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Gerais : Revista Interinstitucional de Psicologia

 ISSN 1983-8220

Gerais, Rev. Interinst. Psicol. vol.4 no.spe Juiz de fora dez. 2011

 

ARTIGOS

 

Sustentabilidade organizacional: a proposição de uma framework representativa do agir competente para seu acontecimento

 

Organizational sustainability: proposing a representative framework for the occcurence of its competent action

 

 

Luciano MunckI,1; Mariana Gomes Musetti MunckI; Rafael Borim-de-SouzaII

IUniversidade Estadual de Londrina, Londrina, Brasil
IIUniversidade Federal do Paraná, Curitiba, Brasil

 

 


RESUMO

Este artigo tem por objetivo propor uma framework representativa dos processos necessários ao acontecimento da sustentabilidade organizacional. A orientação epistemológica do artigo se alinha com as perspectivas da teoria do agir organizacional, que delineia a organização como um processo de ações e decisões permanente que se dissemina por todos os níveis. Ao adotar essa lógica, buscou-se por uma teoria, a qual norteasse a organização na busca de coerência em suas ações e decisões. Encontrou-se a abordagem das competências. A partir da inter-relação entre as premissas do agir organizacional, da sustentabilidade organizacional e da gestão por competências, elaborou-se a referida framework, que, em síntese, exprime: uma rede representativa das exigências para se chegar à sustentabilidade organizacional, os agrupamentos de competências necessários para viabilizar a conquista da sustentabilidade organizacional e a validação da justaposição desses dois fenômenos como preceito de gestão capaz de inserir os princípios da sustentabilidade nas ações e decisões organizacionais.

Palavras-chave: Sustentabilidade Organizacional, Agir Organizacional, Competências, Framework, Organizações


ABSTRACT

The objective of this article is to propose a framework which shows the necessary processes for the occurrence of the corporate sustainability. The epistemological approach of this article is guided by the theory of organizational action, which observes the organization as a permanent process of actions and decisions which are disseminated in all managerial levels. Once that this logic has been chosen, another theory has been researched which could complement the organizational acting with coherence in its actions and decisions. The competence theory has been selected as a possible alternative. Through this interrelation between the organizational action, the corporate sustainability and the competence management, a framework has been structured showing the following main points: a representative network of challenges necessary for the organization to reach its corporate sustainability; the group of competences needed to validate the reach of the corporate sustainability and the validation of the interconnection of these two phenomena as a managerial precept able of inserting the sustainability principles in the organizational actions and decisions.

Keywords: Corporate Sustainability, Organizational Action, Competences, Framework, Organizations


 

 

Uma revisão crítica da literatura sobre desenvolvimento sustentável, sustentabilidade e sustentabilidade organizacional revela a falta de um quadro teórico global e consolidado para a compreensão teórico-aplicada desses termos e de suas especificidades. Uma análise criteriosa mostra que as definições envoltas aos termos são vagas, discordantes em aspectos éticos, ideológicos e práticos, além de carentes de uma base conceitual comum e unificadora. Há dúvidas até sobre o que deve ser sustentado, em que tempo e com que interesses. Outra lacuna encontrada reside na propositura de caminhos para se chegar ao desenvolvimento sustentável ou à sustentabilidade organizacional. De forma geral, estão presentes na literatura as exigências, os indicadores, os efeitos, a história e a crítica. Contudo, verifica-se que isso é pouco em relação a como articular esses conceitos sistemicamente para que se tornem ações e decisões organizacionais.

Na tentativa de suprir parte dessa lacuna, o presente artigo almeja encontrar as bases que permitam sugerir um caminho para tal, inicialmente no contexto organizacional. Para tanto, utilizou-se da análise conceitual, que envolve revisões na literatura em busca de padrões e semelhanças. Em seguida, sintetizaram-se diferentes classes e seus respectivos conceitos, o que permitiu identificar ideias distintas sobre sustentabilidade e circunscrever os conceitos mais adequados para o presente estudo (Jabareen, 2009).

