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Revista da SPAGESP

versión impresa ISSN 1677-2970

Rev. SPAGESP vol.23 no.2 Ribeirão Preto jul,/dic. 2022

https://doi.org/https://doi.org/10.32467/issn.2175-3628v23n2a13 

https://doi.org/10.32467/issn.2175-3628v23n2a13

ARTIGOS

 

Avaliação de estratégias para a redução de comportamentos agressivos em crianças

 

Evaluating strategies to reduce aggressive behavior in children

 

Evaluación de estrategias para reducir las conductas agresivas en niños

 

 

Marília Pereira Dutra1; Lilian Kelly de Sousa Galvão2; Cleonice Pereira dos Santos Camino3; Viviane Alves dos Santos Bezerra4

Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa-PB, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Diante dos elevados índices de agressão no âmbito educacional, realizou-se uma pesquisa com delineamento quase experimental, com o objetivo de comparar os resultados de duas estratégias interventivas para verificar qual a mais eficaz para redução de comportamentos agressivos na infância. Participaram 36 alunos/as do 4º ano do ensino fundamental, distribuídos em três grupos, sendo dois experimentais (grupo afetivo-discursivo e grupo informativo-discursivo) e um de controle, avaliados em um pré-teste, pós-teste e follow-up, por meio da aplicação do Questionário de Agressão de Buss e Perry e da Escala de Empatia de Bryant. Os dados foram analisados através da estatística não-paramétrica. De um modo geral, os resultados indicaram que as duas estratégias avaliadas são eficazes para reduzir comportamentos agressivos na infância.

Palavras-chave: Intervenção; Escola; Empatia; Agressão; Infância.


ABSTRACT

Considering the high levels of aggression in the educational field, research with a quasi-experimental design was conducted, comparing the results of two intervention strategies to verify which is the most effective for reducing aggressive behavior in childhood. Thirty-six students from the 4th grade of the elementary school participated and were divided into three groups, two experimental ones (affective-discursive and informative-discursive groups) and a control one, evaluated at a pre-test, post-test, and follow-up moments, through the Buss and Perry Aggression Questionnaire and the Bryant Empathy Scale. Data were analyzed using non-parametric statistics. Overall, the results indicated that the two strategies evaluated are effective in reducing childhood aggressive behavior.

Keywords: Intervention; School; Empathy; Aggression; Childhood.


RESUMEN

Ante los altos niveles de agresividad en el ámbito educativo, se realizó una investigación con diseño cuasiexperimental, con el objetivo de comparar los resultados de dos estrategias de intervención para verificar cuál es la más efectiva para la reducción de los comportamientos agresivos en la infancia. Participaron 36 estudiantes del 4to año de la enseñanza fundamental, distribuidos en tres grupos, dos de los cuales eran experimentales (grupo afectivo-discursivo y grupo informativo-discursivo) y uno de control, evaluados en un pre-test, post-test y follow-up, mediante la aplicación del Cuestionario de Agresión de Buss y Perry y de la Escala de Empatía de Bryant. Los datos se analizaron por medio de estadísticas no paramétricas. En general, los resultados indicaron que las dos estrategias evaluadas son efectivas para reducir comportamientos agresivos en la niñez.

Palabras clave: Intervención; Escuela; Empatía; Agresión; Niñez.


 

 

Diversas áreas do conhecimento têm se debruçado sobre o estudo dos comportamentos agressivos devido às suas consequências negativas para o desenvolvimento do indivíduo. Staub (1975), um estudioso clássico do desenvolvimento humano, define os comportamentos agressivos como comportamentos que procuram infligir sofrimento ou dor em outra pessoa. Pesquisas demonstram uma relação entre comportamentos agressivos persistentes na infância e diferentes problemas em fases posteriores, tais como: dificuldades de relacionamento, complicações acadêmicas, condutas delinquentes e transtornos de humor (Borsa & Bandeira, 2011; Elias et al., 2012; Gomes et al., 2012; Pavarino et al., 2005).

