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Revista da SPAGESP

versión impresa ISSN 1677-2970

Rev. SPAGESP vol.23 no.2 Ribeirão Preto jul,/dic. 2022

https://doi.org/https://doi.org/10.32467/issn.2175-3628v23n2a12 

https://doi.org/10.32467/issn.2175-3628v23n2a12

ARTIGOS

 

Comparações do desempenho social de crianças submetidas à intervenção musicoterapêutica: estudo piloto

 

Comparisons of the social performance score of children undergoing music therapy intervention: pilot study

 

Comparaciones de la puntuación de desempeño social de los niños sometidos a una intervención de musicoterapia: estudio piloto

 

 

Thaciana Araujo da Silva1,I; Lilia Iêda Chaves Cavalcante2,I; Ana Emília Vita Carvalho3,II

IUniversidade Federal do Pará, Belém-PA, Brasil
II
Centro Universitário do Pará, Belém-PA, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Este estudo comparou medidas de desempenho social em crianças integrantes de um programa de intervenção musicoterapêutica. Participaram sete crianças de idades entre sete a nove anos, sendo seis meninos e uma menina, e também seus pais. Os instrumentos utilizados foram SSRS para avaliar habilidades sociais e IMTAP, apenas o domínio social. Os resultados não apontaram diferenças estatisticamente significativas entre as medidas avaliadas. Na reavaliação houve aumento nos escores pela IMTAP, já pelo SSRS houve diminuição nas habilidades sociais nas duas versões - crianças e pais, além de aumento nos escores dos comportamentos problemáticos. O relato dos pais indicou melhorias na emissão de comportamentos sociais adequados.

Palavras-chave: Musicoterapia; Habilidades sociais; Crianças em idade escolar.


ABSTRACT

This study compared measures of social performance in children participating in a music therapy intervention program. Seven children aged between seven and nine years participated, six boys and one girl, as well as their parents. The instruments used were SSRS to assess social skills and IMTAP, only the social domain. The results did not show statistically significant differences between the measures evaluated. In the reassessment there was an increase in the scores by the IMTAP, on the other hand by the SSRS, there was a decrease in social skills in both versions – children and parents, in addition to an increase in scores problematic behavior. The parents' report indicated improvements in the emission of appropriate social behaviors.

Keywords: Music therapy; Social skills; Elementary school students.


RESUMEN

Este trabajo comparó medidas de desempeño social em niños participaron em un programa de intervención de musicoterapia. Participaron siete niños de entre siete y nueve años, siendo seis niños y una niña, así como sus padres. Los instrumentos utilizados fueron SSRS para evaluar habilidades sociales e IMTAP, solo el dominio social. Los resultados no apuntaran a diferencias estadísticamente significativas entre las medidas evaluadas. En la reevaluación, hubo un aumento em los puntajes por el IMTAP, por otro lado, por el SSRS, hubo una disminución en las habilidades sociales en ambas versiones, niños y padres, además de un aumento en los puntajes de comportamientos problemáticos. El informe de los padres indicó mejoras en la emisión de conductas sociales adecuadas.

Palabras clave: Musicoterapia; Habilidades sociales; Estudiantes de 1er grado.


 

 

Prejuízos na área social têm sido estudados por meio da mensuração de habilidades sociais e relações com variáveis pessoais e contextuais do indivíduo, tais como idade, gênero (Amaral, 2018; Machado et al., 2020; Reis & Sampaio, 2018; Silva & Cavalcante, 2015; Van Groll & Andretta, 2016), e ano escolar (Amaral, 2018; Silva & Cavalcante, 2017). Estas habilidades são aprendidas ao longo do desenvolvimento da pessoa e sofre influência de variáveis pessoais, situacionais, cognitivas e ambientais (Caballo, 2003; Del Prette & Del Prette, 2005; Leme et al., 2016). Algumas habilidades consideradas na infância são civilidade, fazer amizades, empatia e solução de problemas (Del Prette & Del Prette, 2005).