Meadows, Meadows and Randers (1992) definem a sustentabilidade como uma estratégia de desenvolvimento que resulta na melhoria de qualidade da vida humana e na minimização simultânea dos impactos ambientais negativos. Nesse sentido, sugerem a gestão integrada, que representa a visão conexa e holística dos aspectos do desenvolvimento social, crescimento econômico e proteção ambiental. A integração das preocupações ambientais, sociais e econômicas na estratégia de gestão é essencial. Os autores reiteram que, para atingir a integridade ecológica, fazem-se necessárias abordagens integradoras e holísticas para a gestão.

Isso posto, o objetivo de propor uma framework representativa das ações e decisões necessárias ao alcance da sustentabilidade organizacional ganha relevância. A sustentabilidade organizacional foi admitida pelos autores também como um objetivo organizacional estratégico, por isso a lógica das competências foi designada como aquela que concederia aos processos e ações viabilizadores desse objetivo, solidez teórica e a aplicabilidade necessária.

 

Procedimentos metodológicos

O objetivo de pesquisa apresentado determinou o desenvolvimento de uma pesquisa qualitativa, teórica, exploratória e bibliográfica. Dentre as perspectivas de pesquisa qualitativa existentes, a adotada para elaboração e condução deste estudo tem a ver com uma abordagem caracterizada pela tentativa de reconstruir estruturas profundas que geram ação e significado. Por esse delineamento, é possível caracterizar o artigo desenvolvido como uma pesquisa qualitativa orientada pela escola da teoria fundamentada de acordo com as assertivas de Glaser and Strauss (1967).

Para Flick (2009), a ideia de desenvolvimento da teoria é adotada como um objetivo geral da pesquisa qualitativa, o que é confirmado por Jabareen (2009) ao manifestar que, quando uma pesquisa busca conciliar conceitos, informações, variáveis e discussões para a formação de uma nova abordagem explicativa a respeito de um fenômeno multidisciplinar, como a sustentabilidade organizacional, persiste uma tentativa de se fundamentar um estudo plenamente teórico que dê conta de explorar os relacionamentos em investigação.

Demo (2000) considera que uma pesquisa teórica é aquela que se dedica a reconstruir teorias, conceitos, ideias e polêmicas, uma vez que, por um imediatismo metodológico, procura aprimorar fundamentos teóricos não muito bem alicerçados. Esse autor ressalta que uma pesquisa teórica não exige e, principalmente, não implica uma imediata intervenção na realidade, mas nem por isso ela deixa de ser importante, pois é por ela que são criadas condições para futuras investigações empíricas. Esforços de pesquisas teóricas são justificáveis quando os fatos e as relações sobre um determinado tema de estudo ainda não estão satisfatoriamente explicados.

Toda essa categorização definiu o caráter exploratório da pesquisa. A pesquisa exploratória intenta conhecer as características de um fenômeno para posteriormente buscar explicações de suas causas e consequências (Richardson, 2008). Esta análise exploratória dos objetivos de pesquisa foi permitida por procedimentos técnicos retidos a um extenso levantamento bibliográfico. Martins e Theóphilo (2007) consideram que a pesquisa bibliográfica é uma estratégia necessária para a condução de qualquer pesquisa científica, pois procura explicar e discutir um assunto, tema ou problema com base em referências publicadas em livros acadêmicos, periódicos e anais de congressos nacionais e internacionais.

Para um melhor aprofundamento do tema em discussão, o presente artigo foi desenvolvido em sete seções: introdução, procedimentos metodológicos, o agir organizacional e as competências, sustentabilidade organizacional, elaborando a framework e considerações finais. O Quadro 1 elenca os principais temas em análise neste artigo e o que se desejou investigar sobre cada um deles.

 

O Agir Organizacional e as Competências

Como o foco deste artigo recai sobre as organizações, buscou-se por uma teoria que permitisse contemplar um agir organizacional - processo de ações e decisões - capaz de qualificar, categorizar e encaminhar a sustentabilidade organizacional. Dessa monta, caminhou-se na direção do padrão teórico referenciado pela teoria do agir organizacional desenvolvida por Maggi (2003a, 2003b).

