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Avaliação Psicológica

versión impresa ISSN 1677-0471versión On-line ISSN 2175-3431

Aval. psicol. vol.21 no.1 Campinas ene./mar. 2022

https://doi.org/10.15689/ap.2022.2101.20074.07 

ARTIGOS

 

Revisão sistemática de instrumentos de atitudes em relação aos idosos e ao envelhecimento

 

Systematic review of instruments of attitudes towards the older persons and aging

 

Revisión sistemática de instrumentos de actitudes hacia las personas mayores y el envejecimiento

 

 

Angélica Maria de Sousa SilvaI, 1; Luana Elayne Cunha de SouzaII; Lucas Cardoso AiresIII

IUniversidade de Fortaleza, Fortaleza-CE, Brasil. https://orcid.org/0000-0002-1011-7005
IIUniversidade de Fortaleza, Fortaleza-CE, Brasil. http://orcid.org/0000-0001-9425-9598
IIICentro Universitário UniAteneu, Fortaleza-CE, Brasil. https://orcid.org/0000-0002-9922-5351

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Esta pesquisa teve como objetivo realizar uma revisão sistemática da literatura a fim de identificar e caracterizar os estudos e instrumentos disponíveis nas bases de dados Scielo, PePsic, Lilacs e PsycArticles, que avaliam as atitudes em relação aos idosos e ao envelhecimento. Foram utilizadas 42 combinações entre os seguintes descritores nos idiomas português, inglês e espanhol: "idosos OR velhice AND preconceito, atitude, discriminação, ageismo, estigma, idadismo e escala". Foram selecionados para análise 31 artigos sendo identificados 18 instrumentos. Os resultados evidenciaram que o interesse dos estudos sobre as atitudes em relação aos idosos e ao envelhecimento se concentram entre os anos de 2015 e 2019, com predomínio da análise da dimensão cognitiva da atitude. Essa temática vem sendo estudada de forma interdisciplinar. Recomenda-se o desenvolvimento de instrumentos que avaliem os demais aspectos das atitudes, além do cognitivo, bem como as experiências de discriminação sofridas por idosos e outros grupos etários.

Palavras-chave: ageísmo; velhice; medidas; revisão sistemática.


ABSTRACT

This study aimed to perform a systematic literature review in order to identify and characterize the instruments that assess attitudes towards older adults and aging, available in the SciELO, PePSIC, LILACS and PsycArticles databases. A total of 42 combinations of the following descriptors were used in Portuguese, English and Spanish: "aged OR old age AND prejudice, attitude, discrimination, ageism, stigma and scale". The search lead to 31 articles being selected for analysis and 18 instruments were identified. The results showed that studies on attitudes towards older adults and aging were concentrated between the years 2015 and 2019, with a predominance of the analysis of the cognitive dimension of the attitude. This theme has been studied in an interdisciplinary way. Instruments should be developed that assess the other aspects of attitudes, in addition to the cognitive dimension, as well as the experiences of discrimination suffered by older adults and other age groups.

Keywords: ageism; old age; measures; systematic review.


RESUMEN

Esta pesquisa teve como objetivo realizar uma revisão sistemática da literatura a fim de identificar e caracterizar os estudos e instrumentos disponíveis nas bases de dados Scielo, PePsic, Lilacs e PsycArticles, que avaliam as atitudes em relação aos idosos e ao envelhecimento. Foram utilizadas 42 combinações entre os seguintes descritores nos idiomas português, inglês e espanhol: "idosos OR velhice AND preconceito, atitude, discriminação, ageismo, estigma, idadismo y escala". Foram selecionados para análise 31 artigos sendo identificados 18 instrumentos. Os resultados evidenciaram que o interesse dos estudos sobre as atitudes em relação aos idosos e ao envelhecimento se concentram entre os anos de 2015 e 2019, com predomínio da análise da dimensão cognitiva da atitude. Essa temática vem sendo estudada de forma interdisciplinar. Recomenda-se o desenvolvimento de instrumentos que avaliem os demais aspectos das atitudes, além do cognitivo, bem como as experiências de discriminação sofridas por idosos e outros grupos etários.

