Ao longo da graduação, universitários podem enfrentar desafios que contribuem para a procrastinação (Situmorang, 2018), para a presença de sintomas depressivos (Chen & Huang, 2015) ou de ansiedade (Schroder et al., 2017). Isso prejudica tanto a saúde mental dos estudantes quanto a instituição de ensino como formadora de profissionais e cientistas. Um exemplo disso é a evasão universitária, que pode estar relacionada a transtornos emocionais e a investimentos públicos sem retorno. Como consequência, explorar as relações entre as formas que os alunos enfrentam os desafios acadêmicos é crucial para a construção de um ambiente saudável e para uma produção científica prolífera (Situmorang, 2018). Para Huéscar Hernández et al. (2020), a adaptação acadêmica desafia os estudantes nas dimensões acadêmicas, sociais, pessoais, institucionais e vocacionais. Pensando nisso, pesquisadores têm estudado construtos que influenciam a adaptação acadêmica, dando suporte para as necessidades sociais, emocionais e comportamentais dos estudantes.
Nesse sentido, é válido entender os mecanismos pelos quais a resolução de problemas sociais, a procrastinação e os modos de enfrentamento influenciam a adaptação acadêmica. Erozkan (2014) define a resolução de problemas sociais como um processo que envolve identificar, descobrir ou criar meios adaptativos de enfrentar problemas pessoais, impessoais e interpessoais em diferentes contextos. Dessa forma, vários pesquisadores brasileiros validaram instrumentos de resoluções de problemas sociais para serem utilizados em universitários brasileiros (Padovani et al., 2009; Soares et al., 2020).
Em outras culturas, como o Japão, onde a educação é historicamente valorizada (Cummings, 2014), a resolução de problemas sociais foi explorada no contexto universitário. Hasegawa et al. (2015) obtiveram resultados que indicam que a ruminação de pensamentos está relacionada à depressão por meio do aumento da orientação negativa de resolução de problemas sociais. Além disso, observaram que o uso de um estilo evitativo de resolução de problema pode predispor à procrastinação.
Nesse contexto, a habilidade de solucionar problemas otimiza o planejamento acadêmico. Em uma investigação sobre o ato de pensar no futuro na resolução de problemas sociais com universitários, Noreen et al. (2015) observaram que, à medida que os níveis de humor depressivo e ruminação de pensamento aumentaram, menor eram os acertos na resolução de problemas.
Pesquisas sobre resolução de problemas sociais e aspectos emocionais do transtorno depressivo também apontam relação entre os construtos. A pesquisa de Thoma et al. (2015) indicou prejuízo de geração de soluções sociais ótimas em indivíduos com transtorno depressivo maior. Isso pode ser atribuído aos deficits motivacionais e dificuldade em agir baseado em objetivos, que prejudicam a identificação e a iniciativa de produção de soluções funcionais. Isso pode se manifestar entre contextos interpessoais, nos quais pessoas com transtorno depressivo maior podem ter uma deficiência motivacional em tendências de aproximação-evitação.
Outra variável importante para a vivência acadêmica saudável é o construto estratégias de enfrentamento. Segundo Compas et al. (2017), uma definição possível para o enfrentamento são os esforços cognitivos e comportamentais para o manejo de exigências ou demandas internas ou externas, que são avaliadas como sobrecarga aos recursos pessoais do indivíduo. Sendo assim, alguns instrumentos foram adaptados e validados para a população brasileira, como o COPE breve (Brasileiro, 2012).
Em outras culturas, uma pesquisa sobre coping e resolução e problemas com universitários indianos e malaios inferiu que o envolvimento religioso pode ser um fator protetivo contra o suicídio entre universitários (Khan et al., 2016). Nesse estudo, participantes que possuíam baixa condição financeira mostraram alta pontuação em estresse acadêmico e ideação suicida. Além disso, participantes indianos reportaram um nível maior de ideação suicida e estresse acadêmico do que malaios. Isso pode ser explicado porque estudantes malaios estariam recebendo mais suporte social e usando estratégias de resolução de problemas melhores do que indianos (Khan et al., 2016).