Para ele, a teoria do agir organizacional é tanto uma teoria do agir social como uma teoria do agir racional. O agir social indica um agir do qual o sentido intencionado, de um ou mais sujeitos, se dirige ao agir de outros sujeitos. Assim, o agir organizacional concerne tanto aos processos de ação de um sujeito singular quanto aos processos de ação coletiva. O agir racional valida a ideia de que o agir organizacional ordena as ações do processo em direção a um objetivo perseguido, mas esse agir racional é intencional e limitado como a razão humana o é (Maggi, 1984, 2001, 2003a, 2003b).

Por meio das proposições de Maggi (2001, 2003a), compreende-se que o agir organizacional é um macroprocesso consequente de inúmeros subprocessos, influenciado tanto por fatores externos quanto internos. Esses processos, para serem efetivamente realizados, precisam ser compreendidos pelos indivíduos que o realizarão e deles participarão. O compreender, no entanto, precisa ser comprovado; caso contrário, torna-se uma adversidade para toda a cadeia de ações dependentes. Essa validação está relacionada em parte com o empirismo organizacional, mas também se relaciona com a riqueza da subjetividade das relações organizacionais. A causalidade dos relacionamentos organizacionais, portanto, acontece pela compreensão das ações individuais, as quais comungam um espaço simultaneamente hipotético e real. Entre esta interligação do que existe e do que se deseja, alcança-se uma rede sistêmica de ações traduzida como o agir organizacional.

Sendo o agir organizacional um agir social circunscrito, observa-se que ele emerge de uma humanidade cujas ações são em grande parte nãológicas ou até mesmo reflexivas. Essa distância do concreto não classifica o agir humano como irreal, pois é pelos momentos de abstração que se alcançam considerações de como agir ou decidir em relação a algo. Decisão e ação são atos findos, mas não finitos, ou seja, a realização dos mesmos, ainda que reversível, deixa um histórico, por isso almejam ser proferidos por uma certeza indubitável. Certeza, aqui, nada mais é do que uma incerteza reduzida sobre uma realidade observável e totalmente influenciável pelos indivíduos que procuram estabelecer posições de dominação em processos de negociação. Se o processo é influenciável, também é conflituoso, e tal conflito, ainda que dentro de uma organização, representa uma desordem social oriunda de uma dimensão social maior. Considera-se como maior dimensão a sociedade, que, para conter seus conflitos e adversidades, procura por regras, as quais podem ser impostas ou negociadas. As regras, normas e demais meios de regulação são tendenciosos, uma vez que constituem uma ação racional tomada e decidida por alguns indivíduos que visam a um benefício social ou individual futuro. Essa lógica de ação, qualificadamente complexa, ainda que estruturada com os mais profundos detalhes, é intencional, pois os indivíduos sabem o que querem, e limitada, assim como a razão humana. Toda essa complexidade de relações é compreendida como o agir social (Maggi, 1984, 2003b).

Maggi (2003a) explica os pilares do agir organizacional a partir da descrição da execução da obra Octeto em fá maior D803, de Schubert, para dois violinos, viola, violoncelo, contrabaixo, clarinete, fagote e trompa, da seguinte forma:

[...] estamos na presença de um trabalho coletivo, qualquer que seja a definição que se dê a essa noção; e na presença de um grupo de trabalho, o conjunto. [...] a ação de cada músico dirige-se à ação dos outros músicos, e a de todos se dirige no mínimo à administração do teatro e ao público presente na sala. [...] o processo de ação de cada sujeito, assim como o processo comum do conjunto, está relacionado a outros processos. [...] a adaptação dos meios aos fins concerne, sem dúvida, aos instrumentos que a composição musical exige, mas também ao nível das capacidades, dos conhecimentos e das competências dos músicos, e ao tempo que dedicaram aos ensaios. [...] os músicos parecem dominar completamente os meios e os fins, mas a incerteza jamais será excluída, não se sabe o que pode acontecer.[...] o que faz a diferença é que cada músico queria tocar essa obra, mas não podia fazê-lo sozinho. [...] sendo a execução da música o objetivo comum, os oito músicos cooperam para atingi-lo. E, para que essa cooperação dê certo, eles se coordenam (p. 8).