Palabras clave: ageísmo; velhice; medidas; revisão sistemática.


 

 

Na atualidade, com o aumento da expectativa de vida, as discussões sobre o envelhecimento passaram a receber atenção nas produções científicas (Menezes et al., 2016; Vieira & Freitas-Junior, 2018). Apesar dessa maior visibilidade, os idosos constantemente são vítimas de preconceito e discriminação na sociedade (França et al., 2017; Teixeira, Souza, & Maia, 2018).

O preconceito pode ser definido como uma atitude desfavorável contra integrantes de um determinando grupo social, meramente por pertencerem àquele grupo, associando-lhes atributos negativos (Allport, 1954). O construto de atitudes conforme o modelo tripartido (Eagly & Chaiken, 1993) é composto por três dimensões: dimensão cognitiva (crenças = estereótipos), dimensão afetiva/avaliativa (preconceito) e dimensão comportamental (discriminação). Embora as atitudes em relação aos idosos apresentem características semelhantes no seu funcionamento em diversas minorias sociais (Lima, 2011), há singularidades que envolvem o preconceito contra a idade. Dentre elas, é o fato de que as pessoas que têm atitudes negativas em relação aos idosos e ao envelhecimento eventualmente se tornarão alvo destas atitudes uma vez que ao longo da vida as pessoas transitam do grupo dos jovens e adultos para o grupo dos idosos (Palmore, 2015). E, geralmente, a discriminação contra idosos ocorre de forma naturalizada e aceita socialmente sem grandes contestações (Teixeira, Souza, & Maia, 2018).

O preconceito contra a idade foi intitulado ageism pela primeira vez pelo psicólogo Robert Butler (1969). Esse fenômeno pode ser conceituado a partir de atitudes, representações, gestos e comportamentos hostis contra pessoas de um determinado grupo em função da idade (Ayalon & Tesch-Römer, 2017; Marques, 2016). O preconceito contra idade não é um fenômeno exclusivo ou vivenciado apenas pelos idosos, uma vez que atitudes negativas em relação a jovens também já foram reportadas (Ayalon & Tesch-Römer, 2018). Entretanto, estudos mostram evidências de que a população idosa se apresenta como a mais vulnerável quando se refere à vivência do preconceito contra a idade (North & Fiske, 2015). Geralmente, o termo idadismo é utilizado em estudos portugueses (Cabral & Macuch, 2016; Castro, 2016; Marques, 2016; Pereira, Ponte, & Costa, 2018), e o termo ageísmo é utilizado em estudos brasileiros (Paula Couto et al., 2009; Fernandes-Eloi et al., 2020; França et al., 2017; Siqueira-Brito et al., 2016; Silva & França, 2015). Neste artigo, optou-se pelo vocábulo ageísmo para valorizar o português, idioma utilizado no Brasil, país em que foi desenvolvido o estudo. As discussões sobre o ageismo mostram que esse fenômeno é um conceito dinâmico e que vem se ampliando com o passar do tempo (Ayalon & Tesch-Römer, 2018). O ageísmo é visto como um fenômeno multidimensional e a definição de atitude tem sido usualmente utilizada pelos pesquisadores para compreender as dimensões cognitiva, afetiva e comportamental desse fenômeno (Ayalon et al., 2019).

Embora evidencie-se o aumento da população idosa mundialmente, comparativamente a outras formas de preconceito, o ageísmo é menos estudado (Cary et al., 2017). A este respeito, foi realizado um levantamento exploratório no Google Acadêmico, no dia 22 de dezembro de 2020, com os descritores "racismo/racism", "sexismo/sexism", "homofobia/homophobia" e "idadismo/ageismo/ageism". A partir da utilização do descritor racismo foram localizadas 410.000 publicações (racism: 1.640.000), seguido do descritor sexismo com 68.900 publicações (sexism: 382.000), o descritor "homofobia" constatou 50.500 produções (homophobia: 178.000), e, por último, com menor prevalência, o descritor idadismo identificou apenas 1.070 produções (ageismo: 440; ageism: 79.300). Esses dados indicam que, quando comparado a outros tipos de preconceito, a temática do ageísmo apresenta menor interesse pelos pesquisadores.

