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Revista Brasileira de Terapias Cognitivas
versión impresa ISSN 1808-5687versión On-line ISSN 1982-3746
Rev. bras.ter. cogn. v.1 n.1 Rio de Janeiro jun. 2005
ARTIGOS
Levantamento sobre o uso de álcool e drogas em universitários
Alcohol use among college students
Neide A. Micelli DomingosI; José Carlos Vasconcelos DomingosII; Alunos do 2º ano de Psicologia Noturno da UNORP, 2003III
I Doutora em Psicologia e Docente do Curso de Psicologia do Centro Universitário do Norte Paulista
II Professor do Centro Universitário do Norte Paulista
III Os nomes dos alunos seguem ao final do artigo
RESUMO
O objetivo do estudo foi obter dados sobre o consumo de álcool e drogas em uma amostra representativa de universitários de um Centro Universitário do Estado de São Paulo. Participaram do estudo 1953 alunos, 349 do período diurno e 1604 do período noturno, dos 27 cursos oferecidos pela instituição e de todas as séries, de acordo com critérios de proporcionalidade. Os resultados indicaram que 1007 (52%) estudantes são do sexo feminino e 942 (48%) do sexo masculino. A média de idade é de 20,6 e a maioria (83,53%) é solteira. Mil trezentos e quarenta e nove (69%) alunos disseram ter usado álcool, 28% fazem uso do tabaco, 19% já fizeram uso de inalantes/solventes, 14% de maconha, 8% de anfetaminas sem prescrição médica, 5% de anabolizantes, 4% de cocaína e 3% de êxtase. Conclusão: o uso do álcool é alto entre os universitários e a droga ilícita mais utilizada é a maconha. Programas preventivos são importantes para auxiliar na redução e programas devem estar disponíveis para os que usam regularmente substâncias.
Palavras-chave: Álcool, Droga, Universitários.
ABSTRACT
The aim of this study was to collect data on alcohol and drug consumption among a sample of college students from a University Center in the state of São Paulo, Brazil. Participants were 1953 students from 27 different careers, 349 attending daytime classes and 1604 attending nighttime classes, 1007 (52%) women and 942 (48%) men (mean age: 20,6), 83,53% of the students were single. 1349 (69%) reported alcohol consumption, 28% smoked cigarettes, 19% used inhaling substances/solvents, 14% smoked marijuana, 8% used amphetamine without medical prescription, 5% used steroids, 4% used cocaine and 3% ecstasy. Conclusion: there is a high rate of alcohol consumption among college students and the most used illicit drug is marijuana. Prevention programs are important to help reduce alcohol and drug consumption and must be available during college years.
Keywords: Alcohol, Drugs, College students.
Introdução
A sociedade moderna se expõe a situações agressoras que prejudicam a saúde, os seus relacionamentos familiares, sociais e sua qualidade de vida. Encontramos dentre os muitos fatores agressores a droga-dependência, cujas conseqüências e prejuízos não se restringem apenas ao usuário, espalha-se também pelos diversos segmentos sociais. As drogas existem na sociedade desde a Antigüidade e são motivos de preocupação mundial, devido aos inúmeros riscos que podem acarretar à saúde.
A palavra droga se refere a qualquer substância com potencial de alterar o funcionamento de um indivíduo, em função de mudanças fisiológicas e de comportamento. Àquelas que alteram o funcionamento psíquico são denominadas de drogas psicotrópicas. Atuam no cérebro e provocam alterações de pensamento, sentimento e comportamento, sendo diferentes para cada tipo de droga.
Os critérios para dependência química descritos no DSM-IV-TR (2002, p.212) incluem um padrão mal adaptativo de uso de substância, com comprometimento clinicamente significativo, manifestado por três ou mais dos seguintes critérios no período de 12 meses:
(1) Tolerância, definida por qualquer um dos seguintes aspectos: (a) necessidade de quantidades progressivamente maiores da substância, para obter a intoxicação ou o efeito desejado; (b) acentuada redução do efeito com o uso continuado da mesma quantidade de substância;
(2) Abstinência, manifestada por qualquer dos seguintes aspectos: (a) síndrome de abstinência característica da substância; (b) a mesma substância (ou uma substância relacionada) é consumida para aliviar ou evitar os sintomas de abstinência;
(3) A substância é freqüentemente consumida em maiores quantidades ou por período mais longo do que o pretendido;
(4) Existe um desejo persistente ou esforços mal-sucedidos no sentido de reduzir ou controlar o uso da substância;
(5) Muito tempo é gasto em atividades necessárias para obtenção da substância (consultas a vários médicos ou longas viagens de automóvel), na utilização da substância (p.ex. fumar em grupo) ou na recuperação de seus efeitos;
(6) Importantes atividades sociais, ocupacionais ou recreativas são abandonadas ou reduzidas em virtude do uso da substância;
(7) O uso da substância continua, apesar da consciência de ter um problema físico ou psicológico persistente ou recorrente que tende a ser causado ou exacerbado pela substância (uso atual de cocaína, embora o indivíduo reconheça como indutora de sua depressão).