Diante da breve exemplificação, pode-se concluir que as características centrais do agir organizacional em diferentes situações são a finalização, que constitui a compreensão da relação meios/fins/resultados, e a estruturação do processo, que envolve a articulação de processos e o entendimento das ações como racionalmente limitadas e intencionais. Além disso, percebe-se que a cooperação influencia o poder das ações, que, por consequência, influencia a efetividade das decisões, a qual, por sua vez, influencia as estratégias organizacionais e os relacionamentos sociais (Maggi, 1984, 2000, 2001, 2003a, 2003b).

Depois de compreendidos os fundamentos da teoria do agir organizacional, pesquisou-se sobre uma teoria que propusesse conceitos impulsionadores de consistência e coerência às ações organizacionais e aproximou-se da lógica das competências. Esta detém premissas exigentes da compreensão do coletivo e de sua relação com o individual. Zarifian (2002) afirma que a gestão por competências exige maior autonomia no ambiente de trabalho e melhores níveis de comunicação entre organização e indivíduo. Os conceitos participados por Fleury e Fleury (2008), nos quais definem a competência como "um saber agir responsável e reconhecido, que implica mobilizar, integrar, transferir conhecimentos, recursos, habilidades que agreguem valor econômico à organização e valor social ao indivíduo" (p. 30); por Mills, Platts, Bourne and Richards (2002), que consideram a competência como um ato organizacional efetivo; e por Maggi (2003a), em que a competência organizacional é definida como um saber fazer coletivo de alta qualidade, deram base para a constatação da abordagem da competência como a mais adequada.

Mills et al. (2002) acrescentam ainda que as competências são construídas a partir de recursos, os quais, se bem articulados e coordenados, configuram as competências organizacionais. Os autores admoestam que a competência é, em síntese, uma ação organizacional expressa por um verbo. Para eles, o que diferencia competência de recurso é que este representa uma potencialidade organizacional enquanto aquela constitui um agir organizacional efetivo. Um recurso denota o que uma empresa tem e uma competência denota o que uma empresa sabe fazer bem a partir da articulação de recursos.

Teece, Pisano and Shuen (2001) complementam a abordagem ao alertarem que forças externas fazem com que as organizações adquiram capacidades mais aprimoradas quanto à organização de seus recursos e, também, exigem que elas desenvolvam competências organizacionais específicas capazes de responder às modificações ambientais. Informação que corrobora a interação entre agir social e agir organizacional.

Mills et al. (2002), em pesquisas interessadas em analisar diferentes contextos organizacionais quanto à disponibilidade e gestão de seus recursos e competências, elaboraram uma hierarquia onde categorizam as competências organizacionais passíveis de serem instigadas e promovidas, as quais foram unidas às perspectivas da teoria do agir organizacional e estão expostas e explicadas no Quadro 2.

No entendimento de Mills et al. (2002), dada uma competência, sempre é possível entendê-la a partir de seus recursos constitutivos. Uma vez entendida, é possível aprimorá-la, seja pelo enriquecimento de seus recursos constitutivos, seja pela melhor coordenação dos mesmos. Frente ao exposto, conclui-se que as competências organizacionais representam a operacionalização sistêmica dos recursos, considerando os objetivos organizacionais e as influências ambientais.

Ao refletir sobre as definições concedidas pelos autores estudados (Fleury & Fleury, 2008; Maggi, 1984, 2000, 2001, 2003a, 2003b; Mills et al., 2002), chegou-se à conclusão de que o agir organizacional - processo de ações e decisões - pode ser traduzido em uma competência organizacional.