Diante da grande lacuna de pesquisas nessa temática, a Organização Mundial da Saúde (OMS) em maio de 2016 instaurou uma resolução que estabelece a campanha mundial de combate ao ageísmo. Para tanto, a OMS promoveu, em julho de 2017, uma reunião com diversos pesquisadores com o intuito de desenvolver projetos de revisões sistemáticas acerca do tema ageísmo (Officer & Fuente-Núñez, 2018). Neste contexto, Ayalon et al. (2019) realizaram uma revisão sistemática a fim de identificar as escalas existentes que mensuram o ageísmo bem como as suas propriedades psicométricas. A coleta de dados foi realizada com a utilização do descritor ageism com combinação de diferentes descritores sobre a temática (por exemplo: estereótipo, preconceito, discriminação), acessados em 14 bases de dados internacionais, dentre elas, a PubMed e PsychInfo. Foram inclusos artigos completos, publicados entre o período de 1970 e 2017, escritos nos idiomas inglês, espanhol e francês. A partir dos achados, foram identificadas onze escalas explícitas de ageísmo. Apesar do ageísmo ser compreendido como um fenômeno multidimensional, a maioria das escalas analisaram suas dimensões de forma independente, sendo mensurado com maior prevalência o aspecto cognitivo da atitude (estereótipos; f = 11), seguido do afetivo (preconceito; f = 6) e com menor frequência a dimensão comportamental (discriminação; f = 4). Vale destacar que a maioria das escalas selecionadas (f = 10) não apresentou evidências psicométricas do seu construto. Dentre os instrumentos selecionados, apenas o Questionário de Expectativas sobre o Envelhecimento apresentou os parâmetros psicométricos satisfatórios (validade de conteúdo, validade estrutural, consistência interna).

Apesar da existência de uma revisão sistemática da literatura sobre as escalas que mensuram de forma explícita o ageísmo (Ayalon et al., 2019), verifica-se que esse estudo apresenta limitações, dentre elas, não foi utilizado o idioma português em sua busca nas bases de dados. Diante do exposto, verifica-se a importância de buscar instrumentos de mensuração explícita, que mensurem as atitudes em relação aos idosos e ao envelhecimento em bases de dados nacionais ou latino-americanas que não foram selecionadas na revisão sistemática anterior. Neste contexto, este estudo teve como objetivo realizar uma revisão sistemática da literatura a fim de identificar e caracterizar os instrumentos disponíveis na produção científica que avaliam as atitudes em relação aos idosos e ao envelhecimento.

 

Método

Seleção da literatura

Realizou-se uma revisão sistemática da literatura de estudos e instrumentos que avaliam as atitudes em relação aos idosos e ao envelhecimento. A busca ocorreu no período de março de 2019 nas bases de dados Scientific Electronic Library Online (SciELO), Periódicos Eletrônicos em Psicologia (PePSIC), Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS) e PsycARTICLES vinculada à American Psychological Association (APA). Estabeleceu-se essas bases por serem bases nacionais e internacionais. Não houve uma delimitação do período de publicação tendo em vista a tentativa de buscar uma visão abrangente acerca das publicações que se relacionavam com o objetivo exposto.

