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Revista Brasileira de Terapias Cognitivas
versión impresa ISSN 1808-5687versión On-line ISSN 1982-3746
Rev. bras.ter. cogn. v.2 n.1 Rio de Janeiro jun. 2006
ARTIGOS
Sintomas depressivos e o uso de substâncias psicoativas durante a vida em adolescentes
Depressive symptoms and the use of psychoactive substances by adolescents during life
Tânia Moraes Ramos Andrade I; Irani Iracema De Lima Argimon II
I Psicóloga, mestre em Psicologia Clínica pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
II Psicóloga, professora Titular do Programa de Pós-Graduação da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, doutora em Psicologia
RESUMO
Introdução: A depressão é um dos transtornos psiquiátricos mais comuns da adolescência. Nos quadros depressivos, é freqüente a ocorrência de comorbidades psiquiátricas, tais como o uso abusivo de substâncias psicoativas. Objetivo: investigar a associação entre sintomas depressivos e o uso de substâncias psicoativas em adolescentes. O grupo estudado é composto por estudantes do ensino médio de escolas privada e pública de porto alegre-rs. Método: trata-se de um estudo com delineamento transversal, com amostra por conveniência de 706 adolescentes. Os instrumentos utilizados foram: uma ficha dos dados sócio-demográficos, informações sobre o uso de substâncias psicoativas e o inventário de depressão de Beck (BDI). Resultados: 28% dos participantes da pesquisa apresentaram sintomas depressivos. OS adolescentes que fizeram uso de álcool, tabaco, cocaína ou outras substâncias apresentaram mais sintomas depressivos do que os que não as utilizaram (t = 2,248, p = 0,025). Conclusão: observa-se que a prevalência de sintomas depressivos nesta amostra é alta e similar a outros estudos com adolescentes. a associação entre o conhecimento da presença de sintomas depressivos nos adolescentes e o uso de substâncias psicoativas pode contribuir para a implantação de programas voltados para essa clientela, visando à prevenção em seus três níveis: primário, secundário e terciário.
Palavras-chave: Adolescência, Sintomas depressivos, Substâncias psicoativas.
ABSTRACT
Introduction: Depression is amongst the most common psychiatric disorders during adolescence, being psychiatric comorbidities such as the abuse of psychoactive substances, frequently observed in depressive cases. Objective: Investigating the association between depressive symptoms and the use of psychoactive substances in adolescents, that is, private and public High School students in Porto Alegre-RS. Method: It is a cross-sectional study, using sample by convenience, of 706 school adolescents. The instruments used were a social and demographic information sheet, information on the use of psychoactive substances, and Beck’s Depression Inventory (BDI). Results: 28% of the participants presented depressive symptoms. The adolescents who used alcohol, tobacco, cocaine or other substances, presented more depressive symptoms than the ones who did not use them (t=2,248 p=0,025). Conclusion: It has been observed that the prevalence of depressive symptoms in this sample is high and similar to the ones found in other studies on adolescents. The knowledge of the presence of depressive symptoms and the association with the use of psychoactive substances may contribute for establishing programs focused on this group, in order to prevent such symptoms, along its three levels: primary, secondary and tertiary.
Keywords: Adolescence, Depressive symptoms, Psychoactive substances.
Introdução
A adolescência pode ser caracterizada como uma fase em que se desenvolve um conjunto de mudanças evolutivas na maturação física e biológica e no ajustamento psicológico e social do indivíduo. Embora ocorram mudanças fisiológicas em todas as etapas do ciclo vital, a rapidez dessas transformações durante o período da adolescência é maior que nos anos que a precedem ou a seguem (Papalia & Olds, 2000). Na adolescência, se tudo transcorrer bem, o jovem atingirá a vida na plenitude de todos os seus potenciais, dispondo de um substrato orgânico, afetivo, emocional e cognitivo para se desenvolver. Porém, se falharem fatores intrínsecos (biológicos, genéticos e emocionais) e extrínsecos (família, escola, amigos e a comunidade), a transformação poderá ser interrompida em diferentes níveis e graus de complexidade (Pinsky & Bessa, 2004). Para Bessa (2004), a adolescência é um momento propício ao surgimento de transtornos psiquiátricos. Segundo Harrington (2005), os jovens tendem a sentir emoções com profundidade e as oscilações de humor são comuns nesse estágio da vida. Por isso, pode ser difícil distinguir reações emocionais intensas de transtornos depressivos. É natural que os adolescentes possuam momentos de depressão, mas não são todos que irão apresentar quadros depressivos. Sendo, portanto, problemático estabelecer os limites do transtorno depressivo em adolescentes.