Um relatório divulgado em junho de 2018 pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância revelou que, em todo o mundo, cerca de 150 milhões de estudantes entre 13 e 15 anos de idade já foram vítimas de agressão por parte de seus colegas (Selim, 2018). No Brasil, em 2015, a Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), realizada com alunos do nono ano do ensino fundamental, mostrou que 23,4% dos entrevistados afirmaram ter se envolvido em brigas ou lutas físicas, pelo menos, uma vez nos 12 meses anteriores à pesquisa, e 12,3% relataram que foram seriamente feridos (IBGE, 2016). Esses dados confirmam a gravidade dessa questão e salientam que este é um problema que precisa ser enfrentado (Abramovay et al., 2016).

Na busca para alterar esse quadro de agressividade que acomete várias escolas no mundo, Pavarino et al. (2005) apontam que diversos países (Canadá, Estados Unidos, Inglaterra, França, Bélgica, Espanha) estão há vários anos investindo em programas de desenvolvimento socioemocional, por acreditarem que sua aplicação favorece melhores condições de saúde e qualidade de vida no âmbito educacional e familiar.

Uma recente revisão sistemática de programas de intervenção internacionais para a prevenção precoce de comportamentos antissociais, agressivos e criminosos em crianças e adolescentes, realizada por Garcia et al. (2019), revelou que a preocupação dos pesquisadores deve se voltar não apenas para uma perspectiva preventiva, mas sim para determinar formas de tornar as intervenções, de fato, eficazes. Para confirmar essa informação, é possível observar que entre os programas atuais não se observam dados suficientes para mostrar a eficácia da intervenção (Da Silva et al., 2016; Langford et al., 2015), e os efeitos encontrados são, relativamente, moderados (Farrington et al., 2017; Gaffney et al., 2018).

Essa revisão também evidenciou que a maioria das intervenções estão ancoradas na teoria behaviorista e adota o "reforço ao bom comportamento", bem como negligencia a origem da violência, da agressão e da delinquência, que poderiam ser trabalhadas a partir de noções de autoconhecimento e do desenvolvimento da empatia. Outra crítica é feita à natureza multidimensional das intervenções, que, em sua maioria, tentam abarcar crianças/adolescentes, pais e professores. De acordo com os autores, esse fator é uma armadilha, uma vez que dificultam o discernimento sobre quais componentes se atribuem os resultados encontrados, sendo indicado o uso de um eixo específico nas intervenções, ou seja, ou só crianças, ou só adolescentes, ou só professores, ou só os pais (Garcia et al., 2019).

Quanto aos programas aplicados no Brasil, se observa uma escassa produção (Landim & Borsa, 2017). Um desses foi realizado por Elias et al. (2012) em uma escola pública no interior de São Paulo denominado "Eu Posso Resolver Problemas – EPRP", visando a estimulação e o desenvolvimento das habilidades cognitivas de solução de problemas interpessoais das crianças através de dramatizações, brincadeiras, histórias e desempenho de papéis. Outro, também executado em São Paulo, foi o "Programa de competência Socioemocional", elaborado por Souza (2007), uma proposta de treinamento para solucionar conflitos e prevenir violências entre crianças de 6 a 7 anos, mediante atividades lúdicas, leitura sociométrica, jogos e dramatizações.

Conforme Landim e Borsa (2017), esses programas nacionais apresentam, do ponto de vista metodológico, diversas limitações, como o uso de instrumentos pouco precisos, a ausência de critérios de avaliação de efetividade das intervenções, o tamanho das amostras, a ausência ou insuficiência de dados estatísticos, dificuldades de generalização dos dados e a falta de avaliações que mostrem que os resultados se mantêm a longo prazo. Grande parte das dificuldades mencionadas por Landim e Borsa (2017), no âmbito nacional, corroboram o encontrado por Garcia et al. (2019), na esfera internacional.

Tendo em vista a quantidade reduzida de programas de intervenção com foco exclusivo na redução desses comportamentos no âmbito nacional, bem como a necessidade de superação das limitações metodológicas desses programas, apontadas por Garcia et al. (2019) e Landim e Borsa (2017), o presente estudo objetiva comparar os resultados de duas estratégias de intervenção para a redução de comportamentos agressivos em crianças: a "estratégia afetiva-discursiva" e a "estratégia informativa-discursiva".

Essas duas estratégias de intervenção foram elaboradas tendo como referência a pesquisa de Galvão (2010) que investigou a importância do afeto e da cognição em relação ao desenvolvimento moral, bem como o estudo de Dutra et al. (2017) que, do mesmo modo, confrontou afeto e cognição em relação ao desenvolvimento empático. Dessa forma, no presente estudo, avalia-se o papel do afeto e da cognição com relação à redução de comportamentos agressivos.