Para a definição dos descritores foram consideradas as principais terminologias relacionadas com a temática e o objetivo deste estudo. Os descritores foram consultados no site das Terminologias em Ciências da Saúde (DECS saúde) e o site da Terminologia em Psicologia, vinculados à Biblioteca Virtual em Saúde (BVS - Psi). Os descritores "idosos", "velhice", "preconceito" e "estigma" foram selecionados a partir das terminologias em Psicologia (BVS-Psi). Os descritores "atitude", "discriminação" e "ageismo" foram selecionados a partir da consulta no DECS Saúde. Considerou-se também o termo "idadismo", mesmo que esse termo não estivesse localizado nas buscas dos descritores, tendo em vista sua utilização por pesquisadores em estudos sobre o preconceito e a discriminação contra idosos (Castro, 2016; Marques, 2016). Embora o termo "escalas" esteja indexado no site das terminologias em Psicologia (BVS-Psi), optou-se por utilizar o descritor "escala" no singular tendo em vista que conseguia-se acessar um maior número de artigos. Desse modo, foram utilizadas 42 combinações entre os seguintes descritores: "idosos/ adultos mayores/aged" OR "velhice/vejez/old age" AND "preconceito/prejuicio/prejudice", "atitude/actitud/attitude", "discriminação/discriminación/discrimination", "ageismo/ageísmo/ageism", "estigma/estígma/stigma", "idadismo/ idadismo/idadismo", "escala/escala/scale", totalizando 14 combinações em cada idioma (português, espanhol e inglês). A fim de filtrar os estudos referentes à temática, estabeleceu-se que os descritores deveriam estar contidos no resumo dos artigos da busca.

Critérios de inclusão/exclusão

Foram considerados os seguintes critérios de inclusão: a) artigos empíricos completos; b) estudos nos idiomas português, inglês e espanhol; c) publicações de todas as áreas do conhecimento que apresentavam relação com o objetivo deste estudo; e d) estudos com delineamento quantitativo. Foram excluídos os artigos: a) duplicados; e b) estudos documentais e revisões de literatura.

Procedimento

Inicialmente, foi realizada uma busca de acordo com as bases de dados e as combinações dos descritores selecionados, a partir da leitura dos resumos, os artigos que estavam de acordo com os critérios de inclusão/exclusão. A seleção final dos artigos selecionados contou com a avaliação cega de três juízes (pesquisadores doutores com expertise na temática) por meio da leitura dos artigos recrutados após a triagem inicial. Estabeleceu-se como critério de inclusão dos artigos uma concordância de 95% entre os juízes. Por fim, realizou-se uma leitura na íntegra dos artigos e foi criada uma planilha no Excel contendo as seguintes informações sobre os estudos inclusos: a) ano de publicação; b) autores; c) revista; d) idioma; d) localização geográfica; e) delineamento do estudo; f) público amostral; g) forma de aplicação da coleta; e h) instrumentos. Semelhante ao estudo de Baptista e Borges (2016), foi realizada uma segunda planilha no Excel contendo as informações referentes aos aspectos específicos identificados em cada instrumento localizados nos artigos: a) ano de publicação do artigo de origem do instrumento; b) autores do artigo de origem do instrumento; c) parâmetros psicométricos do instrumento; d) construtos de avaliação; e) faixa etária da amostra; f) região geográfica; e g) forma de aplicação. A síntese e interpretação dos achados ocorreu a partir da análise de conteúdo (Bardin, 2016), levando em consideração as seguintes etapas: a) leitura exaustiva dos artigos selecionados e dos artigos originais dos instrumentos recrutados; b) detalhamento das características dos estudos e instrumentos; e c) análise dos juízes. Por fim, foi utilizado o formulário PRISMA (Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analysis) para a avaliação geral desta revisão (Liberati et al., 2009).

 

Resultados

Com base na busca inicial foram encontrados 10.226 artigos. Após a triagem, a partir da aplicação dos critérios de inclusão/exclusão, foram selecionados para a análise final 31 artigos (ver Figura 1). Identificou-se que a maioria dos artigos foram excluídos por estarem fora da temática proposta (85,29%). Dentre esses artigos, a maioria abordava sobre a temática da saúde (97,68%). Outras temáticas referiam-se à sexualidade (0,42%), educação (0,24%) e violência contra os idosos (0,12%).

Perfil dos estudos selecionados para a análise final

O ano de publicação dos artigos selecionados variou de 1990 a 2018, tendo como destaque o ano de 2018, totalizando sete publicações. Quanto ao público amostral selecionado nos artigos, verificou-se uma prevalência de estudos realizados com adultos (18 a 50 anos; f = 10). Referente aos pesquisadores que tiveram um maior número de publicações, foram encontrados três estudos de cada um dos seguintes autores: Luchesi, Cachioni e Pavarini. Com relação às revistas científicas, o periódico Psychology and Aging obteve o maior número de artigos sobre a temática com três publicações. A maioria dos artigos foram realizados com adultos (18 a 50 anos; f = 10), desenvolvidos no Brasil (f = 14), publicado em português (f = 16) e ocorreu de forma presencial (f = 28) (ver Tabela 1).