Bahls e Bahls (2002) declaram que o interesse científico pela depressão na adolescência é bastante recente. Somente em 1975, o National Institute Mental Health (NIMH) reconheceu oficialmente a Depressão Maior nos jovens. Anteriormente, a depressão no referido grupo era encarada como rara. A Organização Mundial de Saúde (OMS) afirma que a primeira crise de depressão pode ocorrer entre os 15 e 19 anos, sobretudo nas meninas, e identifica também que 25% dos adultos com Depressão Maior apresentam o primeiro episódio da doença antes dos 18 anos de idade.
Os jovens que evidenciam depressão têm mais características irritáveis do que de tristeza. O curso da depressão costuma ser insidioso e mostra comorbidade com outros transtornos psiquiátricos. Portanto, é comum que adolescentes com quadros depressivos tenham outro transtorno mental como, por exemplo, ansiedade, déficit de atenção, transtorno de conduta e transtorno por uso de substâncias psicoativas. (Bessa, 2004; Faraone, 2005; Harrington, 2005; Lewinsohn, 2005; Sukiennik et al., 2000; Sukiennik & Salle, 2002).
Pesquisadores brasileiros têm investigado a prevalência de sintomas depressivos em adolescentes. Salle (1999), em estudos com 503 estudantes de 15 a 17 anos de idade, verificou sintomas depressivos em 32% dos adolescentes, dentre os quais 5% preenchiam critérios para Depressão Maior. Em outro estudo conduzido por Bahls (2002), com 463 estudantes do Ensino Fundamental e Médio de 10 a 17 anos de idade, constatou-se a presença de sintomas depressivos em 20,3% dos adolescentes. Desse percentual, 72,3% eram meninas e 27,7% meninos. No fator idade, não houve diferença estatisticamente significativa. Entretanto, encontrou-se tendência de aumento dos índices de sintomas depressivos à medida que a idade avançava durante a adolescência, dos 10 aos 15 anos e dos 16 aos 17 anos.
Saluja et al. (2004), investigando a prevalência de sintomas depressivos em 9.863 estudantes (meninos= 4.712; meninas= 5.151) com idade média de 11, 13 e 15 anos, constataram que 10% dos meninos e 25% das meninas, totalizando 18% da amostra, apresentaram sintomas depressivos. Tais resultados indicam que a prevalência dos sintomas depressivos aumentou com a idade para ambos os sexos; que as meninas demonstram mais sintomas depressivos que os meninos e que existe uma associação significativa entre sintomas depressivos e o uso de substâncias psicoativas.
A expressão “uso na vida” de substâncias psicoativas é um conceito que, segundo Galduróz, Noto, Fonseca e Carlini (2004), é utilizado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para definir o uso de qualquer droga psicotrópica, pelo menos uma vez na vida.
Em relação ao uso de substâncias psicoativas, sabe-se que, nos últimos anos, a incidência do consumo tem aumentado na adolescência (Saluja et al., 2004; Poulin, Hand, Boudreau & Santor, 2005; Rey, Martin & Krabman, 2004; Fergusson, Horwood & Swain-Campell, 2002; Fergusson, Goodwin & Horwood, 2003; Degenhardt, Hall & Lynskey, 2003). Por isso, pesquisadores brasileiros têm se ocupado desse tema (Galduróz et al., 2004; Muza, Bettiol, Muccillo & Barbieri, 1997; Baús, Kupek & Pires, 2002; Sanseverino & Abreu, 2003; Saibro & Ramos, 2003).