Quando ocorre pouca estimulação da dimensão social do desenvolvimento infantil, configura-se um déficit nesta área, e que reverbera em outras, conforme é apontado na literatura sobre relação entre déficits em habilidades sociais, com problemas de comportamento (Casali-Robalinho et al., 2015; Souza et al., 2018) e desempenho escolar (Fernandes et al., 2018). Assim, um repertório adequado de habilidades sociais pode prevenir dificuldades de interação com os pares.

Um instrumento de medida de habilidades sociais e de aplicação internacional é o Social Skill Rating System que teve sua validação no Brasil, em 2009, e foi traduzido e adaptado por Del Prette et al. (2016). Este instrumento propõe medidas de habilidades sociais a partir de fatores, mas também apresenta levantamento de dados de problemas de comportamento a partir da perspectiva de pais e professores, sendo que estes últimos avaliam competência acadêmica.

A avaliação é o primeiro passo para nortear a intervenção necessária e uma das formas de estimular o desenvolvimento de relações interpessoais, é através do uso da música (Chong & Kim, 2010; McIntyre, 2007; Pasiali & Clark, 2018; Rickard et al., 2012; Torres & Letelier, 2015). Os estudos de musicoterapia com enfoque em melhorias no desempenho social têm sido aplicados com pessoas com autismo (Bharathi et al., 2019a; Bharati et al., 2019b; Fleury & Santos, 2016) por exemplo, sendo ainda incipiente em populações com desenvolvimento típico e em contexto de vulnerabilidade social (Figueredo & Amorim, 2020). Citam-se alguns estudos que investigaram desempenho de habilidades sociais (Pasiali & Clark, 2018), problemas de comportamento, impulsividade (Chong & Kim, 2010; Fasano et al., 2019; Williams, 2018) e funcionamento social (Porter et al., 2017), antes e após intervenções através da musicoterapia.

Um estudo que ofereceu um programa de musicoterapia de 16 semanas para 89 estudantes, separados em grupos de quatro a seis alunos, foi o de Chong e Kim (2010) e teve por objetivo promover habilidades acadêmicas, diminuir comportamentos problemáticos e melhorar a competência acadêmica. A avaliação realizada ocorreu por meio do Social Skills Rating System (SSRS) antes e após a intervenção e encontraram melhorias significativas em áreas de habilidades sociais e de problemas de comportamento.

Melhorias nas habilidades sociais e no desempenho acadêmico de crianças em idade escolar com recursos financeiros limitados, também foi investigado no estudo de Pasiali e Clark (2018), que examinou o benefício potencial de um programa de desenvolvimento de habilidades sociais por meio da musicoterapia em uma comunidade escolar, para 20 crianças com idades entre 5 e 11 anos. O programa consistiu em oito sessões de 50 minutos e foi medida competência social e comportamento antissocial através da Escala Comportamento Social em Casa e Comunidade (HBSC) e do Sistema de Aperfeiçoamento de Habilidades Sociais. Os resultados mostraram redução de habilidades de baixo desempenho/alto risco, apesar de não haver alteração significativa nas pontuações individuais da subescala HBSC. Outros resultados a partir da avaliação dos professores e pais indicaram melhoria significativa na comunicação, diminuição da hiperatividade e de comportamentos problemas.

Na mesma direção, Porter et al. (2017) examinaram a eficácia da prática clínica musicoterapêutica por 13 semanas em crianças e adolescentes de 8-16 anos com dificuldades sociais, emocionais, comportamentais e de desenvolvimento, conforme percepção dos pais. A primeira reavaliação ocorreu na 13ª semana e encontrou melhoria na comunicação pelo Social Skill Improvement System (SSIS) para adolescentes com idade a partir de 13 anos em intervenção em grupo, e na 26ª foi encontrada melhorias no funcionamento social, autoestima, depressão e funcionamento familiar.