Entender a articulação entre o enfrentamento e os tipos de mentalidade também pode ter consequências para a adaptação acadêmica. Schroder et al. (2017) acreditam que a maleabilidade dos tipos de mentalidade são preditores de enfrentamento positivo em contextos educacionais desafiadores e verificaram que, em estudantes universitários, mentalidades mais rígidas podem gerar ansiedade e funcionam como moderadores de associações entre históricos de eventos estressantes vivenciados e indicadores clínicos de ajustamento.
A procrastinação é outro comportamento universitário frequente, porém, desadaptativo. A procrastinação é definida como o adiamento voluntário de uma atividade pretendida, necessária e/ou com importância pessoal, apesar de o sujeito esperar potenciais consequências negativas que superariam as consequências positivas desse adiamento (Klingsieck, 2013).
Em uma metanálise, Kim e Seo (2015) afimaram que a procrastinação é negativamente correlacionada com a performance em vários aspectos da vida. Segundo eles, os procrastinadores variam de acordo com a capacidade individual de tomar decisões intencionais para procrastinar: procrastinadores passivos podem adiar suas tarefas até o último minuto por incapacidade de agir de acordo com o tempo estipulado para a realização da tarefa; por outro lado, procrastinadores ativos podem intencionalmente procrastinar, mas são capazes de alterar seus planos rapidamente. Dessa forma, procrastinadores ativos conseguem realizar atividades acadêmicas dentro dos prazos porque eles se autorregulam e perseveram em grandes quantidades de trabalho em pouco tempo.
Em outra metanálise, Sirois e Kitner (2015) revisaram a literatura existente sobre a relação entre a procrastinação e o coping. De diversas amostras e medidas de procrastinação e coping, foi visto que a procrastinação é associada ao menor uso do coping adaptativo e maior uso do coping desadaptativo. Apesar dos efeitos médios para cada tipo de coping terem sido significantes, a procrastinação mostrou uma associação moderada com o coping desadaptativo em 13 amostras testadas e uma associação negativa menor com o coping adaptativo em 15 amostras testadas. Esse resultado foi explicado pelos efeitos indiretos do coping desadaptativo ligados à procrastinação e ao estresse.
Considerando o que foi apresentado, o objetivo geral desse estudo é avaliar a relação entre os fatores de resolução de problemas, as estratégias de enfrentamento e a procrastinação entre universitários. Nossas hipóteses de correlação positiva são: existe relação preditiva positiva entre as variáveis estratégias de coping baseadas no problema e no suporte social e a resolução de problemas (perseverança); existe relação positiva entre procrastinação e a resolução de problemas (postergação e desestabilização emocional) e o coping baseado em pensamentos fantasiosos; existe relação positiva entre a resolução de problemas (postergação) e o coping baseado em pensamentos fantasiosos.
Nossas hipóteses de correlação negativa são: existe relação negativa entre a resolução de problemas (perseverança) e as estratégias de coping baseadas na emoção e pensamentos fantasiosos; existe relação negativa entre procrastinação e a resolução de problemas (perseverança); existe relação negativa entre procrastinação e as estratégias de coping baseadas nos fatores emocionais, de suporte social e de foco no problema; existe relação negativa entre a resolução de problemas (postergação) e as estratégias de coping baseadas nos fatores emocionais, de suporte social e de foco no problema; e existe relação negativa entre a resolução de problemas (desestabilização emocional) e as estratégias de coping baseadas nos fatores emocionais, de suporte social e de foco no problema.
Por fim, estas são as hipóteses de predição: a procrastinação, o coping focado no problema, o coping focado na emoção e o coping focado no suporte social possuem valor preditivo na Resolução de problemas (perseverança, postergação e desestabilização emocional).
Método
Estudo correlacional, preditivo e transversal.
Participantes
A amostra foi composta por 200 estudantes universitários, com idade entre 18 e 30 anos (M = 22,87; DP = 2,8), sendo 148 do sexo feminino e 52 do sexo masculino, devidamente matriculados nos cursos superiores, 29 eram do primeiro período, 17 do segundo, 19 do terceiro, 10 do quarto, 25 do quinto, 20 do sexto, 20 sétimo, 20 do oitavo, 15 do nono e 25 do décimo em diante; 23 pertenciam a classe social A, 31 a classe social B e 64 a classe social C, 50 a classe social D e 32 a classe social E; 168 estudavam em instituição de ensino pública e 32 em instituição privada; 174 eram da área de Ciências Humanas, 28 da área de Ciências Exatas.
