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Boletim de Psicologia

 ISSN 0006-5943

     

 

ARTIGOS ORIGINAIS

 

Acampamento de férias para jovens com Diabetes Mellitus Tipo I: Achados da abordagem psicológica

 

Vacation camp for children and adolescents with Type 1 Diabetes Mellitus: Findings of the psychological approach

 

 

Maria Geralda Viana Heleno * I; Marília Martins VizzottoI; Taís MazzottiI; Renata Cressoni-GomesI; Sue Ellen Ferreira ModestoI; Sandra Roberta Ferreira GouveiaII

I Universidade Metodista de São Paulo
II Universidade de São Paulo - Faculdade de Saúde Pública

 

 


RESUMO

Diabetes Mellitus Tipo 1 requer tratamento intensivo no sentido de reduzir o aparecimento e a progressão das suas complicações. Abordagens educacionais são fundamentais para se alcançar o melhor controle metabólico possível. Visando descrever como crianças e adolescentes, participantes de um Acampamento de Férias, percebem sua condição diabética e o tratamento, foram realizadas 98 entrevistas semidirigidas. Os resultados mostraram que o diagnóstico é sempre um fator impactante, difícil de ser aceito pelo jovem e seus familiares. O suporte da família e amigos, quando excessivo, prejudica a qualidade da adaptação. Eles consideram suas vidas sociais restritas e sofrem com o controle imposto pelo tratamento. Consideraram o ambiente do Acampamento de Férias propício para aprender sobre a doença, promover sua independência afetiva e autonomia na auto-monitorização.

Palavras-Chave: Diabetes Mellitus Tipo 1, Acampamento de férias, Educação em diabetes.


ABSTRACT

Type 1 Diabetes Mellitus requires intensive treatment in order to reduce the incidence and progression of complications. Educational measures are fundamental to reach the best metabolic control possible. This study realized 98 semi-structured interviews aimed to describe how children and adolescents, participants in a Vacation Camp, perceive their diabetic condition and treatment. The results revealed that the diagnosis is always an impacting factor, difficult to be accepted by the young ones and their families. The support from family and friends when excessive impairs their adaptation. They consider their social lives very restricted and suffer with the control imposed by the treatment. They consider the environment of the vacation camp appropriate to learn about their illness and to promote affective independence and autonomy into self-monitoring.

Keywords: Type1 Diabetes Mellitus, Vacation camp, Diabetes education.


 

 

Diabetes Mellitus (DM) refere-se a um grupo de doenças metabólicas caracterizadas por hiperglicemia resultante de defeitos na secreção de insulina, na sua ação ou ambos, que, a longo prazo, determinam dano e disfunções em diversos órgãos (American Diabetes Association, 2006). De acordo com a Sociedade Brasileira de Diabetes - SBD (2006), o controle glicêmico estrito é capaz de reduzir o aparecimento e a progressão de suas complicações crônicas. O diagnótico de DM tipo1 geralmente ocorre na infância e adolescência, sendo o pico de incidência ao redor dos 10 a 14 anos de idade. Os sintomas (poliúria, polifagia, polidipsia e perda de peso) que levam a este diagnóstico são proeminentes, podendo haver quadro de cetoacidose. Uma vez estabelecido o diagnóstico de DM tipo1, os pacientes requerem insulinoterapia para sobrevivência, além de outras modalidades de tratamento, visando manter o melhor controle metabólico possível. Para manutenção do controle glicêmico, ao lado da insulinoterapia, fazem-se necessários um plano alimentar, atividade física regular e freqüente monitorização da glicose capilar. As complicações crônicas são as principais responsáveis pela morbi-mortalidade destes indivíduos e estão diretamente associadas ao controle glicêmico inadequado (Gross, Silveiro, Camargo, Reichelt e Azevedo, 2002).

Aspectos psicossociais também contribuem para a estabilidade da glicemia. A forma como o paciente lida com o diagnóstico e o tratamento está relacionada a recursos internos (psíquicos) e externos, tanto dele quanto de sua família. Estudos realizados com indivíduos com diabetes tipo1 mostram a influência de recursos psicológicos, afetivos, psicossocias e o papel da família no controle glicêmico. Além disso, apontam a necessidade de considerar as fases do desenvolvimento humano, pois os indivíduos apresentam comportamentos característicos de cada fase, havendo influência na aderência ao tratamento (Alvarado, Escala e Latorre, 2002; Anderson, Brackett, Finkelstein e Laffe, 1997; Maharaj, Daneman, Olmested e Rodin, 2004).

Suris, Michand e Viner (2004) escreveram um artigo de revisão sobre o impacto da doença crônica no processo biopsicossocial do adolescente. Os autores apontam que a maioria das pessoas jovens apresenta dificuldades para lidar com uma doença crônica. Os adolescentes não têm maturidade para imaginar as futuras conseqüências da doença, também apresentam dificuldades para lidar com regras e limites. Concluem que a doença crônica tem um impacto negativo no desenvolvimento do adolescente. O adolescente apresenta conflitos que são característicos da própria fase do desenvolvimento. Esses conflitos são intensificados com a presença da doença crônica.