Nestes estudos apresentados, observa-se que não houve relato de resultados com diferenças significativas (Chong & Kim, 2010; Pasiali & Clark, 2018), apesar de indicações positivas nas pontuações dos participantes em aspectos de comunicação e funcionamento social e da redução de desempenho de habilidades de risco pela percepção de professores e pais (Pasiali & Clark, 2018; Porter et al., 2017). Estes achados foram atribuídos ao tempo de intervenção que possa ter sido insuficiente.

Em termos de estudos nacionais descritivos e qualitativos, cita-se o de Brasil (2012) que investigou aspectos comportamentais e relacionais em uma amostra de crianças com dificuldades de aprendizagem, submetidos à musicoterapia. Neste estudo foram utilizadas entrevistas semiestruturadas com os alunos, professores e familiares, bem como observações durante as ações de musicoterapia. As crianças durante as intervenções apresentavam muitos conflitos interpessoais e comportamentos inadequados, sendo observado que a musicoterapia no contexto escolar possibilitou um espaço de expressão das relações e de conflitos, além de novas e significativas experiências ao sujeito (fazer e experimentar) o que, segundo a autora, favoreceu a internalização de novas aprendizagens e, consequentemente, do desenvolvimento.

Além desses aspectos, habilidades sociais também podem ser desenvolvidas, principalmente em musicoterapia grupal, já que o indivíduo é exposto a situações como esperar a vez de tocar/cantar, aprender a seguir comandos, a concentrar-se na tarefa, passa a se comunicar corporalmente por meio de olhares, respiração e gestos típicos do meio musical (Machado, 2008; Nascimento, 1999). Outras consequências esperadas a partir das sessões de musicoterapia grupal incluem formar novas amizades, conseguir pedir ajuda, solicitar opinião do outro para avaliar sua execução, e emitir opiniões, o que para crianças e adolescentes deve ser visto como fundamental para sua autoestima e para um desenvolvimento saudável (Carminatti & Krug, 2010; Heyworth, 2013; Machado, 2008). Williams (2018), por exemplo, identificou que atividades em grupo de pré-escolares podem melhorar as funções motoras, auditivas e de autorregulação, ao estimular a sincronização rítmica e coordenação motora.

Uma revisão da literatura feita por Suzuki e Vitalle (2020) aponta que a musicoterapia em contexto escolar tem como foco alunos que apresentam problemas de comportamento, e as sessões podem favorecer o desenvolvimento da empatia, autoconhecimento e a expressão de pensamentos e sentimentos, contribuindo para a auto regulação e diminuição de reações não-habilidosas, como por exemplo, a prática do bullying e agressividade.

Percebe-se nesses estudos qualitativos que as crianças que apresentam dificuldades de aprendizagem, também manifestaram problemas de comportamento e déficits em habilidades sociais. Segundo Gomes (2008), a criança é um ser muito expressivo e sinaliza corporalmente o que sente, seja através de choro, agitação, falta de concentração e até de atitudes agressivas.

A música é uma ferramenta de efeitos positivos na escola e é uma prática já presente como educação musical, enquanto que a musicoterapia nesse contexto ainda precisa avançar no Brasil, apesar de evidências favoráveis para a aprendizagem e relações interpessoais, quando implementadas em ambientes educacionais (Fioerese et al., 2020; Santos Junior et al., 2018). No que diz respeito às pesquisas brasileiras sobre musicoterapia na escola, são predominantes as qualitativas (Gomes, 2011), e com pouca ou ausência de utilização de instrumentos de avaliação padronizados e validados (Zmitrowiczab & Moura, 2018), e por isso, ressalta-se a importância de se buscar outras formas de investigação nesta área estudada, como por exemplo, seguindo o método experimental. Assim, o objetivo deste estudo foi comparar medidas de desempenho social em crianças integrantes de um programa de intervenção musicoterapêutica através de instrumentos específicos. Levantou-se a hipótese de que as medidas de desempenho social obteriam escores maiores na reavaliação.