Instrumentos
Inventário de Resolução de Problemas Sociais para Estudantes do Ensino Superior (Soares, 2020), adaptado do Inventário de Resolução de Problemas Sociais Revisado (D'Zurilla et al., 2002). O inventário utilizado conta com três fatores: Postergação, Perseverança e Desestabilização Emocional e possui 16 itens. O fator postergação possui seis itens (α = 0,70) e se trata do comportamento de procrastinação no processo de solução de problemas ou de lidar com as demandas; o fator Perseverança possui quatro itens (α = 0,68), tendo como significado traços que favorecem a habilidade para lidar com as adversidades, estando associada à capacidade de concretização de objetivos de longo prazo e o fator Desestabilização Emocional possui seis itens (α = 0,62) e representa o nível de suscetibilidade a mudanças emocionais que uma pessoa tem ao se deparar com problemas.
Escala para coping em dificuldades sociais, acadêmicas e situações interpessoais desenvolvida por Soares et al. (2018) conta com quatro fatores: foco na emoção; foco no suporte social; foco no enfrentamento com religião e foco no problema. Contém 26 itens. O fator foco na emoção (α = 0,73) é composto por seis itens e é definido pela habilidade de regular o estado emocional para lidar com situações adversas; o fator suporte social (α = 0,81) é composto por oito itens e se refere a buscar a ajuda dos seus pares, da família ou de qualquer grupo que a pessoa participe; o fator religioso (α = 0,83) é composto por cinco itens e é retratado como dificuldades combatidas com aspectos espirituais e o fator foco no problema (α = 0,70) é composto por sete itens que representam a capacidade cognitiva e comportamental de encarar situações difíceis de lidar.
Escala de motivos da procrastinação acadêmica, construída por Geara et al. (2017). A primeira seção da escala possui quatro itens com tarefas acadêmicas, nas quais o participante deve marcar a frequência de procrastinação respectiva a seus atos, além de indicar a tarefa que mais procrastina. As tarefas são: fazer trabalhos que têm prazo de entrega (trabalhos); estudar para provas (provas); fazer exercícios ou leituras da semana (exercícios); estudar os conteúdos de aula da semana ou rever anotações (estudo). Na segunda seção, o participante responde oito itens sobre possíveis motivos que o leva a procrastinar. Esse estudo irá usar apenas a escala da segunda seção, referente aos motivos que levam à procrastinação. Essa escala conta com duas categorias para representar a procrastinação acadêmica: Procrastinação-desmotivação (α = 0,61) e endereça aspectos de adiamento da tarefa em função de falta de iniciativa, interesse, cansaço e preguiça; e Procrastinação-ansiedade (α = 0,76), que está relacionado à procrastinação motivada por afetos negativos, como preocupação e expectativas muito altas acerca do próprio desempenho na tarefa procrastinada.
Procedimentos de Coleta de Dados
Os dados foram coletados online em grupos de graduação nas faculdades e universidades que ofereciam cursos regulares. Os participantes receberam instruções específicas para cada instrumento utilizado no estudo. Apresentamos nesta ordem todas as tarefas da pesquisa para os participantes: Termo de Consentimento Livre e Esclarecido; questionário de dados sociodemográficos; Escala de Motivos da Procrastinação Acadêmica (Geara et al., 2017); Escala para Coping em Dificuldades Sociais, Acadêmicas e Situações Interpessoais (Soares et al., 2018) e Inventário de Resolução de Problemas Sociais Revisado (Soares et al., 2020). Não houve tempo limite para responder.
Procedimentos Éticos
Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) formalizando nas Diretrizes e Normas Regulamentadoras de pesquisa envolvendo seres humanos, dispostos na resolução 196 do Conselho Nacional de Saúde (CNS), homologada no dia 10 de outubro de 1996. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Salgado de Oliveira - Comitê de Ética em Pesquisa (CEP-UNIVERSO). CAAE: 42420020.2.0000.5289.