A "estratégia afetiva-discursiva" fundamenta-se em pesquisas as quais mostram que a mobilização de aspectos cognitivos e afetivos promovem maior evolução no desenvolvimento empático e moral (Galvão, 2010; Dutra et al., 2017). Nesse sentido, o aspecto afetivo da "estratégia afetiva-discursiva" fundamenta-se na teoria de Hoffman (2003), que define a empatia como a capacidade que uma pessoa tem de se colocar no lugar do outro (role-taking), inferir seus sentimentos e, a partir do conhecimento gerado por esse processo, dar uma resposta afetiva mais adequada para a situação do outro do que para sua própria situação. O autor aponta a possibilidade de o afeto empático promover a redução da agressão em culturas guiadas pelo cuidado e pela justiça, visto que a empatia indicaria para as crianças as consequências que seus comportamentos têm na vida dos outros. Já o suporte metodológico para essa estratégia advém do psicodrama, um método de intervenção que trabalha os conflitos individuais e/ou grupais, por meio de técnicas inspiradas no teatro, e possibilita a experimentação do lugar do outro (Moreno, 1997).

Por sua vez, a estratégia "informativa-discursiva" foi desenvolvida e inspirada em trabalhos anteriores (Benítez-Sillero et al., 2020; Ttofi & Farrington, 2009). Esses estudos demonstraram que informar sobre comportamentos considerados antissociais e suas consequências pode ajudar a diminuir a incidência dos mesmos. O trabalho desenvolvido por Benítez-Sillero et al. (2020), por exemplo, revelou que adolescentes participantes de aulas específicas para descobrir o que é bullying, quem são seus protagonistas e como preveni-lo, diminuíram significativamente suas taxas de agressão e vitimização por bullying, quando comparados a um grupo de controle. Nesse sentido, hipotetizou-se que informar as crianças sobre os tipos de comportamentos agressivos e suas consequências poderia promover resultados semelhantes aos observados nos estudos supramencionados.

O aspecto discursivo, presente tanto na estratégia "afetiva-discursiva", quanto na "informativa-discursiva", fundamenta-se na teoria de Piaget (1976) sobre os processos de equilibração, na qual a compreensão conjunta do grupo, promovida através de debates, é capaz de levar ao conflito cognitivo e pode resultar em desequilíbrios capazes de gerar novos conhecimentos ou avanços nos saberes já adquiridos, favorecendo mudanças na estrutura conceitual dos participantes das intervenções, a fim de torná-los mais críticos e conscientes sobre a temática da agressão. Além de que, de acordo com Turkle (2015), a discussão de forma presencial, no contato cara a cara, pode ser uma das ações mais humanizadoras, capazes de ensinar a ouvir o outro.

Diante do que foi explicitado, o objetivo deste estudo é comparar os resultados de duas estratégias de intervenção para verificar qual a mais eficaz na redução de comportamentos agressivos em crianças com idades de 9 a 12 anos, a saber: a "estratégia afetiva-discursiva" e a "estratégia informativa-discursiva". A tentativa é de avaliar o papel do afeto e da cognição no tocante à redução desses comportamentos.

 

MÉTODO

DELINEAMENTO

Realizou-se uma pesquisa com delineamento quase-experimental (Shaughnessy et al., 2012) e corte longitudinal, com três grupos, sendo dois experimentais e um de controle. Um dos grupos experimentais foi submetido à estratégia "afetiva-discursiva" – Grupo Afetivo-discursivo (GAD) e o outro à estratégia "informativa-discursiva" – Grupo Informativo-discursivo (GID). Com o terceiro grupo, o de controle (GC), não foi realizado intervenção. Os dois grupos experimentais tiveram 12 sessões de intervenção, sendo 3 encontros semanais. Todos os grupos foram avaliados por meio de pré-teste, pós-teste e follow-up, após 9 meses.

Os 12 temas das sessões foram escolhidos com base nos tipos de agressão mais salientes na literatura e nas pesquisas de intervenção anteriores (Buss & Perry, 1992; Dutra et al., 2017; Malta et al., 2019). Esses temas foram: raiva, hostilidade, agressão verbal, agressão física, bullying, agressão intrafamiliar, agressão contra a mulher, agressão racista, agressão a idosos, agressão ao meio ambiente, agressão intergrupal e, no último encontro, uma revisão desses temas.