Perfil dos instrumentos utilizados para mensurar as atitudes em relação aos idosos e ao envelhecimento

A partir dos 31 artigos selecionados, foram identificados 18 instrumentos (ver Tabela 2). No que concerne às dimensões de avaliação do fenômeno, a maioria dos instrumentos buscaram avaliar as atitudes das pessoas frente aos idosos (f = 16), principalmente na mensuração dos estereótipos (f = 08) dos indivíduos frente aos idosos. Somente dois instrumentos objetivaram avaliar as experiências de discriminação sofridas por idosos. Os instrumentos mais utilizados nos estudos foram a Escala para Avaliação de Atitudes em Relação ao Idoso (Escala Neri) (f = 5) e a Escala de Atitudes Face aos Idosos de Kogan (Escala Kogan) (f = 4). Todos os instrumentos compuseram em sua amostra homens e mulheres, sendo a maioria projetados para adultos (18 a 45 anos; f = 7), sendo realizados predominantemente com universitários (f = 7). Ademais, assim como identificado no estudo de Ayalon et al. (2019), alguns dos instrumentos identificados não apresentaram um desses critérios dos parâmetros psicométricos: validade de conteúdo, validade fatorial e/ou consistência interna (f = 05). Dentre os achados, sete instrumentos foram adaptados para o contexto brasileiro, entretanto, alguns destes apresentaram baixo índice de precisão.

Em relação ao ano de publicação dos instrumentos, a partir do século XXI, houve um aumento nos estudos, sendo quatro publicações realizadas no início do ano 2000 e quatro estudos realizados entre 2014 e 2018. No que concerne aos autores com maior publicação de estudos de instrumentos, apenas o pesquisador Erdman Palmore destacou-se com duas publicações, A revista The Gerontologist teve um maior destaque no número de publicações (f = 2). Observa-se um maior número de publicações na área da Gerontologia (f = 6) e Psicologia (f = 5). A maioria dos instrumentos foram construídos nos Estados Unidos (f = 9), publicados no idioma inglês (f = 11), mensurados pela escala tipo Likert (f = 9) e aplicados de forma presencial (f = 17) (ver Tabela 3).

 

Discussão

Este estudo teve como objetivo realizar uma revisão sistemática com o intuito de identificar e caracterizar os instrumentos disponíveis na produção científica que avaliam as atitudes em relação aos idosos e ao envelhecimento nas bases SciELO, PePSIC, LILACS e PsycARTICLES. De modo geral, os resultados deste estudo assemelham-se aos achados da revisão sistemática realizada por Ayalon et al. (2019) no que se refere à ausência de clareza dos instrumentos sobre qual dimensão do ageísmo está sendo avaliada, sobre suas evidências psicométricas e no interesse predominante da análise da dimensão cognitiva da atitude.

Observou-se que no ano de 2018 houve um maior interesse na investigação da temática sobre preconceito e a discriminação contra idosos. Tanto nos estudos selecionados que utilizaram instrumentos quanto nos artigos originais dos instrumentos houve uma maior prevalência de publicações entre os anos de 2015 e 2019. Em relação aos instrumentos que analisam as atitudes das pessoas frente aos idosos, os seguintes instrumentos obtiveram maior destaque no quantitativo de estudos realizados: Escala Neri e a Escala Kogan. Estes dois instrumentos utilizam a técnica de diferencial semântico na sua mensuração e possuem o objetivo de analisar as atitudes que as pessoas possuem em relação 3à velhice. A Escala Neri foi construída por Neri (1991) e apresenta em sua estrutura quatro domínios fatoriais: 1) Cognitivo; 2) Agência; 3) Relacionamento Social; 4) Persona. A Escala Kogan foi desenvolvida por Kogan (1961) e possui dois fatores: atitude positiva e atitude negativa. De modo geral, a maioria dos estudos (f = 24) e instrumentos (f = 08) concentraram-se na análise da dimensão cognitiva da atitude. Identificou-se que apenas a Escala de Idadismo de Fraboni (FSA; Fraboni, Saltstone, & Hughes, 1990) foi construída para avaliar não somente a dimensão cognitiva, mas, para incorporar conjuntamente a essa análise, a dimensão afetiva e comportamental da atitude. No geral, as medidas de atitudes objetivaram medir os estereótipos dos indivíduos frente aos idosos, foram desenvolvidas nos Estados Unidos, com o foco em pessoas adultas (18 a 45 anos) e estudantes universitários.