Procedimentos de Análise de Dados
Para analisar as relações entre os construtos foram realizadas correlações (Pearson) entre a escala de procrastinação, os fatores das escalas de coping e os fatores da escala de resolução de problemas. Além disso, foram feitas análises de regressão linear múltipla (Stepwise) para investigar a relação entre as variáveis explicativas (procrastinação e subescalas do coping: foco no problema, na emoção, na religião e no suporte social) e a variável critério (fatores da escala de resolução de problemas). Nessa técnica, as variáveis são gradativamente incluídas no modelo uma a uma, estabelecendo apenas as que são significativas e podem explicar melhor o modelo (R2). Foram escolhidas como variáveis independentes (preditoras) significativas o escore total da procrastinação e do coping focado no problema.
Resultados
Na Tabela 1 são apresentados os valores das correlações dos resultados obtidos de todas as variáveis em estudo. Pode ser visto uma correlação fraca e positiva (entre 0,3 e 0,5) entre resolução de problemas (perseverança) e Coping focado no problema; entre resolução de problemas (desestabilização emocional) e perseverança. É observado uma correlação fraca e negativa (entre -0,3 e -0,5) entre a resolução de problemas (perseverança) e a procrastinação.
Foi encontrado uma correlação moderada e positiva (entre 0,5 e 0,7) entre resolução de problemas (postergação) e a resolução de problemas (perseverança). Também foi identificado uma correlação moderada e negativa (entre -0,5 e -0,7) entre procrastinação e resolução de problemas (postergação); entre procrastinação e resolução de problemas (desestabilização emocional). Foi encontrada uma correlação forte e positiva (maior que 0,7) entre resolução de problemas (desestabilização emocional) e resolução de problemas (postergação).
Coping suporte social | Coping religioso | Copino problema | Coping emoção | Procrastinação | Perseverança | Dest. Emocional | |
---|---|---|---|---|---|---|---|
Postergação | -0,12 | -0,15* | 0,21** | -0,16* | -0,53** | 0,51** | |
Coping suporte social | 0,25** | 0,19** | 0,1 | 0,17* | 0,19** | ||
Coping religioso | -048** | 0,12 | 0,17* | -0,02 | |||
Coping problema | 0,17* | -0,1 | 0,32** | ||||
Coping emoção Procrastinação Perseverança | 0,19** | -0,11 -0,33** |
** p< 0,01 e* p< 0,05
A Tabela 2 apresenta o tamanho do efeito (d de Cohen) entre os fatores das escalas de Resolução de problemas, entre os fatores de Coping e o escore geral da escala de Procrastinação. Um efeito pequeno (entre 0,1 e 0,29) foi identificado entre Coping focado no problema e Coping focado na emoção; entre Coping focado na emoção e resolução de problemas (postergação); entre resolução de problemas (postergação) e resolução de problemas (desestabilização emocional).
Um efeito médio (entre 0,3 e 0,49) foi encontrado entre Coping focado na religião e resolução de problemas (perseverança); entre Coping focado no problema e resolução de problemas (postergação). Um efeito grande (igual e maior que 0,5) foi visto entre Coping focado no problema e Procrastinação; entre Coping focado no suporte social e resolução de problemas (perseverança); entre Coping focado no problema e resolução de problemas (desestabilização emocional); entre Coping focado na emoção e resolução de problemas (desestabilização emocional; entre resolução de problemas (perseverança) e resolução de problemas (desestabilização emocional); Coping focado na emoção e Procrastinação; entre o Coping focado no suporte social e Coping focado no problema; entre Coping focado na religião e Coping focado no problema; entre o Coping focado no suporte social e Coping focado na emoção; entre Coping focado na religião e Coping focado na emoção; entre Coping focado no suporte social e Procrastinação; entre Coping focado na religião e Procrastinação; entre Coping focado no problema e resolução de problemas (perseverança), entre Coping focado na emoção e resolução de problemas (perseverança), entre Procrastinação e resolução de problemas (perseverança), entre Coping focado no suporte social e resolução de problemas (postergação); entre Coping focado na religião e resolução de problemas (postergação); entre Procrastinação e resolução de problemas (postergação); entre resolução de problemas (perseverança) e resolução de problemas (postergação); entre Coping focado no suporte social e resolução de problemas (desestabilização emocional); entre Coping focado na religião e resolução de problemas (desestabilização emocional) e entre Procrastinação e resolução de problemas (desestabilização emocional).