Grupo 1 – afetivo-discursivo (com ênfase na empatia) (GAD): A estratégia "afetiva-discursiva" mescla o uso de exercícios imaginativos com base em técnicas do psicodrama, com discussões realizadas por meio de rodas de conversas e que objetivava estimular o desenvolvimento da empatia. Cada sessão foi organizada de modo a seguir as três etapas essenciais do psicodrama (Ramalho, 2010): 1) aquecimento, momento em que é introduzida a temática que será trabalhada na sessão, geralmente por meio de recursos lúdicos; 2) dramatização, etapa em que ocorre o uso das técnicas psicodramáticas; 3) compartilhamento, a essa etapa acrescentou-se um momento de discussão, de modo que os participantes se organizam em roda de conversa para compartilhar os sentimentos experienciados na dramatização, e para discutir sobre formas de solucionar as situações de agressão que foram temas das sessões de intervenção.

Grupo 2 – informativo-discursivo (GID): A estratégia "informativa-discursiva" foi assim denominada por se fundamentar na realização de discussões por meio de rodas de conversa que propiciam, de modo coletivo, a produção de novos conhecimentos, com a finalidade de tornar o participante mais informado, consciente e crítico nas suas relações sociais (Melo et al., 2016; Silva, 2012). Nesse sentido, os encontros seguiram os mesmos procedimentos de execução em todas as rodas de conversa realizadas, a saber: 1) organização da sala em círculo e apresentação de informações sobre o tema; 2) discussões sobre as consequências e as formas de evitar agressões e; 3) expressão artística (produção de desenhos sobre o que entenderam do conteúdo conversado). Foram utilizados recursos didáticos como slides, data show e notebook.

Grupo 3 – Controle (GC): O grupo de controle não participou de nenhum dos dois programas de intervenção propostos. Este grupo serviu apenas como parâmetro de comparação e, neste sentido, foi avaliado, em relação à agressividade e a empatia, da mesma forma que os outros dois grupos.

A Figura 1 demonstra como acontecia uma sessão de intervenção nos grupos experimentais, considerando as etapas que cada grupo foi submetido.

Figura 1

 

PARTICIPANTES

Trinta e seis alunos/as do 4º ano do ensino fundamental de uma escola pública da Paraíba provenientes da comunidade local. Vale salientar que inicialmente a pesquisa contou com a participação de 43 alunos que responderam ao pré-teste, contudo, tendo em vista as desistências ocorridas até follow-up, a amostra final foi composta apenas por aqueles alunos que participaram pelo menos dos dois momentos iniciais da pesquisa (pré-teste e pós-teste), permitindo, assim, a comparação entre os grupos.

Os grupos foram distribuídos de forma semelhante, considerando as médias de empatia e de comportamento agressivo, obtidas no pré-teste: Grupo Afetivo-discursivo (GAD) – participaram 12 crianças, sendo 7 meninos e 5 meninas, com idades de 9 a 12 anos (M = 9,9; DP = 0,79); Grupo Informativo-discursivo (GID) – participaram 12 crianças, sendo 7 meninos e 5 meninas, com idades de 9 a 12 anos (M = 9,5; DP = 0,67); Grupo de Controle (GC) – participaram 12 crianças, sendo 8 meninos e 4 meninas, com idades de 9 a 12 anos (M = 10,2; DP = 0,97).

Para confirmar a equivalência entre os grupos em relação às médias de agressividade e empatia, realizou-se um teste de Kruskal-Wallis. Os resultados indicaram que não existia diferença estatisticamente significativa entre os grupos em relação à agressividade [H(2) = 0,82; p = 0,66], bem como em relação à empatia [H(2) = 0,18; p = 0,91]. Assim, pode-se afirmar que antes de serem submetidos às intervenções, os grupos iniciaram com médias equivalentes de empatia e agressividade.