Em contrapartida, apenas dois instrumentos foram planejados com o enfoque na avaliação das experiências de discriminação sofridas pelos idosos sob a perspectiva do grupo-alvo. O Ageism Survey (Palmore, 2001) foi o instrumento mais utilizado nos estudos sobre discriminação selecionados desta revisão. Esta medida foi desenvolvida por Palmore (2001), a partir da participação de idosos do Canadá e Estados Unidos. Apesar da validade desta medida para a avaliação da discriminação contra idosos (α = 0,81), Palmore (2001) indicou a necessidade de inclusão de itens que apresentem a discriminação contra idosos em suas novas configurações. O Ageism Survey foi adaptado e utilizado em diversas pesquisas no Brasil (Paula Couto et al., 2009; Fernandes-Eloi et al., 2020; Silva & França, 2015). No entanto, estes estudos revelaram limitações quanto à sua utilização no contexto brasileiro. Dentre elas, os autores apontaram a necessidade de ampliar a mensuração do instrumento destinado para avaliar a discriminação vivenciada por idosos, bem como a retirada de itens que não contemplam a realidade dos idosos brasileiros (ex.: enviar cartão). Ademais, direitos concedidos aos idosos no Brasil respaldados pelo Estatuto do Idoso (Brasil, 2003), como por exemplo o acesso às filas preferenciais, podem ser vistos como um acréscimo de episódios de discriminação contra idosos.

Ressalta-se que embora fique evidente que o ageísmo tenha sido mensurado como uma atitude, observou-se pouca relação entre a base teórica dos artigos e as dimensões propostas pelas escalas. Apesar deste fenômeno já ter sido abordado na literatura, ainda há um desconhecimento sobre as formas de atuação do preconceito (Vieira, 2018). Isso possivelmente, pode afetar a qualidade da mensuração na área, assim como sobre suas evidências de validade. Ademais, pode potencializar a naturalização e internalização de crenças errôneas sobre a velhice (Ayalon & Tesch-Römer, 2018), fortalecer a discriminação contra idosos e a falta de interesse dos pesquisadores pela temática.

A partir desta revisão sistemática percebeu-se que o interesse dos estudos e instrumentos sobre as atitudes em relação aos idosos e ao envelhecimento se concentram entre os anos de 2015 e 2019 e apresentou um foco maior na análise da dimensão cognitiva da atitude. Em síntese, pode-se concluir que o componente afetivo/avaliativo (preconceito) parece ser aquele que é menos representado na mensuração explicita. Observou-se também que há uma carência de medidas que mensurem as experiências de discriminação relatadas por idosos, bem como os comportamentos de outros indivíduos direcionados a esse grupo. Dentre as limitações identificadas nos instrumentos, verifica-se algumas fragilidades na articulação entre as teorias utilizadas para explicar o ageísmo e as dimensões analisadas nas medidas. Além disso, a maioria dos instrumentos foram desenvolvidos no exterior e, quando adaptados para o Brasil, não apresentaram índices de validade e precisão satisfatórios. Por fim, o foco dos instrumentos se direciona à mensuração das atitudes ou discriminação sofridas por idosos. Contudo, a discriminação etária pode ocorrer contra outros grupos etários (ex.: crianças e adolescentes).