Segundo o V Levantamento Nacional Sobre Consumo de Drogas Psicotrópicas entre estudantes do ensino fundamental e médio da rede pública de ensino, nas 27 capitais brasileiras (Galduróz et al., 2004), 65,2% do total dos adolescentes pesquisados fizeram uso na vida de álcool (masculino = 64,5%; feminino = 66,3%); 24,9% de tabaco (masculino = 25,2%; feminino = 24,7%); 5,9% de maconha (masculino = 7,9%; feminino = 4,1%) e 2,0% de cocaína (masculino = 2,8%; feminino = 4,1%). Os pesquisadores observaram também uma maior defasagem escolar entre os estudantes que já tinham feito uso na vida de drogas, comparados aos que não o tinham feito. As drogas mais utilizadas pelos estudantes, excetuando-se álcool e tabaco, pela ordem, foram: solventes, maconha, ansiolíticos, anfetamínicos e anticolinérgicos. O total estimado de estudantes brasileiros da rede estadual de ensino que fizeram uso na vida de drogas foi de 22,6%. Porto Alegre, em comparação a outras capitais, foi identificada como a capital em que os adolescentes mais fizeram uso na vida de maconha, com o percentual de 10,9%. Em relação às outras substâncias psicoativas, eis os resultados de Porto Alegre: álcool - 69%, tabaco - 33,5%, solvente - 12,3% e cocaína - 2,3%.
Saibro e Ramos (2003), avaliando 1.586 estudantes de 14 escolas públicas e privadas do Ensino Médio e Fundamental de Porto Alegre, com idades de 10 a 18 anos, investigaram os itens a seguir: a prevalência de uso na vida de substâncias psicoativas, a idade de início de uso e a distribuição por idade e sexo. Foram encontradas as seguintes taxas de prevalência de uso na vida: álcool (83,7%), tabaco (39%), maconha (21,1%), inalantes (20,4%) e cocaína (3,5%). As meninas apresentaram maior uso na vida de anfetaminas (11,3%) e tabaco (44,5%) que os meninos. Estes evidenciaram um maior uso na vida de cocaína, com a percentagem de 5%. O uso de maconha e inalantes foi equivalente entre os sexos.
Lafay, Manzanera, Papet, Marcelli e Senon (2003), investigando 1.521 estudantes com idade entre 18 e 24 anos, identificaram que 30% dos adolescentes estudados apresentavam sintomas depressivos e faziam o uso de substâncias psicoativas. Desse grupo, 6% preenchiam critérios diagnósticos de Depressão Maior.
A incidência de adolescentes com sintomas depressivos e uso de substâncias psicoativas foi investigada por Blore, Schulze e Lessing (2004), em pesquisa com 1.298 adolescentes, apontando que as meninas possuíam mais sintomas depressivos que os meninos. Os sintomas depressivos foram significativamente correlacionados tanto à freqüência do uso de substâncias psicoativas quanto à precocidade do uso. Os fatores de risco para depressão e abuso de substâncias psicoativas, no estudo citado, incluíram dificuldade de relacionamento entre os pais, presença de eventos estressantes, insatisfação com o rendimento escolar e uso das referidas substâncias pelos amigos.
Pela relevância do tema, o objetivo deste estudo foi verificar, em adolescentes de escola pública e privada, a prevalência dos sintomas depressivos e do uso na vida de substâncias psicoativas, bem como a presença da associação ou não entre os sintomas depressivos e o uso na vida dessas substâncias.
Método
Foi realizado um estudo de delineamento transversal, com uma amostra por conveniência, composta por 706 adolescentes, provenientes de duas escolas: uma pública (n=353) e uma escola privada (n=353), ambas situadas em Porto Alegre, Rio Grande do Sul.
As séries escolhidas para participação no estudo foram o segundo e terceiro anos do Ensino Médio, sendo a escolha determinada pela faixa etária de interesse do estudo: 15 e 22 anos. Foram pesquisados todos os adolescentes que pertenciam àquelas séries escolares e que aceitaram participar da pesquisa, devolvendo o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido assinado pelos seus responsáveis.