INSTRUMENTOS E ESTRATÉGIAS DE COLETA DE DADOS

Para investigar a média de agressividade dos participantes (antes e depois da intervenção) foi utilizado o Questionário de Agressão de Buss e Perry (BPAQ) (1992), versão validada e adaptada para o contexto brasileiro por Gouveia et al. (2008), composto de 26 itens, respondidos pelos participantes em uma escala tipo likert de 5 pontos. Este instrumento é formado por quatro fatores de primeira ordem, sendo estes: agressão física, verbal, raiva e hostilidade; e um fator de segunda ordem, que avalia a agressividade de forma geral, adotado nas análises da presente pesquisa. Considerando que o BPAQ foi validado para o contexto brasileiro com uma amostra de estudantes em faixa etária diferente da do atual estudo, a consistência interna do mesmo foi avaliada por meio da Confiabilidade Composta (CC), observando-se valores adequados para fins de pesquisa (CC = 0,75).

Para investigar a média de empatia dos participantes (antes e depois da intervenção) foi utilizada a Escala de Empatia para Crianças e Adolescentes (EECA) de Bryant (1982), adaptada para a utilização no Brasil por Koller et al. (2001), composta por 22 itens afirmativos e negativos, os quais foram lidos para as crianças, que deveriam concordar ou não. Os itens 2, 3, 9, 10, 15, 16, 17, 18, 20, 21 e 22 possuem direção inversa e devem ser invertidos quando for calculado o escore global da escala, feito através de soma simples. De modo semelhante ao instrumento anterior, a EECA apresentou valores adequados de consistência interna (CC = 0, 76).

PROCEDIMENTO

O pré-teste, o pós-teste, a execução das intervenções e o follow-up, nos três grupos, ficaram sob a responsabilidade da primeira autora deste trabalho, com o apoio de cinco monitoras, estudantes de psicologia, que foram previamente treinadas para auxiliar na aplicação dos instrumentos. Destas, apenas duas participaram efetivamente da execução das intervenções, tendo também recebido treinamento prévio para este fim.

Após a separação dos alunos nos grupos, foi realizada uma reunião com os 24 que iriam participar dos grupos experimentais. Neste momento, foi apresentado o tema e os objetivos do projeto, a quantidade de encontros que seriam realizados (12), o tempo de duração (60 minutos) e os dias em que deveriam acontecer (segundas, quartas e sextas-feiras, das 8h às 9h, no horário de aula disponível pela escola); além do esclarecimento da importância da participação nas intervenções.

Ao final dessa primeira reunião, foi agendada a aplicação da EEAC e do BPAQ no pré-teste. Os participantes responderam individualmente a esses instrumentos, em ambiente coletivo de sala de aula. A aplicação durou cerca de 60 minutos e foi auxiliada por seis pesquisadores, previamente treinados, que se disponibilizaram a ajudar as crianças na leitura dos itens, caso solicitassem. Em relação ao pós-teste e ao follow-up (que aconteceu 9 meses após o término da intervenção), foram seguidos os mesmos procedimentos adotados na aplicação do pré-teste.

PROCESSAMENTO E ANÁLISE DE DADOS

Para a análise dos dados quantitativos, utilizou-se o programa Statistical Package Social Science (SPSS), o grau de significância adotado foi de p ≤ 0,05. A fim de verificar a adequação dos dados com relação à normalidade, os grupos foram analisados por meio do teste de Shapiro-Wilk. Nessa análise a distribuição normal dos dados foi confirmada no pré-teste, pós-teste e follow-up em relação às médias de agressividade e empatia para o GAD e o GC. Apenas o GID não apresentou distribuição normal para a média de agressividade no follow-up, conforme pode ser observado naTabela 1. Diante disso, e considerando o tamanho da amostra, optou-se por adotar a estatística não-paramétrica.

Tabela 1

 

Foram utilizadas estatísticas descritivas (média e desvio-padrão) e análises inferenciais (teste de Kruskal-Wallis, teste de Wilcoxon Signed Rank e teste de Mann-Whitney) para comparar se houve mudanças intragrupos e intergrupos nas médias de empatia e agressividade, nos diferentes momentos da pesquisa. O tamanho de efeito (r) para os resultados encontrados foi calculado por meio da fórmula: r = Z⁄(√n.). Em que Z é o escore-z, calculado pelo SPSS, e N é o tamanho total de observações realizadas, na qual Z foi baseado. Salienta-se que tamanhos de efeito até 0,30 são considerados baixos, valores acima de 0,30 até 0,50 são considerados efeitos moderados, e valores superiores a 0,50 são considerados altos (Field, 2020).