Burd (2004) considera que a adolescência é um momento crítico para o controle do DM. Segundo Bryden et al. (2001), os conflitos inerentes ao período da adolescência são importantes variáveis a serem consideradas no controle glicêmico. Carrol e Marrero (2006) realizaram um estudo com adolescentes com diabetes e apresentaram a percepção deles referente ao impacto da doença, ao relacionamento com os pais e amigos, na escola e nas atividades diárias. Os resultados mostraram que os adolescentes acreditam que o DM Tipo1 promove um comportamento responsável; eles precisam ter mais responsabilidade comparada aos amigos “não diabéticos”. Tais jovens percebem a preocupação e superproteção dos pais para com eles e muitas vezes deixam de fazer o teste da glicemia capilar para evitar conflito. Eles acreditam que os resultados indesejáveis, hiperglicemia ou hipoglicemia, podem desencadear reação negativa por parte dos pais. Em relação aos amigos, de forma geral, sentem-se seguros e confiantes. Os amigos representam suporte e facilitam a forma como lidam com a doença, embora, em raras situações, estes apresentem atitudes invasivas, assemelhando-se ao comportamento dos pais. Em casos extremos os adolescentes mantêm segredo absoluto sobre sua condição diabética por sentirem vergonha de realizar a glicemia de ponta de dedo ou de aplicar insulina no ambiente escolar ou social.

A dieta impõe restrições em termos quantitativos e qualitativos que podem implicar em transtornos alimentares (TA). Alguns estudos revelaram a presença de TA em crianças e adolescentes com diabetes (Azevedo, Papelbaum e D’Elia, 2002; Stewart, Rao, Emslie e Klein, 2005). O artigo de revisão de Azevedo, Papelbaum e D’Elia (2002) mostrou freqüência aumentada de TA no DM Tipo1, quando comparado com pessoas sem diabetes, sendo a bulimia nervosa o transtorno mais observado. Esta possibilidade deve ser lembrada pelos profissionais da saúde, quando da dificuldade de controle glicêmico, pois as alterações da dieta interferem diretamente na qualidade do controle da glicemia. O tratamento do TA em pacientes com DM Tipo1 pode estar associado à diminuição das complicações desta disfunção.

 

RELACIONAMENTO, SUPORTE FAMILIAR E TRATAMENTO

A participação e a colaboração da família têm papel importante para assegurar o bem estar da criança e do adolescente com DM Tipo1. A forma como os pais lidam, reagem e comportam-se em relação à doença pode ter impacto na sua evolução. Diversos estudos comprovam a relevância do relacionamento e suporte familiar no controle metabólico do adolescente diabético (Anderson et al. , 1997; Harris, Mertlich e Rotheiler, 2001; Maia e Araújo, 2004; Skinner e Hampson, 1998).

Doenças crônicas, como é o caso do DM Tipo1, alteram o processo de desenvolvimento da criança e do adolescente e modificam a dinâmica familiar. A progressiva autonomia e independência podem estar prejudicadas. O desafio enfrentado pela família é permitir a independência mediante as restrições impostas pela doença, sem superproteger o filho. Tendo em vista a complexidade do DM Tipo1 e as dificuldades para adequação à nova rotina, a literatura tem mostrado a importância do atendimento multiprofissional tanto ao jovem como à sua família para se obter adequado controle da doença (Burd, 2004; Lidchi e Eisenstein, 2004).

Mellin, Neumark-Sztainer e Patterson (2004) realizaram uma pesquisa com pais de crianças e adolescentes com diabetes, que mostra a repercussão do DM Tipo1 na dinâmica familiar. Um dos conflitos entre pai e filho é gerado pela extrema preocupação dos pais com o controle glicêmico. Antes, por ocasião da descoberta da doença, os pais vivem grande impacto emocional negativo, além do temor de que eles tenham contribuído para o desencadeamento da doença, o que gera sentimentos de culpa. A partir de então as atenções se voltam para o necessário controle glicêmico, os conflitos giram em torno deste tema. As complicações, temidas pelos pais, decorrentes do mau controle glicêmico são referidas pelos pais com grande angústia e medo. Outro impacto importante ocorre na mudança da rotina familiar, pela exigência do tratamento, que impõe uma série de restrições e disciplina. Apesar dos conflitos e angústias os pais reconhecem alguns aspectos positivos como a responsabilidade que o adolescente precisa ter para lidar com a doença.

Alguns autores referem-se à superproteção como um comportamento comum encontrada em pais de crianças e adolescentes com DM Tipo1. As crianças e adolescentes percebem o comportamento superprotetor como invasivo (Burd, 2004; Caroll e Marrero, 2006; Mellin, Neumark-Sztainer e Patterson, 2004; Weinger, O’Donnell e Ritholz, 2001).