 

MÉTODO

A pesquisa seguiu delineamento experimental do tipo sujeito único. O delineamento experimental busca o controle e manipulação de variáveis, realizando medidas pré-teste e pós-teste de sujeito único. Ou seja, as medidas de cada participante foram avaliadas antes e depois do experimento, e cada sujeito foi comparado com ele mesmo (Sampaio et al., 2008).

PARTICIPANTES

Os participantes foram sete crianças com idade entre sete e nove anos, sendo seis meninos e uma menina, estudantes do 2º ao 4º ano do ensino fundamental. Os critérios de inclusão foram: integridade visual e auditiva, sem restrição a sons ou música, sem exposição anterior a atividades musicais ou estivessem sendo acompanhado em algum processo musicoterapêutico. Os critérios de exclusão referiram-se ao preenchimento de protocolos incompletos e frequência abaixo de 80% em todo o processo.

Na Tabela 1 está a caracterização sociodemográfica e informações sugestivas de dificuldade de aprendizagem entre as crianças participantes, conforme relato dos cuidadores.

As crianças participantes tinham de sete a nove anos de idade (M=7,85; DP = 0.899), com renda familiar de 1 a 2 salários-mínimos, e a mãe como cuidador principal. Com exceção da Participante 7, todas as crianças segundo os registros no documento consultado, apresentavam dificuldade de aprendizagem (leitura e matemática) não diagnosticadas, segundo informações dos pais.

Tabela 1

 

AMBIENTE

A coleta de dados da pesquisa foi realizada em uma instituição atende crianças em idade escolar de sete a onze anos, no horário do contraturno escolar, por meio de um projeto voltado à educação, saúde e empreendedorismo de famílias em situação de vulnerabilidade na cidade de Belém-PA. Além de reforço escolar, são ofertadas rodas de leitura, aulas de inglês, inclusão digital e serviços de saúde (médico e odontológico). A aplicação dos instrumentos com as crianças foi realizada na sala onde funciona a Biblioteca. A coleta de dados com os responsáveis ocorreu no auditório e os dados sociodemográficos foram obtidos por meio de consulta ao setor do serviço social da instituição disponíveis na sala da Assistência Social.

INSTRUMENTOS E TÉCNICAS

Roteiro de Entrevista de Percepção do Cuidador: Elaborado pela autora, o roteiro é dividido em duas partes: a primeira solicita informações de identificação, idade e ano escolar da criança, e inclui perguntas sobre a expectativa da participação da criança no programa aplicado antes da intervenção; a segunda parte aborda perguntas sobre a percepção do responsável em relação a mudanças e possíveis ganhos da criança no comportamento, desempenho escolar e área emocional.

Sistema de Avaliação de Habilidades Sociais/Social Skills Rating System (SSRS): De Gresham e Elliott (2016), traduzido e adaptado ao Brasil e permite avaliar três áreas do comportamento de crianças de 06-13 anos: Habilidades sociais, Problemas de comportamento e Competência acadêmica. Os fatores avaliados na área de habilidades sociais são: (a) Autoavaliação (crianças): Responsabilidade; Empatia; Assertividade; Autocontrole; Evitação de problemas; Expressão de sentimento Positivo; (b) Avaliação-Pais: Cooperação; Amabilidade; Iniciativa/Desenvoltura social; Asserção; Autocontrole/civilidade; Autocontrole passivo; (c) Avaliação Professores: Responsabilidade; Asserção positiva; Autocontrole; Autodefesa; Cooperação com Pares Afetividade/cooperação; Desenvoltura social e Civilidade. Nas três versões a frequência de habilidades sociais é medida pela escala likert que possui três alternativas de respostas nunca = 0, algumas vezes =1 e muito frequente = 2. A área que avalia indicadores de comportamentos problemáticos gera fatores de Comportamentos Internalizantes e Comportamentos Externalizantes. A Competência Acadêmica é avaliada nas seguintes categorias: entre os 10% piores = 1; entre os 20% piores = 2; entre os 40% médios = 3; entre os 20% bons = 4; e entre os 10% melhores = 5. Neste estudo a versão professores não entrou na análise devido a não adesão dos mesmos e respostas incompletas dos questionários referentes às crianças que compuseram a amostra do estudo.