Isso permite objetividade na descrição e torna-o capaz de registrar eficiência na ação organizativa frente aos resultados almejados. O conceito unificado remete à capacidade organizacional de conceder retorno econômico suficiente e agregar valor social aos indivíduos, complementado com os preceitos do triple bottom line, agrega-se à exigência de não comprometer o ambiente (Mills et al., 2002; Elkington, 1999; Fleury & Fleury, 2008). Competência, portanto, para este estudo, relata eficiência, ou seja, o melhor uso possível e articulado dos recursos. É ela meio de fomento e verificação da eficácia nos processos de ações e decisões.

 

Sustentabilidade organizacional

O que pode ser considerado para classificar uma empresa como sustentável? Até meados da década de 1970, uma empresa poderia ser considerada sustentável se fosse economicamente saudável, com um bom patrimônio e lucros crescentes, mesmo se houvesse dívidas. Para um país, um viés social, pois o desenvolvimento teria que incluir uma divisão da riqueza gerada pelo crescimento econômico, seja por meio de empregos criados, seja por meio de mais serviços sociais para a população em geral, além do fato de esse crescimento não comprometer o capital natural. Hoje, a abordagem do triple bottom line, conhecida também como os três Ps (People, Planet and Proift), dá outras configurações para a organização sustentável, porque deverá se ater não somente ao quesito lucro, mas também e concomitantemente ao desenvolvimento social e à preservação ambiental.

A sustentabilidade organizacional, de acordo com Lélé (1991), Jiménez-Herrero (2000) e Osorio, Lobato and Castillo (2005), é apenas uma das sustentabilidades que potencializam o alcance de um desenvolvimento sustentável sistêmico. A sustentabilidade, quando buscada pelas diversas formas de organizações existentes (empresas, universidades, ONGs, departamentos políticos etc.), constitui-se em intentos que primam pela busca de um equilíbrio macro de diversos sistemas sociais. A soma desses intentos e seus consequentes alcances é o que concede os alicerces institucionais, sociais, culturais e econômicos para a viabilização de um desenvolvimento sustentável sistêmico.

A aproximação entre organizações e princípios da sustentabilidade ganha gradativa relevância na academia e no mercado em escala global. O elevado interesse pela sustentabilidade em organizações advém, principalmente, da globalização, pela qual a complexidade do mundo dos negócios eleva-se ininterruptamente. É por ela que demandas antes não existentes começam a surgir e a cobrar, por parte das empresas, o desenvolvimento de mecanismos que comprovem um elevado nível de transparência em seus respectivos processos de negociação (Azapagic & Perdan, 2000; Dyllick & Hockerts, 2002; Azapagic, 2003; van Marrewijk, 2003; Jamali, 2006).

Organizações envolvidas ativamente no debate sobre sua sustentabilidade tentam identificar maneiras pelas quais elas possam desenvolver novas metodologias de gestão que confluam no aprimoramento de práticas relacionadas a cada um dos pilares que alicerçam esse fenômeno e, consequentemente, contribuir de maneira mais coerente com o desenvolvimento sustentável sistêmico (Azapagic, 2003). Quando se fala nas dimensões, nos pilares, nos sustentáculos e por que não nas competências que fundamentam a sustentabilidade organizacional, procura-se uma lógica que explique cientificamente essa divisão. Dentre as muitas proposições, adotou-se a abordagem sistêmica de Passet (1996), a qual ressalta a interdependência de três pilares principais inseridos no sistema de compreensão e acontecimento da sustentabilidade: o pilar econômico, o pilar ambiental e o pilar social.

Observando o exigido em cada pilar em comparação com as premissas do agir organizacional, neste estudo, por entender que isso traria mais objetividade e propriedade à discussão, os pilares foram convertidos em sustentabilidades componentes da sustentabilidade organizacional. Seriam, portanto, subsistemas da sustentabilidade organizacional, aqui entendida como uma representação sistêmica do equilíbrio dos subsistemas - agires organizacionais - Sustentabilidade Econômica, Sustentabilidade Ambiental e Sustentabilidade Social, conforme apresentado no Quadro 3.