A superproteção, apesar de invasiva, deve ser analisada com cuidado. O DM tipo1 freqüentemente manifesta-se de forma súbita, podendo tal diagnóstico ser estabelecido durante hospitalização do jovem. Por se tratar de uma doença crônica, que requer disciplina no seu controle diário e sem perspectiva de cura, exige da família uma série de procedimentos, difíceis de serem prontamente assimilados, não pela questão intelectual, mas, em grande parte, pela crise emocional que se estabelece na família. Administrações diárias de insulina são obrigatórias, assim como a monitorização glicêmica (ponta de dedo). O tratamento também altera a rotina das pessoas envolvidas pelos cuidados com a dieta do jovem diabético que repercutem em toda a família. A criança, com o tempo, assume a responsabilidade do seu tratamento e controle, mas os pais estarão encarregados de cuidar da dieta e da atividade física e supervisionar a administração de insulina e controle glicêmico. Os episódios, principalmente de hipoglicemia, geram em muitos pais o temor de morte iminente da criança. Reside nesta situação de risco real a capacidade dos pais manterem o equilíbrio, assumindo a responsabilidade pela vida do filho portador de DM Tipo1.

Pelo caráter crônico e complexidade no manejo da doença, o DM Tipo1 exige demais da criança e de seus familiares. De acordo com Carrol e Marrero (2006), os pais impõem às crianças e adolescentes com DM Tipo1 restrições como, por exemplo, dormir na casa de amigos e a realizar atividades habituais para crianças não-diabéticas. Os pais justificam tais atitudes por considerarem seus filhos com diabetes mais vulneráveis a contratempos. Martins e Pires (2001), estudando pais de crianças com DM Tipo 1, observaram que a maior dificuldade era conviver com o medo constante da morte do filho, que se inicia no diagnóstico e passa a estar sempre presente em suas vidas.

Para Delamater (1990), a presença do DM Tipo1 provoca não apenas angústia nos pais, mas exige capacidade para lidar com as barreiras impostas pela presença do DM Tipo 1. Estas, além das psicológicas, são de ordem econômica. Os custos elevados do tratamento que inclui medicação, dieta e atividades físicas, além de todas as necessidades da criança e do adolescente, exigem dos pais grandes recursos financeiros.

Maharaj et al. (2004) realizaram um estudo com 88 adolescentes do sexo feminino que mostrou a importância do relacionamento mãe-filha no controle glicêmico. Fatores subjetivos e experiências prévias, antes do diagnóstico, no relacionamento mãe-filha estão associados com a facilidade ou não com que a adolescente lida com a doença. Assim, quando mãe e filha, no decorrer do desenvolvimento da criança, mantiveram relações positivas aumenta a possibilidade de a filha manter um bom controle glicêmico. Ao contrário as relações prévias insatisfatórias não estão associadas ao bom controle glicêmico.

A maneira pela qual os pais enfrentam a situação está, portanto, na dependência do máximo aproveitamento dos recursos disponíveis, quer sejam psíquico-sociais ou econômicos. Para isso, o primeiro passo é a educação do jovem e da sua família, ministrada por uma equipe de saúde bem preparada. Quando a educação não é eficiente e suficiente, dadas as características da família, a equipe multiprofissional deve elaborar estratégias alternativas. Cabe a estes profissionais um diagnóstico precoce e amplo da conjuntura familiar para ajudá-los a encontrar as medidas mais eficazes para garantir uma boa qualidade do controle glicêmico.

 

ACAMPAMENTO DE FÉRIAS PARA JOVENS COM DIABETES

De acordo com a Sociedade Brasileira de Diabetes - SBD (2006) cada vez mais se reconhece a necessidade e os benefícios do envolvimento do portador de DM Tipo1 e de sua família com a equipe de saúde. A educação é um dos pontos fundamentais para estabilidade do controle e os diferentes tipos de atividades educacionais, como grupos de orientação e palestras, têm como objetivo comum alcançar o melhor resultado possível. No Brasil, existem registros de Acampamento de Férias - AF no Rio de Janeiro, em Minas Gerais, no Rio Grande do Sul, na Bahia e em São Paulo. Os AF educativos permitem aliar lazer e cultura, proporcionando ao jovem ou criança com diabetes a aquisição de conhecimentos, estímulo à automonitorização e melhor aceitação da doença, através do trabalho realizado por uma equipe multiprofissional (Alcântara e Gonçalves, 1985; Maia e Araújo, 2004; Vivolo, Ferreira e Sustovich, 1993).

O AF promovido pela Associação de Diabetes Juvenil de São Paulo (ADJ/SP) e pelo Centro de Diabetes da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) e realizado no Acampamento Nosso Recanto (NR), desde a década de 1970, é um ambiente onde o jovem e a criança participam de atividades esportivas, recreativas, culturais e educativas (temas em diabetes), com acompanhamento por uma equipe composta por médicos, enfermeiros, nutricionistas, psicólogos, monitores de recreação e um coordenador da área médica, com experiência em AF.

Nas diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes - SBD (2006) esta modalidade de educação via AF educativo para portadores com DM Tipo1 está recomendada desde que garantida a segurança dos acampantes em todas as atividades. Durante o AF é realizado controle diário e minucioso da glicemia de cada jovem. Além das reuniões educativas formais, coordenadas pelos profissionais, o AF é um campo permanente de aprendizagem para os portadores de diabetes e profissionais.