Este estudo ao apresentar o cenário latino-americano das produções acerca das atitudes direcionadas aos idosos contribuiu para evidenciar as lacunas existentes na literatura sobre essa temática. Também servirá como diretriz para o desenvolvimento de novas pesquisas e instrumentos voltados para essa área que ainda é pouco explorada na literatura. Dentre as limitações desta pesquisa, está a quantidade e a área das bases de dados na qual a pesquisa foi realizada. Esta revisão foi realizada sobretudo em bases de dados vinculadas à área da Psicologia. Todavia, como os resultados apresentaram, o processo de envelhecimento vem sendo estudado de forma interdisciplinar. Ademais, é possível que a grande quantidade de artigos obtidos e excluídos esteja relacionado com a abrangência e variabilidade dos termos utilizados na busca dos dados. Em estudos futuros, a utilização de termos mais específicos (por exemplo, estereótipos) poderá suprir essa limitação.

Recomenda-se o desenvolvimento de instrumentos (principalmente construídos no Brasil) que avaliem os demais aspectos das atitudes, além do cognitivo, bem como as experiências de discriminação sofridas por idosos. O perfil dos instrumentos identificado nesta revisão foi realizado predominantemente com estudantes universitários. Desse modo, sugere-se que os novos instrumentos sejam desenvolvidos com amostras heterogêneas em relação ao gênero, idade, renda, cor da pele e escolaridade. Esses avanços podem afetar a qualidade da mensuração na área, assim como nos parâmetros psicométricos das escalas.

 

Agradecimentos

Os agradecimentos se estendem ao programa de pós-graduação em Psicologia da Unifor, aos membros do Laboratório de Estudos sobre Processos de Exclusão Social (LEPES - Unifor) e à FUNCAP pelo financiamento à pesquisa.

Financiamento

Todas as fontes de financiamento para elaboração e produção do estudo (coleta, análise e interpretação dos dados, bem como, escrita dos resultados no presente no manuscrito) foram fornecidas pelo projeto de pesquisa FUNCAP.

Contribuição dos autores

Declaramos que todos os autores participaram da elaboração do manuscrito. Especificamente, as autoras Angélica Maria de Sousa Silva e Luana Elayne Cunha de Souza participaram da redação inicial do estudo - conceitualização, investigação, visualização, os autores Angélica Maria de Sousa Silva, Luana Elayne Cunha de Souza e Lucas Cardoso Aires participaram da análise dos dados, e os autores Angélica Maria de Sousa Silva, Luana Elayne Cunha de Souza e Lucas Cardoso Aires participaram da redação final do trabalho - revisão e edição.

Disponibilidade dos dados e materiais

Todos os dados e sintaxes gerados e analisados durante esta pesquisa serão tratados com total sigilo devido às exigências do Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos. Porém, o conjunto de dados e sintaxes que apoiam as conclusões deste artigo estão disponíveis mediante razoável solicitação ao autor principal do estudo.

Conflito de interesses

Os autores declaram que não há conflitos de interesses.

 

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Endereço para correspondência:
Angélica Maria de Sousa Silva
Universidade de Fortaleza
Fortaleza, CE, Brasil. CEP 60811-905
ppgp@unifor.br
Tel. (85) 9 8830-4975
E-mail: angelica_psi.silva@hotmail.com

Recebido em março de 2020
Aprovado em abril de 2011

 

 

Nota dos autores:
Angélica Maria de Sousa Silva, é psicóloga (Estácio). Doutoranda e Mestre em Psicologia pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR). Bolsista FUNCAP.
Luana Elayne Cunha de Souza, é psicóloga (UFPB). Doutora em Psicologia pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Professora adjunta no Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Psicologia da Universidade de Fortaleza. Coordenadora do Laboratório de Estudos sobre Processos de Exclusão Social (LEPES).
Lucas Cardoso Aires, é graduando em Psicologia pelo Centro Universitário Ateneu.
"Artigo derivado da 'Dissertação de mestrado' de 'Angélica Maria de Sousa Silva' com orientação de 'Luana Elayne Cunha de Souza', defendida em '2020' no programa de pós-graduação 'em Psicologia do Centro de Ciências da Saúde' da 'Universidade de Fortaleza'".

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