Coping suporte social | Coping religioso |
problema | Coping emoção | Procrastinação | Perseverança | Dest. Emocional |
|
---|---|---|---|---|---|---|---|
Postergação | 2,13 | 1,58 | 0,45 | 0,24 | 1,3 | 1,48 | |
Coping suporte social | 0,04 | 2,29 | 2,25 | 3,93 | 0,62 | ||
Coping religioso | 1,84 | 1,73 | 2,82 | 0,43 | |||
Coping problema | 0,29 | 0,67 | 1,76 | ||||
Coping emoção | 0,97 | 1,65 | |||||
Procrastinação | 3,06 | ||||||
Perseverança |
A Tabela 3 mostra o modelo de regressão linear para o fator Perseverança da Resolução de Problemas. Primeiramente, o modelo incluiu a Procrastinação que explicou 10,2% do valor obtido na Perseverança. Na segunda etapa foi adicionada a variável Coping focado no problema, totalizando 18% para a explicação do valor obtido na Perseverança. Por fim, a variável Coping focado no suporte social foi adicionada ao modelo e foi obtido uma explicação de 21,5% da variância da Perseverança.
Modelo | R | R2 | R2 ajustado | Erro padrão da estimativa | Estatísticas de mudança | |
---|---|---|---|---|---|---|
R2 | F | |||||
1 | 0,327a | 0,107 | 0,102 | 3,450 | 0,107 | 23,7 |
2 | 0,434b | 0,188 | 0,180 | 3,297 | 0,082 | 19,789 |
3 | 0,476c | 0,227 | 0,215 | 3,224 | 0,039 | 9,900 |
a. Proditores: (Constante), Procrastinação
b. Proditores: (Constante), Procrastinação, Coping problema
c. Proditores: (Constante), Procrastinação, Coping problema, Coping suporte social
A Tabela 4 mostra o modelo de regressão linear para o fator Postergação na Resolução de Problemas. O modelo foi construído de forma a introduzir as variáveis na seguinte ordem: procrastinação e Coping focado no problema. A procrastinação explicou 27,5% da Postergação e, ao inserir o Coping focado no problema, passou para a explicação de 29,96% do modelo.
Modelo R | R2 | R2 ajustado | Erro padrão da estimativa | Estatísticas de mudança | ||
---|---|---|---|---|---|---|
R2 | F | |||||
1 | 0,528a | 0,279 | 0,275 | 4,341 | 0,279 | 76,533 |
2 | 0,550b | 0,303 | 0,296 | 4,279 | 0,024 | 6,826 |
a. Preditores: (Constante), Procrastinação
b. Preditores: (Constante), Procrastinação e Coping problema
A Tabela 5 mostra o modelo de regressão linear para o fator desestabilização emocional na Resolução de Problemas. O modelo é inicialmente composto pela procrastinação, que explicou 26,4% da variável desestabilização emocional. Em seguida, o Coping focado na emoção foi incluido no modelo passando para 28,2% e, finalmente, o modelo foi completado ao ser inserido o Coping focado no problema, resultando na explicação de 31% da explicação da desestabilização emocional.
Modelo | R | R2 | R2 ajustado | Erro padrào da estimativa | Estatísticas de mudança | |
---|---|---|---|---|---|---|
R2 | F | |||||
1 | 0,517a | 0,268 | 0,264 | 3,949 | 0,268 | 72,315 |
2 | 0,538b | 0,289 | 0,282 | 3.900 | 0,022 | 5,992 |
3 | 0,566c | 0,320 | 0,310 | 3,824 | 0,031 | 8,871 |
a. Preditores: (Constante), Procrastinação
b. Preditores: (Constante), Procrastinação, Coping emoção
c. Preditores: (Constante), Procrastinação, Coping emoção e Coping problema
Discussão
O estudo confirmou que há relações entre estratégias de coping e resolução de problemas assim como entre procrastinação e resolução de problemas. A capacidade de focar no problema teve uma relação forte com a capacidade de perserverar durante a superação de algum problema. Essa relação é também descrita em Huéscar Hernández et al. (2020), onde é explicado que uma das características da baixa capacidade de lidar com problemas é o foco em outros pensamentos, principalmente o de memórias autobiográficas. Essa pesquisa também corrobora o resultado de que, à medida que a perseverança aumenta, a procrastinação diminui.