Um importante aspecto do AF reside no fato de ser uma oportunidade para os pais perceberem que seus filhos podem ficar sem sua proteção. Para as crianças e para os jovens, que em muitos casos nunca se separaram dos pais, é uma valiosa experiência de autonomia e independência. Esta situação é muito particular em vista da segurança que o AF oferece, na presença de seus coordenadores de equipes e profissionais. As crianças no acampamento são cuidadas de forma integral e os pais recebem o apoio da equipe antes e durante o acampamento. As reuniões com as famílias realizadas pela equipe de profissionais promovem um vínculo de confiança e segurança, fator essencial para que os pais possam ficar longe dos seus filhos e usufruir de forma positiva desta nova experiência.

Tendo em vista o exposto acima e o interesse de avaliar como as crianças e adolescentes percebem sua doença e o tratamento, os objetivos deste trabalho foram: a) caracterizar a população de crianças e adolescentes freqüentadores de um AF; b) descrever o impacto da doença e adaptação à nova situação; c) descrever o relacionamento familiar e sua importância para o portador de DM; d) descrever os relacionamentos extrafamiliares, incluindo amigos e escola; e) descrever as limitações impostas pela disfunção; f) descrever a experiência do AF.

 

MÉTODO

Sujeitos

A amostra foi composta por 98 crianças e adolescentes de ambos os sexos, participantes da 20a e 21a edição do AF da ADJ/UNIFESP/NR, sendo 35,2% do sexo masculino e 64,8% do feminino, com idades entre 9 e 18 anos. Metade freqüentava escolas públicas e a outra metade escolas particulares e a maioria (62,5%) tinha parentes com diabetes. O AF foi realizado em uma das unidades do Acampamento Nosso Recanto, localizado em Sapucaí-Mirim, Minas Gerais, com duração de uma semana. Todas as crianças e adolescentes foram entrevistados durante a realização do acampamento.

Instrumento

Para a coleta de dados foi elaborado um roteiro de entrevista composto de questões abertas e fechadas. As questões fechadas serviram para a caracterização da amostra, levantando dados referentes a sexo, idade, escolaridade, tipo de escola freqüentada (pública ou privada), existência de parentes com diabetes, idade com que recebeu o diagnóstico, profissão dos pais e prática de atividade física. As questões abertas orientaram a realização da entrevista semi-dirigida, na qual cinco grandes temas foram abordados e se referiam à doença (diagnóstico da doença, adaptação à nova condição e adesão ao tratamento); ao relacionamento familiar (dificuldades e pontos favoráveis); a socialização (relações extra-familiares, amigos, escola); as limitações impostas pela doença; e a experiência no AF.

As entrevistas semi-dirigidas foram realizadas segundo o modelo proposto por Bleger (1985), que permite ao paciente a configuração da entrevista, ele pode falar livremente. Ao mesmo tempo, o entrevistador tem liberdade para coletar os dados que são importantes para alcançar seus objetivos na pesquisa. Assim, o paciente teve liberdade para abordar os grandes temas da maneira como ele preferiu e o entrevistador, também, teve liberdade para tirar dúvidas sobre as respostas dados pelos participantes da pesquisa. As entrevistas foram analisadas considerando o conteúdo das respostas para cada categoria.

Procedimento

A equipe de Psicologia, composta por cinco psicólogas, cada uma alocada em um quarto diferente, coletou os dados para este estudo. A realização da entrevista ocorreu mediante apresentação da proposta do trabalho e consentimento da criança ou adolescente em participar. As entrevistas foram realizadas com tempo máximo de duração de uma hora (incluindo preenchimento de dados da caracterização). Antes dos jovens irem ao AF, por ocasião da reunião prévia com os pais, foram comunicados e esclarecidos os objetivos e procedimentos da pesquisa. Foi solicitado a cada responsável, caso concordasse que o seu filho participasse da pesquisa, que assinasse o termo de consentimento livre e esclarecido. Foi ainda assegurado aos pais que a entrevista só seria realizada com a concordância do jovem e que não haveria nenhum prejuízo para o mesmo. As crianças e os jovens foram comunicados da pesquisa em seus quartos e com o pesquisador decidiram qual seria o melhor momento da coleta de dados. Apesar de ter sido estabelecido com cada um dos acampantes o momento da entrevista, havia flexibilidade no horário, tendo em vista a preocupação dos pesquisadores de não prejudicarem a criança ou adolescente no aproveitamento das atividades do acampamento.

 

RESULTADOS

I. Relação com a doença: diagnóstico, adaptação à nova condição e adesão ao tratamento

Os acampantes relataram a descoberta do DM Tipo1 como uma experiência impactante, tanto para eles quanto para seus familiares. A identificação da existência de um problema, antes do diagnóstico, se deu através da presença de sintomas como polidipsia, poliúria, perda de peso, desânimo e cansaço. Os relatos apontaram momentos de extrema tensão em virtude de alguns dos sintomas vivenciados, principalmente quando houve necessidade de internação. Os entrevistados relataram sua percepção face às reações dos pais, descrevendo-os como “desesperados”, “assustados”, “nervosos”.