A consistência interna das estruturas fatoriais confirmatórias foi avaliada por meio da confiabilidade composta, encontrando valores razoáveis na versão Pais para Habilidades Sociais (F1=0,69, F2=0,73, F= 0,62, F4=0,65, F5=0,63) e Problemas de comportamento (F=0,84, F2=0,64); e valores abaixo do esperado para Habilidades Sociais (F=0,52, F2=0,58, F=0,49, F=0,34), versão-crianças.

Individualized Music Therapy Assessment Profile (IMTAP): É um instrumento elaborado por um grupo de norte-americanos traduzido e validado por Silva (2012) divididos em dez domínios que são musicalidade, comunicação expressiva, comunicação receptiva/percepção auditiva, interação social, motricidade ampla, motricidade fina, motricidade oral, cognição, habilidade emocional e habilidade sensorial. Os subdomínios possuem diversas habilidades totalizando 374 na escala completa. A pontuação para cada um varia conforme a escala likert de Nunca (0%), Raramente (abaixo de 50%), Inconsistente (50-79%) e Consistente (80-100%), conforme a presença de determinado comportamento da criança em cada subdomínio. Para este estudo foram selecionados apenas os domínios cognitivo e social relacionados aos objetivos da pesquisa.

MATERIAIS

Fichas dos instrumentos aplicados, canetas, pastas, pranchetas, instrumentos musicais, tatames, celular para filmagem.

PROCEDIMENTO

No primeiro momento houve solicitação de autorização da instituição, a qual fez uma lista das crianças 22 e, foi realizada uma reunião com os pais para a apresentação da pesquisa e, 11 responsáveis que concordaram em participar, junto com sua criança, assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e Termo de Assentimento. Das 11 crianças que finalizaram todas as etapas do processo avaliativo, apenas 7 crianças obtiveram o mínimo de frequência de 80% nas sessões, sendo estas crianças selecionadas para a análise dos dados.

A coleta de dados foi realizada em dias e horários previamente combinados, sendo a aplicação do Roteiro de entrevista do cuidador e do SSRS-versão pais realizada por voluntários graduandos da área da saúde, de forma individualizada, a autoavaliação do SSRS foi aplicada por um psicólogo, e a IMTAP foi preenchida por musicoterapeutas. O período de reavaliação ocorreu após a intervenção. Ressalta-se que os colaboradores que coletaram essas informações foram treinados previamente, não possuindo acesso às hipóteses e nem participação em qualquer outra etapa do estudo.

CUIDADOS ÉTICOS

A pesquisa obteve aprovação do comitê de ética sob o parecer 3.285.513, do Núcleo de Medicina Tropical da Universidade Federal do Pará (UFPA).

INTERVENÇÃO

Foram realizadas 10 sessões de musicoterapia com duração de 30 a 40 minutos, sendo a primeira e a última sessões de avaliação e reavaliação, respectivamente. O número de sessões foi definido conforme o calendário escolar, mas principalmente após a revisão da literatura sobre intervenções musicais anteriores e o tempo da sua aplicação nessas pesquisas. As crianças foram divididas em dois grupos, um no turno da manhã com cerca de 3 a 5 crianças e no turno da tarde, com 3 a 6 crianças. Os grupos foram divididos conforme o turno que as crianças frequentavam no projeto social da instituição. A pesquisadora musicoterapeuta foi cega às características das crianças bem como de seus desempenhos na avaliação. A sala era organizada com tatame e os instrumentos de percussão permaneciam numa caixa e o violão no canto da sala, sendo somente manuseados quando a atividade realizada requeresse o seu uso. As atividades envolveram movimento e percussão corporal, canções e execução de instrumentos. O celular para filmagem ficava acoplado em um suporte em um dos cantos da sala.