Nossos resultados apontaram para uma associação forte e positiva entre a busca de apoio social na solução de adversidades com a perseverança mediante desafios. Isso pode ser visto em Khan et al. (2016), onde foi verificado que o nível das relações sociais se correlacionou positivamente com a perseverança na superação de obstáculos e teve efeito na diminuição dos níveis de ideação suicida. Foi verificado que a procrastinação e o coping baseado em pensamentos fantasiosos se correlacionam positivamente. Isso pode ser observado pelo adiamento de tarefas para se refugiar em pensamentos com valor afetivo positivo, como explica Sirois e Kitner (2015). Na prática, é possível procrastinar fantasiando sobre conquistas do passado ou sobre dimensões agradáveis da academia. Isso também explica como altos níveis de postergação implicam em baixos níveis de enfrentamento baseado em fatores emocionais e no foco no problema, pois é esperado a resolução dos problemas os postergando, esperando que o problema se resolva sozinho evitando se envolver emocionalmente e deixando de lado o foco do problema.
Outro resultado que correspondeu às nossas hipóteses foi que, quanto mais baixo o nível de resolução problemas do fator desestabilização emocional, maiores foram os níveis de enfrentamento baseado nas emoções e com foco no problema. Essas relações estão consoantes com o trabalho de Schroder et al. (2017) sobre mentalidades. Por exemplo, uma pessoa com mentalidade de crescimento teria menos probabilidade de tentar solucionar um problema não se preservando emocionalmente, pois usaria os obstáculos para crescer e os superar, focando no problema ou na sua regulação emocional para resolvê-lo. No entanto, diferente das nossas hipóteses iniciais, existe uma relação negativa forte entre procrastinação e a postergação como estratégia para a resolução de problemas. Uma possível explicação para isso é que usamos apenas a sub escala de motivações para a procrastinação da escala, que contém apenas uma pergunta sobre perfeccionismo - uma das principais características de quem posterga para resolver seus problemas (Geara et al., 2017). Por exemplo, é comum uma pessoa perfeccionista procrastinar até considerar que atingiu as condições perfeitas para o seu trabalho. Dessa forma, apenas uma questão sobre perfeccionismo pode ter sido insuficiente para representar a variável postergação.
A existência de uma relação negativa forte entre a procrastinação e a resolução de problemas do fator desestabilização emocional também não corroborou nossas hipóteses. Uma possível explicação é que procrastinadores são mais emocionais, sobrecarregados e ansiosos (Geara et al., 2017) e a procrastinação é um mecanismo evitativo dessas sensações que pode se estender à evitação de emoções desestabilizantes.
Também, diferente do esperado, foi encontrada uma relação negativa entre a resolução de problemas (postergação) e o enfrentamento com foco nos pensamentos fantasiosos. Isso pode ser entendido por esse tipo de enfrentamento poder representar o apego à religião (Brasileiro, 2012) e, dependendo de seus dogmas, pode funcionar como motivação para a realização de tarefas com responsabilidade e organização no período de tempo demandado. Por exemplo, como Brooke e Numbers (2012) explica que a “salvação” é algo conquistado a partir de trabalho duro.
A relação positiva forte entre a procrastinação e a estratégia de coping focada na emoção também não foi prevista. Isso possivelmente ocorreu por não termos trabalhado com o conceito de procrastinação ativa e passiva, já que, de acordo com Kim e Seo (2015), apenas na procrastinação ativa o indivíduo usaria efetivamente a pressão emocional do tempo para realizar suas tarefas no último momento, enquanto na procrastinação passiva seria esperado que suas emoções o fizessem procrastinar e não realizar suas responsabilidades.
A relação positiva forte entre procrastinação e coping focado no suporte social também não teve resultados como o esperado. Possivelmente, o suporte social manifestado pela esperança de que outros resolvam o problema ou que o problema se resolva sozinho leva à procrastinação (Brasileiro, 2012).
Em relação aos modelos de predição, em convergência com nossas hipóteses, eles explicaram entre 21,5% e 31% dos fatores de resolução de problemas. Isso retrata a complexidade dessa variável que envolve as interações interpessoais, processos sociocognitivos, como a compreensão explícita das convenções sociais, das consequências das ações e da avaliação dos comportamentos, motivos, pensamentos e emoções do outro (Soares et al., 2020).