As crianças e os adolescentes descreveram também o evento da internação inicial e contato com a doença como algo “horripilante”, pois muitos não imaginavam do que se tratava. O desconhecido se transformou numa situação desesperadora para a qual não era possível ter esperança. Falaram sobre o medo de morrer por ocasião do diagnóstico, tanto em função da reação dos pais quanto em função da própria enfermidade e sintomas. “Eu não entendia direito o que estava acontecendo, não sabia o que era, mas sabia que era uma coisa ruim, senti medo da morte”.

Os relatos indicaram também, que, quando a notícia era insuportável, um dos meios foi utilizar a negação como mecanismo de defesa frente ao diagnóstico. “Quando você recebe a notícia parece que não é verdade”. “Ainda é inacreditável!”. Outra forma de negar a gravidade da doença é transformar a percepção em algo bom. “As crianças diabéticas são mais felizes, pois aprendem a valorizar a vida”. “Eu sou normal, minha vida é igual a de qualquer um. É tudo normal!”.

No presente estudo a maioria dos jovens relatou que no início da doença encontraram dificuldades em administrar a insulina. Aos poucos eles foram se adaptando à nova situação. Logo após o diagnóstico, a maioria precisava da ajuda dos pais na aplicação de insulina. Aqueles com diagnósticos recentes precisavam também do auxílio dos profissionais de saúde. Esta condição dependente foi alterada durante o AF, quando estes jovens passaram a fazer auto-aplicação da insulina.

Alguns adolescentes destacaram que mesmo não tendo dificuldade em aplicar a insulina percebem essa rotina muito desagradável: “Ter que aplicar a insulina todo dia é um saco”. Outros adolescentes relatam sentir raiva em aplicar a insulina: “Tenho raiva de tomar insulina”.

Para as crianças esta rotina não parece ser tão difícil, considerando que na maioria dos casos (90%) os pais são inteiramente responsáveis pelo tratamento, incluindo a aplicação de insulina.

Do tratamento, a dieta parece ser o item mais difícil para muitos dos adolescentes. Eles referiram que apesar das dificuldades para aplicar a insulina, mais difícil é seguir a dieta. Algumas crianças e adolescentes relatam a dificuldade em participar de eventos sociais como festas de aniversário. Um deles disse: “Não gosto de ir a aniversários, para não ficar com vontade de comer doce e bolo”. Os adolescentes e as crianças cujos colegas da escola não sabem sobre a disfunção, em muitas situações, vivem experiências muito desagradáveis. Um deles relatou: “É muito difícil passar vontade. Às vezes, quem não sabe me oferece um doce e eu falo que estou com dor de estômago”.

II. Relacionamento Familiar (dificuldades e pontos favoráveis)

De um modo geral, as crianças e os adolescentes relatam que o apoio ou suporte da família é caracterizado como um fator de proteção. Os participantes percebem os pais como pessoas que auxiliam no controle do diabetes, apesar de se queixarem de excessos em algumas ocasiões. Há oscilação, sentimentos de ambivalência, entre sentirem-se amparados pelo cuidado dos pais e sentirem-se oprimidos e controlados o tempo todo. Uma adolescente destaca como se sente “sufocada” pelos pais: “A família é importante, meus pais me ajudam, mas eles são superprotetores e isto me sufoca”.

Há também relatos de que intenções de ajuda por parte da família podem ser sentidas como extremamente agressivas. Como nas situações em que outros membros da família comem escondidos alimentos, que o paciente com diabetes não pode comer. As crianças e os adolescentes percebem o comportamento superprotetor como invasivo. Um acampante diz: “Depois que ganhei um celular, minha mãe me liga toda hora para saber se estou bem”.

O relato de uma acampante (13 anos), diferente dos demais, reflete o modo como mudanças podem melhorar o relacionamento dos irmãos a partir do diagnóstico da disfunção. Segundo esta acampante, antes do diagnóstico, tinha muita dificuldade em se relacionar com o irmão mais velho (15 anos). Eles brigavam constantemente por ciúmes e falta de afinidade; após o diagnóstico o relacionamento mudou radicalmente, passando a ser mais agradável e satisfatório, inclusive com o desejo do irmão de ter desenvolvido a doença no lugar da irmã. Parece que o irmão sentiu-se culpado pelo ocorrido e passou a ter uma atitude mais positiva para com a irmã.

Neste estudo observou-se, na maioria dos casos, dificuldade no relacionamento entre irmãos. Algumas crianças e adolescentes com diabetes relatam que há muito desinteresse pela sua condição de saúde por parte dos irmãos e que estes não poderiam ajudá-los em uma situação de emergência na ausência dos pais. Outros se sentem culpados em virtude de decisões extremas dos pais, como impor a dieta a todos os membros da família. Situações como esta não raramente infligem sentimentos de culpa e inadequação, pois levam a criança ou o adolescente a sentir que atrapalha a vida da família.