Os critérios para Abuso de Substância, também descritos pelo DSM-IV-TR (2002, p.214) são:
A. Padrão maladaptativo de uso de uma substância levando a prejuízo ou sofrimento clinicamente significativo, manifestado por um (ou mais) dos seguintes aspectos, ocorrendo dentro de um período de 12 meses:
(1) Uso recorrente da substância, acarretando fracasso em cumprir obrigações importantes no trabalho, na escola ou em casa (repetidas ausências ou fraco desempenho ocupacional relacionados de substâncias; faltas, suspensões ou expulsões da escola relacionados à utilização da substância; negligência dos filhos ou dos afazeres domésticos);
(2) Uso recorrente da substância em situações nas quais isso representa perigo para a integridade física (dirigir veículo ou operar máquina quando alterado pelo uso da substância);
(3) Problemas legais recorrentes relacionados à substância (detenções por conduta desordeira relacionada à substância);
(4) Uso continuado da substância, apesar de problemas sociais ou interpessoais persistente ou recorrentes causados ou exacerbados pelos efeitos desta (discussões com o cônjuge acerca das conseqüências da intoxicação, lutas corporais);
B. Os sintomas jamais satisfizeram os critérios para dependência de substância relativos a esta classe de substância.
Pesquisas mundiais têm mostrado que o consumo de álcool e drogas entre os jovens inicia-se na infância. Estima-se que 50% a 80% das crianças em idade escolar utilizam drogas com finalidades recreacionais (Scivoletto & Giusti, 2005) e que nos Estados Unidos, cerca de três milhões de crianças e adolescentes fazem uso de tabaco; mais de 50% dos estudantes das últimas séries, correspondente ao nosso ensino médio, usam álcool pelo menos uma vez por mês; 5% fazem uso regular de maconha e 30% fazem uso freqüente de cocaína (Hird, Khuri, Dusenbury & Millman, 1997; Dryfoos, 1990; Weinberg, Rahdert, Colliver & Glanz, 1998).
Estudo de Ferigolo et al. (2004) aponta que a idade de início do uso de álcool e tabaco ocorre antes dos 12 anos e que as meninas utilizam mais medicamentos e os meninos mais álcool, tabaco e drogas ilícitas. Borini, Guimarães e Borini (2003) encontraram como idade de início de uso de álcool, antes dos 20 anos e a prevalência de drogas ilícitas é maior entre os homens.
No Brasil, estudos realizados pelo Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (CEBRID) têm mostrado que o consumo de drogas psicotrópicas (inalantes, maconha, cocaína e crack) é de 11,6%, sendo a maconha a de maior uso (Galduróz, 2001; Galduróz, Noto, Nappo & Carlini, 2003; Jungerman, Laranjeira & Bressan, 2005), mas o álcool e o tabaco ocupam o primeiro lugar.
Pesquisas comprovam que estudantes pouco sabem sobre o uso de drogas e álcool e que seus conhecimentos são mínimos e fragmentados. Também apontam o álcool como a substância mais utilizada, sendo as taxas mais elevadas no sexo masculino. Entre as drogas ilícitas, pesquisas indicam a maconha como a mais consumida (Pereyra et al., 2000).
Vários são os fatores desencadeantes para o uso de álcool e drogas, que vai desde a curiosidade, obtenção de prazer, forma artificial de aliviar as tensões físicas e emocionais causadas pelo cotidiano, sofrimento psíquico (depressão, ansiedade, culpa, baixa auto-estima) (Pereyra, et al., 2000; Scivoletto, 1997), condições familiares (ambientais e genéticas), escola e mídia. Em relação à escola, dificuldades de aprendizagem podem levar ao insucesso escolar e entre universitários das mais diversas áreas, pode estar relacionado às situações de stress que passam durante a graduação (Miyazaki, 1997). A forma de enfrentar esta nova etapa da vida (morar sozinho, mudar de cidade, exigência de sucesso acadêmico) e o stress relacionado à cobrança de um desempenho satisfatório, seja por parte dos pais ou de si próprio, pode favorecer o uso do álcool ou droga.