Os modelos que explicam a perseverança e a postergação na resolução de problemas são constituídos principalmente pela procrastinação e pelo coping com foco no problema. Isso significa que a combinação entre alto nível de perseverança e baixo nível de procrastinação predizem o alto nível do coping focado no problema em um indivíduo, e o alto nível da postergação é predito pela alta procrastinação e baixo coping focado no problema. Isso é condizente com os achados de Thoma et al. (2015), que observa que, quanto maior é a capacidade de volição, maior é a capacidade de resolução de problemas. Isto é, o senso de agência individual pode recompensar o aluno que persevera em algum obstáculo acadêmico, aumentando sua experiência positiva por conseguir superar desafios. A experiência universitária positiva como consequência da perseverança é condizente com a pesquisa de Huéscar Hernández et al. (2020) sobre o melhor preditor para as notas ser a perseverança ou a paixão por um tema. Nessa pesquisa, só a perseverança se mostrou uma variável significativa para alcançar boas notas, de modo que a paixão por um tema sem a perseverança poderia levar um aluno à procrastinação perfeccionista e uma experiência negativa.
O modelo que explica a desestabilização emocional na resolução de problemas foi formado pela procrastinação, pelo coping focado na emoção e no problema. Esses dados corroboram com a perspectiva recente (Rebetez et al., 2015; Hasegawa et al., 2015; Noreen et al., 2015) que mostra como o processamento emocional é central na procrastinação. Hasegawa et al. (2015) e Noreen et al. (2015) observaram a ruminação se correlacionando negativamente com a habilidade de resolução de problemas por funcionar como uma limitante da regulação emocional causada pela ansiedade, direcionando o foco cognitivo em repetições de pensamentos e à procrastinação.
Em paralelo, Rebetez et al. (2015) mostraram que a dimensão emocional na procrastinação pode se manifestar como um comportamento evitativo de atividades compreendidas como desagradáveis ou empreendidas com um humor negativo prévio. Em uma dimensão clínica, esses pesquisadores observaram como o baixo critério na escolha de estratégias de regulação emocional, junto com o baixo nível de autoestima, manifesta outra característica da relação entre processamento emocional com a procrastinação.
Portanto, é coerente que esses resultados impliquem que outras variáveis podem estar associadas à capacidade de resolução de problemas. Apesar desse estudo ter enfatizado as estratégias de enfrentamento e a procrastinação dos alunos como preditores significativos da resolução de problemas, é válido ressaltar, a partir da literatura, a importância de outras variáveis, como, por exemplo, desordens emocionais relacionadas às experiências universitárias.
Considerações Finais
Esse estudo buscou avaliar a relação entre as estratégias de resolução de problemas, as estratégias de enfrentamento e a procrastinação entre universitários. Os resultados apontam diferentes associações entre estratégias de enfrentamento e procrastinação com a capacidade de resolução de problemas dos universitários, contribuindo para o crescimento de pesquisas que investigam os desafios da vivência do estudante no ensino superior e de que forma eles podem ser superados.
Contudo, este estudo possui algumas limitações que precisam ser consideradas na análise dos resultados. A pesquisa utilizou um delineamento transversal e correlacional, de modo que não é possível realizar conclusões causais, apenas indicar possíveis associações entre as variáveis. Outras implicações dos resultados devem ser destacadas. Por exemplo, o tamanho limitado da amostra e possíveis vieses da coleta de dados pela web - limitando a pesquisa para universitários que possuem acesso à Internet, conta na rede social utilizada e participação nos grupos que a pesquisa foi apresentada - podem ter sido responsáveis pela existência da correlação positiva fraca entre resolução de problemas (perseverança) e Coping focado no problema; pela correlação fraca e negativa entre a resolução de problemas (perseverança) e a procrastinação; pela correlação moderada e positiva entre resolução de problemas (postergação) e a resolução de problemas (perseverança) e pela correlação moderada e negativa entre procrastinação e resolução de problemas (postergação).
Estudos subsequentes poderiam incluir no modelo de predição outras variáveis, como regulação emocional, nível socioeconômico e gênero. Essas variáveis não foram incluídas aqui para não exceder o número de tarefas realizadas respondidas pelos participantes, o que poderia causar desistências. Além disso, outras pesquisas poderiam investigar possíveis diferenças entre instituições de ensino pública e particular e entres cursos, buscando compreender se existem diferenças entre esses tipos de instituições ou entre os alunos de cada uma, além das implicações dessas diferenças.