Cada uma das sustentabilidades mencionadas compõe um todo, um sistema. Representa, por um lado, capacidades organizacionais e, por outro,objetivos estratégicos. Muitos estudiosos, ambientalistas e governantes concordam que a sustentabilidade pode ser alcançada pelo equilíbrio eficaz dos objetivos sociais, ambientais e econômicos (Meadows et al., 1992). Autores, como Passet (1996), Elkington (1999), Dyllick andHockerts (2002), McDonough and Braungart (2002) e O'Connor (2006), consideram que os pilares que alicerçam a sustentabilidade das organizações não são fenômenos desvinculados uns dos outros, mas, sim, coexistentes, cíclicos e dinâmicos, os quais, por meio de seus interrelacionamentos, possibilitam o desenvolvimento de mecanismos que diagnosticam a sustentabilidade de uma organização. Em busca de operacionalização e viabilização da SO, sondaram-se termos e conceitos representativos de ações objetivas, passíveis de serem analisados a partir de seus recursos constitutivos, e medidos por indicadores que retratassem o alcance ou não dos elementos centrais da SO. Chegou-se a três competências de suporte: a ecoeficiência, a justiça socioambiental e a inserção socioeconômica.

A ecoeficiência refere-se à capacidade de fornecimento de bens e serviços a preços competitivos que satisfaçam as necessidades humanas e proporcionem qualidade de vida ao mesmo tempo em que reduz progressivamente o impacto ambiental e o consumo de recursos. Na visão de Piotto (2003), é o saber combinar desempenho econômico e ambiental, reduzindo impactos ambientais, usando mais racionalmente matérias-primas e energia, reduzindo os riscos de acidentes e melhorando a relação da organização com as partes interessadas (stakeholders). Entre os principais elementos da ecoeficiência, estão: reduzir o consumo de materiais com bens e serviços, reduzir o consumo de energia com bens e serviços, reduzir a dispersão de substâncias tóxicas, intensificar a reciclagem de materiais, maximizar o uso sustentável de recursos renováveis, prolongar a durabilidade dos produtos e agregar valor aos bens e serviços. Denota, portanto, a capacidade organizacional de promover o desenvolvimento econômico aliado à preservação e conservação ambiental.

A justiça socioambiental, adaptando o conceito de Nusdeo (2002) ao contexto organizacional, trata da equalização da distribuição dos benefícios e dos constrangimentos impostos pelo ambiente organizacional. Objetiva que os grupos, em especial os mais vulneráveis, como as chamadas minorias, não sejam afetados desproporcionalmente pelos efeitos negativos da organização produtiva. Além disso, prima pelo direito de participação efetiva nas decisões que os afetam e compensação pelos constrangimentos por eles suportados. A concretização da ideia de justiça socioambiental, assim, tem uma dimensão substantiva, relacionada à distribuição dos benefícios, riscos e impedimentos, e também um aspecto procedimental, relacionado à participação da população afetada nas decisões das políticas ambientais que as atingem. Portanto, a justiça socioambiental denota a capacidade organizacional de realizar o gerenciamento, a preservação e a conservação ambiental aliados ao desenvolvimento social.

Já a inserção socioeconômica, adaptando as visões de Bujes (2008) e Moreira (2006) ao contexto organizacional, é uma competência capaz de viabilizar o engajar da organização em favor do coletivo, de modo que todos os funcionários possam ter acesso à informação, alimentação, saúde, educação, habitação, trabalho, renda e dignidade compatíveis com sua posição hierárquica. Isso envolve a mobilização organizacional na promoção de mais justiça e igualdade, de forma que haja crescimento real nas diversas unidades organizacionais e níveis hierárquicos, com vistas a eliminar, gradativamente, os déficits sociais apresentados nos indicadores discutidos mundialmente. Observa-se ligação direta com a melhor formação das pessoas. Essa formação deve contribuir publicamente para melhores condições de exercer ação frente aos novos desafios tecnológicos e competitivos. Portanto, a inserção socioeconômica denota capacidade organizacional de promover o desenvolvimento social aliado ao desenvolvimento econômico.