 

Tabela 2

 

ANÁLISE DOS DADOS

O roteiro de entrevista de percepção do cuidador obteve informações qualitativas e estas foram categorizadas conforme dimensões comportamento, social e acadêmico. Já os dados da IMTAP foram analisados por meio das filmagens da primeira e da última, sendo selecionadas três atividades para análise, com duração de 2-5 minutos, por dois juízes e mais a pesquisadora. Os juízes possuíam formação em musicoterapia e tinham treinamento na aplicação do instrumento, e estavam cegos ao problema de pesquisa.

O índice de concordância entre os avaliadores para o domínio social foi de 94% na avaliação e reavaliação. Segundo Matos (2014), o índice de concordância é considerado aceitável quando atinge o mínimo de 75% e valores a partir de 90% são considerados altos. Para o cálculo dos escores total do domínio avaliado (social), dividiu-se a soma dos escores brutos de cada subdomínio pelo número do escore total possível, e o valor encontrado pode ser transformado em porcentagem (Silva, 2012).

Os dados do SSRS foram pontuados conforme manual e inseridos em plataforma on-line Pearson para avaliação de cada criança, e os escores foram avaliados conforme os percentis do instrumento. O valor do escore geral de habilidades sociais, e de cada fator é obtido pela soma das pontuações de cada item que corresponde a um valor na tabela de "percentis para escore geral". Além disso, a pontuação de cada criança foi inserida em banco de dados no Excel, assim como o escore gerado na plataforma para produção de gráfico do desempenho geral das crianças.

As informações coletadas foram armazenadas no software Excel 2010™ onde também foram confeccionados os gráficos. Os testes de Shapiro-Wilk e Lilliers e o teste t de Student foram utilizados para analisar as variáveis com distribuição normal, e comparação das mesmas respectivamente. Foi adotado o nível α de 0,05 para rejeição da hipótese nula.

 

RESULTADOS

Na Tabela 3 estão contidas informações sobre comportamento e desempenho social antes e após a intervenção, de acordo com o relato dos cuidadores. Nota-se que, na categoria comportamento, apenas os cuidadores dos Participantes 1 e 6 referiram um quadro de melhora após a intervenção, sinalizado por respostas como "Menos impulsivo" e "Mais calma e tolerante", respectivamente. No aspecto social, segundo o relato do cuidador de cada criança participante, houve melhorias na interação social em P1, na variação de brincadeiras envolvendo música em P3, em P4 relato de estar menos agressivo, P6 em brincar sem bater e P7 como brincando com as irmãs sem brigar. P2 e P5 não referiram mudanças.

Tabela 3

 

Na Figura 1 são apresentados os escores de habilidades sociais de seis participantes, comparando medidas de avaliação e reavaliação. Com exceção de P4, todas as crianças na autoavaliação apresentaram baixo escore na reavaliação do seu desempenho no quesito habilidades sociais, mas em termos de classificação, todas as crianças participantes, permaneceram na faixa considerada repertório abaixo da média inferior, com exceção de P2 que variou de repertório médio inferior para abaixo da média inferior, e P6 que permaneceu na faixa de repertório médio inferior. Os dados de P7 na autoavaliação deste instrumento não compuseram esta análise por estar incompleto.

Figura 1

 

Na Figura 2, os escores finais do domínio social, de acordo com o IMTAP, são representados. Na avaliação do domínio social P6 estava na faixa inconsistente e os demais na faixa consistente, enquanto que, na reavaliação, houve ganhos discretos em P1, P2 e P7; já P3 e P5 apresentaram diminuição nos escores e P4 permaneceu com o mesmo valor.