CUIDADOS ÉTICOS

Após a homologação da aprovação da realização da pesquisa pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos (CAAE: 91791518.6.0000.5182), foi apresentado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido aos responsáveis das crianças que contribuíram com a pesquisa e, após a aprovação dos mesmos, o Termo de Assentimento para as crianças participantes. Todo o processo foi realizado de acordo com a Resolução 510/2016 do Conselho Nacional de Saúde.

 

RESULTADOS

Agressividade e empatia do pré-teste para o pós-teste: comparações intragrupos e intergrupos

O teste de Wilcoxon Signed-Rank foi conduzido com o objetivo de verificar se houve mudanças intragrupos nas médias de agressividade e empatia do pré-teste para o pós-teste. Considerando o GAD, observou-se que os níveis de agressividade no pós-teste (M = 2,66; DP = 0,43) foram menores que no pré-teste (M = 3,23; DP = 0,54), sendo essa diferença estatisticamente significativa (z = -2,82; p < 0,005; r = 0,81). No que se refere ao GID, nota-se que a média de agressividade também diminuiu do pré-teste (M = 3,16; DP = 0,69) para o pós-teste (M = 2,60; DP = 0,61) de forma significativa (z = -2,49; p < 0,01; r = 0,72). Por fim, no GC também foram verificadas diferenças significativas nas médias de agressividade do pré-teste (M = 3,05; DP = 0,62) para o pós-teste (M = 3,48; DP = 0,41). Contudo, diferente dos outros grupos, nos quais houve uma diminuição da agressividade, no GC observou-se um aumento estatisticamente significativo da agressividade no pós-teste (z = -1,03; p = 0,02; r = 0,30). Os tamanhos de efeito para os resultados apresentados variaram de baixos a altos.

No que se refere à empatia, notou-se que, no GAD, houve um aumento da média de empatia do pré-teste (M = 13,00; DP = 2,04) para o pós-teste (M = 15,42; DP = 2,23), sendo essa mudança estatisticamente significativa (z = -2,82; p = 0,005; r = 0,81). De modo semelhante, no GID também houve um aumento na empatia do pré-teste (M = 12,67; DP = 3,49) para o pós-teste (M = 13,42; DP = 3,08), mas a diferença entre as médias não foi significativa (z = -0,67; p = 0,50; r = 0,19). No GC também não houve diferença significativa da média de empatia do pré-teste (M = 12,75; DP = 3,95) para o pós-teste (M = 13,33; DP = 2,80) (z = -1,03; p = 0,30; r = 0, 30). Os tamanhos de efeito para estes resultados variaram de baixos a alto.

Buscando avaliar os dados sobre outra perspectiva, o teste de Kruskal-Wallis foi realizado com o objetivo de investigar as diferenças intergrupos nas médias de agressividade e empatia. O resultado deste teste foi estatisticamente significativo quando foram comparadas as médias de agressividade entre os três grupos: (H(2) = 16,50; p < 0,001). Nomeadamente os resultados demonstraram que os participantes dos grupos de intervenção, GAD e GID, apresentaram menores níveis de agressividade, quando comparados aos participantes do GC. Contudo, não houve diferenças significativas nas médias de agressividade entre os participantes dos grupos experimentais. O tamanho do efeito para os resultados observados foi alto, conforme pode ser observado na Tabela 2.

No que se refere à empatia, o teste de Kruskal-Wallis não foi significativo: (H(2) = 3,89; p = 0,14). O que indica que não existem diferenças significativas nos níveis de empatia entre os três grupos participantes da pesquisa no pós-teste.

Tabela 2

 

FOLLOW-UP: COMPARAÇÕES INTRAGRUPOS E INTERGRUPOS

Essa análise foi realizada 9 meses após a aplicação do pós-teste. Entretanto, logo após o pós-teste, o período letivo foi finalizado e uma parcela de alunos saiu da escola, assim, uma parte da amostra foi perdida. Apesar disso, os grupos experimentais em que foram realizadas as intervenções permaneceram com a maior parte dos participantes (GAD N = 10; GID N = 11). Contudo, como o GC perdeu um número considerável de participantes (N = 5) para as análises do follow-up, foram considerados apenas os dados dos grupos experimentais.