Quando validadas, tais competências permitem um equilíbrio organizacional sistêmico representante da conquista da sustentabilidade organizacional, a qual contribuirá para um equilíbrio maior de interesses relacionados a cada uma de suas sustentabilidades, que, lastreadas pelas premissas do agir organizacional, ainda que inconscientemente, provêm de um entendimento de desenvolvimento coletivo, com objetivos compartilhados, coordenados e em contexto de cooperação.

Enfim, essas interações permitem analisar como se dá a relação de conflitos entre interesses econômicos, sociais e ambientais, e exigem um novo raciocínio de gestão que seja capaz de equilibrá-los e integrá-los no cotidiano das organizações (Dyllick & Hockerts, 2002; Elkington, 1999; Jabareen, 2006; McDonough & Braungart, 2002).

 

Elaborando a Framework

Dada à importância de os termos em análise encontrarem-se alinhados, buscou-se entendimento sobre o que seria estar alinhado em contexto organizacional. Em pesquisas relacionadas à estratégia, o alinhamento denota agrupamento, coesão, ajuste e congruência entre diferentes dimensões, podendo ser discutido simultaneamente como processo e resultado, por isso é assumido como uma dinâmica de ajuste da organização com o ambiente ou como um mecanismo de mobilização dos recursos organizacionais em função da interatividade inerente aos processos estratégicos (Galbraith & Kazanjiam, 1986).

Como já ressaltado, o desenvolvimento sustentável constitui um fenômeno sistêmico dependente de uma série de sustentabilidades, entre as quais a sustentabilidade organizacional. Esta representa o equilíbrio de todo um sistema, o qual é amparado por processos relacionados ao desenvolvimento sustentável organizacional, que se responsabiliza pelo equilíbrio de cada subsistema organizacional e suas respectivas interações. Ao se converterem os subsistemas da SO em competências, em agires, criam-se mecanismos aplicados de gestão capazes de aglutinarem-se e constituírem-se em uma arquitetura de competências descritora e orientadora do acontecimento da SO.

Assim, fundamentando-se nos conceitos já definidos e interagidos, entende-se aqui a Sustentabilidade Organizacional como uma competência central, viabilizada pela justaposição das competências-chave: Sustentabilidade Econômica, Sustentabilidade Ambiental e Sustentabilidade Social, que, por sua vez, são viabilizadas pela interação e atendimento das competências de apoio: Ecoeficiência, Justiça Socioambiental e Inserção Socioeconômica. Nesse sentido, a Sustentabilidade Organizacional, um agir organizacional, uma competência central, é compreendida pela arquitetura de competências apresentada na Figura 1.

É fundamental lembrar que esse agir organizacional - a sustentabilidade organizacional - está articulado ao agir social e vinculado à estratégia organizacional, bem como a uma série de recursos organizacionais. Prioriza-se, assim, o âmbito das competências que constituem, em suma, o agir organizacional mobilizador de recursos e formador de uma cadeia de relacionamento capaz de retratar o caminho para o acontecimento da sustentabilidade organizacional. Contudo, ressalta-se o que já foi dito anteriormente: como esse agir social vai muito além do escopo de ação gerido e assimilado internamente pelas organizações, é necessário considerar as influências externas.

Percebe-se que a lógica das competências concede orientações para se gerirem os quesitos relacionados à sustentabilidade das organizações, pois permite delimitar e orientar ações objetivas e coerentes com os respectivos "agires organizacionais" pretendidos. Também é responsabilidade das competências delimitar as qualificações que permitirão às organizações o status de serem qualificadas como sustentáveis.