Instrumentos
Foram utilizados os seguintes instrumentos:
1) Ficha sócio-demográfica: com informações a respeito dos hábitos, história familiar, desempenho escolar e uso de substâncias psicoativas dos adolescentes. Para coleta das informações desse último item, foram utilizadas algumas questões do I Levantamento Domiciliar Sobre o Uso de Drogas Psicotrópicas no Brasil – 2001 (Carlini, Galduróz, Noto & Nappo, 2002).
2) Inventário Beck de Depressão (BDI, Steer & Beck, 1993), traduzido e validado no Brasil por Cunha (2001). É um instrumento utilizado para medir a intensidade dos sintomas depressivos, sendo uma escala auto-aplicável que avalia componentes cognitivos, afetivos, comportamentais e somáticos da depressão. Os pontos de corte da versão brasileira são: mínimo = 0-11, leve = 12-19, moderado = 20-35, grave = 36-63. A pontuação mínima é considerada como inexistência de sintomas depressivos.
Procedimentos
Esta pesquisa foi, primeiramente, submetida e aprovada pelo Comitê de Ética da PUC-RS. Os participantes, assim como seus responsáveis legais, foram informados dos procedimentos e dos objetivos deste estudo. Os dados foram coletados após a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido pelo aluno e seu responsável, em duas vias, uma ficando com o participante.
A coleta dos dados foi realizada por uma equipe treinada, coordenada pela pesquisadora, nas salas de aula das escolas participantes. Foi realizada aplicação coletiva, iniciando pelo preenchimento da Ficha de dados sócio-demográficos e uso de substâncias psicoativas, seguido da aplicação do Inventário Beck de Depressão.
Análise dos dados
O banco de dados foi estruturado no Statistical Package for Social Sciences –SPSS versão 11.5. A análise exploratória dos dados constou de testes estatísticos descritivos e de freqüências. Na análise inferencial, foram utilizados o Teste Qui-Quadrado, Teste Exato de Fisher, Teste t de Student para Amostras Independentes e o Coeficiente de Correlação Linear de Pearson. A regressão linear múltipla, com o método stepwise, foi empregada para identificar os fatores preditores dos sintomas depressivos. O nível de significância utilizado como parâmetro foi o de 5 %.
Resultados
O estudo contou com um total de 706 adolescentes, sendo que 369 (52,3%) eram do sexo masculino e 334 (47,3%) do sexo feminino, com idades variando entre 15 e 22 anos (M=16,42 anos; SD=0,89) e cursando o Ensino Médio.
De todos os participantes, 405 (57,4%) residiam com ambos os pais; 184 (26,1%) moravam com um dos pais; 68 (9,6%) residiam com outros familiares; 9 (1,3%) moravam sozinhos e 39 (5,5%) com outras pessoas.
Sintomas depressivos e fatores associados
Conforme a intensidade dos sintomas depressivos identificados, 504 (71,4%) dos adolescentes não manifestaram sintomas depressivos; 130 (18,4%) apresentaram sintomas depressivos de categoria leve; 64 (9,1%) de moderada e 2 (0,3%) de grave.
A média dos escores do BDI foi de 8,86 pontos (SD = 7,46), o que é considerado grau mínimo. Ao considerarmos somente as categorias leve, moderada e grave do BDI (28% da amostra), a média foi de 18,44 pontos (SD = 6,45).
O Teste t de Student para Amostras Independentes, apontou diferença significativa nos escores dos sintomas depressivos conforme o gênero (t = -7,759; p<0,001). As médias de sintomas depressivos dos meninos foram menores (M = 6,87; SD = 6,374), quando comparadas às das meninas (M = 11,10; SD = 7,969). Cabe ressaltar que a proximidade de valores entre a média e o desvio-padrão demonstra que houve uma grande variação intragrupos da presente amostra. A distribuição das categorias do BDI entre os gêneros encontra-se demonstrada na tabela 1.
Tabela 1 - Distribuição da classificação dos sintomas depressivos de acordo com o gênero
N (%)
Foi encontrada uma correlação positiva de muito baixa intensidade entre a idade e sintomas depressivos, de acordo com o Coeficiente de Correlação Linear de Pearson (r= 0,087; p = 0,021).