Tanto as crianças quanto os adolescentes reconhecem a importância do apoio familiar, entretanto a cobrança excessiva dos pais parece interferir de modo negativo na vida dos portadores de diabetes. Eles relatam que os pais desconfiam sempre do seu comportamento em relação ao diabetes. Esta desconfiança está associada aos exames diários de medida de glicemia e a dieta. Outra conseqüência da preocupação excessiva dos pais é o fato de os portadores de diabetes não poderem sair de casa por períodos um pouco mais prolongados, mesmo por uma noite para dormir fora de casa. Entretanto, as crianças parecem não apresentar muitas dificuldades em relação às exigências dos pais, quando comparadas aos adolescentes. Estes reagem de forma mais intensa aos limites e exigências impostas pelos pais e pela disfunção. A fase da adolescência é caracterizada por mudanças geradoras de conflitos para os adolescentes e seus pais e intensificados quando somada a uma disfunção crônica como é o caso do DM. Eles dizem: “quando estou com hiperglicemia é difícil para meus pais acreditarem que eu não fiz nada de errado”; “Meus pais não confiam em mim, não posso sair de casa”; “Não posso sair porque tenho diabetes”; “A relação com meu pai é ótima, ele aparece uma vez por semana e não me cobra nada, mas minha mãe não dá sossego, parece que nunca está bom”; “Minha mãe fica muito nervosa e briga quando estou com hipoglicemia”.

No AF a separação dos pais e filhos é um importante fator. Os portadores de DM Tipo1 e suas famílias ficarão separados por sete dias. Este é, muitas vezes, um evento inédito na vida deles e nestes casos cabe à equipe lidar de forma eficiente para ajudá-los, tanto os pais quanto os acampantes, a superar a angústia da separação. A experiência no AF tem mostrado que, quando a separação é superada, o que tem sido alcançado em todos os casos poderá trazer benefícios inestimáveis para as famílias e os acampantes.

III. Socialização: relações extrafamiliares, amigos, escola

Os jovens relataram se sentirem apoiados pelos amigos mais próximos, considerando-os pessoas em quem podem confiar e com quem podem falar sobre sua doença. Essas pessoas foram descritas como um “auxílio” para o controle da doença, pois sabem o que eles podem e não podem comer, podem ser avisados quanto a possíveis episódios de hipoglicemia e quanto a formas de ajudarem em casos de necessidade. Há, contudo, relatos de certo desconforto quando estes amigos mais próximos assumem posturas muito controladoras, assemelhando-se aos pais, ou mesmo tornando-se figuras superegóicas mais castradoras. Eles percebem que alguns amigos apresentam um comportamento invasivo que se assemelha aos pais. Há também crianças que não se sentem à vontade em expor sua condição de saúde para os amigos e colegas da escola. Para estas crianças, o diabetes é motivo de vergonha e humilhação. “Sinto-me humilhado, jamais vou contar, todos vão rir de mim”. Outro adolescente também se sente envergonhado: “Na escola não sabem da doença, porque acho que teriam preconceito, não quero que ninguém saiba, pois nunca mais serei convidado para nenhuma festa, eu posso ir à festa e me controlar, se os outros souberem podem falar: ah, não te convidei porque você tem diabetes”. Nestes casos os pais da criança ou do adolescente informam apenas à direção da escola e aos professores, para que possam tomar providências, quando necessário. Mas, a possibilidade do jovem compartilhar a condição de saúde no ambiente escolar pode ser considerada um fator de proteção, uma vez que é inevitável a ocorrência de episódios em que este precisará de ajuda.

IV. Limites em Função da Doença

A maioria dos adolescentes e das crianças relata que não podem dormir fora de casa, na casa de amigos ou de familiares. Os adolescentes acreditam que os pais se preocupam com o estado de saúde do filho e assim preferem que eles durmam na própria casa. Os pais que permitem aos filhos dormirem fora de casa impõem algumas condições, como orientar os pais desses amigos sobre o diabetes. Os pais dos adolescentes com diabetes sentem-se mais seguros quando os amigos dos filhos vêm dormir em sua casa. Os jovens sentem-se diferentes dos amigos não diabéticos. Uma adolescente destacou o quanto gostaria de não ter diabetes: “Gostaria de poder comer com minhas amigas em uma sorveteria. Ser igual aos outros adolescentes”. A alimentação controlada é um fator negativo de destaque no discurso dos jovens com DM Tipo1.

V. O Acampamento de Férias

As crianças e os adolescentes relataram sobre sua participação no AF. Para eles, a experiência de participar do AF ajuda a esclarecer muitas dúvidas relacionadas à disfunção. Eles acreditam que essa experiência pode modificar e influenciar de forma positiva a sua rotina, quando voltarem para casa. Eles participaram de uma série de atividades muito prazerosas e junto a isto tiveram uma experiência de tratamento no qual eles atuaram ativamente. O fato de eles poderem discutir com o médico e compreender as medidas adotadas para o controle de sua glicemia parecem resultar em aumento da confiança da capacidade deles em manter um bom controle. Ainda, de serem capazes de administrar os momentos de crise provocados pelo mau controle. Relatam, também, o quanto é divertido e prazeroso estar no AF onde conhecem novos amigos e, em muitos casos, encontram nos monitores, portadores de DM Tipo 1, um exemplo de como é possível conviver de forma saudável com a doença. Para os adolescentes que receberam o diagnóstico há pouco tempo, a experiência do AF parece ter sido essencial para conhecer e entender muitas questões relacionadas ao DM Tipo1.