Logo, enquanto a competência fundamenta a capacidade de as organizações desenvolverem-se sustentavelmente (agir organizacional) em consonância com o agir social, a articulação entre diferentes níveis de competências conectará os conhecimentos organizacionais referentes às preocupações sociais, econômicas e ambientais e, por meio de processos devidamente compreendidos, concederão cada vez mais força e objetividade a esse relacionamento. Alcançam-se, assim, a descrição e a explicação da framework, considerada ainda em construção, conforme verificado na Figura 1.

 

Considerações finais

Ao introduzir as premissas do agir organizacional como norteadoras para a construção de uma sequência de processos interconectados que formasse uma rede descritora das exigências para se chegar à sustentabilidade organizacional, encontrou-se um agir organizacional orientado para a sustentabilidade da organização. Não limitado em si, mas compreensivo de que a organização depende de inúmeros relacionamentos ocorrentes com diversos atores sociais inseridos em contextos que vão além daqueles controlados por processos de gestão diretamente vinculados a administração das empresas, é essencialmente promovido por um intuito interno de a organização desenvolver métodos e rotinas de gestão que se preocupem em ofertar não somente para si mesma, mas para todos que com ela mantêm contatos, resultados sustentáveis. Enfim, explicou-se como a sustentabilidade organizacional expressa a capacidade de a organização desenvolver-se sustentavelmente, bem como os caminhos para tal, de forma permanente, nunca acabada e disseminada por todos os níveis.

Ao se buscarem os agrupamentos de competências necessários para viabilizar a conquista da sustentabilidade organizacional, chegou-se a três grupos de competências traduzidos como agires e ordenados de forma a aturem ao mesmo tempo como objetivos e indicadores das ações e decisões para se chegar à SO. Todos os grupos atuam de forma alinhada, interconectada e se retroalimentando.

Ao se buscar validar a justaposição da abordagem das competências com a sustentabilidade organizacional, chegou-se ao preceito de gestão viabilizador da inserção dos princípios da sustentabilidade nas ações e decisões organizacionais. Embora seja uma validação encontrada por meio da descrição e explicação da complementaridade das temáticas em estudo, tendo em vista a lacuna conceitual sobre a aplicabilidade da SO, a aproximação em pauta concede rumos para as ações e decisões, bem como meios para melhor compreendê-las e modificá-las frente aos desafios ambientais.

Diante das discussões estabelecidas ao longo do artigo, destacam-se ainda os seguintes comentários.

Mantém-se o entendimento de que a SO é um sistema, composto e mantido por seus subsistemas SE, SA e SS, que, por sua vez, são mantidos e compreendidos pelos subsistemas ecoeficiência, justiça socioambiental e inserção socioeconômica. Isso reforça a relação de mútua influência, deixando claro que qualquer modificação em uma parte do sistema influenciará o todo.

Articular o agir organizacional à temática sustentabilidade organizacional significa buscar preencher espaços deficientes nessa relação, significa compreender o processo de acontecimento e suas variâncias, não ações isoladas, muitas vezes alardeantes do fim próximo do mundo, outras vezes ingênuas quanto à sua viabilidade e efeitos. Aqui, propõe-se que os agires organizacionais sejam regularizados, alinhados, coordenados e alcancem a razão máxima permitida pela mente humana. Ainda que as competências apresentem este potencial de orientar a gestão da sustentabilidade, se ambas não estiverem articuladas, processos desintegrados podem acarretar uma falta de coesão das estratégias organizacionais, situação que confluiria em prejuízos econômicos, sociais e ambientais ainda maiores.

Por fim, acredita-se que a framework construída e apresentada na Figura 1 introduz aos estudos das organizações a validação, ainda que teórica, da importância da justaposição dos termos como meio de viabilizar o acontecimento da SO. Raciocinar nesse sentido pode permitir às organizações avançar rumo à aplicação de algo que atualmente parece tão distante. Ressalta-se, por último, que o presente trabalho continua em construção, entende suas lacunas e encontra-se aberto para sugestões de aprimoramento.

 

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Recebido em: 23/08/11
Aceito em: 26/11/11

 

 

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