Não houve diferença significativa na intensidade dos sintomas depressivos entre os adolescentes que moravam com seus pais, com um dos pais, que residiam com outras pessoas ou sozinhos, conforme o Teste de Qui-Quadrado (c2 = 10,634; p = 0,561).
Também não foi observada diferença relevante nos sintomas depressivos entre os adolescentes da escola pública (M = 8,44; SD = 7,42) e da escola privada (M = 9,28; SD = 7,49), conforme o Teste t de Student para amostras independentes (t = 1,496; p = 0,135).
Segundo o Teste t de Student para amostras independentes, entre os adolescentes pesquisados, ter história de reprovação escolar (17,8% da amostra; t = 2,030; p = 0,043), ter alguém na família com problemas com o uso de substância psicoativa (27,1%; t = 2,059; p = 0,040) e ter amigos próximos com história de uso de maconha (29,6%; t = 2,430; p= 0,015) está associado ao aumento dos sintomas depressivos.
A prática de esportes (n= 589; 83,4%) pelos adolescentes estava inversamente associada aos sintomas depressivos (t = -5,491; p<0,001). Os adolescentes praticantes de esportes tiveram uma média de pontos referentes aos sintomas depressivos (M = 8,19 pontos; SD = 6,95) menor que os não-praticantes (M = 12,29; SD = 8,93).
Substâncias Psicoativas
O total de adolescentes que fizeram uso na vida de álcool, tabaco, maconha, solvente, cocaína e outras substâncias psicoativas foi de 82,2% (580). Enquanto os que não usaram nenhuma das referidas substâncias na vida foi de 17,8% (126).
A idade média de início do uso do álcool foi de 13,88 anos (SD = 1,51; 6 - 18); do tabaco: 14,18 anos (SD = 1,68; 8 - 18); da maconha: 15,02 anos (SD = 1,06; 11 - 17) e de outras drogas: 15,07 anos (SD = 1,26; 11 -17).
Segundo o Teste de Qui-Quadrado, não foi encontrada diferença importante entre os gêneros no item referente ao uso na vida de substâncias psicoativas, exceto do uso na vida de tabaco já que as meninas utilizaram-no mais que os meninos. Os dados referentes ao item mencionado encontram-se demonstrados na tabela 2.
Tabela 2 - Uso na vida de substâncias psicoativas conforme o gênero ( n = 703)
Entre os adolescentes que usaram uma destas substâncias: álcool, tabaco, maconha, solvente, cocaína e outras psicoativas uma vez na vida, a média de pontos do BDI foi de 9,16 (SD = 7,40) e a dos que não as utilizaram foi de 7,50 (SD = 7,61). De acordo com o Teste t de Student para amostras independentes, pôde-se verificar que houve diferença significativa entre as médias dos sintomas depressivos de acordo com o uso na vida de substâncias psicoativas (t = 2,248; p= 0,025).
As substâncias psicoativas mais utilizadas pelos adolescentes foram: o álcool (81,7%); o tabaco (28,2%); a maconha (20,7%); outras substâncias (6,9%); solvente (5,8%) e cocaína (1,8%).
Foi encontrada associação entre sintomas depressivos e uso na vida das seguintes substâncias psicoativas: álcool (t= 2,27; p=0,024), tabaco (t = 3,38; p = 0,01) e cocaína (t= 2,59; p = 0,01), estando tal relação demonstrada na tabela 3.
Tabela 3 - Comparação das médias dos sintomas depressivos e do uso na vida de substâncias psicoativas
De acordo com o Teste Exato de Fisher, os alunos da escola privada usaram mais álcool que os alunos da escola pública (cð2= 11,619; p<0,001). O mesmo ocorreu com o uso de maconha (cð2= 15,388; p<0,001), solventes (cð2= 16,261; p<0,001) e outras substâncias (cð2= 13,784; p<0,001). Não foram encontradas diferenças quanto ao uso de tabaco (cð2= 0,603; p = 0,452) e cocaína (cð2= 0,697; p = 0,577) entre as escolas. A comparação pode ser observada na tabela 4.