O AF, segundo os relatos, promove a independência em relação à doença. Eles dizem: “Comecei a aplicar insulina sozinho e agora sei quando estou com hipoglicemia ou hiperglicemia”.

O fato de encontrar e conviver uma semana com crianças e adolescentes com DM Tipo1 demonstrou ser um facilitador paras esses jovens. Uma criança disse: “0 acampamento me fez ver que existem outras crianças com a mesma dificuldade”. Os adolescentes sentem-se seguros com a equipe multiprofissional do AF. Um adolescente relatou: “Gostei do acampamento. Senti segurança por ter tantos profissionais”. Para alguns adolescentes a rotina do acampamento facilita a forma como lidam com a doença e até mesmo com o controle metabólico. “Aqui no acampamento é diferente, tem horário para comer, comida certa, tem uma rotina que facilita”.

 

DISCUSSÃO

A percepção dos jovens em relação ao diagnóstico é muito ruim, assim como é para seus pais. Nossos resultados assemelham-se aos encontrados por Mellin, Neumark-Sztainer, e Patterson (2004) em seu estudo, realizado com pais de adolescentes com diabetes, observaram que a descoberta da disfunção gera um impacto emocional negativo com a presença de sentimentos de culpa. Além da angústia os pais precisam ter recursos para enfrentar as barreiras econômicas e sociais relacionadas ao tratamento (Delamater, 1990).

Quanto à adesão ao tratamento, vários estudos mostram a dificuldade do portador de diabetes tipo1 em manter o controle glicêmico (Anderson et al., 1997; Bryden et al., 2001; Burd, 2004; Harris, Mertlich e Rotheiler, 2001; Maharaj et al., 2004; Maia e Araújo, 2004), fato que foi observado nesta pesquisa.

No que se refere ao relacionamento familiar tanto o presente estudo como o de Gross et al. (2002) mostraram a importância do relacionamento e suporte familiar no controle metabólico do adolescente com diabetes. A maioria dos adolescentes considerou que o relacionamento familiar tem importante influência na forma como lidam com a doença. A extrema preocupação dos pais torna-se motivo de conflito no relacionamento pai-filho. A cobrança excessiva dos pais parece interferir de modo negativo na vida dos portadores de diabetes. Esses dados são encontrados também na literatura (Lidchi e Eisenstein, 2004; Papelbaum et al., 2004).

A fase da adolescência é caracterizada por mudanças geradoras de conflitos que são intensificados, quando somada a uma disfunção crônica como é o caso do DM Tipo1, neste estudo foi possível observar este fenômeno. Suris, Michaud e Viner (2004) concluem que a doença crônica tem um impacto negativo no desenvolvimento do adolescente, que intensifica os conflitos próprios da idade.

O apoio dos amigos é considerado um fator muito importante para a criança e, principalmente, para o adolescente com diabetes. Neste estudo, os jovens relataram sentirem-se apoiados pelos amigos mais próximos, considerando-os pessoas em quem podem confiar e com quem podem falar sobre sua doença. A possibilidade do jovem compartilhar a condição de saúde no ambiente escolar pode ser considerada um fator de proteção, uma vez que é inevitável a ocorrência de episódios em que este precisará de ajuda.

As crianças e os adolescentes consideram haver alguns limites em função do DM Tipo1, tais como: não poder sair desacompanhado, não dormir fora de casa, ter uma vida social restrita e alimentação controlada. Dados semelhantes foram encontrados na pesquisa de carrol e Marrero (2006) realizada com adolescentes com diabetes.

Os relatos das crianças e dos adolescentes sobre o AF corroboram os dados apresentados na literatura. O discurso dos jovens revelou que a experiência em participar do AF ajuda a esclarecer muitas dúvidas relacionadas à disfunção. Eles acreditam que essa experiência pode modificar e influenciar de forma positiva a sua rotina quando voltarem para casa. Logo, os acampamentos educativos permitem aliar lazer e cultura, proporcionando ao jovem ou à criança com DM Tipo1 a aquisição de conhecimentos, estimulação da automonitorização e melhor aceitação da doença, através do trabalho realizado por uma equipe interdisciplinar, considerando que as atividades ocorrem de forma integrada (Alcântara e Gonçalves, 1985; Maia e Araújo, 2004; Vivolo, Ferreira e Sustovich, 1993).