O teste de Wilcoxon Signed-Rank foi novamente conduzido com o objetivo de verificar se houve mudanças intragrupos nas médias de agressividade e empatia do pós-teste para o follow-up. No que se refere ao GAD, observou-se que não houve diferenças significativas entre a média de agressividade obtida no pós-teste (M = 2,66; DP = 0,43) e aquela obtida no follow-up (M = 2,79; DP = 0,44) (z = -0,80; p = 0,42; r = 0,20). No GID, também pode-se observar que as médias obtidas no pós-teste (M = 2,60; DP = 0,61) e no follow-up (M = 3,08; DP = 0,65) não se diferenciam de forma significativa (z = -1,53; p = 0,12; r = 0,44).

No que se refere a empatia, observou-se que para nenhum dos grupos experimentais, GAD e GID, houve mudanças estatisticamente significativas das médias de empatia do pós-teste para o follow-up, como pode ser visto na Tabela 3.

Tabela 3

 

Buscando realizar as comparações sobre outra perspectiva, aquela que compara os grupos entre si, o teste de Mann-Whitney revelou que no follow-up, não existem diferenças significativas entre as médias do GAD e do GID tanto no que se refere a agressividade (U = 41,50; z = -1,75; p = 0,07; r = 0,36), quanto para a empatia (U = 55,00; z = -0,99; p = 0,34; r = 0,20).

 

DISCUSSÃO

O objetivo principal do presente estudo foi comparar os resultados de duas estratégias interventivas para verificar qual seria a mais eficaz na redução de comportamentos agressivos em crianças. De acordo com os resultados apresentados, nota-se que as duas estratégias de intervenção adotadas se mostraram eficazes para diminuir comportamentos agressivos, corroborando tanto com a literatura que considera a informação como uma possibilidade para diminuir comportamentos antissociais, como a agressão (Benítez-Sillero et al., 2020; Ttofi & Farrington, 2009), quanto com os estudos que demonstram que a maior capacidade de empatia contribui para o declínio da agressão (Gomes et al., 2012; Hoffman, 2003; Jollife & Farrington, 2011; Moura, 2014). Ademais, como ambas as estratégias fizeram uso de rodas de conversa, nota-se que as discussões, realizadas por meio dessa ferramenta, favoreceram a compreensão de significados que podem incentivar aprendizagens e mudanças de comportamento (Adamy et al., 2018; Melo et al., 2016; Sampaio et al., 2014), neste caso, a diminuição dos comportamentos agressivos.

Especificamente no tocante a estratégia "afetiva-discursiva", a expectativa inicial, com base nas intervenções realizadas por Galvão (2010) e Dutra et al. (2017), era que esse modelo de intervenção fosse o mais eficaz, na medida em que poderia promover um duplo benefício para os participantes: aumentar a empatia e diminuir os comportamentos agressivos, de modo longitudinal. Contudo, contrariando, em parte, o esperado, a estratégia "afetiva-discursiva" só favoreceu, a longo prazo, a redução da agressão. Diante dessa ocorrência, fica uma pergunta sem resposta no momento: qual realmente é o papel da empatia na redução dos comportamentos agressivos? Será que esse resultado decorreu do tamanho reduzido da amostra? Ou do tempo de duração do programa de intervenção? Para responder a essas questões, serão necessárias outras pesquisas.

Em relação à estratégia "informativa-discursiva", em consonância com o esperado, os resultados de sua eficácia para a diminuição da agressividade também se mostraram constantes, tanto após o término da intervenção, como a longo prazo. Desse modo, se observa, como apontado anteriormente, que informar e discutir as causas e as consequências de vários tipos de agressão de forma coletiva e no contato direto com as crianças, favorece a aquisição de novos conhecimentos e a ressignificação dos modos de agir (Piaget, 1976; Ryckebusch, 2011), assim como a consideração pelo outro (Turkle, 2015).

No que concerne aos resultados de aumento da agressividade, encontrados no grupo de controle no pós-teste, considera-se que eles refletem o cenário de agressão exposto na introdução deste trabalho, ao mesmo tempo em que faz refletir a necessidade de intervir para que mudanças efetivas aconteçam. Quanto ao nível de agressão desse grupo, a longo prazo, não foi possível analisá-lo devido a perda amostral de participantes que, ao final do ano, foram transferidos para outras escolas, tornando difícil o contato e a localização dos mesmos para os fins desta pesquisa. Tendo isso em vista, sugere-se que em outros estudos o follow-up aconteça, de preferência, no mesmo ano letivo, na tentativa de diminuir a perda amostral.