Tabela 4 - uso na vida de substâncias psicoativas dos adolescentes das escolas privada e pública (n = 706)
Para avaliar as variáveis preditoras dos sintomas depressivos nessa amostra, foi realizada a Regressão Linear Múltipla, método stepwise (tabela 5), com as seguintes variáveis: idade, repetência escolar, gênero, uso de álcool, tabaco, cocaína, solvente, maconha e outras substâncias. Os modelos de regressão apontam para a contribuição independente de gênero, repetência escolar, uso de cocaína, uso de tabaco, uso de outras substâncias. O coeficiente de determinação global obtido (R2) foi de 0,114, isto é, 11,4% de variância dos sintomas depressivos. O que pode ser justificado pelas variáveis gênero, repetência escolar, uso de cocaína, tabaco, outras substâncias.
Tabela 5 - Variáveis preditoras dos sintomas depressivos em adolescentes
Discussão
O presente estudo mostra que, entre adolescentes do Ensino Médio de escola pública e privada, a prevalência de sintomas depressivos foi de 28%. A média obtida, 18,44 pontos, está no limiar superior da categoria leve de avaliação da intensidade dos sintomas depressivos. Esse dado ratifica os achados de alguns pesquisadores como: Bahls (2002), que verificou a presença de sintomas depressivos em 20,3% de sua amostra; Field, Diego e Sanders (2001), que observaram 29% de sintomas depressivos; Salle (1999), que apontou 32% dos mesmos sintomas e Saluja et al. (2004), que encontraram 18% deles.
A associação entre a presença de sintomas depressivos e a diferença de gênero foi outra constatação relevante, na qual as meninas apresentaram maiores médias de sintomas depressivos em relação aos meninos. Dita relação é encontrada em diversos estudos, apresentando sempre os mesmos resultados constatados aqui. Como exemplo, temos as investigações realizadas por Bahls (2002); Blore et al., (2004); Bond, Toumbourou, Thomas, Catalano e Patton (2005); Fergusson et al., (2003); Gorenstein, Andrade, Zanolo e Artes (2005); Poulin, Hand, Broudreau e Santor (2005) e Saluja et al. (2004).
Um dado importante diz respeito à associação significativa entre sintomas depressivos e idade. Testificou-se que, quanto maior fosse a idade, maior seria a presença de sintomas depressivos. Semelhante ligação foi encontrada por Blore, et al., (2004); Gorenstein, et al., (2005) e Saluja et al. (2004).
Não foi comprovada diferença significativa entre adolescentes que moram com os pais, com um dos pais, com familiares, sós ou com outros pessoas e sintomas depressivos. Ocorreu o mesmo na comparação entre as escolas de ensino público e privado.
Deve-se destacar que houve uma relação estatisticamente significativa entre adolescentes com história de reprovação escolar e a presença de sintomas depressivos.
Os informantes que mencionaram ter um amigo ou alguém na família com problemas relacionados ao uso de substâncias psicoativas apresentaram mais sintomas depressivos, o que também foi observado por Bond et al., (2005) e Blore et al., (2004).
Aspecto importante é o dos adolescentes que relataram praticar esportes, pois mostraram menos sintomas depressivos, quando comparados aos que não praticam esportes. É o que se percebe no estudo de Field, Diego e Sanders (2001), em que adolescentes depressivos gastam menos tempo se exercitando.
Em relação ao uso geral de substâncias psicoativas descritas neste estudo (álcool, tabaco, maconha, solventes, cocaína e outras), a prevalência de uso na vida pelos adolescentes foi de 82,15%, evidenciando um elevado índice. Galduróz et al., (2004) verificaram ser alta a prevalência do uso de drogas entre os estudantes do ensino fundamental e médio, visto que há uma maior exposição ao uso destas substâncias na faixa etária estudada.
A idade média de início do uso do álcool e do tabaco nos adolescentes investigados é menor do que a idade de início do uso de maconha e outras drogas, o que pode ser confirmado por outros estudos, tais como: Galduróz et al. (2004); Saibro e Ramos (2003); Tavares, Béria e Lima (2001) e Micheli e Formigoni (2004) que verificaram um aumento linear na idade da experimentação do álcool, tabaco, maconha, ansiolítico, anfetaminas e cocaína.
