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Revista Brasileira de Psicanálise
versión impresa ISSN 0486-641Xversión On-line ISSN 2175-3601
Rev. bras. psicanál v.41 n.2 São Paulo jun. 2007
RESENHAS DE LIVROS
Cintia Buschinelli*
Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo
Linguagem e construção do pensamento
Concepção e organização: José Renato Avzaradel
São Paulo: Casa do Psicólogo, 2006, 285 p.
Colaboradores: Arnaldo Chuster, Danilo Marcondes, Eliane Yunes, Elias M. da Rocha Barros, Isaias Melsohn, J. A. Bockmann de Faria, José Francisco da Gama e Silva, Luiz Carlos Uchôa Junqueira Fº., Ney Marinho, Paulo Marchon
Ricardo Piglia, a propósito da relação entre psicanálise e literatura, apresenta em seu livro Formas breves2, a seguinte consideração: A psicanálise é em certo sentido a arte da natação, uma arte de manter à tona no mar da linguagem pessoas que estão sempre fazendo força para afundar (p. 56). A reflexão de Piglia pode esclarecer um dos sentidos da coletânea Linguagem e construção do pensamento, pois ela dá a conhecer algumas das maneiras possíveis de mergulhar nesse profundo e extenso mar da linguagem cujas correntes marítimas têm uma única direção, qual seja, a da comunicação. Como nos diz José Renato Avzaradel, organizador da coletânea, ao introduzir o livro:
Os processos de como se formam os pensamentos na mente humana e sua relação com a linguagem são questões básicas para a psicanálise. Essa importância é de caráter tanto teórico quanto clínico, pois é nas alterações do pensamento e da linguagem que residem a origem e as conseqüências das patologias graves (p. 11).
Portanto, a proposta última dos autores deste livro é pensar a linguagem para chegar à clínica psicanalítica, e, para tanto, transitar entre os meandros da construção do pensamento cuja intenção última seria reconhecer em que ponto o fio do pensamento se partiu para que se perdesse sua capacidade de se exprimir.
No longo e diversificado caminho da construção do pensamento até a linguagem verbal, há que fazer uma parada no território das imagens e suas representações e, como não poderia deixar de ser, no universo dos sonhos em sua essência imagética, pedra de toque de todo o trabalho psicanalítico. São vários os autores que transitam nesse território: Elias Rocha Barros, que em Afeto e imagem pictórica procura relacionar a criação e elaboração de significados com a produção de representações imagéticas da experiência emocional (p. 15), Isaias Melsohn, para quem o sonho é uma forma particular de pensamento carregada de expressividade; Paulo Marchon, que investiga as imagens no pensamento e na linguagem verbal; José Francisco da Gama e Silva, que utiliza um soneto de Camões cujo conteúdo se expressa por meio da linguagem, criando imagens visuais, auditivas e sinestésicas de alto poder emocional (p. 249), José Renato Avzaradel, que se vale do ideograma chinês para investigar a linguagem pictórica que precede e de certa forma sustenta a linguagem verbal; e Luiz Carlos Uchôa Junqueira Fo., que ressalta a importância da ideogramatização como único recurso que permite a representação atemporal do inconsciente. Junqueira, no entanto, acrescenta um elemento decisivo na construção de ideogramas, afirmando com convicção que o poder do registro do ideograma não reside nas imagens, mas, sim, nos vínculos que as articulam (p. 223). É nessa mesma direção o trabalho de J. A. Bockmann de Faria, cujo título é A influência afetiva nos significados das interações comunicativas entre seres humanos. Segundo esse autor, a noção de significado é indissoluvelmente ligada ao fenômeno vida. Um acontecimento terá significado somente se percebido por ou atuar sobre um ser vivente ou parte de sua estrutura (p. 227).
Vale a pena ressaltar duas unanimidades na coletânea, a saber, a profundidade com que os psicanalistas aqui reunidos transitam pelo tema linguagem e a presença marcante de Bion na maioria dos textos que a compõe. Por exemplo, o artigo de Arnaldo Chuster é dedicado à compreensão minuciosa de transformações, tema central da obra de Bion. Além disso, o leitor atento não deixará de notar que tanto o artigo de Danilo Marcondes, que abre a coletânea, como o de Eliana Yunes, que a fecha, foram constituídos em solo de regiões vizinhas à psicanálise, a saber, o da filosofia e o da literatura. A permeável fronteira entre filosofia e psicanálise é palmilhada cuidadosamente no trabalho de Ney Marinho, em artigo que precede os psicanalíticos por excelência.
O detalhamento da apresentação dos textos deixa ver o cuidadoso trabalho de José Renato Avzaradel na organização deste livro, que passa a ser presença obrigatória na atualização de leitura tanto de psicanalistas quanto de todos aqueles que se interessam pelo extenso e diversificado campo da linguagem.
* Membro associado da SBPSP
2 São Paulo: Companhia das Letras, 2004.