Um estudo verificou a freqüência do uso de álcool e fumo em filmes infantis e concluiu que em 40% dos filmes, o uso do álcool e seus efeitos estavam presentes e não havia avisos de advertências. Embora os filmes mais recentes mostrem menos uso desta substância, ainda não mostram o efeito negativo sobre a saúde dos personagens (Thompson & Yokota, 2001).
Assim, o objetivo deste estudo foi levantar o consumo de álcool e drogas em uma amostra representativa de universitários de um Centro Universitário, caracterizar os alunos quanto ao sexo, idade e estado civil e é identificar indivíduos que provavelmente apresentam problemas relacionados ao uso de álcool.
Metodologia
Sujeitos
Sendo a pesquisa um estudo de levantamento é importante que o tamanho da amostra seja representativo. Para tanto, foi utilizada uma tabela de amostras populacionais para definir o número de alunos a serem pesquisados. Participariam do estudo 2700 alunos de graduação de um Centro Universitário, sendo 513 do período diurno e 2187 do noturno, que são proporcionais ao número de alunos de cada período, mas efetivamente foram sujeitos 1953 alunos, sendo 349 do período diurno e 1604 do noturno. Para que não houvesse identificação do aluno, a amostra foi composta por alunos de todos os cursos e todas as séries, de acordo com critérios de proporcionalidade (Quadro 1). Utilizou-se a lista de chamada para a escolha da amostra de cada sala, isto é, por ordem de chamada até compor o número estabelecido para aquela classe.
Foi critério de inclusão, ser aluno regularmente matriculado e aceitar participar da amostra e critérios de exclusão, não estar presente em sala de aula no momento da aplicação do questionário ou se recusar a participar.
Esta pesquisa foi realizada pelos alunos do segundo ano noturno do curso de psicologia no ano de 2003, como requisito de trabalho final da disciplina de Metodologia de Pesquisa.
Quadro 1: Amostragem por curso e por série
Materiais
Para realização do estudo foram utilizados: Termo de Consentimento e um questionário auto-aplicável. Este questionário foi elaborado especificamente para esta pesquisa e é composto por três partes.
A primeira parte inclui questões de identificação, tais como curso freqüentado, sexo, idade e com quem mora. A segunda parte é composta por 15 questões fechadas, ligadas diretamente ao tema estudado, como por exemplo, se já fez uso das seguintes drogas (álcool; anfetaminas/ estimulantes; êxtase; cocaína; crack; maconha; alucinógenos; analgésicos; opiáceos; fenilciclidina; anabolizantes; inalantes, solventes; tabaco; outros); se o uso iniciou-se antes ou após o ingresso na universidade; se gosta de brincadeiras que envolvem álcool ou drogas; se tem alguém na família que faz uso de álcool ou droga; se já sofreu acidente provocado pelo uso de álcool ou droga; se sentiu “fissura” por álcool ou droga, entre outras. Para estas questões, o aluno apenas assinalava se sim ou não para álcool ou droga.
A terceira parte inclui o questionário CAGE, que é composto por quatro questões cuja finalidade é identificar indivíduos que apresentam problemas relacionados ao uso de álcool. É um questionário pouco intimidativo, fácil e rápido. O indivíduo deve responder apenas sim ou não para as afirmativas feitas. Considera-se o indivíduo com problemas relacionados ao álcool se assinalar sim para duas questões (Mansur & Monteiro, 1983).
Procedimento
Primeiramente, o projeto foi encaminhado ao Comitê de Ética em Pesquisa da FAMERP, que emitiu parecer favorável (Parecer nº 147/2003). A responsável pelo estudo informou sobre o projeto de pesquisa a todos os coordenadores e solicitou permissão para que os alunos-pesquisador aplicassem o questionário durante as aulas. Estes foram divididos em oito grupos e cada grupo ficou responsável pela aplicação dos questionários nos cursos previamente selecionados.
Os alunos–pesquisador visitaram cada sala de aula, com o número pré-estabelecido da amostra a ser pesquisada, solicitaram a participação dos alunos e aqueles que concordaram, assinaram o termo de consentimento e responderam ao questionário.
Os dados da primeira e segunda parte do questionário foram analisados por meio de freqüência e porcentagem e para análise da terceira parte utilizou-se Teste para aproximação normal para uma proporção.