Quanto ao uso na vida de substâncias psicoativas e diferença de gênero, as meninas usaram mais tabaco que os meninos. A mesma diferença foi relatada em pesquisas referentes à cidade de porto alegre por Galduróz et al. (2004) e Saibro e Ramos (2003).
No que se refere ao uso de substâncias psicoativas e associação com sintomas depressivos, os resultados encontrados apontam para uma maior média de sintomas depressivos entre os adolescentes que usaram álcool, tabaco e cocaína, quando comparados aos que não usaram tais substâncias. Field et al. (2001), por exemplo, verificaram que os adolescentes com sintomas depressivos faziam, com mais freqüência, uso de cocaína e maconha. Escobedo, Reddy e Giovino (1998) encontraram associação entre sintomas depressivos e o uso de tabaco. Saluja et al. (2004); Bond et al. (2005) e Fergusson et al. (2002) acharam uma conexão entre sintomas depressivos e uso de substâncias psicoativas.
Cabe salientar o número expressivo de pesquisas encontradas durante a revisão da literatura, avaliando os seguintes pontos: sintomas depressivos/depressão e uso/abuso/ dependência de substâncias psicoativas. Servem de modelos os estudos de Fergusson et al. (2003), que pesquisou a associação da depressão maior à dependência de nicotina e os estudos de Chabrol, Ducongé, Casas, Roura e Carey (2005); Libby, Orton, Stover e Riggs (2005); Degenhardt, Hall e Lynskey (2001, 2003) e Rey, Martin e Krabman (2004), que abordaram a depressão maior e sua associação à maconha.
Em relação ao uso de substâncias psicoativas entre os alunos de escola pública e privada, observou-se que os estudantes desta usaram mais álcool, maconha, solvente e outras substâncias que os daquela. Quanto ao tabaco, não foram encontradas diferenças.
De acordo com a Regressão Linear Múltipla, notou-se que as variáveis preditoras dos sintomas depressivos foram o gênero, a repetência escolar, o uso de cocaína, de tabaco e de outras substâncias.
Conclusão
Até meados da década de 70, acreditava-se que a adolescência não era afetada pela depressão e que seus sintomas eram pouco relatados tanto pelos educadores e familiares, como pelos profissionais da área da saúde. Atualmente, os estudos demonstram a vulnerabilidade do adolescente frente à possibilidade de apresentar sintomas ou quadros depressivos. Os achados deste estudo, em relação à prevalência de sintomas depressivos nos adolescentes e à ocorrência dos mesmos nos diferentes gêneros, aparecendo mais em meninas do que em meninos, são similares aos de pesquisas já realizadas em âmbitos nacional e internacional. Os escores de sintomas depressivos verificados neste e em outros estudos demonstram a necessidade da detecção precoce desses sintomas em adolescentes, a fim de reduzir o impacto dos fatores de risco para o uso de substâncias psicoativas e garantir o tratamento a tempo.
Além da prevalência de sintomas depressivos, procurou-se investigar o consumo na vida de substâncias psicoativas entre os adolescentes, sendo que as taxas obtidas foram semelhantes às de estudos brasileiros. O aumento do consumo de substâncias pelos adolescentes e a associação com os sintomas depressivos servem de alerta para prevenção de transtornos depressivos. O diagnóstico precoce da depressão, bem como do uso de substâncias psicoativas, propicia o não-desenvolvimento de quadros depressivos graves que podem comprometer a evolução dos adolescentes para a vida adulta. Portanto, este pode ser um alerta a profissionais da área da saúde que trabalham com adolescentes, para que os mesmos não descaracterizem sinais e/ou sintomas, pois podem evoluir drasticamente, se não trabalhados no momento oportuno.
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Endereço para correspondência
Rua Florêncio Ygartua, 288, conjunto 303, Moinhos de Vento - Porto Alegre, RS. CEP: 90430-010.
E-mail: taniaandrade@terra.com.br.
Recebido em: 20/05/2006
Aceito em: 21/06/2006