Figura 2

 

A Tabela 4 apresenta a média e desvio-padrão das variáveis do IMTAP e SSRS para o momento de avaliação e reavaliação, bem como o nível de significância da diferença das médias entre esses dois momentos.

Tabela 4

 

Não houve diferença estatisticamente significativa, na comparação das medidas de avaliação e reavaliação. As médias apontam aumento das medidas gerais na reavaliação pela IMTAP, permanecendo na faixa de classificação consistente; e na subescala de comportamento problemáticos pelo SSRS, enquanto que nas médias gerais de habilidades sociais nas duas versões houve diminuição. Os escores gerais da reavaliação das medidas de habilidades sociais de comportamentos problemáticos sofreram alteração na reavaliação. Os participantes apresentaram repertório acima da média superior para problemas de comportamento, e repertório abaixo da média inferior para habilidades sociais nas versões pais e criança.

 

DISCUSSÃO

Os resultados do teste relacionados às medidas sociais antes e após a intervenção não apontaram diferenças significativas como observado no estudo de Pasiali e Clark (2018), e no de Chong e Kim (2010), porém os resultados do SSRS foram ao encontro do de Rickard et al. (2012), em que houve aumento de presença de comportamentos agressivos similar ao aumento de comportamentos-problemas apontados pelos pais por meio do SSRS. Dado que diferiu do estudo de Porter et al. (2017), no qual ocorreu melhorias no funcionamento social e comunicação em adolescentes de 13 anos, mas sem mudanças nas crianças com idade inferior, que é a faixa etária do presente estudo.

Levanta-se a hipótese de que os pais poderiam não estar sensíveis para mudanças comportamentais pontuais das crianças elencadas no instrumento SSRS, indicando que há necessidade de esclarecimento acerca de comportamentos adequados e inadequados, bem como a consequência que o cuidador fornece para ambos. Neste sentido, medidas de autoavaliação e percepção dos pais podem supervalorizar problemas de comportamento inadequados e minimizar habilidades sociais adequadas (Rickard et al., 2012). Em contrapartida, as medidas da IMTAP que avaliou o repertório da criança em sessão, no contexto de grupo a partir de filmagens, indicou um repertório social adequado considerado consistente em 80% das vezes e no roteiro utilizado com os pais, os participantes P1, P4, P6 e P7 foram descritos após a intervenção com menos comportamentos agressivos e brincadeiras com menos brigas.

Assim, os resultados apontam para melhorias discretas em termos de escore no repertório social das crianças, conforme a IMTAP e pelos relatos dos pais, em um período de 3 meses, sugerindo que um tempo maior poderia oferecer mudanças mais expressivas, conforme os estudos de Porter et al. (2017) e Pasiali e Clark (2018) apontam.

Os aspectos sociais durante a fase da infância vão se aprimorando conforme a idade e número de contextos vivenciados (Amaral, 2018; Machado et al., 2020; Reis & Sampaio, 2018; Silva & Cavalcante, 2015; Van Groll & Andretta, 2016). E neste caso, a intervenção em musicoterapia, considerada como um contexto de desenvolvimento, proporcionou oportunidades de estimular seguimentos de instruções, expressividade verbal e musical, habilidades de espera, empatia e civilidade. Nestas condições, os escolares participantes entraram em contato com percepção de si mesmos, bem como sobre suas condutas ao longo das sessões através da mediação musicoterapeuta.

Além disso, as atividades oferecidas, os objetos presentes nas sessões, as condutas adotadas na interação foram elementos favoráveis para mudanças pontuais, tais como na execução de instrumentos musicais, itens não-musicais, atividades sonoras que exigiam a criatividade e exposição de cada participante e os modelos de comportamentos e regras desempenhados pelos papéis da terapeuta.

