalho, diversos modos de realização da perícia psicológica nos casos de suspeita de abuso sexual infanto-juvenil em diferentes contextos do cenário mundial, ressaltando-se duas principais dificuldades com as quais o perito se depara na realização de uma perícia, a saber, a avaliação de possíveis danos psíquicos e a avaliação da credibilidade do relato da suposta vítima. Assim, nas perícias psicológicas em casos de abuso sexual infanto-juvenil, embora o conjunto de procedimentos técnicos seja específico a uma mesma área, a Psicologia, não parece haver ainda uma uniformidade, em nível mundial, sobre o modo como esse tipo de perícia deve ser realizado. Em verdade, o que pode ser observado, na prática, é que essas diferenças, mais facilmente identificadas com a comparação de autores de diferentes contextos mundiais, estão presentes também numa dimensão muito menor: no Brasil, peritos de um mesmo Estado, de uma mesma cidade ou, ainda, de uma mesma instituição, podem trabalhar de modos diversos.

Com a exposição dos diferentes modos de fazer perícia, o presente artigo não pretende ter sugerido a necessidade de se eleger um único modelo a ser considerado o ideal na realização de uma avaliação psicológica investigativa nos casos de abuso sexual infantojuvenil. Ao contrário, pretende ter apontado para a riqueza da diversidade envolvida no fato de profissionais elaborarem e utilizarem variadas estratégias para tentarem dar conta da complexidade da avaliação de cada suspeita e, ao mesmo tempo, tentar aproximar-se da verdade sobre os fatos.

 

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Recebido em novembro de 2011
Reformulado em agosto de 2012
Aprovado em outubro de 2012

 

 

Sobre as autoras

Lara Lages Gava: é Psicóloga pela Universidade Federal do Espírito Santo – UFES, Mestre em Filosofia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS e Doutora em Psicologia nesta mesma instituição.
Cátula Pelisoli: é Psicóloga pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS, Mestre e Doutoranda em Psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Débora Dalbosco Dell’Aglio: é Psicóloga Mestre e Doutora em Psicologia do Desenvolvimento pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul.


1Apoio: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científi co e Tecnológico – CNPq

2Endereço para correspondência:
Rua Ramiro Barcelos, 2600/115, 90035-003, Porto Alegre-RS. Tels.: (51) 9334-2080 / 3398-2080. E-mail: laralagesgava@gmail.com