Vale ressaltar que, diante do elevado nível de agressividade observado no pós-teste e em consonância com os cuidados éticos para grupos de controle, preconizados por Robson e MacCartan (2016), foram encaminhados grupos de estagiários em Psicologia para realizarem intervenções objetivando a diminuição de comportamentos agressivos com os estudantes dessa escola.

Após a análise minuciosa dos dados, pergunta-se: qual seria a estratégia recomendada para uma intervenção que promovesse resultados consistentes a curto e a longo prazo? Diante dos resultados observados, acredita-se que tanto a estratégia "afetiva-discursiva" quanto a "informativa-discursiva" poderiam ser adotadas. Contudo, por se observar pontos positivos nas duas estratégias, recomenda-se testar, em futuras pesquisas, qual seria o resultado da junção dos seus aspectos, já que, de acordo com Piaget (1976), afeto e cognição são indissociáveis e se influenciam mutuamente, o que pode resultar em mudanças nesses dois campos.

Desse modo, o que foi avaliado permite sugerir o uso de duas estratégias para serem utilizadas em intervenções para redução da agressão infantil. Destarte, recomenda-se que outros estudos poderiam analisar a união das duas técnicas em seus aspectos fundamentais, transformando-se em uma estratégia "afetiva-informativa-discursiva" pautada no desenvolvimento empático e em informações e discussões sobre diferentes tipos de agressão, visando a redução de comportamentos agressivos em crianças.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Considera-se que os resultados apresentados fornecem uma contribuição empírica por delinear duas formas de intervir para minimizar comportamentos agressivos em crianças. Entretanto, embora as estratégias propostas tenham se mostrado eficazes na redução de comportamentos agressivos em crianças, algumas limitações metodológicas foram percebidas ao longo deste estudo. Uma delas refere-se ao tempo da sessão de intervenção que não foi suficiente para executar todas as etapas propostas na estratégia "afetiva-discursiva", como esperado. Acredita-se que, devido todos os papéis propostos terem que ser dramatizados por todos os participantes, o tempo consumido foi maior do que o planejado.

Outra limitação se refere ao tamanho da amostra e ao baixo poder de generalização dos resultados. Espera-se que outros estudos consigam preencher essa lacuna e favoreçam a ampliação da discussão.

Acredita-se, portanto, que a contribuição deste estudo estaria em poder recomendar, com certo grau de segurança, o uso de duas técnicas: a "afetiva-discursiva" e a "informativa-discursiva", para a redução de comportamentos agressivos em crianças com idades de 9 a 12 anos. Além disso, considera-se que as sessões de intervenção devem durar cerca de uma hora e 30 minutos, ao invés de apenas uma hora. No caso específico da presente pesquisa, o tempo limitado a uma hora ocorreu em função da disponibilidade restrita de horário oferecida pela escola. Nesse sentido, sugere-se que, em estudos futuros, as intervenções sejam promovidas em espaços que permitam um horário mais estendido e, além disso, que programas interventivos, os quais apresentem eficácia comprovada em evidências, sejam estimulados por políticas públicas de prevenção a comportamentos agressivos.

Por fim, almeja-se que essa pesquisa contribua para a realização de novas propostas de intervenção para a redução de comportamentos agressivos nos mais variados contextos, podendo inspirar profissionais, de diversos cenários, preocupados com a promoção do desenvolvimento infantil e com a construção de uma cultura de paz.

 

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Endereço para correspondência
Marília Pereira Dutra
E-mail: mdutracg@gmail.com

Recebido: 03/11/2021
Revisto: 06/06/2022
Aprovado: 12/07/2022

 

1 Marília Pereira Dutra é doutoranda em Psicologia Social pela Universidade Federal da Paraíba.
2 Lilian Kelly de Sousa Galvão é docente do curso de Psicopedagogia da Universidade Federal da Paraíba.

3 Cleonice Pereira dos Santos Camino é professora da Universidade Federal da Paraíba.
4 Viviane Alves dos Santos Bezerra é doutoranda em Psicologia Social pela Universidade Federal da Paraíba.

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