Nota-se, portanto, com os resultados do estudo piloto, que escolas possuem potencial em oferecer intervenções de musicoterapia com alcance nas relações sociais dos estudantes, e consequentemente, na prevenção de problemas de comportamento, conforme apontado por Fioerese et al. (2020), Santos Junior et al. (2018) e na revisão de Suzuki e Vitalle (2020), direcionados principalmente para crianças com desenvolvimento típico que muitas vezes apresentam déficits sociais e que seriam possivelmente beneficiadas pela exposição sistemática à musicoterapia (Figueredo & Amorim, 2020). Acrescenta-se também o fato de que estudos como este, ao buscar obter medidas por instrumentos padronizados, favorecem indicadores mais precisas dos efeitos na intervenção na população aplicada.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo teve por objetivo comparar medidas de desempenho social de crianças que possuíam uma condição socioeconômica e familiar vulnerável ao desenvolvimento, antes e após intervenção musicoterapêutica de duração de 10 sessões. Os resultados não apontaram para alterações significativas nas medidas avaliadas, confirmando em parte a literatura consultada.

No que se refere aos instrumentos aplicados aos pais, sugere-se a participação também dos professores, a fim de sensibilizá-los e mostrar a importância da pesquisa e de sua colaboração, pois a informação que seria obtida, complementaria a visualização de habilidades adquiridas na sessão em outro ambiente, além do familiar.

Em relação aos participantes, houve perda ao longo da pesquisa, e dos que aceitaram, tiveram faltas e, portanto, não atingiram o critério de frequência mínima estabelecida. Neste sentido, é interessante adotar medidas que possam minimizar perdas como, por exemplo, um lanche após a intervenção, possibilidade de uma audição musical ao final da pesquisa como motivadores para maior engajamento, e oferecer palestras e formações aos pais sobre desenvolvimento infantil.

Outro ponto de limitação foi o tempo de intervenção que pode ter sido insuficiente para medidas mais expressivas de mudanças nos escores dos instrumentos, sugerindo-se, portanto, para pesquisas futuras, maior tempo de sessões interventivas, a fim de consolidar mais as habilidades aprendidas.

Aponta-se também que estudo piloto não correlacionou as medidas com variáveis com a variável idade, em função do pequeno número de participantes, assim outras investigações futuras com uma amostra maior podem realizar esta investigação também.

Este estudo contribuiu com a literatura de intervenção em musicoterapia em grupo para crianças e oferece caminhos de aplicação da intervenção, bem como apresentar resultados ainda em discussão na literatura sobre impactos que a música pode oferecer no funcionamento social da criança, e que podem variar conforme faixa etária e número de sessões realizadas, e o tamanho do grupo.

Considera-se, portanto, que ainda são necessárias outras investigações, pois segundo a literatura apresentada e os resultados encontrados, há divergências entre eles. Sugere-se que outras pesquisas envolvam não apenas medidas diretas obtidas com as crianças, mas também medidas que envolvam os pais, professores e treinamento destes no reconhecimento de comportamentos adequados e inadequados de suas crianças, bem como de seus avanços cognitivos.

 

REFERÊNCIAS

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Endereço para correspondência
Thaciana Araujo da Silva
E-mail: thacianaaraujo@yahoo.com.br

Submetido: 19/11/2021
Reformulado: 06/04/2022
Aceito: 12/04/2022

 

1 Thaciana Araujo da Silva é doutora em Teoria e Pesquisa do Comportamento pela Universidade Federal do Pará.
2 Lilia Iêda Chaves Cavalcante é docente da Faculdade de Serviço Social e do Programa de Pós-graduação em Teoria e Pesquisa do Comportamento da Universidade Federal do Pará.

3 Ana Emília Vita Carvalho é docente de graduação em Medicina e em Psicologia e do Programa de Mestrado Profissional em Ensino em Saúde do Centro Universitário do Pará.

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