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As entrevistas realizadas com as crianças e adolescentes com diabetes participantes de um AF revelam que a notícia do diagnóstico de DM Tipo1 é sempre um fator impactante, difícil de ser aceito pelo paciente e por seus familiares. Após o diagnóstico, eles relatam as dificuldades em administrar a insulina e a dieta. No início, referem-se à necessidade de ajuda sistemática da família e aos poucos vão se adaptando à nova situação. Estes relatos reafirmam a importância da educação em DM. A administração rápida e eficiente do tratamento, que pode ser realizada pelo paciente e por seus familiares, gera uma sensação de bem estar e a possibilidade de controle da hiperglicemia e dos episódios de hipoglicemia. Após o diagnóstico, os conhecimentos sobre a doença e a possibilidade de controle associados à observação do nível de ansiedade do jovem e de seus familiares são fatores fundamentais para a eficácia do tratamento.

Quanto ao suporte familiar, os jovens reconhecem que ele é fundamental. Porém, eles se queixam, quando o controle dos pais é excessivo e invasivo. Em muitas ocasiões as crianças e os adolescentes apresentam sentimentos ambivalentes. Assim, apreciam o amparo fornecido pelos pais, mas não suportam a opressão e o controle constante. Estes sentimentos ambivalentes, geralmente, são agravados na adolescência e,muitas vezes, transformam-se em um grande conflito entre pais e filhos. A equipe de saúde deve estar preparada para lidar com estas situações. considerar a posição dos pais, que pensam estar auxiliando os filhos, e a posição dos portadores de DM Tipo1, que precisam ganhar independência e sentem a opressão dos pais.

A administração eficiente deste conflito é muito importante no AF, pois, em muitos casos, é a primeira separação entre pais e filhos portadores de diabetes. Seria importante que os profissionais de saúde dessem atenção a este fato, da separação que deveria ser gradativa, para que o sofrimento pudesse ser minimizado. Assim, a criança deveria ter a oportunidade de separar-se dos pais por períodos menores e gradativamente ter melhores condições de afastar-se de casa por um tempo maior. Pensamos que a qualidade das relações familiares, de forma geral, deve ser observada com atenção para que ela favoreça a adaptação às ituações que se apresentam ao jovem com DM tipo 1 e seus familiares.

Considerando as relações sociais, crianças e adolescentes com DM Tipo1, na maioria das vezes, sentem-se apoiadas pelos amigos e os têm como pessoas nas quais podem confiar e podem falar sobre sua doença. Além disso, podem ajudá-los em situações difíceis com a dieta e episódios de hiperglicemia ou hipoglicemia. Há, contudo, situações nas quais estes amigos mais próximos assumem posturas muito controladoras e invasivas com as quais os portadores de diabetes lidam com dificuldade. Algumas crianças e adolescentes, entretanto, não se sentem à vontade em expor sua condição de saúde para os amigos e colegas de escola. Elas se sentem envergonhadas pela disfunção que possuem, temem a discriminação e compartilhar a condição de saúde no ambiente escolar e social é fator de proteção, este é outro problema a ser administrado pelos profissionais de saúde que atendem os pacientes com DM tipo1.

No que se refere aos limites impostos pela doença, as crianças se queixam de não poderem sair desacompanhadas ou dormirem fora de casa. Elas, de forma geral, consideram suas vidas restritas e sofrem com o controle alimentar e com a necessidade de medicação diária. Estes limites fazem com que as crianças e os adolescentes sintam-se diferentes dos amigos não diabéticos.

Quanto à participação no AF as crianças e os adolescentes consideram que este é um local onde elas puderam esclarecer muitas dúvidas relacionadas à disfunção. Eles acreditam que essa experiência pode modificar e influenciar de forma positiva a sua rotina, quando voltarem para casa. Para eles, o AF promove a independência em relação ao tratamento, pois eles são estimulados a automonitorização. Os relatos dos jovens revelaram que o AF proporciona uma semana de atividades de lazer e cultura aliadas à educação em DM. Eles se sentiram estimulados a adquirir novos conhecimentos, a se autocuidarem e a aceitarem melhor sua doença. Estes resultados reforçam a importância da educação em DM, principalmente considerando o AF, pois nesta modalidade é possível ao jovem diabético ter uma experiência real da possibilidade de administrar de forma adequada e saudável o tratamento do DM.

Finalmente, vale ressaltar que o trabalho educativo em DM deve ser realizado de forma continuada. Todos os conhecimentos e experiências vivenciadas pelos pacientes com DM no AF, por exemplo, devem ser cultivados e ampliados, não só pelo paciente, mas principalmente por cada um dos profissionais que cuidam deles, incluindo suas famílias. caso contrário muito do que foi obtido se perde com o tempo em função das dificuldades do dia-a-dia.

Sugerimos que a abordagem psicológica poderia fornecer subsídios para a equipe multiprofissional aperfeiçoar sua atuação junto a estes jovens e para estes melhorarem a maneira de encarar limitações psicológicas e sociais da doença.

 

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Recebido em 25/03/2008
Revisto em 28/08/2008
Aceito em 30/0802008

 

 

* Endereço para correspondência: Maria Geralda Viana Heleno - Avenida Gilda, 173, Vila Gilda. Santo André - SP. CEP: 09190-510. Fone: 4426-3153; E-mail: geraldaviana@superig.com.br.

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