Resultados e Discussão
Para maior proteção dos entrevistados, optou-se por apresentar os dados de forma global e não por períodos e cursos.
Do total de alunos entrevistados, 942 (48%) são do sexo masculino e 1007 (52%) são do feminino e a média de idade é de 20,6 anos. Em relação ao estado civil, 1618 (84%) são solteiros, 277 (14%) são casados, 37 (1,90%) são divorciados e 5 (0,25%) são viúvos.
Os resultados da Tabela 1 mostram que o álcool é o mais utilizado, ficando em segundo lugar os analgésicos sem prescrição médica, em terceiro lugar o tabaco e drogas ilícitas (anfetaminas, êxtase, cocaína, crack, maconha, alucinógenos, opiáceos, fenilciclidina, anabolizantes e inalantes) embora em menor porcentagem, também são citadas. Estes dados estão de acordo com a literatura, onde o álcool aparece em primeiro como o mais usado, tanto em pesquisas nacionais como internacionais (Galduróz et al., 2003). O uso de analgésicos aparece em segundo lugar (34% dos universitários entrevistados) e o fumo em terceiro lugar (28%). Mesmo assim, o álcool e fumo são os mais consumidos quanto comparados às drogas ilícitas, tal como na literatura (Galduróz, 2001; Galduróz et al., 2003).
Em relação ao comportamento no uso de álcool e droga, observa-se que os universitários já faziam uso do álcool antes de entrar na faculdade. Isto reflete a idade precoce dos jovens em relação ao uso do álcool, identificada em vários estudos mundiais (Borini et al. 2003; Ferigolo et al., 2004). Embora o uso do álcool apareça em primeiro lugar, os resultados indicaram que os universitários não precisam aumentar a quantidade ingerida para que tenham o efeito desejado. Quanto ao controle sobre o uso do álcool ou droga, os resultados indicam que os universitários têm controle sobre ingestão do álcool e droga. Quando questionados sobre a dependência, tanto de álcool quanto de drogas, as respostas indicaram não haver dependência (Tabela 2).
Os estudantes também foram abordados sobre o uso destas substâncias pelos amigos e as respostas indicaram que 60% utilizam o álcool e 36% usam droga.
Os universitários também foram solicitados a responder um instrumento cuja finalidade é identificar indivíduos que provavelmente apresentam problemas relacionados ao uso de álcool (CAGE). Responderam este questionário 1800 alunos. Os resultados indicaram que 418 (23%) universitários provavelmente apresentam problemas relacionados ao uso de álcool. Pode-se afirmar haver evidência de que mais de 20% dos universitários têm problemas relacionados ao uso de álcool (Teste para aproximação normal para uma proporção, p = 0.00031). Comparando este dado com os anteriormente apresentados, cujos resultados indicaram não haver falta de controle e dependência, parece que há certa discordância. Isto talvez possa ser explicado pelo fato de que neste instrumento (CAGE) as variações individuais não possam causar influência nos dados coletados. Alguns estudos chamam a atenção para a sensibilidade e especificidade do questionário CAGE quanto à detecção de problemas relacionados ao uso de álcool (Amaral & Malbergier, 2004).
Tabela 1: uso de álcool e drogas
Tabela 2: Comportamento do uso de álcool e droga
Conclusões
Neste Centro Universitário, o número de estudantes do sexo feminino é maior que do sexo masculino, o estado civil solteiro é mais prevalente e a idade média é de 20,6 anos. O álcool é a substância mais utilizada, ficando os analgésicos (sem prescrição médica) em segundo lugar e o tabaco em terceiro lugar. O uso do álcool parece não estar associado ao ingresso na universidade. As demais drogas aparecem em menor porcentagem, mas também são consumidas, trazem prejuízo ao indivíduo e carecem atenção.
Embora os universitários tenham informado que há controle sobre o uso do álcool, os resultados obtidos por meio do questionário CAGE indicaram que há uma parcela significativa de estudantes que provavelmente apresentam problemas relacionados ao uso do álcool. Devido à sensibilidade e especificidade do questionário os resultados encontrados chamam atenção e servem de alerta para o desenvolvimento de programas preventivos, além do que, pode ser utilizado como diagnóstico precoce.
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Endereço para correspondência
Rua Luiz Edmundo Gallo, 60 Jd. Alto Rio Preto CEP 15020-260, São José do Rio Preto – SP.
Recebido em: 11/04/2005
Aceito em: 07/06/2005
Alunado
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